A prisão do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro e a ofensiva contra pastores que transformaram o MEC em uma máquina de fazer negócios põem por terra o discurso de que não há corrupção no governo comandado por Jair Bolsonaro. Três meses depois de dizer que botava “a cara no fogo” por Ribeiro, Bolsonaro tenta agora se desvincular do ex-auxiliar numa estratégia sob medida para não sair totalmente queimado na corrida pela reeleição.
Com o escândalo batendo à porta do Palácio do Planalto, o presidente já se descolou de Ribeiro. Foi aconselhado pelo comando de sua campanha a recorrer à retórica da traição e deu o tom de como será a reação do governo. “Ele que responda pelos atos dele”, disse Bolsonaro, nesta quarta-feira, 22, em entrevista à Rádio Itatiaia, numa referência ao ex-ministro.
Antes amigo de fé, irmão, camarada, o evangélico Ribeiro tem tudo para virar o traidor da história, na versão do Planalto, com o intuito de salvar o chefe do Executivo. “Se a Polícia Federal prendeu, tem um motivo. É um sinal de que eu não interfiro na PF”, emendou Bolsonaro.
Um integrante do Centrão observou que, de agora em diante, Bolsonaro não poderá mais recorrer ao bordão de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), seu principal adversário, quer “voltar à cena do crime”. A expressão chegou a ser usada pelo ex-governador Geraldo Alckmin, hoje vice da chapa petista, quando, em 2006, ele disputava a Presidência e Lula era seu rival. À época, Alckmin acusava Lula de promover “roubalheira”.
Nos bastidores, Bolsonaro disse, mais de uma vez, que querem derrubá-lo. É crise dos combustíveis, inflação, inquérito das fake news e, agora, uma operação da Polícia Federal. Em conversas reservadas, ministros chegaram a suspeitar de “vingança” da PF por não ter recebido reajuste salarial. Prometido por Bolsonaro, o aumento de 5% – considerado irrisório pela corporação – acabou ficando apenas no discurso.
Nessa “tempestade perfeita”, o tráfico de influência no MEC, revelado pelo Estadão, tem potencial para atingir em cheio a campanha do presidente por um novo mandato. Não é à toa que, nas redes sociais, pipocam memes exibindo o rosto de Bolsonaro em chamas.
Sob a gestão de Ribeiro, os pastores Arilton Moura e Gilmar Santos – que não ocupavam cargos no MEC – atuavam como lobistas e abriam portas para prefeitos e empresários aliados. Era esse gabinete paralelo que controlava a liberação de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). O fundo, por sinal, também é comandado por um amigo do Centrão, bloco de partidos que dá as cartas no governo. Três prefeitos afirmaram que Moura cobrou propina em ouro e dinheiro vivo para agilizar a verba do FNDE. Havia também venda de Bíblias, com a fisionomia de Ribeiro estampada.
Mesmo assim, Bolsonaro resistiu muito a demitir o ministro. Planejou mesmo dar a ele uma licença e chamá-lo de volta ao MEC. Agora, ao jogar o ex-auxiliar ao mar, o presidente faz um discurso para a “bolha” bolsonarista de que não compactua com erros, tanto que já havia afastado Ribeiro. Tenta se livrar de um peso morto. Resta saber se esse peso não vai “ressuscitar” e apontar o dedo para quem lhe deu a cadeira na Esplanada dos Ministérios.