Traduzindo a política

Opinião|STF e governo Lula são os principais promotores do bolsonarismo hoje no Brasil


Ex-presidente usa discurso de perseguição para alimentar sentimento de revolta que o mantém no controle da oposição, e decisões na Corte e no Executivo contribuem com essa narrativa

Por Ricardo Corrêa
Atualização:

Os principais promotores do bolsonarismo no Brasil atual, que ajudam a manter a mobilização em torno do ex-presidente mais ou menos nos mesmos patamares nos últimos seis meses, estão no Supremo Tribunal Federal (STF) e no governo Lula. Mesmo impactado por ações da Polícia Federal - como a desta quinta-feira, que determina a apreensão de seu passaporte e mira civis e militares de seu entorno - e pelos efeitos negativos da radicalização que promoveu e que levou aos atos golpistas de 8 de janeiro, parte da população continua dando atenção e sustentando o discurso de Jair Bolsonaro (PL), reforçado justamente por seus adversários. Quando o ministro Dias Toffoli derruba multas e decisões de operações contra a corrupção, quando decisões a respeito da antiga família presidencial trazem erros, por menores que sejam, quando há dúvidas razoáveis sobre a relatoria dos processos que o envolvem o clã, sempre nas mãos de Alexandre de Moraes, ou quando Lula escolhe seu advogado pessoal ou seu ministro mais combativo para a Corte, ganha mais força a única narrativa que sobrou ao bolsonarismo: a de que o mal a ser combatido está na aliança entre esquerda e STF.

Jair Bolsonaro utiliza-se de subsídios oferecidos por seus próprios adversários para manter oposição vinculada ao seu discurso mais radical Foto: Orlando Kissner/Alep

Essa percepção alimentada justamente por seus maiores adversários é transformada em um sentimento de revolta que inibe o surgimento de uma oposição mais moderada em contrapartida a um grupo que quer colocar fogo em tudo. E reforça o desejo de grande parte da parcela da sociedade que apoiou Bolsonaro de não aceitar qualquer hipótese de reconciliação do Brasil.

continua após a publicidade

Não por acaso, Bolsonaro continua sendo, segundo o instituto Atlas, a figura da direita com a maior avaliação positiva (43%), ao lado do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ainda que reúna também a maior rejeição, já que é mais conhecido. A pesquisa mostra que, nos últimos seis meses, a avaliação de Bolsonaro apenas oscilou, estando hoje no exato patamar da pesquisa de julho de 2023: 51% de rejeição e 43% de aprovação. Quando se olha o cenário de um ano, imediatamente após deixar o governo, e agora, pouca coisa mudou. A rejeição recuou de 54% para 51%, enquanto a aprovação ficou nos mesmos 43%.

Outros dados da pesquisa, feita entre os dias 28 e 31 de janeiro, embora divulgada nesta semana, ajudam a entender o impacto que as decisões de Toffoli e as posições do governo no campo da Justiça e também no combate à criminalidade - com as relativizações presentes no discurso do presidente quanto os crimes de menor potencial ofensivo - podem ter na visão que a sociedade brasileira possui do cenário político. Quando indagados a falar sobre os três maiores problemas do Brasil atualmente, 59,4% dos brasileiros citam a criminalidade e o tráfico de drogas. Outros 57,6% citam a corrupção. Os índices estão bem distantes do terceiro problema mais citado: a pobreza, o desemprego e a desigualdade social (19,3%), área de maior foco da gestão Lula. Neste último caso, o índice é pouco maior do que os que citam o “mau funcionamento da Justiça” como problema: 17,5%.

O “extremismo” e o “enfraquecimento da democracia”, características que se notam nos comportamentos de Bolsonaro, são lembrados por apenas 12,4% e 11,3% da população, respectivamente. No caso da corrupção, entre novembro de 2023 e janeiro de 2024, intervalo no qual as decisões de Toffoli foram exaradas, o índice aumentou 8 pontos. No mesmo intervalo, a preocupação com a pobreza, o desemprego e a desigualdade social caiu 5 pontos.

continua após a publicidade

Quando se pega um recorte dos eleitores de Bolsonaro no segundo turno, essa correlação fica mais nítida. São 81% os bolsonaristas que apontam a corrupção como um dos principais problemas, e 63,2% os que citam a criminalidade. O terceiro tema mais apontado por eles foi justamente o mau funcionamento da Justiça: 28,7%. Assim, a cada vez que seus adversários reforçam essa percepção, dão nova sobrevida a um Bolsonaro que, mesmo inelegível, continua fazendo a oposição girar no seu entorno.

