Taxação de apostas esportivas por governo Lula acelera lobby pela legalização dos jogos de azar


Presidente da Câmara tenta assumir liderança no debate sobre o tema e ameaça com instalação de CPI

Por Daniel Weterman
Atualização:

BRASÍLIA - A decisão do governo Lula de taxar as apostas esportivas abriu caminho para a legalização dos jogos de azar no País. A proposta de taxação, preparada pelo Ministério da Fazenda, desencadeou uma disputa entre grupos políticos e reativou o lobby pelos jogos, cassinos e bingos. Enquanto o governo age para aumentar a arrecadação, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ameaça instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para dominar o debate. Já os empresários do setor tentam aproveitar o momento para liberar todas as modalidades de jogatina.

O Palácio do Planalto decidiu assinar uma medida provisória para regulamentar as apostas esportivas. A atividade está legalizada desde 2018, mas até agora funciona em um mercado cinzento cercado de ilegalidades e concentração de recursos em paraísos fiscais. A intenção da equipe econômica é cobrar impostos sobre as operações no Brasil e aumentar a arrecadação federal.

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, ameaça instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar as apostas Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados
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O debate, no entanto, não para por aí. Quem é a favor dos jogos de azar aproveitou para pressionar pela legalização de jogos eletrônicos, cassinos e bingos. Os sites de apostas esportivas oferecem também cassinos online e ganham cada vez mais adeptos. Defensores dizem que o Brasil perde arrecadação de uma atividade que, mesmo ilegal, já funciona a pleno vapor. Essas atividades, porém, estão associadas à lavagem de dinheiro, à manipulação de resultados e ao vício causado pela jogatina. Diante da discussão de regulamentar, o governo não aumentou a estrutura de fiscalização das apostas e de outros jogos.

Propina

Foi justamente o jogo que ameaçou o primeiro mandato de Lula, em 2004. Naquele ano, veio à tona o primeiro caso de corrupção envolvendo um integrante do governo petista. Waldomiro Diniz, subchefe de Assuntos Parlamentares, homem de confiança do então ministro da Casa Civil José Dirceu, foi gravado pedindo propina ao bicheiro Carlos Cachoeira. Com o escândalo, Lula correu para assinar uma medida provisória proibindo a exploração de bingos e de máquinas caça-nível.

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Agora, no terceiro mandato, o presidente entra de novo na discussão, desta vez dando o pontapé para a regulamentação das apostas esportivas e ressuscitando um lobby mais forte pela legalização dos jogos de azar. A medida provisória sobre o tema está pronta há pelo menos três semanas, mas ainda não foi publicada porque começou a receber críticas do Congresso, dos apostadores e dos grandes clubes de futebol.

O ex-secretario da Casa Civil Waldomiro Diniz presta depoimento à CPI dos Bingos, em agosto de 2005. Foto: Joedson Alves/AE 11/08/2005

O movimento da taxação dos jogos mexe com um mercado que já representa a terceira maior fonte de patrocínio dos clubes do futebol brasileiro, atrás apenas dos bancos e da construção civil. Os sites de apostas esportivas já lideram o patrocínio master dos times da Série A do Campeonato Brasileiro, ocupando o lugar mais nobre de propaganda no uniforme dos jogadores. O setor calcula que os brasileiros compõem hoje o segundo maior público de apostadores esportivos no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos.

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Crime

Não há dados oficiais sobre quanto o segmento movimenta no Brasil. Projeções variam de R$ 10 bilhões a R$ 100 bilhões em um único ano, de acordo com agentes das apostas. O avanço veio acompanhado do crime. O Ministério Público começou a investigar uma série de manipulações de resultados. Em alguns casos, jogadores foram acusados de receber mais de R$ 100 mil para cometer uma falta durante uma partida. Em outro episódio recente, um atleta do Grêmio apostou em uma partida do próprio time.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, calcula que a medida irá gerar até R$ 15 bilhões de arrecadação por ano para os cofres públicos. O governo promete cobrar R$ 30 milhões de cada empresa que queira operar apostas esportivas no Brasil por uma licença de cinco anos, além de cobrar 15% em impostos sobre o lucro das plataformas. O apostador, por sua vez, terá de pagar 30% de tributos sobre os prêmios que ganhar, mesmo podendo perder esse valor numa aposta seguinte.

