Inocentes que usaram batom? As provas da violência e do vandalismo no 8/1, segundo as investigações


Próprios policiais que atuaram para conter destruição aos prédios dos Três Poderes contaram cenas de agressão e quase morte

Por Rayanderson Guerra
Atualização:

RIO – O ato em Copacabana neste domingo, 16, em prol dos denunciados e condenados pelos ataques aos prédios dos Três Poderes, em Brasília, no dia 8 de janeiro de 2023, foi marcado pela relativização dos crimes cometidos contra o Estado e das cenas de vandalismo e violência praticados por “pessoas de bem”, como citaram os políticos aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), questionou “o que eles (os condenados) fizeram?” e ironizou as cenas de barbárie em Brasília ao perguntar se eles “usaram batom” nos ataques. Policiais militares do Distrito Federal escalados para conter os vândalos contaram em investigações em curso e na CPMI do 8 de Janeiro, no Congresso Nacional, que “quase foram mortos”.

“O que eles fizeram? Usaram batom? Num país onde todo dia a gente assiste traficantes indo pra rua, onde os cara que assaltaram o Brasil, assaltam a Petrobras, voltaram para a cena do crime, voltaram à cena política. Está certo isso?”, afirmou Tarcísio ao lado de Bolsonaro e do pastor Silas Malafaia, organizador do evento.

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‘Barras de ferro e barras de madeira’

A cabo Marcela Pinno, da Polícia Militar do Distrito Federal, que fez parte do policiamento da Esplanada dos Ministérios durante os atos de vandalismo nas sedes dos Três Poderes, afirmou à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que foi atacada com barras de ferro, barras de madeira e pedradas.

“Enquanto alguns me chutavam, me agrediam com barras de ferro, com barras de madeira, outro tentava tomar a minha arma. Momento esse em que fui atingida com uma barra de ferro na cabeça. Quando eles perceberam que eu ainda me mantinha ali no embate, eles começaram a tentar arrancar meu capacete”, contou.

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Cabo da Polícia Militar do Distrito Federal Marcela da Silva Moraes Pinno, uma das vítimas dos vândalos no 8 de Janeiro Foto: Wilton Junior/Estadão

A cabo disse em depoimento, no dia 12 de setembro de 2023, que jamais presenciou “tamanha agressividade”, ao se referir aos ataques aos prédios públicos.

‘Eu quase fui morto’

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Em depoimento em uma investigação da Corregedoria da Polícia Militar do DF, divulgado pela TV Globo, o subtenente Beroaldo José de Freitas Júnior contou que “quase foi morto” pelos vândalos que invadiram os prédios dos Três Poderes. Segundo o policial, ele foi socorrido “ensanguentado” e que o “clima no interior era de caos”.

“O clima no interior era de caos. A gente fala que é de caos total. Até porque a nossa tropa estava com aproximadamente 20 homens – talvez um pouco mais ou pouco menos. Mas acredito que eram mais de 200 de pessoas lá no interior do Palácio. E nós já tínhamos enfrentado eles lá fora. O ânimo deles era totalmente agressivo. Inclusive, eu quase fui morto. Eu e a soldado Marcela quase morremos nesse confronto, nesse primeiro momento. Estava ferido, fui socorrido depois disso todo ensanguentado, porque nem sabia que estava ferido. Mas depois fui identificado como lesionado”, contou.

Praça dos Três Poderes, em 8 de janeiro de 2023 Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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Policial é derrubado de cavalo e agredido

Em outro episódio de violência explícita, os golpistas cercaram com barras de ferro e pedaços de madeira um policial da cavalaria do Esquadrão de Choque do DF, derrubaram o PM e agrediram o animal. O cavalo 847 foi atingido próximo ao olho, cerca de um centímetro do globo ocular.

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O soldado Teles, seu montador, foi puxado e agredido pelos extremistas. À época, o cavalo recebeu os primeiros socorros no local e foi retirado. O soldado Teles sofreu alguns hematomas e uma lesão no joelho.

