SÃO PAULO – Os viadutos de São Paulo abrigam uma série de ocupações irregulares, sejam de barracos de madeira ou de casas de alvenaria. O ponto em comum: o histórico de incêndios. Em outras áreas da cidade, o espaço sob a estrutura vira depósito de entulho, refúgio de usuário de droga ou até academia de boxe – como mostra visita do Estado. Procurada, a Prefeitura destacou já ter lançado um projeto-piloto para revitalização.
Na sexta-feira, um incêndio atingiu uma série de barracos sob a Ponte do Jaguaré, na Marginal do Pinheiros, interditou a estrutura e desalojou os sem-teto. Na ocasião, a gestão Bruno Covas (PSDB) divulgou nota afirmando “monitorar constantemente a situação das ocupações sob viadutos”. Existiriam “sete pontes ocupadas”.
Fora dessa lista, cerca de mil pessoas, segundo moradores, vivem em barracos de madeira sob o viaduto por onde passam linhas da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), também na Marginal do Pinheiros. Vizinha, a comunidade está a cerca de 4 quilômetros da Ponte do Jaguaré e também já passou por incêndio.
Segundo os sem-teto, o fogo atingiu o local há seis anos. “Queriam tirar todo mundo daqui, mas só ofereceram auxílio-aluguel e o pessoal não aceitou”, diz a moradora Quele Cristina Santos, de 25 anos. Ela também conta que os barracos até chegaram a ser desocupados neste mês, para demolição, mas como ainda não vieram abaixo, os moradores estão voltando.
“O viaduto é o meu teto”, diz a autônoma Francis Ramos, de 31 anos, que mora com o ex-marido e três filhos em uma casa de dois andares, toda feita de tijolos e vigas de ferro, sob o Viaduto Tiquatira, na Penha, zona leste. No quarto, nem construiu a parede dos fundos: aproveitou a estrutura do viaduto.
Por lá, as instalações elétricas são irregulares e moradores relatam dois incêndios - um na década de 1990 e outro no ano passado. Ainda é possível ver marcas das chamas, na parte de baixo do Tiquatira. “A gente fica apreensivo porque pode acontecer com a gente”, diz a desempregada Maria do Carmo Santos, de 34. “Quando chove, entra água nas casas. Também tem muita poluição e pombos.”
Outras áreas
Já no Viaduto Alcântara Machado, na Mooca, há dezenas de barracos de madeira. “Malocas resistem por moradia, dignidade e autonomia”, diz uma faixa. Sob a estrutura, funciona, ainda, uma academia, com equipamentos ao ar livre.
Embaixo do Viaduto Pacheco Chaves, na zona sul, há casas com mais de 20 anos que, agora, começam a ganhar estrutura de alvenaria e azulejos. Os moradores começaram a trocar tábuas por tijolos após um incêndio no local. “O pessoal começou a colocar bloco para ter menos risco”, diz a dona de casa Mônica Reis, de 34 anos. “Não quero sair daqui de jeito nenhum.”
O pedreiro Severino Reis de Carvalho, de 53 anos, construiu boa parte dos barracos na última década e meia, desde que chegou para morar na comunidade. “Essa favela aqui, a maior parte dos barracos quem costruiu fui eu”, conta.
Foi o dinheiro da construção que custeou as reformas do seu próprio barraco, improvisado a poucos metros da pista do viaduto, e também dos casebres que fez para suas três filhas. Ele diz que não vê motivo para sair. “A gente reza para ter um bocado de sossego e continuar por aqui, porque a comunidade é tranquila.”
A cerca de 2 quilômetros, pilhas de lixo e entulho ocupavam a pista sob o Viaduto Grande São Paulo, que dá acesso à Avenida do Estado. Lá, fissuras na estrutura são visíveis, ainda assim há barracas montadas. O local foi apontado como uma das estruturas em piores condições em fevereiro deste ano, após um viaduto ceder na Marginal do Pinheiros.
No centro, o Viaduto do Glicério sofreu uma série de incêndios em 2017. Embora a área já tenha sido protegida por grades e tapumes, ainda se vê barracas de lona, montadas diariamente por moradores de rua e por usuários da Cracolândia. “Eles (agentes da Prefeitura) levam tudo, tiram a madeira onde o sujeito está dormindo e deixam ao relento”, diz a moradora Cristiane, de 34 anos.
Procurada, a Prefeitura informou estar “empenhada num grande programa de requalificação dos baixos de viadutos”. O programa-piloto foi publicado no Diário Oficial do dia 8, para “receber propostas para as áreas sob os viadutos Pompeia, Lapa e Antártica, na zona oeste, que servirão de modelo.