GENEBRA – A Volkswagen manteve entre seus funcionários no Brasil um criminoso de guerra e membro do regime nazista, Franz Stangl, mas a multinacional não sabia de seu passado quando ele foi contratado no final dos anos 50. A informação vai constar do informe final preparado pelo historiador da empresa, o alemão Christopher Kopper, sobre o papel da Volkswagen na ditadura brasileira.
O historiador confirmou nesta quinta-feira, 27, que investigou o caso Franz Stangl. “Ele foi empregado na Volkswagen do Brasil entre 1959 até sua prisão em 1967. Ele assinou seu contrato de trabalho com seu nome verdadeiro. Mas, na época, ele não estava ainda na lista de criminosos nazistas procurados”, justificou. “A Volkswagen do Brasil desconhecia totalmente que ele havia sido um oficial da SS”, concluiu o historiador.
Em seu informe final, Kopper vai mostrar como a multinacional cooperou com o regime militar brasileiro, entregando nome de funcionários ao Dops e espionando seus próprios empregados. O historiador, que teve um ano para realizar seu trabalho, consultou arquivos brasileiros e alemães para chegar ao resultado de sua pesquisa, realizada segundo ele sem a interferência da empresa.
No que se refere à Stangl, porém, a conclusão é de que não houve uma intenção da multinacional de trazer para seu grupo um ex-oficial da SS. Ainda assim, foi ele quem estabeleceria o serviço de vigilância dos funcionários da fábrica de São Bernardo do Campo e que acabaria ajudando os militares brasileiros.
Stangl chegou ao Brasil em 1951, depois de passar pela Itália e Síria. Durante o nazismo, ele comandou os campos de extermínio de Treblinka e Sobibór na Polônia. Ele ainda fez parte de um programa de eutanásia organizado pela cúpula nazista.
De acordo com a Comissão Nacional da Verdade (CNV), em 2014, a estrutura montada por Stangl para espionar os funcionários da Volks no Brasil envolvia policiais, membros das Forças Armadas e mostrava uma complexidade que chamava a atenção. O sistema permitia até mesmo um acompanhamento diário de suspeitos de fazerem parte de organizações “subversivas”.
Apesar de o historiador não responsabilizar a empresa por sua contratação, Stangl chegou a receber uma sugestão da multinacional para contratar um advogado quando ele foi detido em São Paulo em 28 de fevereiro de 1967. Isso ocorreu depois que Simon Wiesenthal, um reconhecido "caçador de nazistas", o denunciou às autoridades brasileiras.
O ex-comandante nazista acabou sendo extraditado para a Alemanha e, três anos depois, o Tribunal de Düsseldorf o condenou à prisão perpétua pelo assassinato de 400 mil pessoas. Em junho de 1971, porém, ele morreu, vítima de um infarto.
A imprensa alemã, nesta semana, revelou ainda como o então chefe da Volkswagen do Brasil, Friedrich Wilhelm Schultz-Wenk, também havia enviado uma carta para a sede da empresa na Alemanha, depois da prisão do ex-oficiais da SS, para confirmar que não sabia do passado de Stangl. Schultz-Wenk, porém, havia sido membro do partido nazista em sua juventude.
Em uma entrevista ao Estado em maio de 2013, o delegado José Paulo Bonchristiano, do Departamento de Ordem Política e Social de São Paulo (Dops-SP), apontou que a prisão havia sido realizada sob seu comando. “O pessoal diz que o Dops só prendia comunista. Nós prendemos o carrasco nazista Franz Paul Stangl”, disse. “Eu que fiz a prisão dele, o carrasco nazista. Levei para Bonn, na Alemanha”, completou.