Os bastidores do Planalto e do Congresso

Opinião|Governo Lula 3 é como o de Dilma: quanto mais intervenção, melhor


Movimentos feitos pelo presidente para controlar atuação de empresas escancaram disputa pelos rumos do terceiro mandato

Por Vera Rosa
Atualização:

A crise provocada pela divergência em torno da distribuição de dividendos extraordinários da Petrobras vai além das aparências e reflete a divisão no governo e no PT pelos rumos do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. Em conversas reservadas, até aliados do Palácio do Planalto mostram preocupação e há quem compare o governo Lula 3 ao da ex-presidente Dilma Rousseff por causa do intervencionismo na economia.

Em mais um capítulo do “estica e puxa” no Planalto, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se posicionou ao lado do presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, em defesa do pagamento de remuneração extra aos acionistas da Petrobras. Mas quem ganhou a guerra, ao menos até agora, foram os ministros Rui Costa (Casa Civil) e Alexandre Silveira (Minas e Energia).

Os ministros Fernando Haddad (Fazenda), Rui Costa ( Casa Civil ) e Alexandre Silveira (Minas e Energia) disputam os rumos do governo. Foto: Wilton Junior/Estadão Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO
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A dupla convenceu Lula da necessidade de retenção de R$ 43 bilhões para não comprometer o plano de investimentos da empresa, que é de US$ 102 bilhões até 2028. Sob a orientação do presidente, conselheiros da Petrobras ligados ao governo votaram contra a distribuição desses dividendos adicionais, enquanto os do setor privado foram a favor. Prates se absteve.

“Eu não tinha nenhum ‘tensiômetro’ para medir a tensão ali”, ironizou Costa nesta terça-feira, 12, ao ser questionado sobre o nível de estremecimento entre Haddad, Silveira e Prates durante a reunião com Lula, realizada na véspera.

Não é segredo para ninguém que Silveira e Prates não se entendem há tempos, assim como Haddad e Costa não se bicam. O titular da Fazenda tem o apoio do ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, mas é alvo de críticas de seu próprio partido, o PT.

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No meio do tiroteio, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, fica ao lado do colega Haddad. Foto: Wilton Junior/Estadão. Foto: WILTON JUNIOR

A cúpula petista não concorda com a meta de déficit zero neste ano, sob o argumento de que, mais cedo ou mais tarde, isso levará a um gigantesco bloqueio de gastos, nem com a distribuição dos dividendos extraordinários da Petrobras. Em dezembro do ano passado, o PT aprovou uma resolução na qual batizou a atual política econômica como “austericídio fiscal”.

Dois meses antes, em outubro, Lula havia dito que “dificilmente” o País chegaria à meta de déficit zero e, à época, chamou o mercado de “ganancioso demais” por cobrar uma coisa que sabia não ser possível cumprir. Nesse quesito, o presidente dava total razão a Rui Costa.

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Haddad, porém, disse a Lula que manter o objetivo fiscal até a apresentação do primeiro relatório, em março, era fundamental para evitar desconfiança e rombo ainda maior nas contas públicas.

O presidente cedeu, mas tem ouvido cada vez mais vozes intervencionistas. Além disso, vira e mexe lança mão do discurso de ataque ao mercado. Desde segunda-feira, por exemplo, tem se referido a essa “entidade” como “dinossauro voraz” e “rinoceronte”.

“A cabeça do Lula 3 é a cabeça da Dilma: intervencionista e brizolista”, resumiu um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Em 2014, no último ano de seu primeiro mandato, Dilma gastou R$ 32,5 bilhões a mais do que arrecadou. Foi também naquele ano que estourou o escândalo do petrolão.

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A então presidente Dilma Rousseff sempre procurou se posicionar à esquerda das duas gestões de Lula. Foto: André Coelho/EFE

Hoje presidente do Banco dos Brics, com sede em Xangai, Dilma sempre procurou se posicionar à esquerda das duas gestões anteriores de Lula. Em 2010, seu programa de governo era ancorado pelo mote do “novo projeto nacional de desenvolvimento” e já pregava maior presença do Estado na economia.

Lula também sempre teve esse discurso, mas, na prática, ajudou banqueiros e empresas privadas nos seus dois primeiros mandatos. Ao que tudo indica, agora fará uma espécie de “meia volta volver”.