Momento em que 'Drácula' recebeu um curativo, após ser agredido na Praça dos Três Poderes Foto: Redação

Vandalismo nos prédios dos Três Poderes

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Por volta das 15 horas do dia 8, os manifestantes avançaram sobre a Esplanada dos Ministérios e, pouco tempo depois, depredaram o Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal e o Palácio do Planalto. Os vândalos furaram, sem ou com pouca resistência da Polícia Militar, o bloqueio de segurança e invadiram os edifícios públicos.

O grupo desceu pelo Eixo Monumental, furou o bloqueio da PM e ocupou gramado, rampas, acessos e teto do Congresso. Houve a primeira invasão, com cenas de vandalismo no Senado e na Câmara.

Em seguida, pela Praça dos Três Poderes, transformada em campo de batalha, os radicais tomaram o Planalto e o Supremo. Quebraram vidraças, entraram em gabinetes e depredaram obras de arte. Houve focos de incêndio. Os plenários de Câmara, Senado e STF foram ocupados.

Plenário do STF destruído

O grupo de manifestantes que invadiu os prédios públicos deixou um cenário de destruição no Supremo, um dos principais alvos dos ataques de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro nos últimos anos.

O plenário foi invadido e o local foi depredado. Até mesmo cadeiras dos ministros do Supremo e o brasão da República, que estava fixado no local, foi retirado por manifestantes. “Supremo é o povo” foi uma das frases usadas durante a invasão.

Na cerimônia de abertura do ano Judiciário, em fevereiro daquele ano, foi mostrado um vídeo com o antes e depois da reforma necessária após a depredação.

Obras e estrutura do Palácio do Planalto

No Palácio do Planalto, a galeria de ex-presidentes foi um dos itens vandalizados no 8 de Janeiro. Obras de arte, como o quadro “As Mulatas”, de Di Cavalcanti, e o relógio de mesa, de Balthazar Martinot, foram danificados.

As obras voltaram a ser expostas dois anos após os atos antidemocráticos, em janeiro deste ano. As peças foram submetidas a um processo de recuperação e estão expostas novamente ao público como parte das celebrações pelos dois anos do episódio.

Relógio de Balthazar Martinot passou por processo de restauração após ser destruído Foto: Reprodução/Embaixada da Suíça/@SwissAmbBrazil

O relógio histórico de Balthazar Martinot e André Boulle foi arremessado ao chão durante a invasão ao Palácio do Planalto e retornou ao Brasil após ser restaurado na Suíça. De origem francesa, o objeto raro virou um símbolo dos ataques à democracia brasileira, por causa do grau de destruição e da brutalidade da cena, gravada pelo circuito interno de vigilância da Presidência da República. As imagens rodaram o mundo.

A destruição da relíquia foi provocada por Antônio Cláudio Alves Ferreira, de 32 anos. O mecânico e militante radical trajava uma camiseta preta com o rosto do ex-presidente Bolsonaro no dia da intentona golpista e frequentava acampamentos que reuniam bolsonaristas radicais – defensores de um golpe militar, eles se aglomeraram em frente ao Quartel-General do Exército inconformados com a vitória eleitoral do presidente Lula.

Tela As Mulatas

O painel “As Mulatas”, com 3,43 metros de largura e 1,12m de altura, do modernista Di Cavalcanti foi perfurado. As imagens divulgadas à época pelo governo mostram ao menos cinco buracos na obra com valor estimado em R$ 8 milhões, segundo o Planalto.

As Mulatas, de Di Cavancanti Foto: Reprodução

Ao todo, 21 obras vandalizadas durante a invasão do Palácio do Planalto foram oficialmente reintegradas ao patrimônio em janeiro deste ano. Cerca de 50 profissionais estiveram diretamente envolvidos nas restaurações.

‘Perdeu, mané’

Estátua da Justiça e prédio do STF foram vandalizados Foto: Wilton Junior/Estadão

A Estátua da Justiça foi pichada com os dizeres “Perdeu, mané” no dia dos ataques. Forjada em bloco monolítico, mede três metros de altura e é um dos principais símbolos turísticos para os visitantes da capital federal.

