Os bastidores do Planalto e do Congresso

Análise|O dia em que ‘Dona Marta do PT’ mandou Maluf calar a boca


Ex-prefeita, conhecida por não levar desaforo para casa, vai ser a vice na chapa de Boulos à Prefeitura em acordo construído por Lula

Por Vera Rosa
Atualização:

O debate estava tenso quando, de repente, um grito ecoou no auditório da TV Bandeirantes: “Cala a boca, Maluf!”. A “ordem” partiu da psicóloga Marta Suplicy, que, dias antes, havia ensaiado aquela forma impactante de interromper Paulo Maluf (PP), seu adversário no segundo turno da disputa pela Prefeitura de São Paulo. “Cala a boca você! Eu não admito”, reagiu Maluf. Era outubro de 2000, noite de primavera.

Durante a campanha, marqueteiros apresentavam Marta como uma mulher corajosa, que não levava desaforo para casa. Mas pesquisas mostravam que São Paulo era uma capital conservadora. A estratégia foi traçada, então, para buscar um meio-termo, na tentativa de não colar o nome da candidata ao PT de Luiz Inácio Lula da Silva, que, àquela altura, já havia perdido três eleições presidenciais.

Debate entre Marta Suplicy e Paulo Maluf na eleição municipal em São Paulo, em 2000 Foto: MONICA ZARATTINI/ESTADÃO - 16/10/2000
continua após a publicidade

Maluf, que de bobo nunca teve nada, percebeu a tática e passou a chamar a rival de “Dona Marta do PT”. Chegava mesmo a aumentar o tom de sua voz anasalada ao pronunciar “do PT”, como se quisesse carimbá-la com a sigla. No debate da Band, pouco antes do “Cala a boca!”, Maluf tinha dito que sua oponente era “desqualificada para administrar”. Diante dos protestos, mandava que ela ficasse “quietinha” enquanto ele falava.

Vinte e três anos se passaram e, de lá para cá, muita coisa mudou na cena política. Dona Marta do PT nunca mais conseguiu se eleger prefeita de novo. Há quem diga que ela perdeu a identidade ao deixar as fileiras petistas, migrar para o MDB e, depois, fazer uma escala no Solidariedade.

continua após a publicidade

Sondagens indicam, porém, que a maioria dos eleitores ainda acha que ela é do PT, partido para o qual retorna agora. O acordo para fazer Marta vice da chapa encabeçada por Guilherme Boulos (PSOL) na corrida à Prefeitura foi construído por Lula, que ignorou resistências internas.

Marta e Boulos fecham acordo construído por Lula, que ignorou resistências de alas radicais do PT. Foto: José Luis da Conceição

Uma pesquisa feita pela Quaest em dezembro do ano passado, perto do Natal, ajuda a entender o empenho do presidente. Quando questionados sobre quem foi o melhor prefeito de São Paulo, 24% dos entrevistados responderam Marta; 9% citaram Luiza Erundina e outros 9%, Paulo Maluf. Bruno Covas obteve 8% e ficou empatado com Gilberto Kassab, também com 8%. Fernando Haddad somou 7%, Mário Covas, 3%, João Doria, 2%, e o atual prefeito, Ricardo Nunes, 1%. O levantamento da Quaest ouviu 3 mil pessoas na capital paulista e 29% não souberam citar nenhum nome de prefeito.

continua após a publicidade

Embora Marta tenha rompido com o PT há nove anos, sob o argumento de que a legenda era “protagonista de um dos maiores escândalos de corrupção”, Lula se reconciliou com ela. O mesmo não se pode dizer de Dilma Rousseff, que até hoje não a perdoa por ter votado a favor do impeachment.

continua após a publicidade

Em 2022, Marta apoiou Lula contra o então presidente Jair Bolsonaro (PL) e foi anfitriã do almoço que selou a adesão de Simone Tebet (MDB) à campanha. O petista quer reeditar aquela frente ampla porque mira 2026, quando pretende disputar a reeleição e emplacar um governador – ou governadora – no Palácio dos Bandeirantes.

