Presidente do Novo: ‘Amoêdo era meu herói, mas se desconectou do partido ao declarar voto em Lula’


Eduardo Ribeiro diz que só se filiou à legenda por causa de seu fundador, mas ressalva que ele ‘mudou muito’ e se isolou das bases partidárias

Por José Fucs
Atualização:

Quando João Amoêdo, ex-comandante e um dos fundadores do Novo, declarou voto em Lula no segundo turno, o presidente do partido, Eduardo Ribeiro, classificou a decisão como “vergonhosa, constrangedora e incoerente” numa publicação no Twitter.

Ribeiro apoiou também a divulgação de um comunicado da legenda – que havia emitido dias antes uma nota oficial na qual criticava Lula e liberava o voto dos filiados – contestando a atitude de Amoêdo e afirmando que “o Novo sempre foi e sempre será oposição ao lulopetismo e a tudo o que ele representa”.

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Nesta entrevista ao Estadão, Ribeiro, de 34 anos, fala sobre a sua reação e a do partido ao apoio de Amoêdo a Lula e sobre os pedidos de expulsão apresentados contra ele na Comissão de Ética partidária. Analisa também o desempenho eleitoral do Novo, que conseguiu reeleger no primeiro turno o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, mas viu sua representação parlamentar encolher de oito para três deputados federais e de sete para cinco deputados estaduais.

“O João era meu herói. Só me filiei ao partido por causa dele. Mas ele não é mais a mesma pessoa. Mudou muito e o partido, não”, afirma. “Hoje, o João está completamente isolado e desconectado das bases do partido que ele mesmo fundou. A grande maioria dos filiados se sentiu traída com a sua declaração de voto em Lula.” Confira a seguir os principais trechos da entrevista.

João Amoêdo, ex-comandante e um dos fundadores do Novo, declarou voto em Lula no segundo turno  Foto: Helvio Romero/Estadão
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Como o sr. avalia o desempenho do Novo nestas eleições?

A minha avaliação é de que não fomos bem. A eleição foi muito polarizada e nós acabamos sofrendo as consequências disso. Tirando o PL (Partido Liberal), do presidente Jair Bolsonaro, nem mesmo outros partidos que apoiaram sua candidatura conseguiram ter um bom desempenho na esfera federal. O PTB, por exemplo, só fez um deputado. Nós elegemos três. O Novo se colocou num espaço de centro-direita crítico ao Bolsonaro e ao Lula, mas claramente não era esse o espírito desta eleição. Na esfera estadual, o nosso resultado também ficou abaixo do esperado. Elegemos cinco deputados estaduais e tínhamos uma expectativa de ir muito melhor, mas sofremos do mesmo mal.

O candidato do partido à Presidência, Luiz Felipe D’Avila, obteve apenas 560 mil votos, o equivalente a 0,5% dos votos válidos. Em sua avaliação, o que explica este desempenho?

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Acredito que foi um reflexo do mesmo problema. O resultado final da eleição no 1º turno foi 48% para Lula e 43% para Bolsonaro. Somando os dois, foram mais de 90% dos votos válidos. Não tinha muito o que fazer. Não havia espaço para outras candidaturas. Se tivesse sido 33% a 22% e houvesse outro candidato com 15% e mais um com 8%, 10% dos votos, seria diferente. Veja o que aconteceu com a Simone Tebet (candidata do MDB) e com a Soraia (Thronicke, candidata do União Brasil), que gastaram bilhões de reais na campanha. Todo mundo ficou no mesmo patamar. Vamos combinar que, no fundo, de 1% para 4% é quase a mesma coisa numa eleição como esta. Os dois extremos estavam muito bem sedimentados. E nós não usamos nem recursos do fundo eleitoral nem do fundo partidário. Gastamos cerca de R$ 2 milhões, obtidos por meio de captação própria, em toda a campanha. Agora, o D’Avila, que foi uma aposta pessoal minha, representou muito bem o partido, nos deu muito orgulho. Alguém que fala bem, que entende da política brasileira. A gente sabia que seria difícil construir uma candidatura do zero, mas ele foi essencial para reforçar a nossa identidade partidária.

Como a reeleição do governador de Minas, Romeu Zema, no primeiro turno se insere neste contexto?

O Zema conseguiu levar para a eleição o excelente resultado de sua gestão, mesmo com todas as dificuldades que se colocaram durante esses quatro anos, e a população reconheceu isso nas urnas. Ele conseguiu a proeza de ser reeleito num Estado grande, no qual o Lula venceu no primeiro turno, mantendo a fidelidade partidária e apoiando o Felipe, sabendo das dificuldades que isso representava. Com a nossa coligação em Minas, ele obteve um apoio na Assembleia que vai ser muito maior do que no primeiro mandato. A partir do ano que vem, teremos um governo muito mais articulado para caminhar com as pautas que dependam da aprovação da Assembleia. Agora, ele terá grandes chances de eleger um presidente da Assembleia aliado, o que vai mudar o cenário político. Então, do ponto de vista do Executivo, acredito que nós fomos bem, com a reeleição do Zema. Mas, de forma geral, tínhamos a expectativa de crescer a nossa bancada federal, que hoje tem oito deputados, e aumentar as nossas bancadas estaduais, que somam sete deputados, e o resultado foi bem frustrante. A gente trabalhou muito, mas infelizmente acho que não era isso o que a população estava querendo neste momento.

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Ninguém poderia imaginar que alguém do calibre do João iria declarar voto em Lula”

Logo depois do primeiro turno, o Novo divulgou uma nota na qual liberava o voto dos filiados no segundo turno. Mas, quando o João Amoêdo declarou voto em Lula, houve uma reação muito forte contra ele, tanto de dirigentes como de mandatários do partido. Se havia liberdade de opção, o Amoêdo não poderia ter optado por Lula?