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Há temor de que essas cobranças façam com que empresários e apostadores continuem trabalhando e jogando na ilegalidade, movimentando dinheiro no exterior. Na mesma medida, o governo decidiu resgatar a Lotex (Loteria Instantânea Exclusiva), conhecida como raspadinha, que está fora de operação há cinco anos e será vendida exclusivamente por pessoas com deficiência, de acordo com o Ministério da Fazenda.

O lobby do setor ficou explícito durante uma audiência pública na Câmara, na última quarta-feira, 12. O Ministério da Fazenda e empresários foram chamados para discutir a taxação das apostas. Todos concordaram em regulamentar a atividade, mas houve disputa sobre o alcance da taxação, o tratamento entre grandes e pequenas empresas e apostadores e quem será o grande negociador dessa proposta no poder público.

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O presidente da Câmara age para liderar a discussão e aumentar o poder de barganha nas negociações. Arthur Lira é adepto dos jogos. No carnaval deste ano, fugiu da folia tradicional das cidades brasileiras e foi a Las Vegas, o maior centro de apostas do mundo. Aliados do deputado pressionam o governo a desistir da medida provisória e defendem que a taxação seja definida por meio de um projeto de lei para a Câmara, o que entrega o poder de negociação para o presidente da Casa.

Outra ameaça dos deputados é mudar a proposta do governo e aumentar a taxação, colocando os impostos sobre o lucro bruto das empresas, e não sobre o lucro líquido, o que na prática aumenta as resistências dessas empresas e força um lobby maior durante a aprovação. Por isso, empresários do setor temem ficar reféns de Lira e do Centrão na hora de discutir a regulamentação. “Pelo modelo que eles querem fazer, a medida provisória é inconstitucional”, afirmou o deputado Wellington Roberto (PL-PB), um dos principais líderes do bloco e aliado de Lira. Ao Estadão, o parlamentar disse ter feito a crítica diretamente ao assessor especial da Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda, José Francisco Manssur, que participa da elaboração da medida provisória.

CPI

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Além da pressão para controlar o projeto da taxação, Lira deu aval para a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito. A CPI tem por objetivo investigar a manipulação de jogos no futebol por meio das apostas online. O alvo são as empresas e os apostadores. “A CPI é a menina dos olhos do Arthur”, disse o líder do PSB na Câmara, Felipe Carreras (PE). Ele foi escalado pelo presidente da Casa para coletar as assinaturas da CPI e relatar a proposta de regulamentação do setor. “Para quem é apaixonado por futebol, é urgente que o parlamento e as autoridades públicas se debrucem sobre isso.”

Há ainda um terceiro grupo atuando: os empresários que ganham dinheiro com as apostas. O setor age para reduzir danos na taxação, evitar uma cobrança de imposto que considera excessiva e ainda quer aproveitar a proposta para retomar a pauta da legalização de todos os jogos de azar no Brasil, incluindo cassinos e bingos, tema de outro projeto de lei. O lobby para acomodar esses interesses está a todo vapor em Brasília, com reuniões no Palácio do Planalto, no Ministério da Fazenda e no Congresso, principalmente na Câmara.

Empresas estrangeiras como Pixbet, Betsson e Bet365 patrocinam hoje grandes clubes brasileiros e, de acordo com representantes do setor, concentram recursos em paraísos fiscais. Recentemente, companhias estrangeiras abriram diferentes associações no Brasil para fazer lobby pela regulamentação. “Nós achamos que tem que regular antes de proibir. A proibição leva ao jogo clandestino e o jogo clandestino leva à corrupção”, afirmou Wesley Cardia, CEO da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL).

No ano passado, a Câmara aprovou um projeto que legaliza os jogos de azar, abrindo o País para os bingos, os cassinos e o jogo do bicho operarem de forma aberta. O projeto está agora no Senado e deve ser ressuscitado. Defensores dizem que o Brasil perde arrecadação de uma atividade que, mesmo ilegal, já funciona amplamente. “Todas as modalidades de jogos devem ser legalizadas, todas, todas, porque não há opção na sociedade para o não jogo”, afirmou o deputado João Carlos Bacelar Batista (PV-BA).