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Rui Costa transformou crise em ruído de comunicação

Após as turbulências causadas pela decisão da Petrobras de reter o pagamento dos dividendos extraordinários e a queda das ações da companhia na Bolsa, Lula pediu a Costa que, em público, jogasse água na fervura. Foi por isso que o ministro passou boa parte do dia tentando transformar a crise em um ruído de comunicação puxado pelo mercado.

“Eu não sei por que essa polêmica toda. A Petrobras deu o segundo maior lucro da história e era para todo mundo estar comemorando”, afirmou o chefe da Casa Civil. “Mas é sempre o que o mercado solicita (que vale), não é isso? Toda vez que tem esse movimento, alguém ganha muito dinheiro. E não é aquele que está vendendo.”

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Ao contrário do que disse o ministro, porém, as coisas não andam às mil maravilhas, tanto que Haddad precisou pedir assento para a Fazenda no Conselho de Administração da Petrobras.

A oposição aproveitou a deixa da disputa no governo e, nesta terça-feira, 12, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovou convite para o presidente da Petrobras prestar informações sobre a “interferência indevida” do Executivo na gestão da companhia.

“O que está ocorrendo gera insegurança jurídica, afeta a credibilidade da Petrobras e pode afugentar investidores”, disse o presidente da CAE, senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO).

O problema não para aí: desde o ano passado, Lula tem tentado emplacar o novo presidente da Vale, empresa que foi privatizada há quase 27 anos. O governo trabalhava pela indicação do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, sofreu um revés no último dia 8, quando o Conselho da Vale decidiu renovar o contrato de Eduardo Bartolomeu até dezembro, mas não desistiu.

“Empresas brasileiras precisam estar de acordo com aquilo que é o pensamento de desenvolvimento do governo”, afirmou Lula, em 27 de fevereiro, ao programa “É Notícia”, da Rede TV. “A Vale não pode pensar que ela é dona do Brasil, não pode pensar que ela pode mais do que o Brasil.”

Em janeiro, o presidente também chamou de “escárnio” a privatização da Eletrobras – levada a cabo em junho de 2022 – e disse que o governo vai “brigar muito” para reaver o direito de voto na empresa.

Na prática, sem contar com os homens fortes de seu primeiro mandato, em 2003, Lula 3 se parece cada vez mais com a gestão de Dilma. O petista, no entanto, tem mais jogo de cintura política do que sua afilhada. Ao menos nessa temporada, é difícil que o MDB velho de guerra precise lhe entregar um bambolê, como fez com a então presidente.

A crise provocada pela divergência em torno da distribuição de dividendos extraordinários da Petrobras vai além das aparências e reflete a divisão no governo e no PT pelos rumos do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. Em conversas reservadas, até aliados do Palácio do Planalto mostram preocupação e há quem compare o governo Lula 3 ao da ex-presidente Dilma Rousseff por causa do intervencionismo na economia.

Em mais um capítulo do “estica e puxa” no Planalto, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se posicionou ao lado do presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, em defesa do pagamento de remuneração extra aos acionistas da Petrobras. Mas quem ganhou a guerra, ao menos até agora, foram os ministros Rui Costa (Casa Civil) e Alexandre Silveira (Minas e Energia).

Os ministros Fernando Haddad (Fazenda), Rui Costa ( Casa Civil ) e Alexandre Silveira (Minas e Energia) disputam os rumos do governo. Foto: Wilton Junior/Estadão Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO

A dupla convenceu Lula da necessidade de retenção de R$ 43 bilhões para não comprometer o plano de investimentos da empresa, que é de US$ 102 bilhões até 2028. Sob a orientação do presidente, conselheiros da Petrobras ligados ao governo votaram contra a distribuição desses dividendos adicionais, enquanto os do setor privado foram a favor. Prates se absteve.

“Eu não tinha nenhum ‘tensiômetro’ para medir a tensão ali”, ironizou Costa nesta terça-feira, 12, ao ser questionado sobre o nível de estremecimento entre Haddad, Silveira e Prates durante a reunião com Lula, realizada na véspera.

Não é segredo para ninguém que Silveira e Prates não se entendem há tempos, assim como Haddad e Costa não se bicam. O titular da Fazenda tem o apoio do ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, mas é alvo de críticas de seu próprio partido, o PT.

No meio do tiroteio, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, fica ao lado do colega Haddad. Foto: Wilton Junior/Estadão. Foto: WILTON JUNIOR

A cúpula petista não concorda com a meta de déficit zero neste ano, sob o argumento de que, mais cedo ou mais tarde, isso levará a um gigantesco bloqueio de gastos, nem com a distribuição dos dividendos extraordinários da Petrobras. Em dezembro do ano passado, o PT aprovou uma resolução na qual batizou a atual política econômica como “austericídio fiscal”.