Questões como a indicação de Flávio Dino ao STF parecem ser cruciais para essa interpretação em uma parcela da sociedade que votou em Bolsonaro. Basta ver o que aconteceu com Sergio Moro, flagrado pelo fotógrafo do Estadão, Wilton Junior, e por outros meios da imprensa trocando mensagens dizendo que não assumiria o voto a favor de Flávio Dino, ainda que sugerisse no texto que votaria nesse sentido. Entre novembro, mês imediatamente antes do episódio, e janeiro, mês imediatamente depois, sua aprovação despencou de 41% para 22%. Sua reprovação, por outro lado, foi de 45% para 65%. Com isso, ele jogou fora tudo o que tinha garimpado de melhoria entre janeiro de 2022, seu pior momento e o ano passado, o que permitiu, no meio do caminho, ser eleito senador pelo Paraná. Entre os que votaram em Bolsonaro no segundo turno, apenas 10,4% continuam avaliando Moro positivamente, enquanto 80,7% o rejeitam.

continua após a publicidade

A situação envolvendo Moro também sugere que o eleitor bolsonarista, em sua essência, não quer nem pensar em conciliação. Tarcísio de Freitas, que tem adotado postura menos belicista que o ex-presidente, tem visto sua popularidade cair aos poucos. Em julho, 54% dos brasileiros avaliavam o governador positivamente. Agora, são 43%. Nos últimos meses, houve apenas oscilação, mas sempre para baixo. No mesmo período, a avaliação negativa passou de 26% para 34%. A pesquisa, reitera-se, foi feita antes do encontro do governador com Lula, e não se deve desconsiderar que o desgaste da presença no governo, natural quando se aproxima da eleição, também deve ser contabilizado nessa análise.

Voltando a Bolsonaro, percebe-se que grande parte de suas bandeiras ficaram pelo caminho. O Brasil não se transformou em uma Venezuela, nem virou um país comunista. A situação econômica não se deteriorou e, ainda que o governo não seja o que o mercado espera, está longe de ser a catástrofe que se pintou na campanha. Lula até consegue melhorar seus índices de popularidade, segundo a mesma pesquisa. Restou o discurso de perseguição promovida pelo Judiciário em associação com o governo para que sobreviva. E os elementos para continuar insuflando a população nesse sentido lhe são oferecidos regularmente por seus adversários.

Isso se dá não apenas por meio de decisões impopulares do STF, mas pelo reforço dessa aliança quando ministros da Corte estão diretamente envolvidos na escolha de nomes para tribunais ou o Ministério Público Federal (MPF) e até mesmo pelo fato de que, agora, quase semanalmente vemos operações contra integrantes do núcleo de apoio ao ex-presidente. Isso, de nenhuma maneira, significa que não é preciso investigar os episódios que terminaram em uma tentativa de golpe no dia 8, o ponto central da operação desta quinta. Trata-se da operação com o maior volume de provas até agora de todas as que envolvem Bolsonaro e seus aliados. Mas é fato que quanto mais o ex-presidente é contraposto ao STF e, em especial, ao ministro Alexandre de Moraes, relator dessa e de quase todas as investigações que esbarram em seus aliados mesmo que em alguns passos figure ele também como vítima, mais se reforça a tese que ele quer espalhar em seus discursos.

Os principais promotores do bolsonarismo no Brasil atual, que ajudam a manter a mobilização em torno do ex-presidente mais ou menos nos mesmos patamares nos últimos seis meses, estão no Supremo Tribunal Federal (STF) e no governo Lula. Mesmo impactado por ações da Polícia Federal - como a desta quinta-feira, que determina a apreensão de seu passaporte e mira civis e militares de seu entorno - e pelos efeitos negativos da radicalização que promoveu e que levou aos atos golpistas de 8 de janeiro, parte da população continua dando atenção e sustentando o discurso de Jair Bolsonaro (PL), reforçado justamente por seus adversários. Quando o ministro Dias Toffoli derruba multas e decisões de operações contra a corrupção, quando decisões a respeito da antiga família presidencial trazem erros, por menores que sejam, quando há dúvidas razoáveis sobre a relatoria dos processos que o envolvem o clã, sempre nas mãos de Alexandre de Moraes, ou quando Lula escolhe seu advogado pessoal ou seu ministro mais combativo para a Corte, ganha mais força a única narrativa que sobrou ao bolsonarismo: a de que o mal a ser combatido está na aliança entre esquerda e STF.