Nós procuramos posicionar o partido para quem quiser anular o voto e quem quiser votar no Bolsonaro se sinta confortável. Fizemos uma declaração tentando manter a coerência, na mesma linha que em 2018. Nós nos colocamos claramente contra o PT. Reforçamos que o PT e o lulismo são contrários a tudo o que a gente sempre defendeu. Agora, ninguém poderia imaginar que alguém do calibre do João iria declarar voto no Lula. Aí, não dá. Até entendo que o João tenha sido muito crítico ao Bolsonaro, mas ele também fez críticas fortes ao Lula, dizendo que ele não era representante da democracia. Como a imagem do João é muito vinculada ao partido, o posicionamento dele poderia dar a impressão, se nós não posicionássemos ali, de que o Novo está apoiando o Lula. Então, a gente não tinha outra opção neste momento. Não tinha como a gente só assistir.

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Agora, o sr. acredita que na nota do partido ficou claro que a liberação não incluía o voto em Lula?

Acredito que sim. Nós temos três cosmovisões diferentes no Novo: tem gente que gosta do Bolsonaro, tem gente que vai votar a contragosto no Bolsonaro e tem gente que não vota de jeito nenhum no Bolsonaro. Boa parte das pessoas vai acabar anulando o voto. Mas ninguém vai votar no Lula. O espírito do partido é esse. Como presidente do partido tenho de respeitar isso e até evito declarar o meu voto para preservar as opções dos filiados.

O sr. chegou a dizer que a declaração de voto do Amoêdo em Lula era “vergonhosa”. Até que ponto a sua reação reflete a visão da maioria dos filiados, dirigentes e mandatários do partido?

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Não fui só eu que se sentiu atingido com as declarações dele. Neste segundo turno, como acabei de dizer, o Novo está dividido, de forma absolutamente majoritária, entre votar nulo ou votar no Bolsonaro. A grande maioria dos filiados não chegou ontem ao Novo. Está no Novo desde 2015. As pessoas carregaram a bandeira do Novo, pediram voto para o Amoêdo na rua em 2018 e se sentiram traídas com a declaração de voto dele em Lula. Esta é a verdade. Tanto que a nota foi muito bem recebida. Foram quase 82 mil likes na publicação da nota do partido no Twitter. Nunca outra nota partidária chegou perto disso. Foi também a nota mais curtida na história do Novo no Instagram. Então, acho que as pessoas entenderam a nossa posição e que o João sentiu um pouco a pancada. O João, hoje, está completamente isolado e desconectado das bases do partido que ele mesmo fundou. Mas ele não está nem aí. Parece que a intenção dele é realmente afundar o negócio.

Depois da declaração de voto de Amoêdo em Lula, o Novo soltou outra nota oficial criticando a decisão dele de votar em Lula. O partido não está sendo muito rigoroso nesta questão?

Ele passou os últimos dois anos e meio metendo o pau na bancada, me criticando, criticando a gestão do partido, falando que estava tudo errado. Infelizmente, o que eu mais ouvi ao longo das campanhas dos nossos candidatos em 2020 e 2022, foi: “Edu, eu não aguento mais ter de ficar explicando o Amoêdo. Era para o Novo ser um partido de direita e quando a nossa principal liderança não transmite essa mensagem acaba criando confusão na nossa base e muito desgaste”. Depois, ele se lançou candidato à Presidência e caiu fora na primeira dificuldade, criticando todos os dirigentes, culpando todo mundo pela falta de unidade no partido. Não quis conversar com ninguém, não quis construir nada. Na campanha eleitoral, não fez uma menção sequer aos nossos candidatos, ao Felipe, a ninguém. Aí, no segundo turno, ele declara voto em Lula. O que ele queria? Que o partido aplaudisse? Todo mundo se sentiu traído. Foi realmente uma decepção muito grande.

O presidente de um partido não pode impor suas ideias goela abaixo de dirigentes e filiados”

Além da repercussão dessa nota nas redes sociais, o que o leva a dizer que a posição do partido no segundo turno tem o respaldo das bases partidárias?

Você não consegue liderar 30 mil pessoas, que é o total de filiados do Novo hoje, querendo impor uma opinião minoritária. A não ser que o partido seja uma propriedade sua – e o Novo não é uma empresa familiar. É claro que sempre vou ter minha opinião e tentar convencer o pessoal, evidentemente, a segui-la. Mas o presidente de um partido tem de entender qual é o sentimento de seus dirigentes e filiados. Não pode querer impor goela abaixo as suas ideias. Então, na minha gestão, procurei me aproximar dos diretórios estaduais e da base do partido. Desde que assumi, em março de 2020, pelo menos uma vez por semana ou no máximo a cada quinze dias todo mundo se reúne para falar o que tem de falar. Eu quero saber o que está acontecendo e o que o pessoal está pensando. Isso é fundamental para a gente chegar num consenso e tomar as decisões partidárias. Esta é a minha filosofia. É muito difícil fazer isso. É muito mais fácil dar um canetaço e falar que quem não concordar deve sair, como acontecia antes. Só que aí vai chegar uma hora em que não haverá mais ninguém no partido.

Alguns mandatários e dirigentes do Novo entraram com processos na Comissão de Ética do partido pedindo a expulsão do Amoêdo. Como o sr. vê isso? Qual a chance efetiva de ele ser expulso do partido?

Todo processo administrativo deve seguir um rito. Primeiro, há uma denúncia e a Comissão de Ética (CEP) avalia se acata ou não. Se for acatada, o denunciado tem o direito de se defender e só então a CEP vai julgar o caso. Se houver condenação, ainda cabe recurso ao Diretório Nacional. E, como membro do Diretório Nacional, não seria adequado eu me pronunciar sobre um processo que ainda está em andamento. O que posso garantir é que a nossa Comissão de Ética é formada por pessoas qualificadas, com formação jurídica, e tem extremo bom senso para julgar os casos que chegam para ela.

Agora, é duro a coisa ter chegado nesse ponto, envolvendo um dos fundadores e ex-presidente do partido. Como o sr. encara tudo isso?

O João era meu herói. Só me filiei ao partido, em 2015, logo depois da obtenção do registro na Justiça Eleitoral, por causa dele. Fui para a rua me matei, gastei dinheiro, doei dinheiro, perdi tempo da minha vida com a minha família, para tentar construir isso por causa dele. Aí, é triste vê-lo ir nas redes sociais me atacar, criar narrativas, dizer que eu estava mudando o estatuto do partido. Nunca mudei o estatuto. O João deixou de ser uma pessoa de bom senso para se tornar alguém para quem a narrativa é mais importante. Ele mudou muito. Não é mais a mesma pessoa. Em algum momento, ele mudou e o partido, não. Aí, quando o partido não mudou junto, ele tentou controlar o partido no grito.