Dois meses antes, em outubro, Lula havia dito que “dificilmente” o País chegaria à meta de déficit zero e, à época, chamou o mercado de “ganancioso demais” por cobrar uma coisa que sabia não ser possível cumprir. Nesse quesito, o presidente dava total razão a Rui Costa.

Haddad, porém, disse a Lula que manter o objetivo fiscal até a apresentação do primeiro relatório, em março, era fundamental para evitar desconfiança e rombo ainda maior nas contas públicas.

O presidente cedeu, mas tem ouvido cada vez mais vozes intervencionistas. Além disso, vira e mexe lança mão do discurso de ataque ao mercado. Desde segunda-feira, por exemplo, tem se referido a essa “entidade” como “dinossauro voraz” e “rinoceronte”.

“A cabeça do Lula 3 é a cabeça da Dilma: intervencionista e brizolista”, resumiu um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Em 2014, no último ano de seu primeiro mandato, Dilma gastou R$ 32,5 bilhões a mais do que arrecadou. Foi também naquele ano que estourou o escândalo do petrolão.

A então presidente Dilma Rousseff sempre procurou se posicionar à esquerda das duas gestões de Lula. Foto: André Coelho/EFE

Hoje presidente do Banco dos Brics, com sede em Xangai, Dilma sempre procurou se posicionar à esquerda das duas gestões anteriores de Lula. Em 2010, seu programa de governo era ancorado pelo mote do “novo projeto nacional de desenvolvimento” e já pregava maior presença do Estado na economia.

Lula também sempre teve esse discurso, mas, na prática, ajudou banqueiros e empresas privadas nos seus dois primeiros mandatos. Ao que tudo indica, agora fará uma espécie de “meia volta volver”.

Rui Costa transformou crise em ruído de comunicação

Após as turbulências causadas pela decisão da Petrobras de reter o pagamento dos dividendos extraordinários e a queda das ações da companhia na Bolsa, Lula pediu a Costa que, em público, jogasse água na fervura. Foi por isso que o ministro passou boa parte do dia tentando transformar a crise em um ruído de comunicação puxado pelo mercado.

“Eu não sei por que essa polêmica toda. A Petrobras deu o segundo maior lucro da história e era para todo mundo estar comemorando”, afirmou o chefe da Casa Civil. “Mas é sempre o que o mercado solicita (que vale), não é isso? Toda vez que tem esse movimento, alguém ganha muito dinheiro. E não é aquele que está vendendo.”

Ao contrário do que disse o ministro, porém, as coisas não andam às mil maravilhas, tanto que Haddad precisou pedir assento para a Fazenda no Conselho de Administração da Petrobras.

A oposição aproveitou a deixa da disputa no governo e, nesta terça-feira, 12, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovou convite para o presidente da Petrobras prestar informações sobre a “interferência indevida” do Executivo na gestão da companhia.

“O que está ocorrendo gera insegurança jurídica, afeta a credibilidade da Petrobras e pode afugentar investidores”, disse o presidente da CAE, senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO).

O problema não para aí: desde o ano passado, Lula tem tentado emplacar o novo presidente da Vale, empresa que foi privatizada há quase 27 anos. O governo trabalhava pela indicação do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, sofreu um revés no último dia 8, quando o Conselho da Vale decidiu renovar o contrato de Eduardo Bartolomeu até dezembro, mas não desistiu.

“Empresas brasileiras precisam estar de acordo com aquilo que é o pensamento de desenvolvimento do governo”, afirmou Lula, em 27 de fevereiro, ao programa “É Notícia”, da Rede TV. “A Vale não pode pensar que ela é dona do Brasil, não pode pensar que ela pode mais do que o Brasil.”

Em janeiro, o presidente também chamou de “escárnio” a privatização da Eletrobras – levada a cabo em junho de 2022 – e disse que o governo vai “brigar muito” para reaver o direito de voto na empresa.

Na prática, sem contar com os homens fortes de seu primeiro mandato, em 2003, Lula 3 se parece cada vez mais com a gestão de Dilma. O petista, no entanto, tem mais jogo de cintura política do que sua afilhada. Ao menos nessa temporada, é difícil que o MDB velho de guerra precise lhe entregar um bambolê, como fez com a então presidente.

