BRASÍLIA - Vinte anos após nascer de um racha interno do PT e dez anos depois de entrar na disputa presidencial com ataques duros à então presidente Dilma Rousseff, o PSOL firmou os petistas como seus principais aliados na disputa pelas prefeituras do País.
Em 2014, num dos momentos de maior atrito entre PSOL e PT, a candidata psolista à Presidência, Luciana Genro, chegou a comparar Dilma, Aécio Neves (PSDB) e Marina Silva (então no PSB) a “três irmãos siameses”, referindo-se à crítica de que todos eles manteriam a mesma política econômica neoliberal se eleitos, em sua avaliação.
Agora, o partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva conta com o aliado para romper o cenário vivido na última eleição municipal, quando não conquistou nenhuma prefeitura de capitais, e também reconquistar a maior cidade da América Latina. As duas legendas devem estar juntas em pelo menos nove capitais, e São Paulo se tornou símbolo da dependência petista do PSOL para renovar suas lideranças.
Pela primeira vez desde a redemocratização, o PT, que voltou a filiar a ex-prefeita Marta Suplicy para ser vice de Guilherme Boulos (PSOL), não terá cabeça de chapa na eleição para a capital paulista. A decisão petista não foi tomada sem resistência interna. Mas, após o pleito de 2020, em que o então candidato petista, Jilmar Tatto, ficou em 6º lugar, com 8,65% dos votos, e diante do favoritismo de Boulos, não houve opção viável senão abrir mão da vaga.
A chapa entre PT e PSOL se repete em Belém, Macapá, Porto Alegre e se encaminha em Manaus. Já nas capitais de Minas Gerais, Goiás, Paraíba e Mato Grosso os partidos estarão juntos, mas não necessariamente vão compor a chapa à prefeitura.
Belém é a única capital controlada pelo PSOL, com Edmilson Rodrigues, e terá o petista Edilson Moura como vice na disputa pela reeleição. O prefeito, no entanto, não enfrenta boa aprovação, e corre o risco de tirar de seu partido a maior cidade sob seu comando – outros quatro municípios menores são administrados pela sigla entre os 5,5 mil espalhados pelo País. Além das capitais paraense e paulista, o PSOL do candidato Paulo Lemos terá Ivaneia Alves (PT) como vice na disputa pela prefeitura de Macapá.
Em Porto Alegre, numa chapa 100% feminina, Maria do Rosário (PT) contará com Tamyres Filgueira (PSOL) na tentativa de levar a esquerda de volta à prefeitura. Por uma década e meia, entre 1989 e 2004, os petistas governaram a capital gaúcha, e desde então têm falhado em retomá-la. Na eleição passada, Manuela d’Ávila (PCdoB) e seu vice Miguel Rossetto (PT) ficaram com 45,37% dos votos no segundo turno.
O número de dobradinhas seria maior se o PT não tivesse desmanchado a chapa com o PSOL em Maceió por meio de uma intervenção inesperada. Veio do diretório nacional petista a ordem, na semana passada, para retirar a candidatura de Ricardo Barbosa e fortalecer o candidato apoiado pelo senador Renan Calheiros, Ricardo Brito (MDB).
Pesou o fato de Barbosa não ser uma candidatura competitiva para enfrentar o prefeito João Henrique Caldas (PL), conhecido como JHC, que vai concorrer a um novo mandato e tem apoio tanto de Jair Bolsonaro (PL) quanto do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). A chapa petista com a vice do PSOL, Eliana Silva, já estava oficializada em convenção.
Sem candidato a vice, o PSOL vai apoiar a chapa do PT com Rogério Correia em Belo Horizonte, com Adriana Accorsi em Goiânia, Luciano Cartaxo em João Pessoa e Lúcio Cabral em Cuiabá. Mas, embora o partido tenha a meta de dobrar o seu número de vereadores – foram eleitos 90 no pleito passado –, seus dirigentes apostam todas as fichas em segurar a prefeitura de Belém e levar Boulos à vitória em São Paulo.
O histórico de críticas ao PT no Palácio do Planalto vai ficar, pela primeira vez, para trás. “A grande diferença desta vez, para a gente, é que o PSOL disputa (uma eleição) na condição de governo, porque fomos oposição todo esse tempo”, diz a presidente do PSOL, Paula Coradi.
Rixas históricas
O PSOL surgiu em 2004 a partir de um racha no PT. No ano anterior, quatro parlamentares petistas tinham anunciado que votariam contra a reforma das aposentadorias dos servidores públicos, proposta pelo governo Lula, e foram expulsos: a senadora Heloísa Helena (AL) e os deputados Luciana Genro (RS), João Fontes (SE) e João Batista Araújo, o “Babá” (PA).
As tendências internas ligadas aos expulso deixaram o PT junto deles. Um ano depois, os dissidentes fundaram o PSOL, que fez oposição aos governos petistas até o processo de impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, quando o cenário mudou. O episódio, que até hoje é chamado de “golpe” pelo PSOL, reunificou os dois grupos.
Ao longo da primeira década, o PSOL abriu as portas para insatisfeitos do PT, como Marcelo Freixo e Randolfe Rodrigues, e não se cansou de criticar o governo federal por suas políticas econômicas e pelos escândalos de corrupção. Em 2012, Randolfe chegou a afirmar que o PT tinha perdido a “referência ética” e que estava “muito parecido com o PSDB”.