SÃO PAULO - A Polícia Civil prendeu na noite desta quarta-feira, 29, Ana Flávia Menezes Gonçalves, de 24 anos, sob suspeita de matar o pai, a mãe e o irmão mais novo. Também foi presa Carina Ramos, de 31 anos, companheira de Ana Flávia.
A família foi encontrada carbonizada no porta-malas de um veículo encontrado na madrugada de terça-feira, 28, em uma estrada rural de São Bernardo do Campo, no ABC paulista. As vítimas são Flaviana Guimarães, de 40 anos, Romuyuki Gonçalves, de 43, e Juan Victor Gonçalves, de 15.
Ana Flávia e Carina tiveram as prisões temporárias de 30 dias decretadas pela Justiça após investigação do Setor de Homicídios da Delegacia Seccional da cidade. Os delegados responsáveis pelo caso acreditam que o tempo será suficiente para obter informações que esclareçam como todo o crime aconteceu.
Para prender as duas suspeitas, a polícia alegou ter havido contradições nos depoimentos, como horários de atividades ao longo do dia. Questionadas na terça, elas disseram que a família estaria enfrentando problemas com um agiota para quem deviam R$ 200 mil.
No depoimento, Ana Flávia estava muito abalada e passou mal, segundo relato dos investigadores. Depois de algum tempo, ela melhorou e retomou a oitiva. "Depois do depoimento, já se supunha que algo de estranho estava acontecendo na versão que elas apresentavam", disse o delegado Ronaldo Tossunian, seccional de São Bernardo.
Já parentes ouvidos pela polícia dizem que o cotidiano da família era conturbado e as brigas eram recorrentes. No centro dessas brigas estava o relacionamento homoafetivo do casal. A polícia diz que Romuyuki não aceitava o namoro que já durava dois anos. Elas moravam em uma outra casa, em Santo André. Apesar disso, o pai estaria lidando melhor com o relacionamento recentemente e teria sido visto conversando com Carina na garagem da casa na segunda passada.
Um outro elemento que está ajudando a polícia a compreender o que aconteceu é uma testemunha cuja identidade está sendo protegida. Ela é considerada chave por ter dito ter visto movimentações na casa no início da madrugada da terça, com o posicionamento do carro do casal de ré na casa para realizar um carregamento. A polícia suspeita que os corpos tenham sido dispostos no porta-malas nesse momento.
Mas nem tudo está claro para a polícia até agora. Além da briga, os investigadores não souberam dizer que outros motivos poderiam ter levado o casal a planejar e executar um triplo homicídio. “Não convém adiantar o motivo para o crime nesse momento. Continuamos com as investigações e vamos apontar isso ao final do inquérito”, disse o delegado Paul Henry Bozon Verduraz, da Delegacia de Investigações Criminais de São Bernardo.
Ao menos mais uma pessoa participou do crime, diz polícia
O que a polícia já sabe é que ao menos mais uma pessoa participou do crime. A testemunha relatou ter visto um homem de 1,90m na casa naquela noite. “A informação desmente o que elas falavam até então. Elas diziam que estavam na casa acompanhadas apenas dos pais até que eles decidiram sair para pagar um agiota. Mas ninguém leva um filho adolescente para ir pagar um suposto agiota violento”, disse Verduraz.
O pai era um executivo que havia deixado a empresa recentemente após 20 anos de serviço, o que lhe rendeu um bom valor. Ele já havia aberto duas lojas de perfumaria, uma das quais era administrada por Flaviana em um shopping de São Bernardo. A mulher saiu do shopping na segunda e chegou à casa por volta das 22h, segundo apontam as câmeras de segurança do condomínio.
Ao longo daquele dia, a polícia relata que o carro de Ana Flávia e Carina entrou e saiu do local várias vezes. Por volta da 1h da terça, os dois carros deixam o condomínio. Duas horas depois, o carro de Romuyuki e Flaviana foi encontrado incendiado em uma estrada.
Corpos foram identificados pela arcada dentária; objetos foram roubados da casa
Para identificá-los a polícia teve de recorrer ao exame de arcada dentária. O exame do médico legista apontou ainda ferimentos na cabeça das vítimas por um objeto contundente, como uma barra de ferro ou pedaço de pau. O laudo descreve os traumas cranioencefálicos. A polícia ainda não sabe o que foi usado exatamente para matar a família e ainda investiga se eles já estavam mortos quando foram queimados.
Na casa da família, em algum ponto da madrugada, foram roubados eletrodomésticos, cerca de R$ 8 mil, dólares, joias e uma arma, uma espingarda velha provavelmente já inutilizável. Os investigadores encontraram a casa revirada e com manchas de sangue, o que também foi encontrado em roupas de Ana Flávia. Testes estão sendo feitos para verificar a quem o sangue pertencia. “Todos os indícios do triplo homicídio apontam para elas e estamos caminhando para indiciá-las”, disse Verduraz.
Agora, os investigadores continuarão tomando depoimentos para entender a relação do casal com as vítimas e tentar chegar a outras informações sobre a madrugada do crime. Perícias foram realizadas na casa e nos carros da família e também poderão fornecer informações úteis. Os celulares das suspeitas estão sendo analisados.
Cronologia do caso
- Carro da família, um Jeep Compass chega ao condomínio por volta das 22h da segunda-feira, 27. Polícia acredita que esteja sendo dirigido por Flaviana. Na casa, estariam Romuyuki, Juan Victor, Ana Flávia e Carina, que havia chegado a pé poucas horas antes.
- Por volta da 1h da terça-feira, 28, o carro de Ana Flávia e o carro Compass, de Flaviana, saem do condomínio. A polícia acredita que parte das mortes já tinha ocorrido nesse momento e provavelmente os corpos estavam no porta-malas de algum dos carros. Flaviana estaria dirigindo sob ameaça das suspeitas.
- Perto das 3h da terça-feira, 28, a polícia é acionada para uma ocorrência envolvendo um carro incendiado na Estrada do Montanhão, em São Bernardo. No porta-malas do Compass, encontram corpos carbonizados, mas naquele momento não conseguem quantificar o número de vítimas. Os corpos são levados para o IML e identificados a partir da arcada dentária. Eram Romuyuki, Flaviana e Juan Victor.
- Na madrugada da terça, Ana Flávia e Carina prestam depoimento na polícia. Elas dizem que a família tinha uma dívida de R$ 200 mil com um agiota e que ele era violento. Acrescentam que Flaviana saiu de casa, de madrugada, para realizar o pagamento, e disse que iria para Minas Gerais na sequência. Informações levantam primeiras suspeitas da polícia, principalmente em razão da presença de Juan Victor num pagamento a um agiota de madrugada, o que é pouco provável.
- Outras contradições levam a polícia a apresentar à Justiça um pedido de prisão temporária de Ana Flávia e Carina. O pedido é deferido e elas são presas na noite de quarta-feira, 29. Elas ficarão presas por no mínimo 30 dias. A polícia não esclareceu qual motivo teria levado o casal a atacar a própria família.