BRASÍLIA - Um ano após a fusão entre DEM e PSL, o União Brasil ainda vive um clima de brigas internas e disputas por protagonismo nas decisões políticas. Setores do partido, principalmente aqueles ligados ao antigo DEM, têm reclamado do presidente da sigla, Luciano Bivar. Eles dizem que Bivar tentou levar o União Brasil para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e que ele tem tomado decisões sem ouvir o conjunto da legenda. Críticos do dirigente também dizem que ele tem a “doce ilusão” de ser o presidente da Câmara em 2023 caso Lula vença a eleição presidencial.
Um dos principais líderes da sigla, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, vocalizou publicamente a insatisfação com Bivar. “A decisão pessoal dele não pode ser determinante quando se fala em maioria, a tese partidária não é o rito imperial do presidente, é da maioria. O presidente do partido pode ter a opinião dele, mas a maioria do partido já se declarou favorável (a Bolsonaro)”, disse no dia 6 de outubro quando participou de um pronunciamento no Palácio da Alvorada ao lado presidente.
Contra a maioria bolsonarista, o União Brasil anunciou neutralidade no segundo turno da eleição presidencial. Além de Bivar, o ex-prefeito de Salvador e candidato a governador da Bahia pelo partido, ACM Neto, foi essencial para isso, já que apoiar Bolsonaro seria ruim para ele que concorre em um Estado de maioria lulista. Neto tem adotado a neutralidade em relação à disputa nacional desde o primeiro turno e a manteve na segunda fase da eleição.
Uma reunião da direção nacional e com a presença dos deputados e senadores eleitos está marcada para esta semana em Brasília. Não há uma pauta pré-definida, mas uma ala do partido pretende questionar o modo como a legenda está sendo conduzida. Outro ponto que precisa ser pacificado é a negociação para uma fusão ou federação com o PP. Uma parte do União Brasil é contra e vê isso como uma estratégia do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para capturar a legenda e fazer frente ao PL, que elegeu 99 deputados neste ano.
A divisão da legenda também pode ser observada no diretório do Rio. Lá, o prefeito de Belford Roxo e presidente do diretório estadual, Wagner Carneiro, o Waguinho, e a mulher, a deputada federal eleita mais votada no Rio, Daniela do Waguinho, apoiam Lula. Já o deputado estadual mais votado, Márcio Canella, e a família do ex-governador Anthony Garotinho decidiram apoiar Bolsonaro. O senador eleito Sérgio Moro, o vice-presidente da legenda, Antonio Rueda, e diretórios de estados como Acre, Amazonas, Ceará e Mato Grosso, por exemplo, também já aderiram à campanha bolsonarista.
O caso de atrito interno do União Brasil mais recente aconteceu na disputa para o governo de Pernambuco, terra de Bivar. O dirigente chegou a falar que a sigla está com a candidata Marília Arraes (Solidariedade), que é apoiada por Lula, mas outros membros do partido no Estado, como ex-ministro da Educação Mendonça Filho, o deputado Fernando Coelho Filho e o ex-prefeito de Petrolina Miguel Coelho, todos eles vindos do extinto DEM, se apressaram em dizer que estão com a tucana Raquel Lyra na disputa pelo governo estadual e que apoiam Bolsonaro para presidente.
Bivar também não esconde o incômodo com os colegas de partido e minimizou os apoios deles. “O União Brasil e nós que dirigimos a legenda em Pernambuco estamos apoiando Marília Arraes. Mendonça e a família Coelho não falam pelo partido em Pernambuco”, disse ele ao Estadão. Sobre Lula, o dirigente evitou dar um endosso público, mas já disse que os apoios dados a Bolsonaro por caciques da legenda não representam o partido. “Nenhum deles responde pelo União Brasil nacional, nenhum deles. União Brasil é um pacto de 27 Estados com representatividade e diretórios. Isso é que representa o União Brasil nacional. Cada Estado tem sua independência”, afirmou o presidente do partido no último dia 6, quando anunciou que a legenda adotaria a neutralidade no segundo turno da eleição presidencial. Em nota divulgada no início de outubro, o presidente do partido também fez uma crítica velada ao bolsonarismo e disse que não pode ”comungar com forças retrógradas extremistas e conservadoras”.
Bivar já foi aliado de Bolsonaro e inclusive foi o dirigente partidário que viabilizou sua candidatura à Presidência em 2018, mas os dois romperam logo no primeiro ano de governo, em 2019, após uma disputa pelo comando do antigo PSL. Nesta eleição, o deputado fez um acordo informal com o PT e o PSB, que tem a prefeitura do Recife e o governo do Estado, para conseguir se reeleger como deputado federal. A estimativa inicial do União Brasil em Pernambuco era eleger dois deputados federais -Mendonça Filho e Fernando Coelho - e Bivar não estava lista.
Durante a disputa por uma vaga na Câmara, Mendonça Filho chegou a acusar Bivar de boicotar sua candidatura. “Falta menos de um mês para a eleição e eu estou sem acesso à maior parte dos recursos que recebi. Preciso ter condições de fazer campanha. É uma aberração”, afirmou o deputado eleito ao Estadão em setembro. Para conseguir se eleger, o presidente do partido contou com o auxílio dos partidos de esquerda em Pernambuco, que mobilizaram prefeitos e vereadores para ajudar Bivar a ter votos.