Fincar bandeiras em São Paulo é crucial para o jogo de Lula, principalmente depois que Tarcísio de Freitas (Republicanos), aliado de Bolsonaro, ganhou o governo do Estado.

Desde 2012, o PT vem perdendo prefeitos, em todo o Brasil: elegeu 635 naquele ano, quando Fernando Haddad chegou ao poder, com o apoio de Maluf, que exigiu até foto com Lula para dizer “sim”. Em 2016, foram 256 eleitos e, em 2020, o número caiu ainda mais: 179, mas nenhum em capital. Nesta disputa, o partido não tinha um candidato competitivo para liderar a chapa em São Paulo ou ocupar a vice.

continua após a publicidade
Em 2012, Lula posou para foto ao lado de Maluf, que fez essa exigência para anunciar apoio a Haddad, então candidato a prefeito Foto: Epitácio Pessoa / Agência Estado

Vice decorativa? Nem pensar

Marta irá agora para as ruas e pode ajudar a desconstruir preconceitos contra Boulos, político que combateu no segundo turno da campanha de 2020, quando ficou ao lado do tucano Bruno Covas. Eleito prefeito, Covas morreu seis meses depois, em maio de 2021.

continua após a publicidade

Se Boulos vencer, Marta não será uma vice decorativa. Leva na bagagem programas sociais elogiados, como o Bilhete Único e os Centros Educacionais Unificados (CEUs), mas também polêmicas que lhe renderam o apelido de “Martaxa” por causa da cobrança de taxas de lixo e iluminação, entre outras. Se perder, tem tudo para voltar a comandar um ministério na Esplanada, onde Lula tenta encaixar mais mulheres.

De qualquer forma, a campanha do prefeito Ricardo Nunes (MDB) fará tudo para imprimir na ex-secretária de Relações Internacionais a pecha de “traidora”. Mas Lula, padrinho de Marta, não liga: acha que a política é como nuvem, que cada dia está de um jeito. E, nessas idas e vindas, o “Cala a boca” de hoje vira casamento com o Centrão amanhã. Ou não.

O debate estava tenso quando, de repente, um grito ecoou no auditório da TV Bandeirantes: “Cala a boca, Maluf!”. A “ordem” partiu da psicóloga Marta Suplicy, que, dias antes, havia ensaiado aquela forma impactante de interromper Paulo Maluf (PP), seu adversário no segundo turno da disputa pela Prefeitura de São Paulo. “Cala a boca você! Eu não admito”, reagiu Maluf. Era outubro de 2000, noite de primavera.

Durante a campanha, marqueteiros apresentavam Marta como uma mulher corajosa, que não levava desaforo para casa. Mas pesquisas mostravam que São Paulo era uma capital conservadora. A estratégia foi traçada, então, para buscar um meio-termo, na tentativa de não colar o nome da candidata ao PT de Luiz Inácio Lula da Silva, que, àquela altura, já havia perdido três eleições presidenciais.

Debate entre Marta Suplicy e Paulo Maluf na eleição municipal em São Paulo, em 2000 Foto: MONICA ZARATTINI/ESTADÃO - 16/10/2000

Maluf, que de bobo nunca teve nada, percebeu a tática e passou a chamar a rival de “Dona Marta do PT”. Chegava mesmo a aumentar o tom de sua voz anasalada ao pronunciar “do PT”, como se quisesse carimbá-la com a sigla. No debate da Band, pouco antes do “Cala a boca!”, Maluf tinha dito que sua oponente era “desqualificada para administrar”. Diante dos protestos, mandava que ela ficasse “quietinha” enquanto ele falava.