Quando João Amoêdo, ex-comandante e um dos fundadores do Novo, declarou voto em Lula no segundo turno, o presidente do partido, Eduardo Ribeiro, classificou a decisão como “vergonhosa, constrangedora e incoerente” numa publicação no Twitter.

Ribeiro apoiou também a divulgação de um comunicado da legenda – que havia emitido dias antes uma nota oficial na qual criticava Lula e liberava o voto dos filiados – contestando a atitude de Amoêdo e afirmando que “o Novo sempre foi e sempre será oposição ao lulopetismo e a tudo o que ele representa”.

Nesta entrevista ao Estadão, Ribeiro, de 34 anos, fala sobre a sua reação e a do partido ao apoio de Amoêdo a Lula e sobre os pedidos de expulsão apresentados contra ele na Comissão de Ética partidária. Analisa também o desempenho eleitoral do Novo, que conseguiu reeleger no primeiro turno o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, mas viu sua representação parlamentar encolher de oito para três deputados federais e de sete para cinco deputados estaduais.

“O João era meu herói. Só me filiei ao partido por causa dele. Mas ele não é mais a mesma pessoa. Mudou muito e o partido, não”, afirma. “Hoje, o João está completamente isolado e desconectado das bases do partido que ele mesmo fundou. A grande maioria dos filiados se sentiu traída com a sua declaração de voto em Lula.” Confira a seguir os principais trechos da entrevista.

João Amoêdo, ex-comandante e um dos fundadores do Novo, declarou voto em Lula no segundo turno  Foto: Helvio Romero/Estadão

Como o sr. avalia o desempenho do Novo nestas eleições?

A minha avaliação é de que não fomos bem. A eleição foi muito polarizada e nós acabamos sofrendo as consequências disso. Tirando o PL (Partido Liberal), do presidente Jair Bolsonaro, nem mesmo outros partidos que apoiaram sua candidatura conseguiram ter um bom desempenho na esfera federal. O PTB, por exemplo, só fez um deputado. Nós elegemos três. O Novo se colocou num espaço de centro-direita crítico ao Bolsonaro e ao Lula, mas claramente não era esse o espírito desta eleição. Na esfera estadual, o nosso resultado também ficou abaixo do esperado. Elegemos cinco deputados estaduais e tínhamos uma expectativa de ir muito melhor, mas sofremos do mesmo mal.

O candidato do partido à Presidência, Luiz Felipe D’Avila, obteve apenas 560 mil votos, o equivalente a 0,5% dos votos válidos. Em sua avaliação, o que explica este desempenho?

Acredito que foi um reflexo do mesmo problema. O resultado final da eleição no 1º turno foi 48% para Lula e 43% para Bolsonaro. Somando os dois, foram mais de 90% dos votos válidos. Não tinha muito o que fazer. Não havia espaço para outras candidaturas. Se tivesse sido 33% a 22% e houvesse outro candidato com 15% e mais um com 8%, 10% dos votos, seria diferente. Veja o que aconteceu com a Simone Tebet (candidata do MDB) e com a Soraia (Thronicke, candidata do União Brasil), que gastaram bilhões de reais na campanha. Todo mundo ficou no mesmo patamar. Vamos combinar que, no fundo, de 1% para 4% é quase a mesma coisa numa eleição como esta. Os dois extremos estavam muito bem sedimentados. E nós não usamos nem recursos do fundo eleitoral nem do fundo partidário. Gastamos cerca de R$ 2 milhões, obtidos por meio de captação própria, em toda a campanha. Agora, o D’Avila, que foi uma aposta pessoal minha, representou muito bem o partido, nos deu muito orgulho. Alguém que fala bem, que entende da política brasileira. A gente sabia que seria difícil construir uma candidatura do zero, mas ele foi essencial para reforçar a nossa identidade partidária.

Como a reeleição do governador de Minas, Romeu Zema, no primeiro turno se insere neste contexto?

O Zema conseguiu levar para a eleição o excelente resultado de sua gestão, mesmo com todas as dificuldades que se colocaram durante esses quatro anos, e a população reconheceu isso nas urnas. Ele conseguiu a proeza de ser reeleito num Estado grande, no qual o Lula venceu no primeiro turno, mantendo a fidelidade partidária e apoiando o Felipe, sabendo das dificuldades que isso representava. Com a nossa coligação em Minas, ele obteve um apoio na Assembleia que vai ser muito maior do que no primeiro mandato. A partir do ano que vem, teremos um governo muito mais articulado para caminhar com as pautas que dependam da aprovação da Assembleia. Agora, ele terá grandes chances de eleger um presidente da Assembleia aliado, o que vai mudar o cenário político. Então, do ponto de vista do Executivo, acredito que nós fomos bem, com a reeleição do Zema. Mas, de forma geral, tínhamos a expectativa de crescer a nossa bancada federal, que hoje tem oito deputados, e aumentar as nossas bancadas estaduais, que somam sete deputados, e o resultado foi bem frustrante. A gente trabalhou muito, mas infelizmente acho que não era isso o que a população estava querendo neste momento.

Ninguém poderia imaginar que alguém do calibre do João iria declarar voto em Lula”

Logo depois do primeiro turno, o Novo divulgou uma nota na qual liberava o voto dos filiados no segundo turno. Mas, quando o João Amoêdo declarou voto em Lula, houve uma reação muito forte contra ele, tanto de dirigentes como de mandatários do partido. Se havia liberdade de opção, o Amoêdo não poderia ter optado por Lula?

Nós procuramos posicionar o partido para quem quiser anular o voto e quem quiser votar no Bolsonaro se sinta confortável. Fizemos uma declaração tentando manter a coerência, na mesma linha que em 2018. Nós nos colocamos claramente contra o PT. Reforçamos que o PT e o lulismo são contrários a tudo o que a gente sempre defendeu. Agora, ninguém poderia imaginar que alguém do calibre do João iria declarar voto no Lula. Aí, não dá. Até entendo que o João tenha sido muito crítico ao Bolsonaro, mas ele também fez críticas fortes ao Lula, dizendo que ele não era representante da democracia. Como a imagem do João é muito vinculada ao partido, o posicionamento dele poderia dar a impressão, se nós não posicionássemos ali, de que o Novo está apoiando o Lula. Então, a gente não tinha outra opção neste momento. Não tinha como a gente só assistir.

