O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), oficializou nesta sexta-feira, 21, o ex-comandante das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) e coronel da reserva da Polícia Militar (PM) Ricardo de Mello Araújo como candidato a vice na chapa do atual prefeito da capital paulista, Ricardo Nunes (MDB), que tentará a reeleição em outubro. O policial militar é uma indicação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O anúncio foi feito pelo governador em uma agenda conjunta com o prefeito.
Bolsonarista, Mello Araújo ecoa o discurso do ex-presidente com ataques ao Judiciário e defesa da pauta conservadora de costumes. Ele foi diretor da Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp) durante o governo Bolsonaro.
“É uma coisa super difícil você conseguir em um número de agremiações tão grande, com visões diferentes, e a gente convergiu para o nome do Mello Araújo. Vai ser um representante nosso como pré-candidato a vice-prefeito. É um nome que agrega muita qualidade, tem uma trajetória ilibada na Polícia Militar e foi testado como gestor no Ceagesp”, disse o governador após a assinatura de aditivo do contrato para expansão da Linha 5-Lilás do metrô até o Jardim Ângela.
Nunes também participou da entrevista coletiva, mas deixou para Tarcísio confirmar o vice. Segundo o prefeito, os 12 partidos da coligação decidiram que caberia ao chefe do Executivo paulista anunciar quem seria seu companheiro de chapa.
“A minha decisão foi de ter uma decisão conjunta, onde pudesse ter a participação das principais lideranças, do ex-presidente Bolsonaro, do governador Tarcísio e dos 12 partidos que compõem nossa frente ampla como a gente viu acontecer entre outras situações”, disse o emedebista, em referência a Guilherme Boulos (PSOL), cuja vice, Marta Suplicy (PT), foi fruto de articulação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A ideia da campanha de Nunes é explorar a gestão feita pelo coronel no Ceagesp e apresentá-lo como alguém técnico, e não político, participando inclusive da formulação do plano de governo na área de segurança pública. O tema é de responsabilidade do governo estadual, mas tem aparecido entre as prioridades do eleitor paulistano nas pesquisas eleitorais mais recentes.
A entrada de Mello Araújo na chapa explicita a aliança entre Nunes e Bolsonaro, algo que o prefeito vinha evitando por conta da alta rejeição do ex-presidente em São Paulo. Mas pessoas com trânsito na campanha do prefeito consideram que a nacionalização já ocorreria de qualquer forma.
Também afirmam que Guilherme Boulos (PSOL), que tem apoio do presidente Lula (PT), pode cair em uma armadilha se decidir abordar a segurança pública porque parte da população é crítica à sua trajetória como coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST).
Questionado se o radicalismo de Mello Araújo poderia atrapalhá-lo nas periferias, Nunes rebateu: “Se for para ser radical contra quem faz exploração sexual infantil, contra o crime organizado, é o cara que eu quero. É esse radicalismo que eu quero”, disse o prefeito.
Aliados: coronel não foi testado nas urnas e histórico na Rota pode dificultar campanha
Embora Nunes e Tarcísio afirmem que os presidentes nacionais das siglas não apresentaram objeções a Mello Araújo, ainda há integrantes que colocam em dúvida se o coronel era o melhor nome para a posição de vice. Milton Leite (União), presidente da Câmara Municipal que participou do anúncio, afirmou que o histórico na Rota pode ser um problema para a campanha entrar em algumas regiões da cidade.
“Espero que ele consiga demonstrar, daqui até a eleição, que tenha a contribuir com votos. Ele não foi testado nas urnas. Cabe a ele agora fazer um grande trabalho e demonstrar que é merecedor desse cargo de vice”, disse Leite, que também postulava a posição.
O deputado estadual Delegado Olim (PP) expressou sua insatisfação ao Estadão. “Vamos levando. É torcer para a gente não perder por causa desse cara [Mello Araújo]. E vamos trabalhar para tentar eleger nosso amigo Ricardo Nunes. Esse cara não traz voto nenhum. Ao contrário: está trazendo discórdia”, afirmou o deputado estadual Delegado Olim (PP).
O próprio Tarcísio e o entorno Nunes preferiam outros nomes como vice pois consideravam que Mello Araújo deslocaria a chapa para a extrema-direita e prejudicaria a tentativa de conseguir votos em eleitores de centro, o que pode dificultar a vida do prefeito em um eventual segundo turno.