Vinte e três anos se passaram e, de lá para cá, muita coisa mudou na cena política. Dona Marta do PT nunca mais conseguiu se eleger prefeita de novo. Há quem diga que ela perdeu a identidade ao deixar as fileiras petistas, migrar para o MDB e, depois, fazer uma escala no Solidariedade.

Sondagens indicam, porém, que a maioria dos eleitores ainda acha que ela é do PT, partido para o qual retorna agora. O acordo para fazer Marta vice da chapa encabeçada por Guilherme Boulos (PSOL) na corrida à Prefeitura foi construído por Lula, que ignorou resistências internas.

Marta e Boulos fecham acordo construído por Lula, que ignorou resistências de alas radicais do PT. Foto: José Luis da Conceição

Uma pesquisa feita pela Quaest em dezembro do ano passado, perto do Natal, ajuda a entender o empenho do presidente. Quando questionados sobre quem foi o melhor prefeito de São Paulo, 24% dos entrevistados responderam Marta; 9% citaram Luiza Erundina e outros 9%, Paulo Maluf. Bruno Covas obteve 8% e ficou empatado com Gilberto Kassab, também com 8%. Fernando Haddad somou 7%, Mário Covas, 3%, João Doria, 2%, e o atual prefeito, Ricardo Nunes, 1%. O levantamento da Quaest ouviu 3 mil pessoas na capital paulista e 29% não souberam citar nenhum nome de prefeito.

Embora Marta tenha rompido com o PT há nove anos, sob o argumento de que a legenda era “protagonista de um dos maiores escândalos de corrupção”, Lula se reconciliou com ela. O mesmo não se pode dizer de Dilma Rousseff, que até hoje não a perdoa por ter votado a favor do impeachment.

Em 2022, Marta apoiou Lula contra o então presidente Jair Bolsonaro (PL) e foi anfitriã do almoço que selou a adesão de Simone Tebet (MDB) à campanha. O petista quer reeditar aquela frente ampla porque mira 2026, quando pretende disputar a reeleição e emplacar um governador – ou governadora – no Palácio dos Bandeirantes.

Fincar bandeiras em São Paulo é crucial para o jogo de Lula, principalmente depois que Tarcísio de Freitas (Republicanos), aliado de Bolsonaro, ganhou o governo do Estado.

Desde 2012, o PT vem perdendo prefeitos, em todo o Brasil: elegeu 635 naquele ano, quando Fernando Haddad chegou ao poder, com o apoio de Maluf, que exigiu até foto com Lula para dizer “sim”. Em 2016, foram 256 eleitos e, em 2020, o número caiu ainda mais: 179, mas nenhum em capital. Nesta disputa, o partido não tinha um candidato competitivo para liderar a chapa em São Paulo ou ocupar a vice.

Em 2012, Lula posou para foto ao lado de Maluf, que fez essa exigência para anunciar apoio a Haddad, então candidato a prefeito Foto: Epitácio Pessoa / Agência Estado

Vice decorativa? Nem pensar

Marta irá agora para as ruas e pode ajudar a desconstruir preconceitos contra Boulos, político que combateu no segundo turno da campanha de 2020, quando ficou ao lado do tucano Bruno Covas. Eleito prefeito, Covas morreu seis meses depois, em maio de 2021.

Se Boulos vencer, Marta não será uma vice decorativa. Leva na bagagem programas sociais elogiados, como o Bilhete Único e os Centros Educacionais Unificados (CEUs), mas também polêmicas que lhe renderam o apelido de “Martaxa” por causa da cobrança de taxas de lixo e iluminação, entre outras. Se perder, tem tudo para voltar a comandar um ministério na Esplanada, onde Lula tenta encaixar mais mulheres.

De qualquer forma, a campanha do prefeito Ricardo Nunes (MDB) fará tudo para imprimir na ex-secretária de Relações Internacionais a pecha de “traidora”. Mas Lula, padrinho de Marta, não liga: acha que a política é como nuvem, que cada dia está de um jeito. E, nessas idas e vindas, o “Cala a boca” de hoje vira casamento com o Centrão amanhã. Ou não.

