Do Beco do Batman ao Museu de Arte de São Paulo (Masp), alguns dos principais pontos turísticos da cidade de São Paulo têm sido alvo frequente da ação de criminosos focados em roubos e furtos de celular. São espaços que costumam concentrar grande parte dos crimes patrimoniais de bairros mais centrais, segundo o Radar da Criminalidade, ferramenta desenvolvida com exclusividade pelo Estadão.
Com circulação de pessoas normalmente maior que em outros locais, os pontos turísticos se destacam pelo uso intenso de aparelhos celulares, seja para tirar fotos ou pedir carros de aplicativo, e pela desatenção de frequentadores, que muitas vezes estão em passeios. Gangues de bicicletas e falsos entregadores então se aproveitam das oportunidades.
A Secretaria da Segurança Pública afirmou, em nota, que está atenta às oscilações dos índices de criminalidade na capital, incluindo as áreas dos pontos turísticos, e tem reforçado o policiamento preventivo e ostensivo em locais de maior incidência criminal. A pasta destaca que, entre janeiro e agosto de 2024, a capital registrou queda de 12,9% nos roubos e de 3,7% nos furtos na comparação com o mesmo período do ano passado.
Também em nota, a Prefeitura afirmou que a Secretaria Municipal de Segurança Urbana, por meio da GCM, “realiza o policiamento e garante a segurança em todas as regiões da cidade, protegendo as ações dos agentes e os bens públicos” (leia mais abaixo).
A violência de um caso recente chama atenção. Três turistas francesas foram vítimas de um assalto no mês passado na região do Beco do Batman, na Vila Madalena, na zona oeste da capital paulista. Imagens de câmeras de segurança mostram que dois indivíduos armados derrubam duas das vítimas e as golpeiam com coronhadas. Eles fugiram na sequência. Segundo a secretaria, a polícia ainda busca identificar os suspeitos.
“Foi a primeira vez que vi assim por aqui”, disse uma artesã de 44 anos, quatro deles trabalhando no Beco do Batman, que preferiu não se identificar.
A reportagem do Estadão esteve por lá na última quinta-feira, 3, para ouvir comerciantes e frequentadores. Em geral, os relatos apontaram que o ponto turístico é relativamente tranquilo, com presença de turistas do mundo todo, mas mostraram preocupação com casos recentes.
Há alguns meses, o comerciante Giovani Fontenele, de 66 anos, viu uma turista ter o celular levado por um motociclista em frente à porta de seu bar. “Não deu nem tempo de ela reagir. Assim que viu, o ladrão já estava longe”, disse ele, que há 16 anos atende a região. “Antes não tinha isso por aqui, foi há um ano que a gente começou a notar mais”, acrescentou. O assalto às turistas estrangeiras ocorreu bem próximo ao estabelecimento de Giovani.
Em agosto deste ano (último mês que se tem registros), Beco do Batman e arredores reuniram 55 roubos e furtos de celular, aponta o Radar da Criminalidade. Foram ainda oito casos de roubo ou furto de veículo. Somados, esses números representam uma alta de 61,5% em relação ao mesmo mês do ano passado. Quando se leva em conta o distrito policial de Pinheiros, foram 390 ocorrências registradas (aumento de 8% no mesmo recorte).
Segundo moradores e comerciantes ouvidos pela reportagem, destaca-se na região principalmente a ação de ladrões de moto, muitas vezes disfarçados de entregadores de aplicativo, que se aproveitam da distração de pedestres e motoristas. No Beco do Batman, isso acontece sobretudo em vias do entorno. O assalto às turistas francesas, por exemplo, se deu no fim da tarde em uma das saídas do ponto turístico, a Rua Gonçalo Afonso.
Preocupados com os casos recentes, comerciantes têm buscado se articular para cobrar mais policiamento na região e estudado até algumas alternativas, como contratar seguranças privados. “A questão é que os valores estão exorbitantes, então a melhor solução para nós seria ter mais policiamento, talvez até com uma base móvel da Polícia Militar”, disse Silvana Pereira, de 59 anos, sócia de uma galeria colaborativa na região.
Masp reúne quase metade de roubos e furtos da Avenida Paulista
A alguns quilômetros dali, na Avenida Paulista, é o Masp que normalmente reúne a maior parte dos roubos e furtos de celular. Em 2022, quando a Avenida Paulista teve o maior número de roubos em 10 anos, com 1,1 mil registros (cerca de três por dia), e 6,3 mil furtos, quatro em dez casos ocorreram perto do museu mais simbólico da cidade.
Como mostrou reportagem do Estadão publicada no ano passado, trata-se de uma região em que, na maioria das vezes, os crimes são cometidos por pequenos grupos, alguns deles com menores de idade como integrantes. A ação ocorre tanto a pé quanto de bicicleta.