Procurado para comentar a disputa política sobre a taxação, Arthur Lira ainda não respondeu.

BRASÍLIA - A decisão do governo Lula de taxar as apostas esportivas abriu caminho para a legalização dos jogos de azar no País. A proposta de taxação, preparada pelo Ministério da Fazenda, desencadeou uma disputa entre grupos políticos e reativou o lobby pelos jogos, cassinos e bingos. Enquanto o governo age para aumentar a arrecadação, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ameaça instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para dominar o debate. Já os empresários do setor tentam aproveitar o momento para liberar todas as modalidades de jogatina.

O Palácio do Planalto decidiu assinar uma medida provisória para regulamentar as apostas esportivas. A atividade está legalizada desde 2018, mas até agora funciona em um mercado cinzento cercado de ilegalidades e concentração de recursos em paraísos fiscais. A intenção da equipe econômica é cobrar impostos sobre as operações no Brasil e aumentar a arrecadação federal.

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, ameaça instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar as apostas Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

O debate, no entanto, não para por aí. Quem é a favor dos jogos de azar aproveitou para pressionar pela legalização de jogos eletrônicos, cassinos e bingos. Os sites de apostas esportivas oferecem também cassinos online e ganham cada vez mais adeptos. Defensores dizem que o Brasil perde arrecadação de uma atividade que, mesmo ilegal, já funciona a pleno vapor. Essas atividades, porém, estão associadas à lavagem de dinheiro, à manipulação de resultados e ao vício causado pela jogatina. Diante da discussão de regulamentar, o governo não aumentou a estrutura de fiscalização das apostas e de outros jogos.

Propina

Foi justamente o jogo que ameaçou o primeiro mandato de Lula, em 2004. Naquele ano, veio à tona o primeiro caso de corrupção envolvendo um integrante do governo petista. Waldomiro Diniz, subchefe de Assuntos Parlamentares, homem de confiança do então ministro da Casa Civil José Dirceu, foi gravado pedindo propina ao bicheiro Carlos Cachoeira. Com o escândalo, Lula correu para assinar uma medida provisória proibindo a exploração de bingos e de máquinas caça-nível.

Agora, no terceiro mandato, o presidente entra de novo na discussão, desta vez dando o pontapé para a regulamentação das apostas esportivas e ressuscitando um lobby mais forte pela legalização dos jogos de azar. A medida provisória sobre o tema está pronta há pelo menos três semanas, mas ainda não foi publicada porque começou a receber críticas do Congresso, dos apostadores e dos grandes clubes de futebol.

O ex-secretario da Casa Civil Waldomiro Diniz presta depoimento à CPI dos Bingos, em agosto de 2005. Foto: Joedson Alves/AE 11/08/2005

O movimento da taxação dos jogos mexe com um mercado que já representa a terceira maior fonte de patrocínio dos clubes do futebol brasileiro, atrás apenas dos bancos e da construção civil. Os sites de apostas esportivas já lideram o patrocínio master dos times da Série A do Campeonato Brasileiro, ocupando o lugar mais nobre de propaganda no uniforme dos jogadores. O setor calcula que os brasileiros compõem hoje o segundo maior público de apostadores esportivos no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos.

Crime

Não há dados oficiais sobre quanto o segmento movimenta no Brasil. Projeções variam de R$ 10 bilhões a R$ 100 bilhões em um único ano, de acordo com agentes das apostas. O avanço veio acompanhado do crime. O Ministério Público começou a investigar uma série de manipulações de resultados. Em alguns casos, jogadores foram acusados de receber mais de R$ 100 mil para cometer uma falta durante uma partida. Em outro episódio recente, um atleta do Grêmio apostou em uma partida do próprio time.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, calcula que a medida irá gerar até R$ 15 bilhões de arrecadação por ano para os cofres públicos. O governo promete cobrar R$ 30 milhões de cada empresa que queira operar apostas esportivas no Brasil por uma licença de cinco anos, além de cobrar 15% em impostos sobre o lucro das plataformas. O apostador, por sua vez, terá de pagar 30% de tributos sobre os prêmios que ganhar, mesmo podendo perder esse valor numa aposta seguinte.