Agora, o sr. acredita que na nota do partido ficou claro que a liberação não incluía o voto em Lula?

Acredito que sim. Nós temos três cosmovisões diferentes no Novo: tem gente que gosta do Bolsonaro, tem gente que vai votar a contragosto no Bolsonaro e tem gente que não vota de jeito nenhum no Bolsonaro. Boa parte das pessoas vai acabar anulando o voto. Mas ninguém vai votar no Lula. O espírito do partido é esse. Como presidente do partido tenho de respeitar isso e até evito declarar o meu voto para preservar as opções dos filiados.

O sr. chegou a dizer que a declaração de voto do Amoêdo em Lula era “vergonhosa”. Até que ponto a sua reação reflete a visão da maioria dos filiados, dirigentes e mandatários do partido?

Não fui só eu que se sentiu atingido com as declarações dele. Neste segundo turno, como acabei de dizer, o Novo está dividido, de forma absolutamente majoritária, entre votar nulo ou votar no Bolsonaro. A grande maioria dos filiados não chegou ontem ao Novo. Está no Novo desde 2015. As pessoas carregaram a bandeira do Novo, pediram voto para o Amoêdo na rua em 2018 e se sentiram traídas com a declaração de voto dele em Lula. Esta é a verdade. Tanto que a nota foi muito bem recebida. Foram quase 82 mil likes na publicação da nota do partido no Twitter. Nunca outra nota partidária chegou perto disso. Foi também a nota mais curtida na história do Novo no Instagram. Então, acho que as pessoas entenderam a nossa posição e que o João sentiu um pouco a pancada. O João, hoje, está completamente isolado e desconectado das bases do partido que ele mesmo fundou. Mas ele não está nem aí. Parece que a intenção dele é realmente afundar o negócio.

Depois da declaração de voto de Amoêdo em Lula, o Novo soltou outra nota oficial criticando a decisão dele de votar em Lula. O partido não está sendo muito rigoroso nesta questão?

Ele passou os últimos dois anos e meio metendo o pau na bancada, me criticando, criticando a gestão do partido, falando que estava tudo errado. Infelizmente, o que eu mais ouvi ao longo das campanhas dos nossos candidatos em 2020 e 2022, foi: “Edu, eu não aguento mais ter de ficar explicando o Amoêdo. Era para o Novo ser um partido de direita e quando a nossa principal liderança não transmite essa mensagem acaba criando confusão na nossa base e muito desgaste”. Depois, ele se lançou candidato à Presidência e caiu fora na primeira dificuldade, criticando todos os dirigentes, culpando todo mundo pela falta de unidade no partido. Não quis conversar com ninguém, não quis construir nada. Na campanha eleitoral, não fez uma menção sequer aos nossos candidatos, ao Felipe, a ninguém. Aí, no segundo turno, ele declara voto em Lula. O que ele queria? Que o partido aplaudisse? Todo mundo se sentiu traído. Foi realmente uma decepção muito grande.

O presidente de um partido não pode impor suas ideias goela abaixo de dirigentes e filiados”

Além da repercussão dessa nota nas redes sociais, o que o leva a dizer que a posição do partido no segundo turno tem o respaldo das bases partidárias?

Você não consegue liderar 30 mil pessoas, que é o total de filiados do Novo hoje, querendo impor uma opinião minoritária. A não ser que o partido seja uma propriedade sua – e o Novo não é uma empresa familiar. É claro que sempre vou ter minha opinião e tentar convencer o pessoal, evidentemente, a segui-la. Mas o presidente de um partido tem de entender qual é o sentimento de seus dirigentes e filiados. Não pode querer impor goela abaixo as suas ideias. Então, na minha gestão, procurei me aproximar dos diretórios estaduais e da base do partido. Desde que assumi, em março de 2020, pelo menos uma vez por semana ou no máximo a cada quinze dias todo mundo se reúne para falar o que tem de falar. Eu quero saber o que está acontecendo e o que o pessoal está pensando. Isso é fundamental para a gente chegar num consenso e tomar as decisões partidárias. Esta é a minha filosofia. É muito difícil fazer isso. É muito mais fácil dar um canetaço e falar que quem não concordar deve sair, como acontecia antes. Só que aí vai chegar uma hora em que não haverá mais ninguém no partido.

Alguns mandatários e dirigentes do Novo entraram com processos na Comissão de Ética do partido pedindo a expulsão do Amoêdo. Como o sr. vê isso? Qual a chance efetiva de ele ser expulso do partido?

Todo processo administrativo deve seguir um rito. Primeiro, há uma denúncia e a Comissão de Ética (CEP) avalia se acata ou não. Se for acatada, o denunciado tem o direito de se defender e só então a CEP vai julgar o caso. Se houver condenação, ainda cabe recurso ao Diretório Nacional. E, como membro do Diretório Nacional, não seria adequado eu me pronunciar sobre um processo que ainda está em andamento. O que posso garantir é que a nossa Comissão de Ética é formada por pessoas qualificadas, com formação jurídica, e tem extremo bom senso para julgar os casos que chegam para ela.

Agora, é duro a coisa ter chegado nesse ponto, envolvendo um dos fundadores e ex-presidente do partido. Como o sr. encara tudo isso?

O João era meu herói. Só me filiei ao partido, em 2015, logo depois da obtenção do registro na Justiça Eleitoral, por causa dele. Fui para a rua me matei, gastei dinheiro, doei dinheiro, perdi tempo da minha vida com a minha família, para tentar construir isso por causa dele. Aí, é triste vê-lo ir nas redes sociais me atacar, criar narrativas, dizer que eu estava mudando o estatuto do partido. Nunca mudei o estatuto. O João deixou de ser uma pessoa de bom senso para se tornar alguém para quem a narrativa é mais importante. Ele mudou muito. Não é mais a mesma pessoa. Em algum momento, ele mudou e o partido, não. Aí, quando o partido não mudou junto, ele tentou controlar o partido no grito.