Hoje, o Radar da Criminalidade indica que os casos na região ainda se concentram nos arredores do Masp, apesar de ter havido uma desaceleração por lá no período recente: foram 57 crimes registrados nas proximidades em agosto deste ano, queda de 43% em relação ao mesmo período do ano passado. No distrito policial dos Jardins, os crimes caíram 30% (foram 224 ocorrências).
Como vem mostrando o Estadão, os roubos e furtos estão em queda neste ano em São Paulo, apesar de altas pontuais em bairros como Pinheiros e Perdizes. Ainda assim, a ação dos criminosos segue padrões parecidos. Segundo autoridades policiais, as ações normalmente concentram onde eles veem mais oportunidade de agir rápido e fugir de forma ilesa.
República vê crimes caírem; entorno do Copan concentra ocorrências
Quando se analisa, por exemplo, a região da República, na região central da cidade, houve melhora expressiva nos indicadores (os crimes mapeados pelo Radar caíram 49% em agosto deste ano). Ainda assim, continua a haver uma concentração de casos próximos ao Copan, edifício histórico projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer que se consolida como um polo cultural e gastronômico na região.
Isso porque há um fluxo de pessoas que frequentam estabelecimentos não só na galeria do prédio, como também nos arredores, o que chama a atenção de criminosos. Não à toa, a região passou a ser marcada nos últimos anos pela atuação das chamadas gangues de bicicleta, focadas nos furtos de celular. Segundo comerciantes, esse movimento até desacelerou, mas não deixou de existir.
Foram registrados 127 crimes nos arredores do prédio em agosto deste ano, queda de 41,2% na comparação com o mesmo período do ano passado. A principal incidência, com 79 casos, foi a de furto de celular. Trata-se de um número equivalente a mais da metade de todas as 194 ocorrências registradas na região da República nesse mesmo recorte.
“Há pessoas que estão voltando a frequentar aqui, mas muito pode ser melhorado ainda”, diz a comerciante Ana Maria Pelligrini, de 70 anos. Lojistas e frequentadores da região destacam, como decisivos para melhorar a situação na região, a presença de uma base móvel da PM, de mais policiais fazendo rondas e também de seguranças privados contratados por alguns estabelecimentos.
O segurança particular Cléber Wesley de Sousa, de 36 anos, afirma que agora a região requer o incremento do policiamento principalmente no período da noite. “É o turno que a base móvel sai de perto da esquina do Copan, então fica bem mais inseguro para quem vai no sentido da Praça da República”, disse.
Para Cândido Prunes, presidente do Conselho Comunitário de Segurança (Conseg) Centro, é preciso também envolver a própria Prefeitura de São Paulo, responsável pelas ações da Guarda Civil Metropolitana (GCM) e por ações de zeladoria.
O que dizem governo do Estado e Prefeitura
Em nota, a Prefeitura afirmou que a Secretaria Municipal de Segurança Urbana, por meio da GCM, “realiza o policiamento e garante a segurança em todas as regiões da cidade, protegendo as ações dos agentes e os bens públicos”. “A GCM realiza o policiamento preventivo com o intuito de inibir delitos nas áreas do Beco do Batman, Masp e Praça da República, por meio de rondas periódicas”, diz a pasta.
“O efetivo disponibilizado na região central é de 2.100 agentes, 195 viaturas e 158 motos. Está prevista para o mês de novembro a entrega de 50 viaturas elétricas”, acrescenta a Prefeitura, que destaca também a criação do programa Smart Sampa, sistema de monitoramento por câmeras inteligentes. Segundo a pasta, a iniciativa possui mais de 16 mil câmeras instaladas em pontos estratégicos da capital, funcionando 24 horas por dia, o que colabora para a captura de flagrantes de roubos e furtos.
Já a Secretaria da Segurança Pública do Estado destacou que, além das quedas globais de roubos e furtos, o índice de roubos e furtos de celulares caiu 20,2%, sendo que a região central foi a que apresentou a maior queda: 30%. “Nesse mesmo intervalo, 29.134 infratores foram presos ou apreendidos, e 2.399 armas de fogo foram retiradas das mãos de criminosos”, destacou a secretaria.
“Entre as ações para coibir a subtração de celulares, há a operação Mobile. Realizada em toda a Capital, a operação também visa deter receptadores responsáveis por alimentar essa cadeia criminosa. Nos primeiros oito meses do ano, a ação resultou na vistoria de 1.032 estabelecimentos, apreensão de 4.346 celulares e na devolução de 1.409 aparelhos às suas respectivas vítimas. Além disso, levou à prisão de 304 infratores”, disse.
A secretaria destacou ainda a Operação SpeedBike, realizada pela 1ª Delegacia Seccional (Centro). “A ação tem foco na região central, especialmente na Avenida Paulista, um dos principais pontos turísticos da capital, e visa identificar e prender criminosos que agem em grupo, nas chamadas ‘gangues da bicicleta’”, disse. Neste ano, essa operação resultou na prisão e apreensão de mais de 20 pessoas em flagrante, na apreensão de 125 bicicletas, além da abordagem e identificação de mais de 100 indivíduos, segundo a secretaria.