O debate estava tenso quando, de repente, um grito ecoou no auditório da TV Bandeirantes: “Cala a boca, Maluf!”. A “ordem” partiu da psicóloga Marta Suplicy, que, dias antes, havia ensaiado aquela forma impactante de interromper Paulo Maluf (PP), seu adversário no segundo turno da disputa pela Prefeitura de São Paulo. “Cala a boca você! Eu não admito”, reagiu Maluf. Era outubro de 2000, noite de primavera.

Durante a campanha, marqueteiros apresentavam Marta como uma mulher corajosa, que não levava desaforo para casa. Mas pesquisas mostravam que São Paulo era uma capital conservadora. A estratégia foi traçada, então, para buscar um meio-termo, na tentativa de não colar o nome da candidata ao PT de Luiz Inácio Lula da Silva, que, àquela altura, já havia perdido três eleições presidenciais.

Debate entre Marta Suplicy e Paulo Maluf na eleição municipal em São Paulo, em 2000 Foto: MONICA ZARATTINI/ESTADÃO - 16/10/2000

Maluf, que de bobo nunca teve nada, percebeu a tática e passou a chamar a rival de “Dona Marta do PT”. Chegava mesmo a aumentar o tom de sua voz anasalada ao pronunciar “do PT”, como se quisesse carimbá-la com a sigla. No debate da Band, pouco antes do “Cala a boca!”, Maluf tinha dito que sua oponente era “desqualificada para administrar”. Diante dos protestos, mandava que ela ficasse “quietinha” enquanto ele falava.

Vinte e três anos se passaram e, de lá para cá, muita coisa mudou na cena política. Dona Marta do PT nunca mais conseguiu se eleger prefeita de novo. Há quem diga que ela perdeu a identidade ao deixar as fileiras petistas, migrar para o MDB e, depois, fazer uma escala no Solidariedade.

Sondagens indicam, porém, que a maioria dos eleitores ainda acha que ela é do PT, partido para o qual retorna agora. O acordo para fazer Marta vice da chapa encabeçada por Guilherme Boulos (PSOL) na corrida à Prefeitura foi construído por Lula, que ignorou resistências internas.

Marta e Boulos fecham acordo construído por Lula, que ignorou resistências de alas radicais do PT. Foto: José Luis da Conceição

Uma pesquisa feita pela Quaest em dezembro do ano passado, perto do Natal, ajuda a entender o empenho do presidente. Quando questionados sobre quem foi o melhor prefeito de São Paulo, 24% dos entrevistados responderam Marta; 9% citaram Luiza Erundina e outros 9%, Paulo Maluf. Bruno Covas obteve 8% e ficou empatado com Gilberto Kassab, também com 8%. Fernando Haddad somou 7%, Mário Covas, 3%, João Doria, 2%, e o atual prefeito, Ricardo Nunes, 1%. O levantamento da Quaest ouviu 3 mil pessoas na capital paulista e 29% não souberam citar nenhum nome de prefeito.

Embora Marta tenha rompido com o PT há nove anos, sob o argumento de que a legenda era “protagonista de um dos maiores escândalos de corrupção”, Lula se reconciliou com ela. O mesmo não se pode dizer de Dilma Rousseff, que até hoje não a perdoa por ter votado a favor do impeachment.

Em 2022, Marta apoiou Lula contra o então presidente Jair Bolsonaro (PL) e foi anfitriã do almoço que selou a adesão de Simone Tebet (MDB) à campanha. O petista quer reeditar aquela frente ampla porque mira 2026, quando pretende disputar a reeleição e emplacar um governador – ou governadora – no Palácio dos Bandeirantes.

Fincar bandeiras em São Paulo é crucial para o jogo de Lula, principalmente depois que Tarcísio de Freitas (Republicanos), aliado de Bolsonaro, ganhou o governo do Estado.

