Justiceiros e PMs fazem parceria para matar nos anos 80


Em 1987, Cabo Bruno tentou assassinar sobrevivente de chacina feita por policiais

Por Bruno Paes Manso

O padre irlandês Jaime Crowe chegou em fevereiro de 1987 ao Jardim Ângela, na zona sul da cidade, para comandar a Igreja Santos Mártires, um dos pilares da pacificação do bairro nos anos 2000. O prédio ainda estava em construção quando, em dezembro, no ano de sua chegada, um menino veio chamá-lo para atender a um homem armado, com bigodes negros e grossos. Diante dele, estava o mais famoso justiceiro da zona sul: Florisvaldo de Oliveira, ex-policial conhecido como Cabo Bruno, que não se identificou e pediu para dormir na igreja. "Era Dia dos Direitos Humanos, 10 de dezembro, eu nunca me esqueço. Eu não sabia que era o Cabo Bruno."Em tese, Cabo Bruno deveria estar no Romão Gomes, presídio da Polícia Militar onde cumpria pena por seus crimes. Mas, naquela madrugada, ele buscava Pirulito, filho de dona Luzia, moradora do Jardim Ângela. Três anos antes, Pirulito havia sido o único sobrevivente de uma chacina praticada por PMs contra quatro jovens. E testemunharia nos próximos dias. Para que ficasse em silêncio, levou 15 tiros. Cabo Bruno fugiria oficialmente do Romão Gomes depois do atentado, na noite de Natal. "Essa é a história de Pirulito que me revelou a parceria entre os PMs e justiceiros", diz o padre. Os detalhes da parceria foram para o túmulo de Florisvaldo de Oliveira, morto há duas semanas. Assassinatos praticados por policiais para coibir roubos acaram incentivando as escolhas homicidas dos justiceiros. Como eram tolerados pelas autoridades, viraram opção popular. Os justiceiros eram bancados por comerciantes, assim como, na década anterior, industriais paulistas já haviam financiado ações nos porões do regime militar. A estimativa é de que os justiceiros tenham matado pelo menos mil pessoas na Grande São Paulo.Conforme os assassinatos cresciam, a população das periferias começava a reagir aos corpos no meio da rua e às pequenas tragédias cotidianas. Em vez de aumentar a sensação de segurança, as ações homicidas acabavam armando os espíritos e produzindo novos assassinatos. Cada novo caso instigava a compra de revólveres, a formação de grupos rivais e círculos de vingança. Comerciante em Diadema nos anos 1980, Laércio Soares andava com duas armas na cintura para se proteger nos campinhos de várzea da cidade. Ele e outros pequenos empresários também pagavam advogados para defender os justiceiros locais. Com raras exceções, os justiceiros eram migrantes rurais apegados aos valores tradicionais das pequenas cidades onde nasceram. Chegavam acreditando nas oportunidades oferecidas por São Paulo. Matavam aqueles que viam como "bandidos", integrantes da geração de jovens urbanos, descendentes de migrantes, que negavam os valores dos pais e buscavam uma identidade própria. Jovens de uma geração que acabou sendo dizimada na São Paulo dos anos 1980 e 1990.