Jair Bolsonaro utiliza-se de subsídios oferecidos por seus próprios adversários para manter oposição vinculada ao seu discurso mais radical Foto: Orlando Kissner/Alep

Essa percepção alimentada justamente por seus maiores adversários é transformada em um sentimento de revolta que inibe o surgimento de uma oposição mais moderada em contrapartida a um grupo que quer colocar fogo em tudo. E reforça o desejo de grande parte da parcela da sociedade que apoiou Bolsonaro de não aceitar qualquer hipótese de reconciliação do Brasil.

Não por acaso, Bolsonaro continua sendo, segundo o instituto Atlas, a figura da direita com a maior avaliação positiva (43%), ao lado do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ainda que reúna também a maior rejeição, já que é mais conhecido. A pesquisa mostra que, nos últimos seis meses, a avaliação de Bolsonaro apenas oscilou, estando hoje no exato patamar da pesquisa de julho de 2023: 51% de rejeição e 43% de aprovação. Quando se olha o cenário de um ano, imediatamente após deixar o governo, e agora, pouca coisa mudou. A rejeição recuou de 54% para 51%, enquanto a aprovação ficou nos mesmos 43%.

Outros dados da pesquisa, feita entre os dias 28 e 31 de janeiro, embora divulgada nesta semana, ajudam a entender o impacto que as decisões de Toffoli e as posições do governo no campo da Justiça e também no combate à criminalidade - com as relativizações presentes no discurso do presidente quanto os crimes de menor potencial ofensivo - podem ter na visão que a sociedade brasileira possui do cenário político. Quando indagados a falar sobre os três maiores problemas do Brasil atualmente, 59,4% dos brasileiros citam a criminalidade e o tráfico de drogas. Outros 57,6% citam a corrupção. Os índices estão bem distantes do terceiro problema mais citado: a pobreza, o desemprego e a desigualdade social (19,3%), área de maior foco da gestão Lula. Neste último caso, o índice é pouco maior do que os que citam o “mau funcionamento da Justiça” como problema: 17,5%.

O “extremismo” e o “enfraquecimento da democracia”, características que se notam nos comportamentos de Bolsonaro, são lembrados por apenas 12,4% e 11,3% da população, respectivamente. No caso da corrupção, entre novembro de 2023 e janeiro de 2024, intervalo no qual as decisões de Toffoli foram exaradas, o índice aumentou 8 pontos. No mesmo intervalo, a preocupação com a pobreza, o desemprego e a desigualdade social caiu 5 pontos.

Quando se pega um recorte dos eleitores de Bolsonaro no segundo turno, essa correlação fica mais nítida. São 81% os bolsonaristas que apontam a corrupção como um dos principais problemas, e 63,2% os que citam a criminalidade. O terceiro tema mais apontado por eles foi justamente o mau funcionamento da Justiça: 28,7%. Assim, a cada vez que seus adversários reforçam essa percepção, dão nova sobrevida a um Bolsonaro que, mesmo inelegível, continua fazendo a oposição girar no seu entorno.

Questões como a indicação de Flávio Dino ao STF parecem ser cruciais para essa interpretação em uma parcela da sociedade que votou em Bolsonaro. Basta ver o que aconteceu com Sergio Moro, flagrado pelo fotógrafo do Estadão, Wilton Junior, e por outros meios da imprensa trocando mensagens dizendo que não assumiria o voto a favor de Flávio Dino, ainda que sugerisse no texto que votaria nesse sentido. Entre novembro, mês imediatamente antes do episódio, e janeiro, mês imediatamente depois, sua aprovação despencou de 41% para 22%. Sua reprovação, por outro lado, foi de 45% para 65%. Com isso, ele jogou fora tudo o que tinha garimpado de melhoria entre janeiro de 2022, seu pior momento e o ano passado, o que permitiu, no meio do caminho, ser eleito senador pelo Paraná. Entre os que votaram em Bolsonaro no segundo turno, apenas 10,4% continuam avaliando Moro positivamente, enquanto 80,7% o rejeitam.

A situação envolvendo Moro também sugere que o eleitor bolsonarista, em sua essência, não quer nem pensar em conciliação. Tarcísio de Freitas, que tem adotado postura menos belicista que o ex-presidente, tem visto sua popularidade cair aos poucos. Em julho, 54% dos brasileiros avaliavam o governador positivamente. Agora, são 43%. Nos últimos meses, houve apenas oscilação, mas sempre para baixo. No mesmo período, a avaliação negativa passou de 26% para 34%. A pesquisa, reitera-se, foi feita antes do encontro do governador com Lula, e não se deve desconsiderar que o desgaste da presença no governo, natural quando se aproxima da eleição, também deve ser contabilizado nessa análise.

