Zoneamento: associações querem impedir prédios em bairros restritos a casas; saiba como


Emendas à ‘minirrevisão’ reclassificaram parte das zonas exclusivamente residenciais, como trechos da Vila Nova Conceição e Cidade Jardim; processo foi transparente e legal, diz Câmara

Por Priscila Mengue
Atualização:

Após a aprovação da “minirrevisão” da Lei de Zoneamento na Câmara, ao menos 24 associações de bairros nobres das zonas oeste e sul de São Paulo estão se organizando para contestar judicialmente as emendas que abrem brechas para a construção de prédios em parte das Zonas Exclusivamente Residenciais (ZERs) da cidade. As mudanças impactam especialmente a Cidade Jardim e a Vila Nova Conceição.

Os grupos defendem o veto do prefeito Ricardo Nunes (MDB) ao projeto de lei, cuja sanção está em análise e deve ser decidida ainda neste mês. Em nota, a presidência da Câmara, do vereador Milton Leite (União Brasil), e a relatoria da “minirrevisão”, de Rodrigo Goulart (PSD), defenderam que a tramitação do projeto e a aprovação ocorreram de “forma legal, com participação popular e transparência”.

A nota também destaca que a aprovação das mudanças no zoneamento ocorreram na parte da tarde, “não na calada da noite”. A votação daquele dia se estendeu até a madrugada, mas relativa a outros projetos de lei.

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Além disso, salientou, a apresentação de emendas é “prerrogativa de cada parlamentar” e estavam disponíveis para consulta em audiência pública na segunda-feira, 1º, e publicadas no Diário Oficial do dia seguinte. “Portanto, também não cabe falar em falta de transparência nem em falta de participação popular”, concluiu.

As emendas criticadas pelas associações são de autoria do vereador Isac Félix (PL). Na semana passada, o parlamentar havia justificado ao Estadão que parte das mudanças envolve “ajuste que se faz necessário para adequar a transição e preservação das características locais”. Procurado novamente, não se manifestou até o momento.

Alterações no zoneamento liberam prédios em parte de zona restrita a casas na Cidade Jardim Foto: Felipe Rau/Estadão - 24/04/2024
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Do total, 12 das associações enviaram moção de repúdio ao Ministério Público de São Paulo (MP-SP) na segunda-feira, 8. O texto diz representar parte dos moradores, proprietários, comerciantes e empresários de diferentes bairros, no qual pedem o veto pelo prefeito e a abertura de ação civil pública pela Promotoria.

As entidades também apontam a possibilidade de abrirem conjuntamente uma ação popular. Há, ainda, outro manifesto de repúdio assinado por 14 organizações, duas signatárias da moção.

Ao Estadão, a Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo confirmou ter recebido representação por escrito assinada pelas associações, a qual será incorporada ao inquérito civil aberto desde o ano passado. Destacou, ainda, que pedidos de suspensão temporária da “minirrevisão” foram indeferidos pela Justiça em 1ª e 2ª instâncias em junho.

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Dessa forma, a Promotoria diz ter recomendado que o prefeito tome a decisão final sobre a sanção com base em “subsídios técnicos” e “questões já identificadas quanto ao seu trâmite” na Câmara. Também ressaltou que “aguardará o término da fase em curso”, a fim de, se for o caso, encaminhar recomendação de ação direta de inconstitucionalidade à Procuradoria-Geral de Justiça.

Especialistas ouvidos pelo Estadão avaliam que as alterações nas zonas exclusivamente residenciais estão em desacordo com as diretrizes principais da legislação urbana vigente em São Paulo, de modo que podem ser contestadas judicialmente.

Também consideram que uma mudança dessa magnitude somente poderia ocorrer após estudos e discussão em audiências públicas e em órgãos colegiados da Prefeitura. Isto é, não por meio de emenda publicada no dia da votação.

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Além dos casos citados, associações de Alto de Pinheiros e da Cidade Jardim também têm se organizado nos últimos meses para contestar judicialmente alterações no zoneamento que entraram em vigor este ano. Essas mudanças também envolvem vizinhanças ligadas às zonas restritas a casas.