Quando João Amoêdo, ex-comandante e um dos fundadores do Novo, declarou voto em Lula no segundo turno, o presidente do partido, Eduardo Ribeiro, classificou a decisão como “vergonhosa, constrangedora e incoerente” numa publicação no Twitter.

Ribeiro apoiou também a divulgação de um comunicado da legenda – que havia emitido dias antes uma nota oficial na qual criticava Lula e liberava o voto dos filiados – contestando a atitude de Amoêdo e afirmando que “o Novo sempre foi e sempre será oposição ao lulopetismo e a tudo o que ele representa”.

Nesta entrevista ao Estadão, Ribeiro, de 34 anos, fala sobre a sua reação e a do partido ao apoio de Amoêdo a Lula e sobre os pedidos de expulsão apresentados contra ele na Comissão de Ética partidária. Analisa também o desempenho eleitoral do Novo, que conseguiu reeleger no primeiro turno o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, mas viu sua representação parlamentar encolher de oito para três deputados federais e de sete para cinco deputados estaduais.

“O João era meu herói. Só me filiei ao partido por causa dele. Mas ele não é mais a mesma pessoa. Mudou muito e o partido, não”, afirma. “Hoje, o João está completamente isolado e desconectado das bases do partido que ele mesmo fundou. A grande maioria dos filiados se sentiu traída com a sua declaração de voto em Lula.” Confira a seguir os principais trechos da entrevista.

João Amoêdo, ex-comandante e um dos fundadores do Novo, declarou voto em Lula no segundo turno  Foto: Helvio Romero/Estadão

Como o sr. avalia o desempenho do Novo nestas eleições?

A minha avaliação é de que não fomos bem. A eleição foi muito polarizada e nós acabamos sofrendo as consequências disso. Tirando o PL (Partido Liberal), do presidente Jair Bolsonaro, nem mesmo outros partidos que apoiaram sua candidatura conseguiram ter um bom desempenho na esfera federal. O PTB, por exemplo, só fez um deputado. Nós elegemos três. O Novo se colocou num espaço de centro-direita crítico ao Bolsonaro e ao Lula, mas claramente não era esse o espírito desta eleição. Na esfera estadual, o nosso resultado também ficou abaixo do esperado. Elegemos cinco deputados estaduais e tínhamos uma expectativa de ir muito melhor, mas sofremos do mesmo mal.

O candidato do partido à Presidência, Luiz Felipe D’Avila, obteve apenas 560 mil votos, o equivalente a 0,5% dos votos válidos. Em sua avaliação, o que explica este desempenho?

Acredito que foi um reflexo do mesmo problema. O resultado final da eleição no 1º turno foi 48% para Lula e 43% para Bolsonaro. Somando os dois, foram mais de 90% dos votos válidos. Não tinha muito o que fazer. Não havia espaço para outras candidaturas. Se tivesse sido 33% a 22% e houvesse outro candidato com 15% e mais um com 8%, 10% dos votos, seria diferente. Veja o que aconteceu com a Simone Tebet (candidata do MDB) e com a Soraia (Thronicke, candidata do União Brasil), que gastaram bilhões de reais na campanha. Todo mundo ficou no mesmo patamar. Vamos combinar que, no fundo, de 1% para 4% é quase a mesma coisa numa eleição como esta. Os dois extremos estavam muito bem sedimentados. E nós não usamos nem recursos do fundo eleitoral nem do fundo partidário. Gastamos cerca de R$ 2 milhões, obtidos por meio de captação própria, em toda a campanha. Agora, o D’Avila, que foi uma aposta pessoal minha, representou muito bem o partido, nos deu muito orgulho. Alguém que fala bem, que entende da política brasileira. A gente sabia que seria difícil construir uma candidatura do zero, mas ele foi essencial para reforçar a nossa identidade partidária.

Como a reeleição do governador de Minas, Romeu Zema, no primeiro turno se insere neste contexto?

O Zema conseguiu levar para a eleição o excelente resultado de sua gestão, mesmo com todas as dificuldades que se colocaram durante esses quatro anos, e a população reconheceu isso nas urnas. Ele conseguiu a proeza de ser reeleito num Estado grande, no qual o Lula venceu no primeiro turno, mantendo a fidelidade partidária e apoiando o Felipe, sabendo das dificuldades que isso representava. Com a nossa coligação em Minas, ele obteve um apoio na Assembleia que vai ser muito maior do que no primeiro mandato. A partir do ano que vem, teremos um governo muito mais articulado para caminhar com as pautas que dependam da aprovação da Assembleia. Agora, ele terá grandes chances de eleger um presidente da Assembleia aliado, o que vai mudar o cenário político. Então, do ponto de vista do Executivo, acredito que nós fomos bem, com a reeleição do Zema. Mas, de forma geral, tínhamos a expectativa de crescer a nossa bancada federal, que hoje tem oito deputados, e aumentar as nossas bancadas estaduais, que somam sete deputados, e o resultado foi bem frustrante. A gente trabalhou muito, mas infelizmente acho que não era isso o que a população estava querendo neste momento.

Ninguém poderia imaginar que alguém do calibre do João iria declarar voto em Lula”

Logo depois do primeiro turno, o Novo divulgou uma nota na qual liberava o voto dos filiados no segundo turno. Mas, quando o João Amoêdo declarou voto em Lula, houve uma reação muito forte contra ele, tanto de dirigentes como de mandatários do partido. Se havia liberdade de opção, o Amoêdo não poderia ter optado por Lula?

Nós procuramos posicionar o partido para quem quiser anular o voto e quem quiser votar no Bolsonaro se sinta confortável. Fizemos uma declaração tentando manter a coerência, na mesma linha que em 2018. Nós nos colocamos claramente contra o PT. Reforçamos que o PT e o lulismo são contrários a tudo o que a gente sempre defendeu. Agora, ninguém poderia imaginar que alguém do calibre do João iria declarar voto no Lula. Aí, não dá. Até entendo que o João tenha sido muito crítico ao Bolsonaro, mas ele também fez críticas fortes ao Lula, dizendo que ele não era representante da democracia. Como a imagem do João é muito vinculada ao partido, o posicionamento dele poderia dar a impressão, se nós não posicionássemos ali, de que o Novo está apoiando o Lula. Então, a gente não tinha outra opção neste momento. Não tinha como a gente só assistir.

