BRASÍLIA – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chamou as ministras Marina Silva (Meio Ambiente) e Sônia Guajajara (Povos Indígenas) para uma reunião nesta sexta-feira, 26, com o objetivo de desfazer a imagem de que atuou para desidratar as pastas comandadas pelas duas mulheres. O Palácio do Planalto tenta desviar os holofotes da mais nova crise política e mostrar que não existem dois governos.
Lula ficou contrariado com o tom usado por Marina, na quarta-feira, quando ela disse, em audiência na Câmara, que o desmonte de seu ministério poderia até mesmo inviabilizar o acordo União Europeia-Mercosul. Não foi só: a ministra afirmou, ainda, que a credibilidade de Lula não era suficiente para garantir a boa imagem do Brasil no exterior. O presidente também não gostou de ver Guajajara admitindo “frustração” e até “um pouquinho de falta de empenho” da parte do petista para reverter o quadro de descalabro nas negociações com o Centrão.
Ao longo do dia, Lula fez vários gestos para mostrar que tudo estava como antes em sua nova temporada à frente do Planalto. Além disso, indicou que pretende virar a página das turbulências com uma pauta positiva. Tanto ele como o vice-presidente Geraldo Alckmin anunciaram o corte de impostos para carros “populares”, de até R$ 120 mil. E, na semana que vem, deve ser lançado o “Desenrola”, programa sob medida para ajudar endividados a sair do vermelho. A classe média é o foco das novas medidas.
Embora Lula tenha dado aval às mudanças aprovadas pela comissão mista do Congresso para “depenar” os ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Originários, a estratégia articulada para o encontro com Marina e Guajajara é passar a imagem de normalidade.
“Tem dias que a gente acorda com notícias parecendo que o mundo acabou”, escreveu o presidente no Twitter, após participar de cerimônia na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). “Eu fui ler as notícias hoje, na verdade, tudo parecia normal. Uma comissão do Congresso querendo mexer numa estrutura de governo que é difícil de mexer. Agora que começou o jogo”, argumentou ele, ao dizer que ninguém deve se assustar com a política. “É na política que se tem as soluções dos grandes e pequenos problemas do país”.
Na prática, Lula tentará mostrar, no encontro desta sexta-feira – com a presença de outros ministros da coordenação política e líderes do governo –, que para tudo tem um jeito. Além de uma boa conversa para tirar foto com Marina e Guajajara, o presidente deverá dizer a elas que o governo não jogou a toalha e só aprovou as mudanças nos ministérios porque a Medida Provisória sobre a reorganização da Esplanada está prestes a caducar, perdendo a validade em 1.º de junho. Trata-se de uma proposta que ainda precisa passar pelos plenários da Câmara e do Senado até esta data para que a configuração da Esplanada não volte a ser como era na gestão de Jair Bolsonaro.
Apesar de o governo ter preferido salvar estruturas poderosas, como a da Casa Civil – que conseguiu manter sob seu guarda-chuva o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) –, Lula afirma agora que o jogo só acaba quando termina. Marina, por exemplo, poderá ter “compensações”, que não se resumem à garantia do presidente de se debruçar com atenção sobre o impasse envolvendo a exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas.
Uma das ideias consiste em fazer uma espécie de administração compartilhada do Cadastro Ambiental Rural (CAR), que foi transferido para o Ministério da Gestão. Seria um modelo de regulação interna, dependendo apenas de uma portaria, para determinar que as licenças continuassem a ser autorizadas pelo Meio Ambiente.
É fato que deputados e senadores do Centrão agem como se o sistema de governo fosse semipresidencialista e põem a faca no pescoço de Lula, ao mexer na estrutura dos ministérios. Mas o petista, como bom camaleão da política, dribla as intempéries com um discurso que muda conforme seus interlocutores para agradar a Marina, a Guajajara e até mesmo ao Centrão.