Instalada em 1961, a estátua foi idealizada pelo artista plástico Alfredo Ceschiatti. A depredação foi causada, segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), por Débora Rodrigues dos Santos, que escreveu com batom na obra.

Ela foi presa pela Polícia Federal em 17 de março de 2023, na 8ª fase da Operação Lesa Pátria, e denunciada pela PGR. O julgamento dela foi marcado para este mês.

Denúncias

Dois anos depois dos atos golpistas que devastaram a Praça dos Três Poderes, em Brasília, o volumoso inquérito que apura os ataques responsabilizou criminalmente 898 réus. Destes, 434 foram condenados pelo Supremo e 527 fecharam acordos de não persecução penal com o Ministério Público Federal.

As penas aplicadas variam de um ano a 17 anos de detenção e foram fixadas pelos ministros em julgamentos virtuais no fim de fevereiro.

Os envolvidos foram condenados por crimes como como golpe de Estado e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito.

Bolsonaro denunciado

A denúncia da PGR contra Bolsonaro conecta o ex-presidente aos ataques do 8 de Janeiro. Segundo Paulo Gonet, procurador-geral da República, o episódio foi fomentado e facilitado pela suposta organização criminosa integrada por Bolsonaro.

Para a Procuradoria, o grupo deve ser responsabilizado “por promover atos atentatórios à ordem democrática, com vistas a romper a ordem constitucional, impedir o funcionamento dos Poderes, em rebeldia contra o Estado de Direito Democrático”.

O Supremo analisa o recebimento da denúncia contra Bolsonaro e outros sete no próximo dia 25. Eles negam o plano de um golpe de Estado.

RIO – O ato em Copacabana neste domingo, 16, em prol dos denunciados e condenados pelos ataques aos prédios dos Três Poderes, em Brasília, no dia 8 de janeiro de 2023, foi marcado pela relativização dos crimes cometidos contra o Estado e das cenas de vandalismo e violência praticados por “pessoas de bem”, como citaram os políticos aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), questionou “o que eles (os condenados) fizeram?” e ironizou as cenas de barbárie em Brasília ao perguntar se eles “usaram batom” nos ataques. Policiais militares do Distrito Federal escalados para conter os vândalos contaram em investigações em curso e na CPMI do 8 de Janeiro, no Congresso Nacional, que “quase foram mortos”.

“O que eles fizeram? Usaram batom? Num país onde todo dia a gente assiste traficantes indo pra rua, onde os cara que assaltaram o Brasil, assaltam a Petrobras, voltaram para a cena do crime, voltaram à cena política. Está certo isso?”, afirmou Tarcísio ao lado de Bolsonaro e do pastor Silas Malafaia, organizador do evento.

‘Barras de ferro e barras de madeira’

A cabo Marcela Pinno, da Polícia Militar do Distrito Federal, que fez parte do policiamento da Esplanada dos Ministérios durante os atos de vandalismo nas sedes dos Três Poderes, afirmou à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que foi atacada com barras de ferro, barras de madeira e pedradas.

“Enquanto alguns me chutavam, me agrediam com barras de ferro, com barras de madeira, outro tentava tomar a minha arma. Momento esse em que fui atingida com uma barra de ferro na cabeça. Quando eles perceberam que eu ainda me mantinha ali no embate, eles começaram a tentar arrancar meu capacete”, contou.

Cabo da Polícia Militar do Distrito Federal Marcela da Silva Moraes Pinno, uma das vítimas dos vândalos no 8 de Janeiro Foto: Wilton Junior/Estadão

A cabo disse em depoimento, no dia 12 de setembro de 2023, que jamais presenciou “tamanha agressividade”, ao se referir aos ataques aos prédios públicos.

‘Eu quase fui morto’

Em depoimento em uma investigação da Corregedoria da Polícia Militar do DF, divulgado pela TV Globo, o subtenente Beroaldo José de Freitas Júnior contou que “quase foi morto” pelos vândalos que invadiram os prédios dos Três Poderes. Segundo o policial, ele foi socorrido “ensanguentado” e que o “clima no interior era de caos”.