Há temor de que essas cobranças façam com que empresários e apostadores continuem trabalhando e jogando na ilegalidade, movimentando dinheiro no exterior. Na mesma medida, o governo decidiu resgatar a Lotex (Loteria Instantânea Exclusiva), conhecida como raspadinha, que está fora de operação há cinco anos e será vendida exclusivamente por pessoas com deficiência, de acordo com o Ministério da Fazenda.

O lobby do setor ficou explícito durante uma audiência pública na Câmara, na última quarta-feira, 12. O Ministério da Fazenda e empresários foram chamados para discutir a taxação das apostas. Todos concordaram em regulamentar a atividade, mas houve disputa sobre o alcance da taxação, o tratamento entre grandes e pequenas empresas e apostadores e quem será o grande negociador dessa proposta no poder público.

O presidente da Câmara age para liderar a discussão e aumentar o poder de barganha nas negociações. Arthur Lira é adepto dos jogos. No carnaval deste ano, fugiu da folia tradicional das cidades brasileiras e foi a Las Vegas, o maior centro de apostas do mundo. Aliados do deputado pressionam o governo a desistir da medida provisória e defendem que a taxação seja definida por meio de um projeto de lei para a Câmara, o que entrega o poder de negociação para o presidente da Casa.

Outra ameaça dos deputados é mudar a proposta do governo e aumentar a taxação, colocando os impostos sobre o lucro bruto das empresas, e não sobre o lucro líquido, o que na prática aumenta as resistências dessas empresas e força um lobby maior durante a aprovação. Por isso, empresários do setor temem ficar reféns de Lira e do Centrão na hora de discutir a regulamentação. “Pelo modelo que eles querem fazer, a medida provisória é inconstitucional”, afirmou o deputado Wellington Roberto (PL-PB), um dos principais líderes do bloco e aliado de Lira. Ao Estadão, o parlamentar disse ter feito a crítica diretamente ao assessor especial da Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda, José Francisco Manssur, que participa da elaboração da medida provisória.

CPI

Além da pressão para controlar o projeto da taxação, Lira deu aval para a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito. A CPI tem por objetivo investigar a manipulação de jogos no futebol por meio das apostas online. O alvo são as empresas e os apostadores. “A CPI é a menina dos olhos do Arthur”, disse o líder do PSB na Câmara, Felipe Carreras (PE). Ele foi escalado pelo presidente da Casa para coletar as assinaturas da CPI e relatar a proposta de regulamentação do setor. “Para quem é apaixonado por futebol, é urgente que o parlamento e as autoridades públicas se debrucem sobre isso.”

Há ainda um terceiro grupo atuando: os empresários que ganham dinheiro com as apostas. O setor age para reduzir danos na taxação, evitar uma cobrança de imposto que considera excessiva e ainda quer aproveitar a proposta para retomar a pauta da legalização de todos os jogos de azar no Brasil, incluindo cassinos e bingos, tema de outro projeto de lei. O lobby para acomodar esses interesses está a todo vapor em Brasília, com reuniões no Palácio do Planalto, no Ministério da Fazenda e no Congresso, principalmente na Câmara.

Empresas estrangeiras como Pixbet, Betsson e Bet365 patrocinam hoje grandes clubes brasileiros e, de acordo com representantes do setor, concentram recursos em paraísos fiscais. Recentemente, companhias estrangeiras abriram diferentes associações no Brasil para fazer lobby pela regulamentação. “Nós achamos que tem que regular antes de proibir. A proibição leva ao jogo clandestino e o jogo clandestino leva à corrupção”, afirmou Wesley Cardia, CEO da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL).

No ano passado, a Câmara aprovou um projeto que legaliza os jogos de azar, abrindo o País para os bingos, os cassinos e o jogo do bicho operarem de forma aberta. O projeto está agora no Senado e deve ser ressuscitado. Defensores dizem que o Brasil perde arrecadação de uma atividade que, mesmo ilegal, já funciona amplamente. “Todas as modalidades de jogos devem ser legalizadas, todas, todas, porque não há opção na sociedade para o não jogo”, afirmou o deputado João Carlos Bacelar Batista (PV-BA).