O padre irlandês Jaime Crowe chegou em fevereiro de 1987 ao Jardim Ângela, na zona sul da cidade, para comandar a Igreja Santos Mártires, um dos pilares da pacificação do bairro nos anos 2000. O prédio ainda estava em construção quando, em dezembro, no ano de sua chegada, um menino veio chamá-lo para atender a um homem armado, com bigodes negros e grossos. Diante dele, estava o mais famoso justiceiro da zona sul: Florisvaldo de Oliveira, ex-policial conhecido como Cabo Bruno, que não se identificou e pediu para dormir na igreja. "Era Dia dos Direitos Humanos, 10 de dezembro, eu nunca me esqueço. Eu não sabia que era o Cabo Bruno."Em tese, Cabo Bruno deveria estar no Romão Gomes, presídio da Polícia Militar onde cumpria pena por seus crimes. Mas, naquela madrugada, ele buscava Pirulito, filho de dona Luzia, moradora do Jardim Ângela. Três anos antes, Pirulito havia sido o único sobrevivente de uma chacina praticada por PMs contra quatro jovens. E testemunharia nos próximos dias. Para que ficasse em silêncio, levou 15 tiros. Cabo Bruno fugiria oficialmente do Romão Gomes depois do atentado, na noite de Natal. "Essa é a história de Pirulito que me revelou a parceria entre os PMs e justiceiros", diz o padre. Os detalhes da parceria foram para o túmulo de Florisvaldo de Oliveira, morto há duas semanas. Assassinatos praticados por policiais para coibir roubos acaram incentivando as escolhas homicidas dos justiceiros. Como eram tolerados pelas autoridades, viraram opção popular. Os justiceiros eram bancados por comerciantes, assim como, na década anterior, industriais paulistas já haviam financiado ações nos porões do regime militar. A estimativa é de que os justiceiros tenham matado pelo menos mil pessoas na Grande São Paulo.Conforme os assassinatos cresciam, a população das periferias começava a reagir aos corpos no meio da rua e às pequenas tragédias cotidianas. Em vez de aumentar a sensação de segurança, as ações homicidas acabavam armando os espíritos e produzindo novos assassinatos. Cada novo caso instigava a compra de revólveres, a formação de grupos rivais e círculos de vingança. Comerciante em Diadema nos anos 1980, Laércio Soares andava com duas armas na cintura para se proteger nos campinhos de várzea da cidade. Ele e outros pequenos empresários também pagavam advogados para defender os justiceiros locais. Com raras exceções, os justiceiros eram migrantes rurais apegados aos valores tradicionais das pequenas cidades onde nasceram. Chegavam acreditando nas oportunidades oferecidas por São Paulo. Matavam aqueles que viam como "bandidos", integrantes da geração de jovens urbanos, descendentes de migrantes, que negavam os valores dos pais e buscavam uma identidade própria. Jovens de uma geração que acabou sendo dizimada na São Paulo dos anos 1980 e 1990.

O padre irlandês Jaime Crowe chegou em fevereiro de 1987 ao Jardim Ângela, na zona sul da cidade, para comandar a Igreja Santos Mártires, um dos pilares da pacificação do bairro nos anos 2000. O prédio ainda estava em construção quando, em dezembro, no ano de sua chegada, um menino veio chamá-lo para atender a um homem armado, com bigodes negros e grossos. Diante dele, estava o mais famoso justiceiro da zona sul: Florisvaldo de Oliveira, ex-policial conhecido como Cabo Bruno, que não se identificou e pediu para dormir na igreja. "Era Dia dos Direitos Humanos, 10 de dezembro, eu nunca me esqueço. Eu não sabia que era o Cabo Bruno."Em tese, Cabo Bruno deveria estar no Romão Gomes, presídio da Polícia Militar onde cumpria pena por seus crimes. Mas, naquela madrugada, ele buscava Pirulito, filho de dona Luzia, moradora do Jardim Ângela. Três anos antes, Pirulito havia sido o único sobrevivente de uma chacina praticada por PMs contra quatro jovens. E testemunharia nos próximos dias. Para que ficasse em silêncio, levou 15 tiros. Cabo Bruno fugiria oficialmente do Romão Gomes depois do atentado, na noite de Natal. "Essa é a história de Pirulito que me revelou a parceria entre os PMs e justiceiros", diz o padre. Os detalhes da parceria foram para o túmulo de Florisvaldo de Oliveira, morto há duas semanas. Assassinatos praticados por policiais para coibir roubos acaram incentivando as escolhas homicidas dos justiceiros. Como eram tolerados pelas autoridades, viraram opção popular. Os justiceiros eram bancados por comerciantes, assim como, na década anterior, industriais paulistas já haviam financiado ações nos porões do regime militar. A estimativa é de que os justiceiros tenham matado pelo menos mil pessoas na Grande São Paulo.Conforme os assassinatos cresciam, a população das periferias começava a reagir aos corpos no meio da rua e às pequenas tragédias cotidianas. Em vez de aumentar a sensação de segurança, as ações homicidas acabavam armando os espíritos e produzindo novos assassinatos. Cada novo caso instigava a compra de revólveres, a formação de grupos rivais e círculos de vingança. Comerciante em Diadema nos anos 1980, Laércio Soares andava com duas armas na cintura para se proteger nos campinhos de várzea da cidade. Ele e outros pequenos empresários também pagavam advogados para defender os justiceiros locais. Com raras exceções, os justiceiros eram migrantes rurais apegados aos valores tradicionais das pequenas cidades onde nasceram. Chegavam acreditando nas oportunidades oferecidas por São Paulo. Matavam aqueles que viam como "bandidos", integrantes da geração de jovens urbanos, descendentes de migrantes, que negavam os valores dos pais e buscavam uma identidade própria. Jovens de uma geração que acabou sendo dizimada na São Paulo dos anos 1980 e 1990.

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