O debate político nas redes é um misto de histeria e opiniões passionais. Não há muito espaço para a ponderação, nem para posições que sejam menos explícitas e tentem ser mais diplomáticas. Nesse contexto, a tradição da diplomacia brasileira fica defasada e, diante de opiniões que evitam para não apontar o dedo a um culpado, a opinião pública trata de posicionar os seus adversários.
Isso tem ocorrido diante dos desdobramentos do ataque terrorista do Hamas e da reação israelense em Gaza. A direita se posicionou muito rapidamente ao lado de Israel, buscando inclusive argumentos bíblicos para justificar de que lado está. É algo vai muito além de condenar as atrocidades cometidas pelo Hamas. É apontar que a esquerda apoia a causa árabe, que não se importa com os princípios religiosos, que está contra o ocidente e que tem sido complacente com atos de terror. Esse é o teor do embate político que vem sendo travado no Brasil acerca do episódio.
O governo demorou para entender que a onda conservadora virou um tsunami nas redes sociais, o que converteu a hesitação oficial em desgaste de imagem. Apesar de o presidente da República ter classificado os ataques a Israel como atos “terroristas”, o fato dele não ter citado o nome do Hamas se tornou um grande alvo de ataques dos seus adversários, que criticaram Lula, compartilhando compulsivamente imagens do terror vivido pelos israelenses. Posteriormente, o Itamaraty acabou fornecendo mais munição contra o governo, ao dizer que a classificação do Hamas como terrorista cabe à ONU e não ao país.
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O resultado foi uma queda da avaliação positiva do governo e uma alta da avaliação negativa. Dados da AP Exata Inteligência Digital, que mostram a aprovação do governo em tempo real, revelam que, desde o início do conflito, os que classificam o governo como bom/ótimo reduziram 0,6%, os que veem a gestão com regular caíram 0,1% e os que avaliam como ruim/péssimo cresceram 0,7%. Percentuais preocupantes, por indicarem uma tendência.
Os números mostram que 40,8% aprovam o governo, 33,9% reprovam e 25,3% o veem como regular. A análise é feita por meio de inteligência artificial, com base na média das pesquisas e nos sentimentos expressados pelos internautas.
A AP Exata analisou ainda 78 mil tuítes que mencionaram os termos “Lula” e “Hamas”, entre os dias 7 e 12 de outubro, e observou as emoções presentes nos posts. O medo está em 18,7% das publicações, a raiva em 14,7% e a tristeza em 10,9%. A confiança está em quarto lugar, aparecendo em apenas 10,7% das postagens.
Nos últimos dias, o governo tem tentado relativizar suas posições e busca se desvencilhar da armadilha criada pela ideia de que a esquerda é contra Israel. As declarações estão se tornando menos neutras e tendem a um alinhamento mais claro com o ocidente. Mas ainda é cedo para saber se isso irá atenuar o desgaste. Até porque as consequências dessa guerra são imprevisíveis. Se o conflito se alastrar pelo mundo árabe, haverá reflexos sobre o preço do petróleo, ocasionando mais inflação. Por isso provavelmente o governo foi ponderado inicialmente. No entanto, a forte pressão interna não deu margem para manobras retóricas.
Mas, como além de histéricas a passionais as redes são profundamente voláteis, correções de rumo são bem aceitas e o discurso pode ir se adaptando aos acontecimentos. Essa é a nova dinâmica da política, que se molda ao ritmo frenético da era digital. É essa a lição que o governo parece estar aprendendo com esse fatídico episódio mundial.