Procurado para comentar a disputa política sobre a taxação, Arthur Lira ainda não respondeu.

BRASÍLIA - A decisão do governo Lula de taxar as apostas esportivas abriu caminho para a legalização dos jogos de azar no País. A proposta de taxação, preparada pelo Ministério da Fazenda, desencadeou uma disputa entre grupos políticos e reativou o lobby pelos jogos, cassinos e bingos. Enquanto o governo age para aumentar a arrecadação, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ameaça instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para dominar o debate. Já os empresários do setor tentam aproveitar o momento para liberar todas as modalidades de jogatina.

O Palácio do Planalto decidiu assinar uma medida provisória para regulamentar as apostas esportivas. A atividade está legalizada desde 2018, mas até agora funciona em um mercado cinzento cercado de ilegalidades e concentração de recursos em paraísos fiscais. A intenção da equipe econômica é cobrar impostos sobre as operações no Brasil e aumentar a arrecadação federal.

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, ameaça instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar as apostas Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

O debate, no entanto, não para por aí. Quem é a favor dos jogos de azar aproveitou para pressionar pela legalização de jogos eletrônicos, cassinos e bingos. Os sites de apostas esportivas oferecem também cassinos online e ganham cada vez mais adeptos. Defensores dizem que o Brasil perde arrecadação de uma atividade que, mesmo ilegal, já funciona a pleno vapor. Essas atividades, porém, estão associadas à lavagem de dinheiro, à manipulação de resultados e ao vício causado pela jogatina. Diante da discussão de regulamentar, o governo não aumentou a estrutura de fiscalização das apostas e de outros jogos.

Propina

Foi justamente o jogo que ameaçou o primeiro mandato de Lula, em 2004. Naquele ano, veio à tona o primeiro caso de corrupção envolvendo um integrante do governo petista. Waldomiro Diniz, subchefe de Assuntos Parlamentares, homem de confiança do então ministro da Casa Civil José Dirceu, foi gravado pedindo propina ao bicheiro Carlos Cachoeira. Com o escândalo, Lula correu para assinar uma medida provisória proibindo a exploração de bingos e de máquinas caça-nível.

Agora, no terceiro mandato, o presidente entra de novo na discussão, desta vez dando o pontapé para a regulamentação das apostas esportivas e ressuscitando um lobby mais forte pela legalização dos jogos de azar. A medida provisória sobre o tema está pronta há pelo menos três semanas, mas ainda não foi publicada porque começou a receber críticas do Congresso, dos apostadores e dos grandes clubes de futebol.

O ex-secretario da Casa Civil Waldomiro Diniz presta depoimento à CPI dos Bingos, em agosto de 2005. Foto: Joedson Alves/AE 11/08/2005

O movimento da taxação dos jogos mexe com um mercado que já representa a terceira maior fonte de patrocínio dos clubes do futebol brasileiro, atrás apenas dos bancos e da construção civil. Os sites de apostas esportivas já lideram o patrocínio master dos times da Série A do Campeonato Brasileiro, ocupando o lugar mais nobre de propaganda no uniforme dos jogadores. O setor calcula que os brasileiros compõem hoje o segundo maior público de apostadores esportivos no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos.

Crime

Não há dados oficiais sobre quanto o segmento movimenta no Brasil. Projeções variam de R$ 10 bilhões a R$ 100 bilhões em um único ano, de acordo com agentes das apostas. O avanço veio acompanhado do crime. O Ministério Público começou a investigar uma série de manipulações de resultados. Em alguns casos, jogadores foram acusados de receber mais de R$ 100 mil para cometer uma falta durante uma partida. Em outro episódio recente, um atleta do Grêmio apostou em uma partida do próprio time.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, calcula que a medida irá gerar até R$ 15 bilhões de arrecadação por ano para os cofres públicos. O governo promete cobrar R$ 30 milhões de cada empresa que queira operar apostas esportivas no Brasil por uma licença de cinco anos, além de cobrar 15% em impostos sobre o lucro das plataformas. O apostador, por sua vez, terá de pagar 30% de tributos sobre os prêmios que ganhar, mesmo podendo perder esse valor numa aposta seguinte.