O zoneamento e o Plano Diretor determinam o regramento de diversos aspectos do dia a dia — como limite de barulho, altura máxima das construções e tipos de comércios permitidos — e, também, delimitam onde ocorrerão as principais transformações, como por meio de incentivos a novos apartamentos perto de estações de metrô e a indicação de parques a serem criados, por exemplo.

Em agenda pública no começo do mês, Nunes sinalizou que poderá fazer vetos à “minirrevisão” se forem recomendados pelos técnicos da prefeitura. O Município tem 15 dias úteis para a decisão final, contados a partir do recebimento da carta de lei, ocorrido no dia 4.

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Como a “minirrevisão” abriu brecha para prédios em parte dos bairros restritos a casas?

Após a aprovação do projeto de lei da “minirrevisão” na terça-feira, 2, os vereadores aprovaram 40 emendas ao texto, a maioria com alterações na classificação de quadras da cidade. Como revelou o Estadão, uma delas abre brecha para a verticalização de regiões exclusivamente de casas há décadas na cidade, como em trechos de Alto de Pinheiros, na zona oeste, e Morumbi, na sul, dentre outros.

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A mudança permite que quadras próximas a acessos de metrô, trem e corredor de ônibus virem “eixo de verticalização” mesmo que nas áreas classificadas hoje como Zona Exclusivamente Residencial (ZER).

Essa alteração não é, contudo, automática, pois depende de mudanças na classificação de cada local da cidade no mapa — o que ocorreu, a princípio, exclusivamente em uma quadra da Vila Nova Conceição, no distrito de Moema.

Embora incluída na “minirrevisão do zoneamento”, a mudança altera diretrizes do Plano Diretor. A nova emenda retira as ZERs da lista de locais excluídos das “áreas de influência” das Zonas Eixo de Estruturação da Transformação Urbana (ZEUs).

Isto é, podem passar a ter essa classificação quando localizadas nas vizinhanças de acessos a metrô, trem e corredor de ônibus. Esses locais têm incentivos construtivos atrativos ao mercado imobiliário, de modo que concentram a maioria dos apartamentos lançados na cidade.

Enquanto o limite de altura em uma ZER é de 10 metros, não há gabarito máximo em uma zona de eixo. Áreas desse tipo têm diversos incentivos construtivos, a fim de aumentar a população que reside perto de transporte coletivo de média e alta capacidade.

A mudança não envolve todas as ZERs, pois parte delas está distante de metrô, trem e corredor de ônibus (como o entorno do Parque Cidade Toronto, na zona norte) ou envolve bairros tombados (Jardins e Pacaembu, por exemplo).

Dentre as quadras que poderiam ser afetadas, estão entornos das Estações São Paulo-Morumbi e Vila Sônia, da Linha 4-Amarela, da Estação Sumaré, da Linha 2-Verde, e da Estação Cidade Universitária (em Alto de Pinheiros), da Linha 9-Esmeralda.

Também poderia incidir futuramente sobre vizinhanças onde há expectativa de obras de metrô, monotrilho e trem, como da possível Estação Cerro Corá, da expansão da Linha 2-Verde à oeste, e da Estação Indianópolis, da Linha 20-Rosa, dentre outros exemplos.

Entorno da Praça Panamerica, em Alto de Pinheiros, está nas proximidades de estação de trem e poderia ser impactado por emenda aprovada na Câmara Foto: Felipe Rau/Estadão

A emenda é do vereador Isac Félix (PL). Ao Estadão, por meio da assessoria de imprensa, o parlamentar respondeu na semana passada que as justificativas estão nas emendas.

Nesse caso, havia justificado que “após a implantação de sistema de transporte público coletivo em novos pontos da cidade, onde antes tínhamos apenas residências unifamiliares, nada mais natural do que atender ao texto explícito no capítulo II” do Estatuto da Cidade.