Leia também
Com Bolsonaro irredutível, pesou a entrada de Pablo Marçal (PRTB) na disputa eleitoral. O apelo do coach entre eleitores bolsonaristas aumentou a pressão para que Nunes selasse o apoio do ex-presidente rapidamente. Até então, o emedebista pretendia definir o vice somente nas semanas anteriores às convenções partidárias, previstas para acontecer entre 20 de julho e 5 de agosto.
Ao longo das últimas semanas, partidos aliados de Nunes foram contra à indicação feita por Bolsonaro. União Brasil, Solidariedade e uma ala do PP criticaram publicamente o coronel. Após Nunes receber na sede da Prefeitura de São Paulo Mello Araújo, o ex-presidente e o governador para um almoço na última sexta-feira, Tarcísio assumiu a tarefa de convencer as siglas a aceitarem o indicado do ex-presidente.
O governador organizou jantar no Palácio dos Bandeirantes na quarta-feira onde presidentes nacionais e representantes dos 12 partidos da coligação concordaram que o PL indicaria o vice e, segundo relatado por ele, não fizeram ressalvas a Mello Araújo. O último a ceder foi o União Brasil, que participou virtualmente da reunião.
Mesmo com as insatisfações já registradas, não há sinal neste momento que os partidos possam romper com Nunes por causa da indicação do vice.
Decisão do União é apoiar Nunes, diz Milton; Kim Kataguiri resiste
Milton Leite voltou a afirmar que o União Brasil apoiará Ricardo Nunes em vez de lançar o deputado federal Kim Kataguiri como candidato a prefeito. “Se o Kim em algum momento quiser levar para convenção, é um direito dele”, disse.
A assessoria de imprensa de Kataguiri disse que Leite tenta levar o partido para apoiar o prefeito, enquanto a direção nacional quer a candidatura própria. “Seguimos de pé”, diz o texto enviado ao Estadão.
A bancada do PL no Legislativo paulistano anunciou nesta sexta-feira que apoiará o União Brasil na eleição para a Mesa Diretora em 2025. Embora afirme que não concorrerá para vereador novamente, Leite quer eleger um aliado para comandar a Casa no ano que vem, caso realmente não vá às urnas.
O apoio do PL faz parte do acordo para o partido de Milton Leite aceitar a indicação de Mello Araújo. Parlamentares também afirmam que o acordo envolve o apoio do PL e do MDB para que Elmar Nascimento (União-BA) suceda Arthur Lira (PP-AL) na presidência da Câmara dos Deputados, em Brasília.
Milton Leite negou as duas condições na entrevista. Oficialmente, o prefeito também nega que a eleição da Câmara dos Deputados tenha sido discutida.
Especialista diz que rivais vão explorar ligação de Nunes com Bolsonaro
Cláudio Couto, cientista político da Fundação Getúlio Vargas (FGV), avalia que ao aceitar a indicação de Bolsonaro como vice, Nunes assegura seu vínculo com o ex-presidente, o que é importante para impedir a migração de eleitores bolsonaristas para Marçal.
Ao mesmo tempo, a escolha pode incomodar eleitores de centro que são antibolsonaristas. “Eu acho que os efeitos da indicação do Mello Araújo podem ser ambivalentes”, diz Couto. “A segurança pública é uma das principais preocupações dos paulistanos hoje. Ter alguém da área na chapa, um policial, sinaliza para o eleitorado que haverá gente no governo com essa preocupação”, acrescenta.
O especialista projeta que tanto Boulos, que conforme as pesquisas disputa a liderança da corrida eleitoral com Nunes, quanto Tabata Amaral (PSB), explorarão a ligação entre Nunes e Bolsonaro. “Os dois, certamente, dirão que ele é o candidato que defende posições bolsonaristas, autoritárias e violentas. Esse tipo de coisa”, conclui Cláudio Couto.
Minutos após a confirmação de Mello Araújo, Tabata criticou a escolha. “Se o prefeito Ricardo Nunes resistiu ao nome do Ricardo Mello Araújo, é porque não o queria como seu vice. Se foi forçado a aceitá-lo é porque quem manda na sua candidatura é o Bolsonaro. Assim ele escancara sua fraqueza e deixa São Paulo de joelhos para outros interesses, não os da cidade”, declarou.