Desde 2012, o PT vem perdendo prefeitos, em todo o Brasil: elegeu 635 naquele ano, quando Fernando Haddad chegou ao poder, com o apoio de Maluf, que exigiu até foto com Lula para dizer “sim”. Em 2016, foram 256 eleitos e, em 2020, o número caiu ainda mais: 179, mas nenhum em capital. Nesta disputa, o partido não tinha um candidato competitivo para liderar a chapa em São Paulo ou ocupar a vice.

Em 2012, Lula posou para foto ao lado de Maluf, que fez essa exigência para anunciar apoio a Haddad, então candidato a prefeito Foto: Epitácio Pessoa / Agência Estado

Vice decorativa? Nem pensar

Marta irá agora para as ruas e pode ajudar a desconstruir preconceitos contra Boulos, político que combateu no segundo turno da campanha de 2020, quando ficou ao lado do tucano Bruno Covas. Eleito prefeito, Covas morreu seis meses depois, em maio de 2021.

Se Boulos vencer, Marta não será uma vice decorativa. Leva na bagagem programas sociais elogiados, como o Bilhete Único e os Centros Educacionais Unificados (CEUs), mas também polêmicas que lhe renderam o apelido de “Martaxa” por causa da cobrança de taxas de lixo e iluminação, entre outras. Se perder, tem tudo para voltar a comandar um ministério na Esplanada, onde Lula tenta encaixar mais mulheres.

De qualquer forma, a campanha do prefeito Ricardo Nunes (MDB) fará tudo para imprimir na ex-secretária de Relações Internacionais a pecha de “traidora”. Mas Lula, padrinho de Marta, não liga: acha que a política é como nuvem, que cada dia está de um jeito. E, nessas idas e vindas, o “Cala a boca” de hoje vira casamento com o Centrão amanhã. Ou não.

O debate estava tenso quando, de repente, um grito ecoou no auditório da TV Bandeirantes: “Cala a boca, Maluf!”. A “ordem” partiu da psicóloga Marta Suplicy, que, dias antes, havia ensaiado aquela forma impactante de interromper Paulo Maluf (PP), seu adversário no segundo turno da disputa pela Prefeitura de São Paulo. “Cala a boca você! Eu não admito”, reagiu Maluf. Era outubro de 2000, noite de primavera.

Durante a campanha, marqueteiros apresentavam Marta como uma mulher corajosa, que não levava desaforo para casa. Mas pesquisas mostravam que São Paulo era uma capital conservadora. A estratégia foi traçada, então, para buscar um meio-termo, na tentativa de não colar o nome da candidata ao PT de Luiz Inácio Lula da Silva, que, àquela altura, já havia perdido três eleições presidenciais.

Debate entre Marta Suplicy e Paulo Maluf na eleição municipal em São Paulo, em 2000 Foto: MONICA ZARATTINI/ESTADÃO - 16/10/2000

Maluf, que de bobo nunca teve nada, percebeu a tática e passou a chamar a rival de “Dona Marta do PT”. Chegava mesmo a aumentar o tom de sua voz anasalada ao pronunciar “do PT”, como se quisesse carimbá-la com a sigla. No debate da Band, pouco antes do “Cala a boca!”, Maluf tinha dito que sua oponente era “desqualificada para administrar”. Diante dos protestos, mandava que ela ficasse “quietinha” enquanto ele falava.

Vinte e três anos se passaram e, de lá para cá, muita coisa mudou na cena política. Dona Marta do PT nunca mais conseguiu se eleger prefeita de novo. Há quem diga que ela perdeu a identidade ao deixar as fileiras petistas, migrar para o MDB e, depois, fazer uma escala no Solidariedade.

Sondagens indicam, porém, que a maioria dos eleitores ainda acha que ela é do PT, partido para o qual retorna agora. O acordo para fazer Marta vice da chapa encabeçada por Guilherme Boulos (PSOL) na corrida à Prefeitura foi construído por Lula, que ignorou resistências internas.

