O Tribunal de Justiça Militar (TJM) deve dar nesta quinta-feira, dia 12, a palavra final sobre um dos mais graves casos de violência policial registrados neste ano no interior paulista: o estupro de uma adolescente de 12 anos. O cabo Wellington Camargo da Silva teria cometido o crime com a conivência de Fernando Silva Teles por volta das 4h50 de 29 de abril no bairro da Ferradura Mirim, em Bauru, a cerca de 340 km da capital. Os policiais estavam sem câmera corporal.
A investigação e o processo do caso correram em segredo de Justiça. Os cabos foram presos e condenados em 8 de agosto pela 4.ª Auditoria da Justiça Militar a 9 anos e 7 meses de prisão pelo estupro e a 1 ano e 3 meses de prisão por abuso de autoridade. Um terceiro acusado – um soldado – foi absolvido. Os advogados dos policiais recorreram da decisão e é a apelação da defesa que será julgada pelo TJM, a 2.ª instância da Justiça Militar estadual. Os PMs alegam inocência e dizem que são vítimas de uma armação feita por traficantes de drogas.
De acordo com a denúncia apresentada pela promotora Giovana Ortolano Guerreiro, os acusados estavam de serviço quando foram acionados para averiguar uma denúncia sobre um homem que estaria armado num local que, segundo os policiais, era conhecido como ponto de venda de drogas. Três PMs entraram no terreno, onde havia três casas conjugadas, e um quarto policial ficou tomando conta das viaturas.
Alegando estar atrás de um suspeito que fugiu correndo em direção de uma viela, o cabo Silva Teles teria pulado a janela da residência de Wesley Aparecido da Silva. Entrou ali, segundo a promotoria, sem autorização do dono da casa e gritando “se todo mundo queria morrer”. “Constrangido, o proprietário da residência obedeceu à ordem ilegal e abriu a porta, a fim de que os outros policiais entrassem”, afirmou o Ministério Público.
Além de Wesley, estava ali sua namorada, Pamela Paola Josino da Silva, e a adolescente de 12 anos, amiga do casal, que ali pernoitava de acordo com a denúncia. “Em dado momento, o cabo PM Camargo dirigiu-se à menor e perguntou a sua data de nascimento, no entanto, por estar nervosa, a adolescente não soube responder, de pronto, motivando o militar a perder a paciência e o controle, ameaçando-a, dizendo que ‘ia dar um tapa na cara dela, se ela não se lembrasse’.”
De acordo com a denúncia, em seguida, em frente aos “demais civis, o cabo Camargo ordenou que a menor abaixasse a blusa que trajava, mas a adolescente, constrangida, abaixou somente parte do vestuário, momento em que o cabo tirou toda a blusa da menor, deixando-lhe os seios à mostra”. Ainda segundo a denúncia, o cabo Silva Teles, que estava no mesmo cômodo da casa, presenciou o fato e não fez nada para impedir o colega.
Para a promotora, ao se omitir, o cabo Silva Teles “aderiu à conduta delitiva do parceiro”. Na sequência, o cabo Camargo determinou que Wesley e Pamela se retirassem do cômodo, permanecendo somente ele e a adolescente. O policial abriu a porta de um guarda-roupas, de acordo com a promotoria, “no intuito de ocultar sua conduta delitiva, e mandou, violentamente, que a adolescente abaixasse, novamente, a blusa e a calça jeans que trajava”.
A denúncia descreve em seguida a violência sexual que teria sido feita pelo policial. “Mesmo causando dor extrema na adolescente, ele repetiu o ato por mais uma vez. Após, repreendeu a ofendida, dizendo que ‘ela estava muito para frente (do armário) e iria meter a mão na cara dela’ (sic). Toda a prática delitiva do cabo Camargo foi acobertada pelo cabo Silva Teles, que se manteve no cômodo vizinho, em poder dos proprietários da residência”, afirmou a denúncia da promotoria.
Mais que isso. Enquanto o colega permanecia com a menina, o cabo Silva Teles teria retirado drogas de uma sacola que trazia consigo e ameaçado o casal, perguntando “se era hoje que eles seriam presos”. Para a promotoria, os acusados cometeram crime de abuso de autoridade ao adentrarem, sem autorização e sem motivo que justificasse sua presença, no imóvel das vítimas, ameaçarem as vítimas, além de Camargo ter cometido crimes sexuais contra a adolescente, com a participação de Silva Teles, que concorreu para o cometimento dos delitos.
O casal ouviu a ordem do cabo para a adolescente e ainda o pedido da menina para que o militar parasse de abusá-la. Viram ainda a adolescente subindo sua calça, após o policial militar estuprá-la no cômodo ao lado. De acordo com as testemunhas, a adolescente entrou em choque. “No dia seguinte, sofreu um sangramento, além de ter sentido fortes dores na região pélvica e genital.” A adolescente estava na escola.
Ela voltou para casa e, só então, contou para sua mãe, que retornou à escola e foi orientada pelo diretor a procurar com urgência a Polícia Civil. O laudo pericial contatou a violência sexual. Foi, então, que a investigação foi aberta e a prisão dos cabos, pedida pela promotoria. Após a condenação em 1.ª instância, o Conselho Permanente de Sentença da 4.ª Auditoria Militar manteve a prisão dos réus.
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O cabo Silva Teles afirmou em sua defesa que não entrou em casa alguma. também negou ter abordado moradores e afirmou que não conhecia ninguém naquele endereço. Por fim, afirmou acreditar que as testemunhas atribuíram falsamente crimes a ele e a seu colega para afastá-los do patrulhamento da região, em razão da atuação firme que eles têm no combate ao tráfico de drogas.
Seu colega, o cabo Camargo, alegou o mesmo. Ele disse que ele e seus colegas são conhecidos no bairro porque incomodam o tráfico de drogas na área. “A equipe inteira foi denunciada pelos traficantes e nenhuma outra”, afirmou. Ele disse que “gosta de trabalhar e busca defender a sociedade”. E concluiu que não sabe por que está sendo acusado, “falsamente, pela menor”. Por fim, ele alegou que nunca foi processado.