A crise provocada pela divergência em torno da distribuição de dividendos extraordinários da Petrobras vai além das aparências e reflete a divisão no governo e no PT pelos rumos do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. Em conversas reservadas, até aliados do Palácio do Planalto mostram preocupação e há quem compare o governo Lula 3 ao da ex-presidente Dilma Rousseff por causa do intervencionismo na economia.

Em mais um capítulo do “estica e puxa” no Planalto, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se posicionou ao lado do presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, em defesa do pagamento de remuneração extra aos acionistas da Petrobras. Mas quem ganhou a guerra, ao menos até agora, foram os ministros Rui Costa (Casa Civil) e Alexandre Silveira (Minas e Energia).

Os ministros Fernando Haddad (Fazenda), Rui Costa ( Casa Civil ) e Alexandre Silveira (Minas e Energia) disputam os rumos do governo. Foto: Wilton Junior/Estadão Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO

A dupla convenceu Lula da necessidade de retenção de R$ 43 bilhões para não comprometer o plano de investimentos da empresa, que é de US$ 102 bilhões até 2028. Sob a orientação do presidente, conselheiros da Petrobras ligados ao governo votaram contra a distribuição desses dividendos adicionais, enquanto os do setor privado foram a favor. Prates se absteve.

“Eu não tinha nenhum ‘tensiômetro’ para medir a tensão ali”, ironizou Costa nesta terça-feira, 12, ao ser questionado sobre o nível de estremecimento entre Haddad, Silveira e Prates durante a reunião com Lula, realizada na véspera.

Não é segredo para ninguém que Silveira e Prates não se entendem há tempos, assim como Haddad e Costa não se bicam. O titular da Fazenda tem o apoio do ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, mas é alvo de críticas de seu próprio partido, o PT.

No meio do tiroteio, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, fica ao lado do colega Haddad. Foto: Wilton Junior/Estadão. Foto: WILTON JUNIOR

A cúpula petista não concorda com a meta de déficit zero neste ano, sob o argumento de que, mais cedo ou mais tarde, isso levará a um gigantesco bloqueio de gastos, nem com a distribuição dos dividendos extraordinários da Petrobras. Em dezembro do ano passado, o PT aprovou uma resolução na qual batizou a atual política econômica como “austericídio fiscal”.

Dois meses antes, em outubro, Lula havia dito que “dificilmente” o País chegaria à meta de déficit zero e, à época, chamou o mercado de “ganancioso demais” por cobrar uma coisa que sabia não ser possível cumprir. Nesse quesito, o presidente dava total razão a Rui Costa.

Haddad, porém, disse a Lula que manter o objetivo fiscal até a apresentação do primeiro relatório, em março, era fundamental para evitar desconfiança e rombo ainda maior nas contas públicas.

O presidente cedeu, mas tem ouvido cada vez mais vozes intervencionistas. Além disso, vira e mexe lança mão do discurso de ataque ao mercado. Desde segunda-feira, por exemplo, tem se referido a essa “entidade” como “dinossauro voraz” e “rinoceronte”.

“A cabeça do Lula 3 é a cabeça da Dilma: intervencionista e brizolista”, resumiu um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Em 2014, no último ano de seu primeiro mandato, Dilma gastou R$ 32,5 bilhões a mais do que arrecadou. Foi também naquele ano que estourou o escândalo do petrolão.

A então presidente Dilma Rousseff sempre procurou se posicionar à esquerda das duas gestões de Lula. Foto: André Coelho/EFE

Hoje presidente do Banco dos Brics, com sede em Xangai, Dilma sempre procurou se posicionar à esquerda das duas gestões anteriores de Lula. Em 2010, seu programa de governo era ancorado pelo mote do “novo projeto nacional de desenvolvimento” e já pregava maior presença do Estado na economia.

Lula também sempre teve esse discurso, mas, na prática, ajudou banqueiros e empresas privadas nos seus dois primeiros mandatos. Ao que tudo indica, agora fará uma espécie de “meia volta volver”.

Rui Costa transformou crise em ruído de comunicação

Após as turbulências causadas pela decisão da Petrobras de reter o pagamento dos dividendos extraordinários e a queda das ações da companhia na Bolsa, Lula pediu a Costa que, em público, jogasse água na fervura. Foi por isso que o ministro passou boa parte do dia tentando transformar a crise em um ruído de comunicação puxado pelo mercado.

