Prefeito paulistano, João Doria demitiu assessor gravado dizendo que faria o que pudesse para dificultar o trabalho dos jornalistas que mais fazem pedidos de informação via LAI à prefeitura. Conforme revelado por um deles - o repórter Luiz Fernando Toledo, do Estado -, o demitido dizia fazer um ranking mental dos mais "chatos": o próprio Toledo (não é parente); Roberta Giacomoni, da TV Globo; e William Cardoso, do Agora.
A declaração do assessor - extraída da gravação oficial de reunião da comissão da prefeitura que analisa os pedidos de informação - é o maior elogio que o trio poderia receber. Incomodar tanto os poderosos e seus auxiliares, ao ponto de serem lembrados pelo nome e classificados como os mais pidões, é um reconhecimento maior do que ganhar o saudoso Prêmio Esso. Deveriam incorporar ao currículo: "dos mais chatos repórteres a cobrir a Prefeitura de São Paulo, segundo a própria".
Quanto ao assessor, caiu por se vangloriar. O prefeito disse em entrevista que ele foi demitido, antes de mais nada, porque falou o que não devia. Não tivesse falado, continuaria lá? O prefeito dá a entender que não, diz que a ordem é outra.
Não se tem notícia de que a atitude descrita pelo ex-assessor, desde que não explicitada, tenha levado algum colega seu à demissão. Nem em prefeituras, nem em governos estaduais ou federal, nem no Legislativo ou Judiciário. Nem hoje nem antes. Simplesmente porque filtrar informações é o seu trabalho. Tanto é que nenhum dos outros participantes da reunião contestou a declaração do futuro demitido, nem fez comentário estranhando.
Nas palavras também gravadas de um ex-ministro da Fazenda, "não tenho escrúpulos, acho que é isso mesmo: o que é bom a gente fatura, o que é ruim, esconde-se". O ministro acabou caindo. De novo, pelo que disse, não pelo que fazia. A prática recorrente 23 anos atrás é recorrente agora. E não só no Brasil.
O repórter Philip Bump, do "Whashington Post", mantém uma lista de tudo o que Trump desfez como presidente. Como nota a revista "Wired", destaca-se entre as desfeitas a quantidade de bases de dados que deixaram de ser informadas à população: pagamentos de petroleiras a governos estrangeiros, salários organizados por raça e gênero dos empregados, registros de acidentes de trabalho, violações às leis do trabalho por contratados pelo governo, relação de visitantes à Casa Branca, entre outras.
A ocultação de informações reforça a importância da lei de acesso. É através dela que todo cidadão, jornalista ou não, pode requisitar, na íntegra, quaisquer dados públicos em poder do estado, desde que não estejam legalmente protegidos por sigilo. E daí fazer o próprio filtro e interpretação, sem estar sujeito "ao que é bom a gente fatura, o que é ruim, esconde-se".
Dificultar o acesso sem motivo, demorar a responder, alegar custos inexistentes, barrar pedidos desse ou daquele são vício na administração pública. Além de ilegal, é burro. Há tantos, mas tantos dados que seria mais inteligente dar tudo, voluntariamente, e torcer para os "chatos" se afogarem neles.