Na eleição mais apertada da história brasileira desde a redemocratização, ganhou um candidato que teve como seu principal cabo eleitoral o adversário. Não é à toa que, em tom jocoso, dirigentes do PT diziam que deveriam erguer uma estátua para a incompetência geral de Bolsonaro – política, gerencial e pessoal.
É a primeira vez também que o incumbente perde para o desafiante, o que diz muito sobre a decepção geral com os rumos de Bolsonaro desde que ele surfou uma onda disruptiva em 2018. Ele conseguiu com que algumas das vozes mais razoáveis, sensatas e equilibradas viessem a público manifestar apoio a um dirigente político – Lula – que presidiu sobre o maior escândalo de corrupção da história brasileira e, ao final de sua ungida, Dilma Rousseff, a pior recessão enfrentada por um país que não estava em guerra.
A pergunta agora é estabelecer quais ferramentas políticas, qual vontade pessoal, quais alianças e quais circunstâncias políticas permitirão que ele governe. Em torno de qual plataforma? O maior problema de Lula é reconhecer que a demanda do eleitorado brasileiro é claramente de centro-direita, mas esse aspecto, traduzido nas eleições legislativas, esconde outro, mais abrangente.
O assim chamado “Brasil que trabalha e produz” recusou o PT no poder em várias circunstâncias – a começar pelas ruas desde 2013. E consiste num amplo espectro que não se encaixa nos conceitos clássicos de sociologia e ciência política.
O principal problema de Lula vencedor é conquistar legitimidade. Por favor, não me confundam: legitimidade entendida como mandato para levar o País pacificado a romper seus maiores desafios, que continuam os mesmos há décadas, a saber, miséria, desigualdade e ignorância.