Da Praça da Sé até o centrinho de Parelheiros são 37 quilômetros de distância. Localizado no extremo sul, o distrito que fica longe de tudo faz parte da Subprefeitura de Parelheiros, dona de 23,2% do território da cidade de São Paulo, mas passava quase despercebido em outro mapa, o da assistência social. Vazio que aos poucos tem sido preenchido pela resiliência e dedicação da psicóloga Adriana Rezende da Silva, de 54 anos. Na contramão de boa parte dos colegas que atuam no serviço público municipal, trabalhar na região não foi a última, mas sua primeira escolha.
A oportunidade surgiu em 2001. Adriana atuava como assistente social na Capela do Socorro, também na zona sul, na região de Interlagos. A transferência ajudou Parelheiros a dar um salto no número de serviços oferecidos aos moradores da região que tem o mais baixo Índice de Desenvolvimento (IDH) de São Paulo.
Juntamente com Marsilac – distrito vizinho mais ao sul ainda, de onde dá até para ver o mar –, Parelheiros soma hoje 36 unidades municipais voltadas à assistência da população, estimada em 10 mil habitantes. Quando Adriana chegou para “explorar o território” eram apenas três.
“Fique em dúvida no início, admito. Lá é muito longe, o acesso é difícil e a exclusão é enorme. Ainda estava com um filho pequeno na época. Mas decidi ir porque vi um potencial ali. Para as pessoas e para mim. Um grande potencial de fazer a diferença”, contou.
Duas décadas depois, Adriana diz se sentir como uma moradora da região, mas ainda insatisfeita do ponto de vista profissional. A psicóloga ressaltou a importância do trabalho realizado especialmente nos últimos 11 anos, quando passou a responder pelo cargo de supervisora, mas observou que tanto Parelheiros como Marsilac ainda têm o que chama de “vazios assistenciais”.
“Toda vez que a gente sai para fazer uma visita encontramos um caso extremo de vulnerabilidade. Nossa região é muito extensa, há locais onde não se chega de carro ainda. As pessoas demoram muito para se deslocar de um bairro a outro, por isso precisamos ampliar mais os serviços. Manacá da Serra, por exemplo, tem 300 moradores e nenhum serviço instalado de assistência. Há um vazio ali”, relatou Adriana.
Querida pelos colegas, a supervisora disse ter fama de “pidona”. “É porque eu peço mesmo, levo fotos para o secretário ou mesmo para o prefeito quando tenho uma oportunidade (Ricardo Nunes é um antigo conhecido dos tempos em que era vereador e representava os moradores da Capela na Câmara Municipal). Conheço a região, não sou daquelas que ficam atrás da mesa, e sei o que ainda precisamos fazer.”
A lista de Adriana inclui, por exemplo, mais unidades consideradas de proteção, como a que atende crianças vítimas de violência. Segundo ela, com a pandemia, cresceu muito a procura por esse serviço em função dos problemas domésticos derivados do isolamento social.
Chamados de Serviços de Proteção à Criança e Adolescente (SPVVs), esses equipamentos oferecem atendimento social e psicossocial tanto para as vítimas como para seus familiares e, quando possível, até para o agressor. A intenção é proporcionar condições para o fortalecimento da autoestima, superação da situação de violação de direitos e reparação da violência vivida. No caso dos agressores, o trabalho visa prevenir o agravamento da situação, promover a interrupção do ciclo de violência e ainda contribuir para a devida responsabilização dos autores.
A rede social instalada por Adriana na região ganhou ao longo dos últimos 20 anos centros profissionalizantes, residências permanentes, núcleos para pessoas com deficiência e, mais recentemente, um centro para que idosos passem o dia fazendo atividades. Diferentemente do restante da cidade, a demanda para atendimento de moradores de rua é mínima em Parelheiros e Marsilac.
“Hoje estamos conseguindo avançar nos serviços e não só da assistência, mas também da e educação. É uma região que está sendo vista agora, depois de muita luta interna. Eu brigo mesmo, mas é por um bom motivo.”