Agora, o sr. acredita que na nota do partido ficou claro que a liberação não incluía o voto em Lula?

Acredito que sim. Nós temos três cosmovisões diferentes no Novo: tem gente que gosta do Bolsonaro, tem gente que vai votar a contragosto no Bolsonaro e tem gente que não vota de jeito nenhum no Bolsonaro. Boa parte das pessoas vai acabar anulando o voto. Mas ninguém vai votar no Lula. O espírito do partido é esse. Como presidente do partido tenho de respeitar isso e até evito declarar o meu voto para preservar as opções dos filiados.

O sr. chegou a dizer que a declaração de voto do Amoêdo em Lula era “vergonhosa”. Até que ponto a sua reação reflete a visão da maioria dos filiados, dirigentes e mandatários do partido?

Não fui só eu que se sentiu atingido com as declarações dele. Neste segundo turno, como acabei de dizer, o Novo está dividido, de forma absolutamente majoritária, entre votar nulo ou votar no Bolsonaro. A grande maioria dos filiados não chegou ontem ao Novo. Está no Novo desde 2015. As pessoas carregaram a bandeira do Novo, pediram voto para o Amoêdo na rua em 2018 e se sentiram traídas com a declaração de voto dele em Lula. Esta é a verdade. Tanto que a nota foi muito bem recebida. Foram quase 82 mil likes na publicação da nota do partido no Twitter. Nunca outra nota partidária chegou perto disso. Foi também a nota mais curtida na história do Novo no Instagram. Então, acho que as pessoas entenderam a nossa posição e que o João sentiu um pouco a pancada. O João, hoje, está completamente isolado e desconectado das bases do partido que ele mesmo fundou. Mas ele não está nem aí. Parece que a intenção dele é realmente afundar o negócio.

Depois da declaração de voto de Amoêdo em Lula, o Novo soltou outra nota oficial criticando a decisão dele de votar em Lula. O partido não está sendo muito rigoroso nesta questão?

Ele passou os últimos dois anos e meio metendo o pau na bancada, me criticando, criticando a gestão do partido, falando que estava tudo errado. Infelizmente, o que eu mais ouvi ao longo das campanhas dos nossos candidatos em 2020 e 2022, foi: “Edu, eu não aguento mais ter de ficar explicando o Amoêdo. Era para o Novo ser um partido de direita e quando a nossa principal liderança não transmite essa mensagem acaba criando confusão na nossa base e muito desgaste”. Depois, ele se lançou candidato à Presidência e caiu fora na primeira dificuldade, criticando todos os dirigentes, culpando todo mundo pela falta de unidade no partido. Não quis conversar com ninguém, não quis construir nada. Na campanha eleitoral, não fez uma menção sequer aos nossos candidatos, ao Felipe, a ninguém. Aí, no segundo turno, ele declara voto em Lula. O que ele queria? Que o partido aplaudisse? Todo mundo se sentiu traído. Foi realmente uma decepção muito grande.

O presidente de um partido não pode impor suas ideias goela abaixo de dirigentes e filiados”

Além da repercussão dessa nota nas redes sociais, o que o leva a dizer que a posição do partido no segundo turno tem o respaldo das bases partidárias?

Você não consegue liderar 30 mil pessoas, que é o total de filiados do Novo hoje, querendo impor uma opinião minoritária. A não ser que o partido seja uma propriedade sua – e o Novo não é uma empresa familiar. É claro que sempre vou ter minha opinião e tentar convencer o pessoal, evidentemente, a segui-la. Mas o presidente de um partido tem de entender qual é o sentimento de seus dirigentes e filiados. Não pode querer impor goela abaixo as suas ideias. Então, na minha gestão, procurei me aproximar dos diretórios estaduais e da base do partido. Desde que assumi, em março de 2020, pelo menos uma vez por semana ou no máximo a cada quinze dias todo mundo se reúne para falar o que tem de falar. Eu quero saber o que está acontecendo e o que o pessoal está pensando. Isso é fundamental para a gente chegar num consenso e tomar as decisões partidárias. Esta é a minha filosofia. É muito difícil fazer isso. É muito mais fácil dar um canetaço e falar que quem não concordar deve sair, como acontecia antes. Só que aí vai chegar uma hora em que não haverá mais ninguém no partido.

Alguns mandatários e dirigentes do Novo entraram com processos na Comissão de Ética do partido pedindo a expulsão do Amoêdo. Como o sr. vê isso? Qual a chance efetiva de ele ser expulso do partido?

Todo processo administrativo deve seguir um rito. Primeiro, há uma denúncia e a Comissão de Ética (CEP) avalia se acata ou não. Se for acatada, o denunciado tem o direito de se defender e só então a CEP vai julgar o caso. Se houver condenação, ainda cabe recurso ao Diretório Nacional. E, como membro do Diretório Nacional, não seria adequado eu me pronunciar sobre um processo que ainda está em andamento. O que posso garantir é que a nossa Comissão de Ética é formada por pessoas qualificadas, com formação jurídica, e tem extremo bom senso para julgar os casos que chegam para ela.

Agora, é duro a coisa ter chegado nesse ponto, envolvendo um dos fundadores e ex-presidente do partido. Como o sr. encara tudo isso?

O João era meu herói. Só me filiei ao partido, em 2015, logo depois da obtenção do registro na Justiça Eleitoral, por causa dele. Fui para a rua me matei, gastei dinheiro, doei dinheiro, perdi tempo da minha vida com a minha família, para tentar construir isso por causa dele. Aí, é triste vê-lo ir nas redes sociais me atacar, criar narrativas, dizer que eu estava mudando o estatuto do partido. Nunca mudei o estatuto. O João deixou de ser uma pessoa de bom senso para se tornar alguém para quem a narrativa é mais importante. Ele mudou muito. Não é mais a mesma pessoa. Em algum momento, ele mudou e o partido, não. Aí, quando o partido não mudou junto, ele tentou controlar o partido no grito.