Há temor de que essas cobranças façam com que empresários e apostadores continuem trabalhando e jogando na ilegalidade, movimentando dinheiro no exterior. Na mesma medida, o governo decidiu resgatar a Lotex (Loteria Instantânea Exclusiva), conhecida como raspadinha, que está fora de operação há cinco anos e será vendida exclusivamente por pessoas com deficiência, de acordo com o Ministério da Fazenda.

O lobby do setor ficou explícito durante uma audiência pública na Câmara, na última quarta-feira, 12. O Ministério da Fazenda e empresários foram chamados para discutir a taxação das apostas. Todos concordaram em regulamentar a atividade, mas houve disputa sobre o alcance da taxação, o tratamento entre grandes e pequenas empresas e apostadores e quem será o grande negociador dessa proposta no poder público.

O presidente da Câmara age para liderar a discussão e aumentar o poder de barganha nas negociações. Arthur Lira é adepto dos jogos. No carnaval deste ano, fugiu da folia tradicional das cidades brasileiras e foi a Las Vegas, o maior centro de apostas do mundo. Aliados do deputado pressionam o governo a desistir da medida provisória e defendem que a taxação seja definida por meio de um projeto de lei para a Câmara, o que entrega o poder de negociação para o presidente da Casa.

Outra ameaça dos deputados é mudar a proposta do governo e aumentar a taxação, colocando os impostos sobre o lucro bruto das empresas, e não sobre o lucro líquido, o que na prática aumenta as resistências dessas empresas e força um lobby maior durante a aprovação. Por isso, empresários do setor temem ficar reféns de Lira e do Centrão na hora de discutir a regulamentação. “Pelo modelo que eles querem fazer, a medida provisória é inconstitucional”, afirmou o deputado Wellington Roberto (PL-PB), um dos principais líderes do bloco e aliado de Lira. Ao Estadão, o parlamentar disse ter feito a crítica diretamente ao assessor especial da Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda, José Francisco Manssur, que participa da elaboração da medida provisória.

CPI

Além da pressão para controlar o projeto da taxação, Lira deu aval para a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito. A CPI tem por objetivo investigar a manipulação de jogos no futebol por meio das apostas online. O alvo são as empresas e os apostadores. “A CPI é a menina dos olhos do Arthur”, disse o líder do PSB na Câmara, Felipe Carreras (PE). Ele foi escalado pelo presidente da Casa para coletar as assinaturas da CPI e relatar a proposta de regulamentação do setor. “Para quem é apaixonado por futebol, é urgente que o parlamento e as autoridades públicas se debrucem sobre isso.”

Há ainda um terceiro grupo atuando: os empresários que ganham dinheiro com as apostas. O setor age para reduzir danos na taxação, evitar uma cobrança de imposto que considera excessiva e ainda quer aproveitar a proposta para retomar a pauta da legalização de todos os jogos de azar no Brasil, incluindo cassinos e bingos, tema de outro projeto de lei. O lobby para acomodar esses interesses está a todo vapor em Brasília, com reuniões no Palácio do Planalto, no Ministério da Fazenda e no Congresso, principalmente na Câmara.

Empresas estrangeiras como Pixbet, Betsson e Bet365 patrocinam hoje grandes clubes brasileiros e, de acordo com representantes do setor, concentram recursos em paraísos fiscais. Recentemente, companhias estrangeiras abriram diferentes associações no Brasil para fazer lobby pela regulamentação. “Nós achamos que tem que regular antes de proibir. A proibição leva ao jogo clandestino e o jogo clandestino leva à corrupção”, afirmou Wesley Cardia, CEO da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL).

No ano passado, a Câmara aprovou um projeto que legaliza os jogos de azar, abrindo o País para os bingos, os cassinos e o jogo do bicho operarem de forma aberta. O projeto está agora no Senado e deve ser ressuscitado. Defensores dizem que o Brasil perde arrecadação de uma atividade que, mesmo ilegal, já funciona amplamente. “Todas as modalidades de jogos devem ser legalizadas, todas, todas, porque não há opção na sociedade para o não jogo”, afirmou o deputado João Carlos Bacelar Batista (PV-BA).