“O clima no interior era de caos. A gente fala que é de caos total. Até porque a nossa tropa estava com aproximadamente 20 homens – talvez um pouco mais ou pouco menos. Mas acredito que eram mais de 200 de pessoas lá no interior do Palácio. E nós já tínhamos enfrentado eles lá fora. O ânimo deles era totalmente agressivo. Inclusive, eu quase fui morto. Eu e a soldado Marcela quase morremos nesse confronto, nesse primeiro momento. Estava ferido, fui socorrido depois disso todo ensanguentado, porque nem sabia que estava ferido. Mas depois fui identificado como lesionado”, contou.

Praça dos Três Poderes, em 8 de janeiro de 2023 Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Policial é derrubado de cavalo e agredido

Em outro episódio de violência explícita, os golpistas cercaram com barras de ferro e pedaços de madeira um policial da cavalaria do Esquadrão de Choque do DF, derrubaram o PM e agrediram o animal. O cavalo 847 foi atingido próximo ao olho, cerca de um centímetro do globo ocular.

O soldado Teles, seu montador, foi puxado e agredido pelos extremistas. À época, o cavalo recebeu os primeiros socorros no local e foi retirado. O soldado Teles sofreu alguns hematomas e uma lesão no joelho.

Momento em que 'Drácula' recebeu um curativo, após ser agredido na Praça dos Três Poderes Foto: Redação

Vandalismo nos prédios dos Três Poderes

Por volta das 15 horas do dia 8, os manifestantes avançaram sobre a Esplanada dos Ministérios e, pouco tempo depois, depredaram o Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal e o Palácio do Planalto. Os vândalos furaram, sem ou com pouca resistência da Polícia Militar, o bloqueio de segurança e invadiram os edifícios públicos.

O grupo desceu pelo Eixo Monumental, furou o bloqueio da PM e ocupou gramado, rampas, acessos e teto do Congresso. Houve a primeira invasão, com cenas de vandalismo no Senado e na Câmara.

Em seguida, pela Praça dos Três Poderes, transformada em campo de batalha, os radicais tomaram o Planalto e o Supremo. Quebraram vidraças, entraram em gabinetes e depredaram obras de arte. Houve focos de incêndio. Os plenários de Câmara, Senado e STF foram ocupados.

Plenário do STF destruído

O grupo de manifestantes que invadiu os prédios públicos deixou um cenário de destruição no Supremo, um dos principais alvos dos ataques de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro nos últimos anos.

O plenário foi invadido e o local foi depredado. Até mesmo cadeiras dos ministros do Supremo e o brasão da República, que estava fixado no local, foi retirado por manifestantes. “Supremo é o povo” foi uma das frases usadas durante a invasão.

Na cerimônia de abertura do ano Judiciário, em fevereiro daquele ano, foi mostrado um vídeo com o antes e depois da reforma necessária após a depredação.

Obras e estrutura do Palácio do Planalto

No Palácio do Planalto, a galeria de ex-presidentes foi um dos itens vandalizados no 8 de Janeiro. Obras de arte, como o quadro “As Mulatas”, de Di Cavalcanti, e o relógio de mesa, de Balthazar Martinot, foram danificados.

As obras voltaram a ser expostas dois anos após os atos antidemocráticos, em janeiro deste ano. As peças foram submetidas a um processo de recuperação e estão expostas novamente ao público como parte das celebrações pelos dois anos do episódio.

Relógio de Balthazar Martinot passou por processo de restauração após ser destruído Foto: Reprodução/Embaixada da Suíça/@SwissAmbBrazil

O relógio histórico de Balthazar Martinot e André Boulle foi arremessado ao chão durante a invasão ao Palácio do Planalto e retornou ao Brasil após ser restaurado na Suíça. De origem francesa, o objeto raro virou um símbolo dos ataques à democracia brasileira, por causa do grau de destruição e da brutalidade da cena, gravada pelo circuito interno de vigilância da Presidência da República. As imagens rodaram o mundo.