Voltando a Bolsonaro, percebe-se que grande parte de suas bandeiras ficaram pelo caminho. O Brasil não se transformou em uma Venezuela, nem virou um país comunista. A situação econômica não se deteriorou e, ainda que o governo não seja o que o mercado espera, está longe de ser a catástrofe que se pintou na campanha. Lula até consegue melhorar seus índices de popularidade, segundo a mesma pesquisa. Restou o discurso de perseguição promovida pelo Judiciário em associação com o governo para que sobreviva. E os elementos para continuar insuflando a população nesse sentido lhe são oferecidos regularmente por seus adversários.

Isso se dá não apenas por meio de decisões impopulares do STF, mas pelo reforço dessa aliança quando ministros da Corte estão diretamente envolvidos na escolha de nomes para tribunais ou o Ministério Público Federal (MPF) e até mesmo pelo fato de que, agora, quase semanalmente vemos operações contra integrantes do núcleo de apoio ao ex-presidente. Isso, de nenhuma maneira, significa que não é preciso investigar os episódios que terminaram em uma tentativa de golpe no dia 8, o ponto central da operação desta quinta. Trata-se da operação com o maior volume de provas até agora de todas as que envolvem Bolsonaro e seus aliados. Mas é fato que quanto mais o ex-presidente é contraposto ao STF e, em especial, ao ministro Alexandre de Moraes, relator dessa e de quase todas as investigações que esbarram em seus aliados mesmo que em alguns passos figure ele também como vítima, mais se reforça a tese que ele quer espalhar em seus discursos.

Os principais promotores do bolsonarismo no Brasil atual, que ajudam a manter a mobilização em torno do ex-presidente mais ou menos nos mesmos patamares nos últimos seis meses, estão no Supremo Tribunal Federal (STF) e no governo Lula. Mesmo impactado por ações da Polícia Federal - como a desta quinta-feira, que determina a apreensão de seu passaporte e mira civis e militares de seu entorno - e pelos efeitos negativos da radicalização que promoveu e que levou aos atos golpistas de 8 de janeiro, parte da população continua dando atenção e sustentando o discurso de Jair Bolsonaro (PL), reforçado justamente por seus adversários. Quando o ministro Dias Toffoli derruba multas e decisões de operações contra a corrupção, quando decisões a respeito da antiga família presidencial trazem erros, por menores que sejam, quando há dúvidas razoáveis sobre a relatoria dos processos que o envolvem o clã, sempre nas mãos de Alexandre de Moraes, ou quando Lula escolhe seu advogado pessoal ou seu ministro mais combativo para a Corte, ganha mais força a única narrativa que sobrou ao bolsonarismo: a de que o mal a ser combatido está na aliança entre esquerda e STF.

Jair Bolsonaro utiliza-se de subsídios oferecidos por seus próprios adversários para manter oposição vinculada ao seu discurso mais radical Foto: Orlando Kissner/Alep

Essa percepção alimentada justamente por seus maiores adversários é transformada em um sentimento de revolta que inibe o surgimento de uma oposição mais moderada em contrapartida a um grupo que quer colocar fogo em tudo. E reforça o desejo de grande parte da parcela da sociedade que apoiou Bolsonaro de não aceitar qualquer hipótese de reconciliação do Brasil.

Não por acaso, Bolsonaro continua sendo, segundo o instituto Atlas, a figura da direita com a maior avaliação positiva (43%), ao lado do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ainda que reúna também a maior rejeição, já que é mais conhecido. A pesquisa mostra que, nos últimos seis meses, a avaliação de Bolsonaro apenas oscilou, estando hoje no exato patamar da pesquisa de julho de 2023: 51% de rejeição e 43% de aprovação. Quando se olha o cenário de um ano, imediatamente após deixar o governo, e agora, pouca coisa mudou. A rejeição recuou de 54% para 51%, enquanto a aprovação ficou nos mesmos 43%.

Outros dados da pesquisa, feita entre os dias 28 e 31 de janeiro, embora divulgada nesta semana, ajudam a entender o impacto que as decisões de Toffoli e as posições do governo no campo da Justiça e também no combate à criminalidade - com as relativizações presentes no discurso do presidente quanto os crimes de menor potencial ofensivo - podem ter na visão que a sociedade brasileira possui do cenário político. Quando indagados a falar sobre os três maiores problemas do Brasil atualmente, 59,4% dos brasileiros citam a criminalidade e o tráfico de drogas. Outros 57,6% citam a corrupção. Os índices estão bem distantes do terceiro problema mais citado: a pobreza, o desemprego e a desigualdade social (19,3%), área de maior foco da gestão Lula. Neste último caso, o índice é pouco maior do que os que citam o “mau funcionamento da Justiça” como problema: 17,5%.