Procurado para comentar a disputa política sobre a taxação, Arthur Lira ainda não respondeu.

BRASÍLIA - A decisão do governo Lula de taxar as apostas esportivas abriu caminho para a legalização dos jogos de azar no País. A proposta de taxação, preparada pelo Ministério da Fazenda, desencadeou uma disputa entre grupos políticos e reativou o lobby pelos jogos, cassinos e bingos. Enquanto o governo age para aumentar a arrecadação, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ameaça instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para dominar o debate. Já os empresários do setor tentam aproveitar o momento para liberar todas as modalidades de jogatina.

O Palácio do Planalto decidiu assinar uma medida provisória para regulamentar as apostas esportivas. A atividade está legalizada desde 2018, mas até agora funciona em um mercado cinzento cercado de ilegalidades e concentração de recursos em paraísos fiscais. A intenção da equipe econômica é cobrar impostos sobre as operações no Brasil e aumentar a arrecadação federal.

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, ameaça instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar as apostas Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

O debate, no entanto, não para por aí. Quem é a favor dos jogos de azar aproveitou para pressionar pela legalização de jogos eletrônicos, cassinos e bingos. Os sites de apostas esportivas oferecem também cassinos online e ganham cada vez mais adeptos. Defensores dizem que o Brasil perde arrecadação de uma atividade que, mesmo ilegal, já funciona a pleno vapor. Essas atividades, porém, estão associadas à lavagem de dinheiro, à manipulação de resultados e ao vício causado pela jogatina. Diante da discussão de regulamentar, o governo não aumentou a estrutura de fiscalização das apostas e de outros jogos.

Propina

Foi justamente o jogo que ameaçou o primeiro mandato de Lula, em 2004. Naquele ano, veio à tona o primeiro caso de corrupção envolvendo um integrante do governo petista. Waldomiro Diniz, subchefe de Assuntos Parlamentares, homem de confiança do então ministro da Casa Civil José Dirceu, foi gravado pedindo propina ao bicheiro Carlos Cachoeira. Com o escândalo, Lula correu para assinar uma medida provisória proibindo a exploração de bingos e de máquinas caça-nível.

Agora, no terceiro mandato, o presidente entra de novo na discussão, desta vez dando o pontapé para a regulamentação das apostas esportivas e ressuscitando um lobby mais forte pela legalização dos jogos de azar. A medida provisória sobre o tema está pronta há pelo menos três semanas, mas ainda não foi publicada porque começou a receber críticas do Congresso, dos apostadores e dos grandes clubes de futebol.

O ex-secretario da Casa Civil Waldomiro Diniz presta depoimento à CPI dos Bingos, em agosto de 2005. Foto: Joedson Alves/AE 11/08/2005

O movimento da taxação dos jogos mexe com um mercado que já representa a terceira maior fonte de patrocínio dos clubes do futebol brasileiro, atrás apenas dos bancos e da construção civil. Os sites de apostas esportivas já lideram o patrocínio master dos times da Série A do Campeonato Brasileiro, ocupando o lugar mais nobre de propaganda no uniforme dos jogadores. O setor calcula que os brasileiros compõem hoje o segundo maior público de apostadores esportivos no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos.

Crime

Não há dados oficiais sobre quanto o segmento movimenta no Brasil. Projeções variam de R$ 10 bilhões a R$ 100 bilhões em um único ano, de acordo com agentes das apostas. O avanço veio acompanhado do crime. O Ministério Público começou a investigar uma série de manipulações de resultados. Em alguns casos, jogadores foram acusados de receber mais de R$ 100 mil para cometer uma falta durante uma partida. Em outro episódio recente, um atleta do Grêmio apostou em uma partida do próprio time.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, calcula que a medida irá gerar até R$ 15 bilhões de arrecadação por ano para os cofres públicos. O governo promete cobrar R$ 30 milhões de cada empresa que queira operar apostas esportivas no Brasil por uma licença de cinco anos, além de cobrar 15% em impostos sobre o lucro das plataformas. O apostador, por sua vez, terá de pagar 30% de tributos sobre os prêmios que ganhar, mesmo podendo perder esse valor numa aposta seguinte.