A destruição da relíquia foi provocada por Antônio Cláudio Alves Ferreira, de 32 anos. O mecânico e militante radical trajava uma camiseta preta com o rosto do ex-presidente Bolsonaro no dia da intentona golpista e frequentava acampamentos que reuniam bolsonaristas radicais – defensores de um golpe militar, eles se aglomeraram em frente ao Quartel-General do Exército inconformados com a vitória eleitoral do presidente Lula.

Tela As Mulatas

O painel “As Mulatas”, com 3,43 metros de largura e 1,12m de altura, do modernista Di Cavalcanti foi perfurado. As imagens divulgadas à época pelo governo mostram ao menos cinco buracos na obra com valor estimado em R$ 8 milhões, segundo o Planalto.

As Mulatas, de Di Cavancanti Foto: Reprodução

Ao todo, 21 obras vandalizadas durante a invasão do Palácio do Planalto foram oficialmente reintegradas ao patrimônio em janeiro deste ano. Cerca de 50 profissionais estiveram diretamente envolvidos nas restaurações.

‘Perdeu, mané’

Estátua da Justiça e prédio do STF foram vandalizados Foto: Wilton Junior/Estadão

A Estátua da Justiça foi pichada com os dizeres “Perdeu, mané” no dia dos ataques. Forjada em bloco monolítico, mede três metros de altura e é um dos principais símbolos turísticos para os visitantes da capital federal.

Instalada em 1961, a estátua foi idealizada pelo artista plástico Alfredo Ceschiatti. A depredação foi causada, segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), por Débora Rodrigues dos Santos, que escreveu com batom na obra.

Ela foi presa pela Polícia Federal em 17 de março de 2023, na 8ª fase da Operação Lesa Pátria, e denunciada pela PGR. O julgamento dela foi marcado para este mês.

Denúncias

Dois anos depois dos atos golpistas que devastaram a Praça dos Três Poderes, em Brasília, o volumoso inquérito que apura os ataques responsabilizou criminalmente 898 réus. Destes, 434 foram condenados pelo Supremo e 527 fecharam acordos de não persecução penal com o Ministério Público Federal.

As penas aplicadas variam de um ano a 17 anos de detenção e foram fixadas pelos ministros em julgamentos virtuais no fim de fevereiro.

Os envolvidos foram condenados por crimes como como golpe de Estado e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito.

Bolsonaro denunciado

A denúncia da PGR contra Bolsonaro conecta o ex-presidente aos ataques do 8 de Janeiro. Segundo Paulo Gonet, procurador-geral da República, o episódio foi fomentado e facilitado pela suposta organização criminosa integrada por Bolsonaro.

Para a Procuradoria, o grupo deve ser responsabilizado “por promover atos atentatórios à ordem democrática, com vistas a romper a ordem constitucional, impedir o funcionamento dos Poderes, em rebeldia contra o Estado de Direito Democrático”.

O Supremo analisa o recebimento da denúncia contra Bolsonaro e outros sete no próximo dia 25. Eles negam o plano de um golpe de Estado.

RIO – O ato em Copacabana neste domingo, 16, em prol dos denunciados e condenados pelos ataques aos prédios dos Três Poderes, em Brasília, no dia 8 de janeiro de 2023, foi marcado pela relativização dos crimes cometidos contra o Estado e das cenas de vandalismo e violência praticados por “pessoas de bem”, como citaram os políticos aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), questionou “o que eles (os condenados) fizeram?” e ironizou as cenas de barbárie em Brasília ao perguntar se eles “usaram batom” nos ataques. Policiais militares do Distrito Federal escalados para conter os vândalos contaram em investigações em curso e na CPMI do 8 de Janeiro, no Congresso Nacional, que “quase foram mortos”.

“O que eles fizeram? Usaram batom? Num país onde todo dia a gente assiste traficantes indo pra rua, onde os cara que assaltaram o Brasil, assaltam a Petrobras, voltaram para a cena do crime, voltaram à cena política. Está certo isso?”, afirmou Tarcísio ao lado de Bolsonaro e do pastor Silas Malafaia, organizador do evento.

‘Barras de ferro e barras de madeira’

A cabo Marcela Pinno, da Polícia Militar do Distrito Federal, que fez parte do policiamento da Esplanada dos Ministérios durante os atos de vandalismo nas sedes dos Três Poderes, afirmou à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que foi atacada com barras de ferro, barras de madeira e pedradas.