“Eu não sei por que essa polêmica toda. A Petrobras deu o segundo maior lucro da história e era para todo mundo estar comemorando”, afirmou o chefe da Casa Civil. “Mas é sempre o que o mercado solicita (que vale), não é isso? Toda vez que tem esse movimento, alguém ganha muito dinheiro. E não é aquele que está vendendo.”

Ao contrário do que disse o ministro, porém, as coisas não andam às mil maravilhas, tanto que Haddad precisou pedir assento para a Fazenda no Conselho de Administração da Petrobras.

A oposição aproveitou a deixa da disputa no governo e, nesta terça-feira, 12, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovou convite para o presidente da Petrobras prestar informações sobre a “interferência indevida” do Executivo na gestão da companhia.

“O que está ocorrendo gera insegurança jurídica, afeta a credibilidade da Petrobras e pode afugentar investidores”, disse o presidente da CAE, senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO).

O problema não para aí: desde o ano passado, Lula tem tentado emplacar o novo presidente da Vale, empresa que foi privatizada há quase 27 anos. O governo trabalhava pela indicação do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, sofreu um revés no último dia 8, quando o Conselho da Vale decidiu renovar o contrato de Eduardo Bartolomeu até dezembro, mas não desistiu.

“Empresas brasileiras precisam estar de acordo com aquilo que é o pensamento de desenvolvimento do governo”, afirmou Lula, em 27 de fevereiro, ao programa “É Notícia”, da Rede TV. “A Vale não pode pensar que ela é dona do Brasil, não pode pensar que ela pode mais do que o Brasil.”

Em janeiro, o presidente também chamou de “escárnio” a privatização da Eletrobras – levada a cabo em junho de 2022 – e disse que o governo vai “brigar muito” para reaver o direito de voto na empresa.

Na prática, sem contar com os homens fortes de seu primeiro mandato, em 2003, Lula 3 se parece cada vez mais com a gestão de Dilma. O petista, no entanto, tem mais jogo de cintura política do que sua afilhada. Ao menos nessa temporada, é difícil que o MDB velho de guerra precise lhe entregar um bambolê, como fez com a então presidente.

A crise provocada pela divergência em torno da distribuição de dividendos extraordinários da Petrobras vai além das aparências e reflete a divisão no governo e no PT pelos rumos do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. Em conversas reservadas, até aliados do Palácio do Planalto mostram preocupação e há quem compare o governo Lula 3 ao da ex-presidente Dilma Rousseff por causa do intervencionismo na economia.

Em mais um capítulo do “estica e puxa” no Planalto, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se posicionou ao lado do presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, em defesa do pagamento de remuneração extra aos acionistas da Petrobras. Mas quem ganhou a guerra, ao menos até agora, foram os ministros Rui Costa (Casa Civil) e Alexandre Silveira (Minas e Energia).

Os ministros Fernando Haddad (Fazenda), Rui Costa ( Casa Civil ) e Alexandre Silveira (Minas e Energia) disputam os rumos do governo. Foto: Wilton Junior/Estadão Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO

A dupla convenceu Lula da necessidade de retenção de R$ 43 bilhões para não comprometer o plano de investimentos da empresa, que é de US$ 102 bilhões até 2028. Sob a orientação do presidente, conselheiros da Petrobras ligados ao governo votaram contra a distribuição desses dividendos adicionais, enquanto os do setor privado foram a favor. Prates se absteve.

“Eu não tinha nenhum ‘tensiômetro’ para medir a tensão ali”, ironizou Costa nesta terça-feira, 12, ao ser questionado sobre o nível de estremecimento entre Haddad, Silveira e Prates durante a reunião com Lula, realizada na véspera.

Não é segredo para ninguém que Silveira e Prates não se entendem há tempos, assim como Haddad e Costa não se bicam. O titular da Fazenda tem o apoio do ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, mas é alvo de críticas de seu próprio partido, o PT.

No meio do tiroteio, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, fica ao lado do colega Haddad. Foto: Wilton Junior/Estadão. Foto: WILTON JUNIOR

A cúpula petista não concorda com a meta de déficit zero neste ano, sob o argumento de que, mais cedo ou mais tarde, isso levará a um gigantesco bloqueio de gastos, nem com a distribuição dos dividendos extraordinários da Petrobras. Em dezembro do ano passado, o PT aprovou uma resolução na qual batizou a atual política econômica como “austericídio fiscal”.