O “extremismo” e o “enfraquecimento da democracia”, características que se notam nos comportamentos de Bolsonaro, são lembrados por apenas 12,4% e 11,3% da população, respectivamente. No caso da corrupção, entre novembro de 2023 e janeiro de 2024, intervalo no qual as decisões de Toffoli foram exaradas, o índice aumentou 8 pontos. No mesmo intervalo, a preocupação com a pobreza, o desemprego e a desigualdade social caiu 5 pontos.

Quando se pega um recorte dos eleitores de Bolsonaro no segundo turno, essa correlação fica mais nítida. São 81% os bolsonaristas que apontam a corrupção como um dos principais problemas, e 63,2% os que citam a criminalidade. O terceiro tema mais apontado por eles foi justamente o mau funcionamento da Justiça: 28,7%. Assim, a cada vez que seus adversários reforçam essa percepção, dão nova sobrevida a um Bolsonaro que, mesmo inelegível, continua fazendo a oposição girar no seu entorno.

Questões como a indicação de Flávio Dino ao STF parecem ser cruciais para essa interpretação em uma parcela da sociedade que votou em Bolsonaro. Basta ver o que aconteceu com Sergio Moro, flagrado pelo fotógrafo do Estadão, Wilton Junior, e por outros meios da imprensa trocando mensagens dizendo que não assumiria o voto a favor de Flávio Dino, ainda que sugerisse no texto que votaria nesse sentido. Entre novembro, mês imediatamente antes do episódio, e janeiro, mês imediatamente depois, sua aprovação despencou de 41% para 22%. Sua reprovação, por outro lado, foi de 45% para 65%. Com isso, ele jogou fora tudo o que tinha garimpado de melhoria entre janeiro de 2022, seu pior momento e o ano passado, o que permitiu, no meio do caminho, ser eleito senador pelo Paraná. Entre os que votaram em Bolsonaro no segundo turno, apenas 10,4% continuam avaliando Moro positivamente, enquanto 80,7% o rejeitam.

A situação envolvendo Moro também sugere que o eleitor bolsonarista, em sua essência, não quer nem pensar em conciliação. Tarcísio de Freitas, que tem adotado postura menos belicista que o ex-presidente, tem visto sua popularidade cair aos poucos. Em julho, 54% dos brasileiros avaliavam o governador positivamente. Agora, são 43%. Nos últimos meses, houve apenas oscilação, mas sempre para baixo. No mesmo período, a avaliação negativa passou de 26% para 34%. A pesquisa, reitera-se, foi feita antes do encontro do governador com Lula, e não se deve desconsiderar que o desgaste da presença no governo, natural quando se aproxima da eleição, também deve ser contabilizado nessa análise.

Voltando a Bolsonaro, percebe-se que grande parte de suas bandeiras ficaram pelo caminho. O Brasil não se transformou em uma Venezuela, nem virou um país comunista. A situação econômica não se deteriorou e, ainda que o governo não seja o que o mercado espera, está longe de ser a catástrofe que se pintou na campanha. Lula até consegue melhorar seus índices de popularidade, segundo a mesma pesquisa. Restou o discurso de perseguição promovida pelo Judiciário em associação com o governo para que sobreviva. E os elementos para continuar insuflando a população nesse sentido lhe são oferecidos regularmente por seus adversários.

Isso se dá não apenas por meio de decisões impopulares do STF, mas pelo reforço dessa aliança quando ministros da Corte estão diretamente envolvidos na escolha de nomes para tribunais ou o Ministério Público Federal (MPF) e até mesmo pelo fato de que, agora, quase semanalmente vemos operações contra integrantes do núcleo de apoio ao ex-presidente. Isso, de nenhuma maneira, significa que não é preciso investigar os episódios que terminaram em uma tentativa de golpe no dia 8, o ponto central da operação desta quinta. Trata-se da operação com o maior volume de provas até agora de todas as que envolvem Bolsonaro e seus aliados. Mas é fato que quanto mais o ex-presidente é contraposto ao STF e, em especial, ao ministro Alexandre de Moraes, relator dessa e de quase todas as investigações que esbarram em seus aliados mesmo que em alguns passos figure ele também como vítima, mais se reforça a tese que ele quer espalhar em seus discursos.

Opinião por Ricardo Corrêa

Coordenador de política em São Paulo no Estadão e comentarista na rádio Eldorado. Escreve às quintas

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.