“Enquanto alguns me chutavam, me agrediam com barras de ferro, com barras de madeira, outro tentava tomar a minha arma. Momento esse em que fui atingida com uma barra de ferro na cabeça. Quando eles perceberam que eu ainda me mantinha ali no embate, eles começaram a tentar arrancar meu capacete”, contou.

Cabo da Polícia Militar do Distrito Federal Marcela da Silva Moraes Pinno, uma das vítimas dos vândalos no 8 de Janeiro Foto: Wilton Junior/Estadão

A cabo disse em depoimento, no dia 12 de setembro de 2023, que jamais presenciou “tamanha agressividade”, ao se referir aos ataques aos prédios públicos.

‘Eu quase fui morto’

Em depoimento em uma investigação da Corregedoria da Polícia Militar do DF, divulgado pela TV Globo, o subtenente Beroaldo José de Freitas Júnior contou que “quase foi morto” pelos vândalos que invadiram os prédios dos Três Poderes. Segundo o policial, ele foi socorrido “ensanguentado” e que o “clima no interior era de caos”.

“O clima no interior era de caos. A gente fala que é de caos total. Até porque a nossa tropa estava com aproximadamente 20 homens – talvez um pouco mais ou pouco menos. Mas acredito que eram mais de 200 de pessoas lá no interior do Palácio. E nós já tínhamos enfrentado eles lá fora. O ânimo deles era totalmente agressivo. Inclusive, eu quase fui morto. Eu e a soldado Marcela quase morremos nesse confronto, nesse primeiro momento. Estava ferido, fui socorrido depois disso todo ensanguentado, porque nem sabia que estava ferido. Mas depois fui identificado como lesionado”, contou.

Praça dos Três Poderes, em 8 de janeiro de 2023 Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Policial é derrubado de cavalo e agredido

Em outro episódio de violência explícita, os golpistas cercaram com barras de ferro e pedaços de madeira um policial da cavalaria do Esquadrão de Choque do DF, derrubaram o PM e agrediram o animal. O cavalo 847 foi atingido próximo ao olho, cerca de um centímetro do globo ocular.

O soldado Teles, seu montador, foi puxado e agredido pelos extremistas. À época, o cavalo recebeu os primeiros socorros no local e foi retirado. O soldado Teles sofreu alguns hematomas e uma lesão no joelho.

Momento em que 'Drácula' recebeu um curativo, após ser agredido na Praça dos Três Poderes Foto: Redação

Vandalismo nos prédios dos Três Poderes

Por volta das 15 horas do dia 8, os manifestantes avançaram sobre a Esplanada dos Ministérios e, pouco tempo depois, depredaram o Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal e o Palácio do Planalto. Os vândalos furaram, sem ou com pouca resistência da Polícia Militar, o bloqueio de segurança e invadiram os edifícios públicos.

O grupo desceu pelo Eixo Monumental, furou o bloqueio da PM e ocupou gramado, rampas, acessos e teto do Congresso. Houve a primeira invasão, com cenas de vandalismo no Senado e na Câmara.

Em seguida, pela Praça dos Três Poderes, transformada em campo de batalha, os radicais tomaram o Planalto e o Supremo. Quebraram vidraças, entraram em gabinetes e depredaram obras de arte. Houve focos de incêndio. Os plenários de Câmara, Senado e STF foram ocupados.

Plenário do STF destruído

O grupo de manifestantes que invadiu os prédios públicos deixou um cenário de destruição no Supremo, um dos principais alvos dos ataques de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro nos últimos anos.

O plenário foi invadido e o local foi depredado. Até mesmo cadeiras dos ministros do Supremo e o brasão da República, que estava fixado no local, foi retirado por manifestantes. “Supremo é o povo” foi uma das frases usadas durante a invasão.

Na cerimônia de abertura do ano Judiciário, em fevereiro daquele ano, foi mostrado um vídeo com o antes e depois da reforma necessária após a depredação.