Dois meses antes, em outubro, Lula havia dito que “dificilmente” o País chegaria à meta de déficit zero e, à época, chamou o mercado de “ganancioso demais” por cobrar uma coisa que sabia não ser possível cumprir. Nesse quesito, o presidente dava total razão a Rui Costa.

Haddad, porém, disse a Lula que manter o objetivo fiscal até a apresentação do primeiro relatório, em março, era fundamental para evitar desconfiança e rombo ainda maior nas contas públicas.

O presidente cedeu, mas tem ouvido cada vez mais vozes intervencionistas. Além disso, vira e mexe lança mão do discurso de ataque ao mercado. Desde segunda-feira, por exemplo, tem se referido a essa “entidade” como “dinossauro voraz” e “rinoceronte”.

“A cabeça do Lula 3 é a cabeça da Dilma: intervencionista e brizolista”, resumiu um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Em 2014, no último ano de seu primeiro mandato, Dilma gastou R$ 32,5 bilhões a mais do que arrecadou. Foi também naquele ano que estourou o escândalo do petrolão.

A então presidente Dilma Rousseff sempre procurou se posicionar à esquerda das duas gestões de Lula. Foto: André Coelho/EFE

Hoje presidente do Banco dos Brics, com sede em Xangai, Dilma sempre procurou se posicionar à esquerda das duas gestões anteriores de Lula. Em 2010, seu programa de governo era ancorado pelo mote do “novo projeto nacional de desenvolvimento” e já pregava maior presença do Estado na economia.

Lula também sempre teve esse discurso, mas, na prática, ajudou banqueiros e empresas privadas nos seus dois primeiros mandatos. Ao que tudo indica, agora fará uma espécie de “meia volta volver”.

Rui Costa transformou crise em ruído de comunicação

Após as turbulências causadas pela decisão da Petrobras de reter o pagamento dos dividendos extraordinários e a queda das ações da companhia na Bolsa, Lula pediu a Costa que, em público, jogasse água na fervura. Foi por isso que o ministro passou boa parte do dia tentando transformar a crise em um ruído de comunicação puxado pelo mercado.

“Eu não sei por que essa polêmica toda. A Petrobras deu o segundo maior lucro da história e era para todo mundo estar comemorando”, afirmou o chefe da Casa Civil. “Mas é sempre o que o mercado solicita (que vale), não é isso? Toda vez que tem esse movimento, alguém ganha muito dinheiro. E não é aquele que está vendendo.”

Ao contrário do que disse o ministro, porém, as coisas não andam às mil maravilhas, tanto que Haddad precisou pedir assento para a Fazenda no Conselho de Administração da Petrobras.

A oposição aproveitou a deixa da disputa no governo e, nesta terça-feira, 12, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovou convite para o presidente da Petrobras prestar informações sobre a “interferência indevida” do Executivo na gestão da companhia.

“O que está ocorrendo gera insegurança jurídica, afeta a credibilidade da Petrobras e pode afugentar investidores”, disse o presidente da CAE, senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO).

O problema não para aí: desde o ano passado, Lula tem tentado emplacar o novo presidente da Vale, empresa que foi privatizada há quase 27 anos. O governo trabalhava pela indicação do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, sofreu um revés no último dia 8, quando o Conselho da Vale decidiu renovar o contrato de Eduardo Bartolomeu até dezembro, mas não desistiu.

“Empresas brasileiras precisam estar de acordo com aquilo que é o pensamento de desenvolvimento do governo”, afirmou Lula, em 27 de fevereiro, ao programa “É Notícia”, da Rede TV. “A Vale não pode pensar que ela é dona do Brasil, não pode pensar que ela pode mais do que o Brasil.”

Em janeiro, o presidente também chamou de “escárnio” a privatização da Eletrobras – levada a cabo em junho de 2022 – e disse que o governo vai “brigar muito” para reaver o direito de voto na empresa.

Na prática, sem contar com os homens fortes de seu primeiro mandato, em 2003, Lula 3 se parece cada vez mais com a gestão de Dilma. O petista, no entanto, tem mais jogo de cintura política do que sua afilhada. Ao menos nessa temporada, é difícil que o MDB velho de guerra precise lhe entregar um bambolê, como fez com a então presidente.

Opinião por Vera Rosa

Repórter especial do ‘Estadão’. Na Sucursal de Brasília desde 2003, sempre cobrindo Planalto e Congresso. É jornalista formada pela PUC-SP. Escreve às quartas-feiras

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