Nas últimas quatro legislaturas, a Câmara Municipal de São Paulo aprovou três projetos que aumentaram o salário dos próprios vereadores. A remuneração era de R$ 15.031,76 no início de 2013 e passará a R$ 26.080,98 em fevereiro do próximo ano. Especialista em transparência de contas públicas consultada pelo Estadão afirma que o último aumento, correspondente a 37%, pode liderar uma tendência em Casas Legislativas de portes semelhantes à da capital paulista.
Os aumentos nos últimos 14 anos ocorreram por meio de projetos de resolução, que regulamentam temas de competência privativa da Câmara, seja de caráter político, processual, legislativo ou administrativo. Esse tipo de texto não precisa passar por sanção do prefeito e, quando aprovado e promulgado, passa a ter eficácia de lei ordinária.
Em 2011, os vereadores aprovaram um reajuste de 22,67% sobre o antigo vencimento, o que determinou que os parlamentares da 16ª Legislatura (a seguinte) passassem a receber, mensalmente a partir de 2013, R$ 15.031,76. O valor anterior, de R$ 12.253,81, havia sido fixado em 2007.
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No último mês de 2016, foi promulgado um reajuste de 26,34%, o que elevou os salários dos vereadores da legislatura iniciada no ano seguinte, em 2017, para R$ 18.991,68. Na justificativa da proposta, os parlamentares ressaltaram que o porcentual foi “inferior à variação dos índices inflacionários no período” buscando “apenas recompor o valor corroído pela inflação”.
No final de 2020, durante a pandemia de covid-19, a mesma disposição foi prorrogada e o salário mantido na legislatura seguinte. Em abril daquele ano, os vereadores reduziram os próprios vencimentos em 30%, mesmo porcentual dos integrantes de gabinetes, e 20% dos demais servidores – cargos comissionados não foram alterados. A regra valeu enquanto durou a situação de calamidade pública causada pelo coronavírus.
O valor atual, de quase R$ 19 mil, ultrapassa a melhor remuneração do Brasil de profissionais com ensino superior em 2023, segundo um levantamento elaborado pela pesquisadora Janaína Feijó, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV). Como mostrou o Estadão, os médicos especialistas foram os profissionais do setor privado com melhores salários, com rendimento médio real de R$ 18.475.
Desde 2017, os salários seguiam sem alteração, o que vai mudar a partir de janeiro de 2025, quando os políticos passarão a receber R$ 24.754,79 em janeiro e, um mês depois, R$ 26.080,98. O novo valor foi fixado por meio da aprovação, nesta terça-feira, 12, da proposta da Mesa Diretora da Casa, encabeçada pelo vereador em fim de mandato Milton Leite (União Brasil).
O aumento em quase nove anos de 37% sobre o salário anterior é maior do que a média de todas as categorias do funcionalismo brasileiro, incluindo União, Estados e municípios, que registraram alta de 13,8% em média, entre 2012 e 2022, conforme mostrou o Estadão. No período, quem teve o maior aumento médio de salário entre os servidores do governo federal foram os militares das Forças Armadas, com 29,6%.
Marina Atoji, diretora de programas da Transparência Brasil, afirma que o Legislativo municipal paulistano, em comparação com Casas semelhantes de outras capitais, proporcionou o próprio reajuste “bastante acima” dos salários dos pares. “No Rio de Janeiro e em Belo Horizonte, o valor ainda está nos pouco mais de R$ 18 mil. São Paulo pode acabar liderando uma tendência de aumento desproporcional de salários nas Câmaras”, afirmou a especialista.
“Definitivamente não é um aumento proporcional ao restante da população, cujos salários são corrigidos, quando muito, pela inflação. Mesmo que o peso da responsabilidade do cargo público seja grande, não se justifica tamanha disparidade em relação à maioria das pessoas que os vereadores representam”, disse Marina, que afirma que o exemplo vem do Congresso, que “também é “generoso ao se conceder reajustes”.
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Enquanto um trabalhador com renda de um salário mínimo, atualmente, recebe R$ 47 por dia (considerando todo o mês), um vereador de São Paulo recebe R$ 633, ou seja, 13 vezes mais. Com o aumento que passará a valer a partir do próximo ano, o valor, por dia, será de R$ 869.
Na justificativa da proposta, a Mesa Diretora usou a Constituição Federal sob argumento de que o vencimento dos vereadores pode ser, no máximo, 75% do salário dos deputados estaduais.
“A fixação pelo valor máximo permitido justifica-se diante do gigantismo de São Paulo, a maior cidade do Brasil, cujos problemas sociais, econômicos, políticos e culturais exigem dos vereadores envolvimento e dedicação proporcionais à responsabilidade do mandato que exercem”, diz trecho da justificativa.