Obras e estrutura do Palácio do Planalto

No Palácio do Planalto, a galeria de ex-presidentes foi um dos itens vandalizados no 8 de Janeiro. Obras de arte, como o quadro “As Mulatas”, de Di Cavalcanti, e o relógio de mesa, de Balthazar Martinot, foram danificados.

As obras voltaram a ser expostas dois anos após os atos antidemocráticos, em janeiro deste ano. As peças foram submetidas a um processo de recuperação e estão expostas novamente ao público como parte das celebrações pelos dois anos do episódio.

Relógio de Balthazar Martinot passou por processo de restauração após ser destruído Foto: Reprodução/Embaixada da Suíça/@SwissAmbBrazil

O relógio histórico de Balthazar Martinot e André Boulle foi arremessado ao chão durante a invasão ao Palácio do Planalto e retornou ao Brasil após ser restaurado na Suíça. De origem francesa, o objeto raro virou um símbolo dos ataques à democracia brasileira, por causa do grau de destruição e da brutalidade da cena, gravada pelo circuito interno de vigilância da Presidência da República. As imagens rodaram o mundo.

A destruição da relíquia foi provocada por Antônio Cláudio Alves Ferreira, de 32 anos. O mecânico e militante radical trajava uma camiseta preta com o rosto do ex-presidente Bolsonaro no dia da intentona golpista e frequentava acampamentos que reuniam bolsonaristas radicais – defensores de um golpe militar, eles se aglomeraram em frente ao Quartel-General do Exército inconformados com a vitória eleitoral do presidente Lula.

Tela As Mulatas

O painel “As Mulatas”, com 3,43 metros de largura e 1,12m de altura, do modernista Di Cavalcanti foi perfurado. As imagens divulgadas à época pelo governo mostram ao menos cinco buracos na obra com valor estimado em R$ 8 milhões, segundo o Planalto.

As Mulatas, de Di Cavancanti Foto: Reprodução

Ao todo, 21 obras vandalizadas durante a invasão do Palácio do Planalto foram oficialmente reintegradas ao patrimônio em janeiro deste ano. Cerca de 50 profissionais estiveram diretamente envolvidos nas restaurações.

‘Perdeu, mané’

Estátua da Justiça e prédio do STF foram vandalizados Foto: Wilton Junior/Estadão

A Estátua da Justiça foi pichada com os dizeres “Perdeu, mané” no dia dos ataques. Forjada em bloco monolítico, mede três metros de altura e é um dos principais símbolos turísticos para os visitantes da capital federal.

Instalada em 1961, a estátua foi idealizada pelo artista plástico Alfredo Ceschiatti. A depredação foi causada, segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), por Débora Rodrigues dos Santos, que escreveu com batom na obra.

Ela foi presa pela Polícia Federal em 17 de março de 2023, na 8ª fase da Operação Lesa Pátria, e denunciada pela PGR. O julgamento dela foi marcado para este mês.

Denúncias

Dois anos depois dos atos golpistas que devastaram a Praça dos Três Poderes, em Brasília, o volumoso inquérito que apura os ataques responsabilizou criminalmente 898 réus. Destes, 434 foram condenados pelo Supremo e 527 fecharam acordos de não persecução penal com o Ministério Público Federal.

As penas aplicadas variam de um ano a 17 anos de detenção e foram fixadas pelos ministros em julgamentos virtuais no fim de fevereiro.

Os envolvidos foram condenados por crimes como como golpe de Estado e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito.

Bolsonaro denunciado

A denúncia da PGR contra Bolsonaro conecta o ex-presidente aos ataques do 8 de Janeiro. Segundo Paulo Gonet, procurador-geral da República, o episódio foi fomentado e facilitado pela suposta organização criminosa integrada por Bolsonaro.

Para a Procuradoria, o grupo deve ser responsabilizado “por promover atos atentatórios à ordem democrática, com vistas a romper a ordem constitucional, impedir o funcionamento dos Poderes, em rebeldia contra o Estado de Direito Democrático”.

O Supremo analisa o recebimento da denúncia contra Bolsonaro e outros sete no próximo dia 25. Eles negam o plano de um golpe de Estado.