Quando João Amoêdo, ex-comandante e um dos fundadores do Novo, declarou voto em Lula no segundo turno, o presidente do partido, Eduardo Ribeiro, classificou a decisão como “vergonhosa, constrangedora e incoerente” numa publicação no Twitter.

Ribeiro apoiou também a divulgação de um comunicado da legenda – que havia emitido dias antes uma nota oficial na qual criticava Lula e liberava o voto dos filiados – contestando a atitude de Amoêdo e afirmando que “o Novo sempre foi e sempre será oposição ao lulopetismo e a tudo o que ele representa”.

Nesta entrevista ao Estadão, Ribeiro, de 34 anos, fala sobre a sua reação e a do partido ao apoio de Amoêdo a Lula e sobre os pedidos de expulsão apresentados contra ele na Comissão de Ética partidária. Analisa também o desempenho eleitoral do Novo, que conseguiu reeleger no primeiro turno o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, mas viu sua representação parlamentar encolher de oito para três deputados federais e de sete para cinco deputados estaduais.

“O João era meu herói. Só me filiei ao partido por causa dele. Mas ele não é mais a mesma pessoa. Mudou muito e o partido, não”, afirma. “Hoje, o João está completamente isolado e desconectado das bases do partido que ele mesmo fundou. A grande maioria dos filiados se sentiu traída com a sua declaração de voto em Lula.” Confira a seguir os principais trechos da entrevista.

João Amoêdo, ex-comandante e um dos fundadores do Novo, declarou voto em Lula no segundo turno  Foto: Helvio Romero/Estadão

Como o sr. avalia o desempenho do Novo nestas eleições?

A minha avaliação é de que não fomos bem. A eleição foi muito polarizada e nós acabamos sofrendo as consequências disso. Tirando o PL (Partido Liberal), do presidente Jair Bolsonaro, nem mesmo outros partidos que apoiaram sua candidatura conseguiram ter um bom desempenho na esfera federal. O PTB, por exemplo, só fez um deputado. Nós elegemos três. O Novo se colocou num espaço de centro-direita crítico ao Bolsonaro e ao Lula, mas claramente não era esse o espírito desta eleição. Na esfera estadual, o nosso resultado também ficou abaixo do esperado. Elegemos cinco deputados estaduais e tínhamos uma expectativa de ir muito melhor, mas sofremos do mesmo mal.

O candidato do partido à Presidência, Luiz Felipe D’Avila, obteve apenas 560 mil votos, o equivalente a 0,5% dos votos válidos. Em sua avaliação, o que explica este desempenho?

Acredito que foi um reflexo do mesmo problema. O resultado final da eleição no 1º turno foi 48% para Lula e 43% para Bolsonaro. Somando os dois, foram mais de 90% dos votos válidos. Não tinha muito o que fazer. Não havia espaço para outras candidaturas. Se tivesse sido 33% a 22% e houvesse outro candidato com 15% e mais um com 8%, 10% dos votos, seria diferente. Veja o que aconteceu com a Simone Tebet (candidata do MDB) e com a Soraia (Thronicke, candidata do União Brasil), que gastaram bilhões de reais na campanha. Todo mundo ficou no mesmo patamar. Vamos combinar que, no fundo, de 1% para 4% é quase a mesma coisa numa eleição como esta. Os dois extremos estavam muito bem sedimentados. E nós não usamos nem recursos do fundo eleitoral nem do fundo partidário. Gastamos cerca de R$ 2 milhões, obtidos por meio de captação própria, em toda a campanha. Agora, o D’Avila, que foi uma aposta pessoal minha, representou muito bem o partido, nos deu muito orgulho. Alguém que fala bem, que entende da política brasileira. A gente sabia que seria difícil construir uma candidatura do zero, mas ele foi essencial para reforçar a nossa identidade partidária.

Como a reeleição do governador de Minas, Romeu Zema, no primeiro turno se insere neste contexto?

O Zema conseguiu levar para a eleição o excelente resultado de sua gestão, mesmo com todas as dificuldades que se colocaram durante esses quatro anos, e a população reconheceu isso nas urnas. Ele conseguiu a proeza de ser reeleito num Estado grande, no qual o Lula venceu no primeiro turno, mantendo a fidelidade partidária e apoiando o Felipe, sabendo das dificuldades que isso representava. Com a nossa coligação em Minas, ele obteve um apoio na Assembleia que vai ser muito maior do que no primeiro mandato. A partir do ano que vem, teremos um governo muito mais articulado para caminhar com as pautas que dependam da aprovação da Assembleia. Agora, ele terá grandes chances de eleger um presidente da Assembleia aliado, o que vai mudar o cenário político. Então, do ponto de vista do Executivo, acredito que nós fomos bem, com a reeleição do Zema. Mas, de forma geral, tínhamos a expectativa de crescer a nossa bancada federal, que hoje tem oito deputados, e aumentar as nossas bancadas estaduais, que somam sete deputados, e o resultado foi bem frustrante. A gente trabalhou muito, mas infelizmente acho que não era isso o que a população estava querendo neste momento.

Ninguém poderia imaginar que alguém do calibre do João iria declarar voto em Lula”

Logo depois do primeiro turno, o Novo divulgou uma nota na qual liberava o voto dos filiados no segundo turno. Mas, quando o João Amoêdo declarou voto em Lula, houve uma reação muito forte contra ele, tanto de dirigentes como de mandatários do partido. Se havia liberdade de opção, o Amoêdo não poderia ter optado por Lula?

Nós procuramos posicionar o partido para quem quiser anular o voto e quem quiser votar no Bolsonaro se sinta confortável. Fizemos uma declaração tentando manter a coerência, na mesma linha que em 2018. Nós nos colocamos claramente contra o PT. Reforçamos que o PT e o lulismo são contrários a tudo o que a gente sempre defendeu. Agora, ninguém poderia imaginar que alguém do calibre do João iria declarar voto no Lula. Aí, não dá. Até entendo que o João tenha sido muito crítico ao Bolsonaro, mas ele também fez críticas fortes ao Lula, dizendo que ele não era representante da democracia. Como a imagem do João é muito vinculada ao partido, o posicionamento dele poderia dar a impressão, se nós não posicionássemos ali, de que o Novo está apoiando o Lula. Então, a gente não tinha outra opção neste momento. Não tinha como a gente só assistir.

