Eleito vereador na capital paulista em 2020 com a bandeira da defesa dos motoristas de aplicativos, Marlon Luz, mais conhecido como Marlon do Uber (MDB), vai sortear no próximo dia 14 um veículo e uma moto zero km avaliados em cerca de R$ 110 mil. O concurso, segundo o Estadão apurou, é ilegal e pode faturar até R$ 200 mil. O sorteio não tem autorização do Ministério da Fazenda, responsável no Brasil por regular essa atividade.
A rifa de Marlon Luz está registrada em nome da Associação Sorte Grande entre Amigos. A entidade foi criada há menos de um mês pelo vereador e o endereço oficial fica num imóvel vizinho ao prédio onde ele reside, na zona sul da capital. De acordo com o cadastro oficial, a especialidade da associação é a de promover “atividades de defesa de direitos sociais”.
Para comprar os bilhetes, só por Pix. A aposta mínima é de R$ 2,47, mas ele oferece desconto para quem comprar dez bilhetes.
De acordo com as regras divulgadas pelo site Sorte Grande, de propriedade de Marlon e outros dois sócios, os bilhetes poderão ser comprados até a véspera e os vencedores serão definidos a partir do resultado da Loteria Federal do dia seguinte.
Procurado, Marlon afirmou ao Estadão que a associação é sem fins lucrativos. Por isso, alega que o concurso que organiza é legal. “Trata-se de uma ação entre os associados regularmente constituída sem fins lucrativos. A ação tem por objetivo apenas bonificar aqueles que são associados, não se enquadrando na lei de 1971 que regulamenta os sorteios para empresas que queiram divulgar seu nome e ter lucro”, afirmou, completando que considera a legislação citada ultrapassada.
No Brasil, porém, não existe autorização legal para operação de sorteios com base em captação de apostas ou comercialização de números por meio de rifas, vale-brindes ou qualquer outra modalidade lotérica de prognósticos numéricos. Segundo o Ministério da Fazenda, ações que dependem da sorte do participante estão penalmente qualificadas como jogos de azar e, por isso, contravenção penal.
A legislação citada por Marlon é a Lei 5.768/1971, que, segundo o Ministério da Fazenda, classifica como “infração penal qualificada como contravenção” sorteios e rifas realizados tanto por pessoa física quanto por pessoa jurídica. A exceção se dá apenas a organizações da sociedade civil que se dediquem exclusivamente a atividades filantrópicas, com o fim de obter recursos adicionais necessários à manutenção ou custeio de obra social. Para organizar sorteio, explica a Receita, essas entidades precisam de pedir uma autorização anual ao fisco.
Em nota, o ministério informou que a Associação Sorte Grande entre Amigos não fez qualquer pedido de autorização para a realização de distribuição gratuita de prêmios, mas que não tem competência legal para se envolver em questões criminais. “Assim, no caso específico do sorteio, o caso deve ser encaminhado às polícias judiciária civil e militar paulistas, e, ainda, ao Ministério Público do Estado.”
Ao contrário do que alega o político, a compra dos bilhetes não está restrita aos associados de sua entidade. Pode ser feita por qualquer pessoa. A reportagem do Estadão fez um Pix para comprovar que a rifa está ativa e os R$ 2,47 foram depositados na conta da Sorte Grande.
Chance
Pelas redes sociais, Marlon comemora o fato de sortear, pela primeira vez, um veículo zero km e afirma aos seguidores que R$ 2 podem mudar a vida de deles. “É a sua chance de sair do aluguel ou do financiamento do seu veículo. Você vai deixar suas dívidas para trás e começar uma nova vida. Quanto mais bilhetes você adquirir, mais chance você tem de ganhar. Só ganha quem participa!”, escreveu o vereador em sua conta no Facebook, em meio a outros posts relacionados ao seu mandato.
Ao jornal, Marlon afirmou que, descontados os valores pagos nos veículos, a verba restante – que pode chegar a R$ 90 mil – será reservada para a compra de outro carro a ser sorteado no dia do motorista de aplicativo, comemorado em 25 de julho.
Marlon do Uber foi eleito pela primeira vez em 2020, com 25.643 votos, pelo Patriota. Apresentado como youtuber, empresário e empreendedor no ramo de tecnologia, ele virou ativista defensor da classe dos motoristas de aplicativos. No ano passado, trocou de partido para disputar um cargo na Câmara dos Deputados, sem sucesso.