Há temor de que essas cobranças façam com que empresários e apostadores continuem trabalhando e jogando na ilegalidade, movimentando dinheiro no exterior. Na mesma medida, o governo decidiu resgatar a Lotex (Loteria Instantânea Exclusiva), conhecida como raspadinha, que está fora de operação há cinco anos e será vendida exclusivamente por pessoas com deficiência, de acordo com o Ministério da Fazenda.

O lobby do setor ficou explícito durante uma audiência pública na Câmara, na última quarta-feira, 12. O Ministério da Fazenda e empresários foram chamados para discutir a taxação das apostas. Todos concordaram em regulamentar a atividade, mas houve disputa sobre o alcance da taxação, o tratamento entre grandes e pequenas empresas e apostadores e quem será o grande negociador dessa proposta no poder público.

O presidente da Câmara age para liderar a discussão e aumentar o poder de barganha nas negociações. Arthur Lira é adepto dos jogos. No carnaval deste ano, fugiu da folia tradicional das cidades brasileiras e foi a Las Vegas, o maior centro de apostas do mundo. Aliados do deputado pressionam o governo a desistir da medida provisória e defendem que a taxação seja definida por meio de um projeto de lei para a Câmara, o que entrega o poder de negociação para o presidente da Casa.

Outra ameaça dos deputados é mudar a proposta do governo e aumentar a taxação, colocando os impostos sobre o lucro bruto das empresas, e não sobre o lucro líquido, o que na prática aumenta as resistências dessas empresas e força um lobby maior durante a aprovação. Por isso, empresários do setor temem ficar reféns de Lira e do Centrão na hora de discutir a regulamentação. “Pelo modelo que eles querem fazer, a medida provisória é inconstitucional”, afirmou o deputado Wellington Roberto (PL-PB), um dos principais líderes do bloco e aliado de Lira. Ao Estadão, o parlamentar disse ter feito a crítica diretamente ao assessor especial da Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda, José Francisco Manssur, que participa da elaboração da medida provisória.

CPI

Além da pressão para controlar o projeto da taxação, Lira deu aval para a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito. A CPI tem por objetivo investigar a manipulação de jogos no futebol por meio das apostas online. O alvo são as empresas e os apostadores. “A CPI é a menina dos olhos do Arthur”, disse o líder do PSB na Câmara, Felipe Carreras (PE). Ele foi escalado pelo presidente da Casa para coletar as assinaturas da CPI e relatar a proposta de regulamentação do setor. “Para quem é apaixonado por futebol, é urgente que o parlamento e as autoridades públicas se debrucem sobre isso.”

Há ainda um terceiro grupo atuando: os empresários que ganham dinheiro com as apostas. O setor age para reduzir danos na taxação, evitar uma cobrança de imposto que considera excessiva e ainda quer aproveitar a proposta para retomar a pauta da legalização de todos os jogos de azar no Brasil, incluindo cassinos e bingos, tema de outro projeto de lei. O lobby para acomodar esses interesses está a todo vapor em Brasília, com reuniões no Palácio do Planalto, no Ministério da Fazenda e no Congresso, principalmente na Câmara.

Empresas estrangeiras como Pixbet, Betsson e Bet365 patrocinam hoje grandes clubes brasileiros e, de acordo com representantes do setor, concentram recursos em paraísos fiscais. Recentemente, companhias estrangeiras abriram diferentes associações no Brasil para fazer lobby pela regulamentação. “Nós achamos que tem que regular antes de proibir. A proibição leva ao jogo clandestino e o jogo clandestino leva à corrupção”, afirmou Wesley Cardia, CEO da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL).

No ano passado, a Câmara aprovou um projeto que legaliza os jogos de azar, abrindo o País para os bingos, os cassinos e o jogo do bicho operarem de forma aberta. O projeto está agora no Senado e deve ser ressuscitado. Defensores dizem que o Brasil perde arrecadação de uma atividade que, mesmo ilegal, já funciona amplamente. “Todas as modalidades de jogos devem ser legalizadas, todas, todas, porque não há opção na sociedade para o não jogo”, afirmou o deputado João Carlos Bacelar Batista (PV-BA).

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