Agora, o sr. acredita que na nota do partido ficou claro que a liberação não incluía o voto em Lula?

Acredito que sim. Nós temos três cosmovisões diferentes no Novo: tem gente que gosta do Bolsonaro, tem gente que vai votar a contragosto no Bolsonaro e tem gente que não vota de jeito nenhum no Bolsonaro. Boa parte das pessoas vai acabar anulando o voto. Mas ninguém vai votar no Lula. O espírito do partido é esse. Como presidente do partido tenho de respeitar isso e até evito declarar o meu voto para preservar as opções dos filiados.

O sr. chegou a dizer que a declaração de voto do Amoêdo em Lula era “vergonhosa”. Até que ponto a sua reação reflete a visão da maioria dos filiados, dirigentes e mandatários do partido?

Não fui só eu que se sentiu atingido com as declarações dele. Neste segundo turno, como acabei de dizer, o Novo está dividido, de forma absolutamente majoritária, entre votar nulo ou votar no Bolsonaro. A grande maioria dos filiados não chegou ontem ao Novo. Está no Novo desde 2015. As pessoas carregaram a bandeira do Novo, pediram voto para o Amoêdo na rua em 2018 e se sentiram traídas com a declaração de voto dele em Lula. Esta é a verdade. Tanto que a nota foi muito bem recebida. Foram quase 82 mil likes na publicação da nota do partido no Twitter. Nunca outra nota partidária chegou perto disso. Foi também a nota mais curtida na história do Novo no Instagram. Então, acho que as pessoas entenderam a nossa posição e que o João sentiu um pouco a pancada. O João, hoje, está completamente isolado e desconectado das bases do partido que ele mesmo fundou. Mas ele não está nem aí. Parece que a intenção dele é realmente afundar o negócio.

Depois da declaração de voto de Amoêdo em Lula, o Novo soltou outra nota oficial criticando a decisão dele de votar em Lula. O partido não está sendo muito rigoroso nesta questão?

Ele passou os últimos dois anos e meio metendo o pau na bancada, me criticando, criticando a gestão do partido, falando que estava tudo errado. Infelizmente, o que eu mais ouvi ao longo das campanhas dos nossos candidatos em 2020 e 2022, foi: “Edu, eu não aguento mais ter de ficar explicando o Amoêdo. Era para o Novo ser um partido de direita e quando a nossa principal liderança não transmite essa mensagem acaba criando confusão na nossa base e muito desgaste”. Depois, ele se lançou candidato à Presidência e caiu fora na primeira dificuldade, criticando todos os dirigentes, culpando todo mundo pela falta de unidade no partido. Não quis conversar com ninguém, não quis construir nada. Na campanha eleitoral, não fez uma menção sequer aos nossos candidatos, ao Felipe, a ninguém. Aí, no segundo turno, ele declara voto em Lula. O que ele queria? Que o partido aplaudisse? Todo mundo se sentiu traído. Foi realmente uma decepção muito grande.

O presidente de um partido não pode impor suas ideias goela abaixo de dirigentes e filiados”

Além da repercussão dessa nota nas redes sociais, o que o leva a dizer que a posição do partido no segundo turno tem o respaldo das bases partidárias?

Você não consegue liderar 30 mil pessoas, que é o total de filiados do Novo hoje, querendo impor uma opinião minoritária. A não ser que o partido seja uma propriedade sua – e o Novo não é uma empresa familiar. É claro que sempre vou ter minha opinião e tentar convencer o pessoal, evidentemente, a segui-la. Mas o presidente de um partido tem de entender qual é o sentimento de seus dirigentes e filiados. Não pode querer impor goela abaixo as suas ideias. Então, na minha gestão, procurei me aproximar dos diretórios estaduais e da base do partido. Desde que assumi, em março de 2020, pelo menos uma vez por semana ou no máximo a cada quinze dias todo mundo se reúne para falar o que tem de falar. Eu quero saber o que está acontecendo e o que o pessoal está pensando. Isso é fundamental para a gente chegar num consenso e tomar as decisões partidárias. Esta é a minha filosofia. É muito difícil fazer isso. É muito mais fácil dar um canetaço e falar que quem não concordar deve sair, como acontecia antes. Só que aí vai chegar uma hora em que não haverá mais ninguém no partido.

Alguns mandatários e dirigentes do Novo entraram com processos na Comissão de Ética do partido pedindo a expulsão do Amoêdo. Como o sr. vê isso? Qual a chance efetiva de ele ser expulso do partido?

Todo processo administrativo deve seguir um rito. Primeiro, há uma denúncia e a Comissão de Ética (CEP) avalia se acata ou não. Se for acatada, o denunciado tem o direito de se defender e só então a CEP vai julgar o caso. Se houver condenação, ainda cabe recurso ao Diretório Nacional. E, como membro do Diretório Nacional, não seria adequado eu me pronunciar sobre um processo que ainda está em andamento. O que posso garantir é que a nossa Comissão de Ética é formada por pessoas qualificadas, com formação jurídica, e tem extremo bom senso para julgar os casos que chegam para ela.

Agora, é duro a coisa ter chegado nesse ponto, envolvendo um dos fundadores e ex-presidente do partido. Como o sr. encara tudo isso?

O João era meu herói. Só me filiei ao partido, em 2015, logo depois da obtenção do registro na Justiça Eleitoral, por causa dele. Fui para a rua me matei, gastei dinheiro, doei dinheiro, perdi tempo da minha vida com a minha família, para tentar construir isso por causa dele. Aí, é triste vê-lo ir nas redes sociais me atacar, criar narrativas, dizer que eu estava mudando o estatuto do partido. Nunca mudei o estatuto. O João deixou de ser uma pessoa de bom senso para se tornar alguém para quem a narrativa é mais importante. Ele mudou muito. Não é mais a mesma pessoa. Em algum momento, ele mudou e o partido, não. Aí, quando o partido não mudou junto, ele tentou controlar o partido no grito.

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