Marta e Boulos fecham acordo construído por Lula, que ignorou resistências de alas radicais do PT. Foto: José Luis da Conceição

Uma pesquisa feita pela Quaest em dezembro do ano passado, perto do Natal, ajuda a entender o empenho do presidente. Quando questionados sobre quem foi o melhor prefeito de São Paulo, 24% dos entrevistados responderam Marta; 9% citaram Luiza Erundina e outros 9%, Paulo Maluf. Bruno Covas obteve 8% e ficou empatado com Gilberto Kassab, também com 8%. Fernando Haddad somou 7%, Mário Covas, 3%, João Doria, 2%, e o atual prefeito, Ricardo Nunes, 1%. O levantamento da Quaest ouviu 3 mil pessoas na capital paulista e 29% não souberam citar nenhum nome de prefeito.

Embora Marta tenha rompido com o PT há nove anos, sob o argumento de que a legenda era “protagonista de um dos maiores escândalos de corrupção”, Lula se reconciliou com ela. O mesmo não se pode dizer de Dilma Rousseff, que até hoje não a perdoa por ter votado a favor do impeachment.

Em 2022, Marta apoiou Lula contra o então presidente Jair Bolsonaro (PL) e foi anfitriã do almoço que selou a adesão de Simone Tebet (MDB) à campanha. O petista quer reeditar aquela frente ampla porque mira 2026, quando pretende disputar a reeleição e emplacar um governador – ou governadora – no Palácio dos Bandeirantes.

Fincar bandeiras em São Paulo é crucial para o jogo de Lula, principalmente depois que Tarcísio de Freitas (Republicanos), aliado de Bolsonaro, ganhou o governo do Estado.

Desde 2012, o PT vem perdendo prefeitos, em todo o Brasil: elegeu 635 naquele ano, quando Fernando Haddad chegou ao poder, com o apoio de Maluf, que exigiu até foto com Lula para dizer “sim”. Em 2016, foram 256 eleitos e, em 2020, o número caiu ainda mais: 179, mas nenhum em capital. Nesta disputa, o partido não tinha um candidato competitivo para liderar a chapa em São Paulo ou ocupar a vice.

Em 2012, Lula posou para foto ao lado de Maluf, que fez essa exigência para anunciar apoio a Haddad, então candidato a prefeito Foto: Epitácio Pessoa / Agência Estado

Vice decorativa? Nem pensar

Marta irá agora para as ruas e pode ajudar a desconstruir preconceitos contra Boulos, político que combateu no segundo turno da campanha de 2020, quando ficou ao lado do tucano Bruno Covas. Eleito prefeito, Covas morreu seis meses depois, em maio de 2021.

Se Boulos vencer, Marta não será uma vice decorativa. Leva na bagagem programas sociais elogiados, como o Bilhete Único e os Centros Educacionais Unificados (CEUs), mas também polêmicas que lhe renderam o apelido de “Martaxa” por causa da cobrança de taxas de lixo e iluminação, entre outras. Se perder, tem tudo para voltar a comandar um ministério na Esplanada, onde Lula tenta encaixar mais mulheres.

De qualquer forma, a campanha do prefeito Ricardo Nunes (MDB) fará tudo para imprimir na ex-secretária de Relações Internacionais a pecha de “traidora”. Mas Lula, padrinho de Marta, não liga: acha que a política é como nuvem, que cada dia está de um jeito. E, nessas idas e vindas, o “Cala a boca” de hoje vira casamento com o Centrão amanhã. Ou não.

Análise por Vera Rosa

Repórter especial do ‘Estadão’. Na Sucursal de Brasília desde 2003, sempre cobrindo Planalto e Congresso. É jornalista formada pela PUC-SP. Escreve às quartas-feiras

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.