Em seguida, a justificativa traz três trechos do estatuto (que é uma lei federal), como o que fala da “universalização do acesso aos benefícios e às comodidades da vida urbana por parte de todos os cidadãos, seja pela oferta e uso dos serviços, equipamentos e infraestruturas públicas”.

Como a “minirrevisão” altera o zoneamento da Vila Nova Conceição?

Dentre as emendas aprovadas, uma delas transforma parte de uma zona restrita a casas na Vila Nova Conceição em Zona Eixo de Estruturação da Transformação Urbana (ZEU). A mudança envolve uma quadra delimitada pelas Ruas Jacques Félix, Professor Filadelfo Azevedo, Domingos Leme e João Lourenço.

Hoje, esse perímetro é dividido em zona restrita a casas (ZER) e Zona Corredor (ZCOR). Esses corredores permitem alguns tipos de comércios e serviços, mas horizontais, com limite de altura de cerca de 10 metros.

Com a alteração, essa quadra terá incentivos municipais para construir prédios sem limite de altura, tornando-se “eixo de verticalização”. Isso porque está nas proximidades do corredor de ônibus da Avenida Santo Amaro.

Presidente da Associação dos Moradores da Vila Nova Conceição, Marcus Abrantes disse ao Estadão que a organização começou a se organizar contrariamente às mudanças na quinta-feira, 4. “Esperamos que sirva para subsidiar a Prefeitura, para que faça o veto”, aponta. Ele critica a forma como as emendas foram divulgadas.

Na véspera da votação, as emendas foram impressas e disponibilizadas para leitura durante a audiência pública na Câmara, mas o conteúdo não foi apresentado ou debatido. Também foram publicadas no Diário Oficial do dia seguinte, assim como foram lidas rapidamente lidas durante a votação (a leitura da emenda que altera a ZER levou menos de 40 segundos, como identificou o Estadão).

O que muda na Cidade Jardim?

A Zona Exclusivamente Residencial da Cidade Jardim passou por novas mudanças aprovadas por emenda na semana passada, assim como outras foram feitas na revisão do zoneamento do ano passado. A Sociedade Amigos Cidade Jardim contratou um advogado nesta quarta-feira, 10, para contestar as mudanças, segundo o presidente da organização, Marcelo Gatti Reis Lobo, confirmou ao Estadão.

Ambas envolvem quadras no entorno do Jockey Club, cuja transformação em parque é proposta pela nova lei do Plano Diretor e cujas atividades podem ser impactadas pela nova lei que proíbe corridas de animais ligadas a apostas (os efeitos foram temporariamente suspensos pela Justiça).

A alteração aprovada mais recentemente abrange a Rua Taques Alvim, a Avenida das Acácias e a Rua Jaguanambi, que passam a ser uma Zona Mista (ZM), a qual permite prédios medianos e diversos tipos de comércios e serviços.

A emenda é de autoria do vereador Isac Félix (PL). Procurado pelo Estadão, ressaltou que a “proposta visa a estabelecer uma zona de transição, como amortecimento ao bairro, para preservar suas características e, ao mesmo tempo, (se) adequar às dinâmicas da Lei de Zoneamento”. Além disso, na emenda, justificou que a Avenida das Acácias teria um “fluxo de veículos maior”.

Emenda altera zoneamento de vias da Cidade Jardim Foto: Google Street View/Reprodução

Outra mudança na vizinhança entrou em vigor em abril após os vereadores derrubarem parte dos vetos feitos pelo prefeito à revisão do zoneamento. As alterações feitas em abril liberaram a construção de prédios e atividades de comércios e de serviços variadas na Rua Doutor José Augusto de Queiroz, na Rua Severo Dumont, na Rua Doutor Alberto da Silveira, na Rua Fonseca Teixeira e em outras vias da Cidade Jardim.

Nesse caso, a alteração transformou parte das ZERs e das Zonas Corredor (ZCor) da Cidade Jardim em Zona Eixo de Estruturação da Transformação Metropolitana (ZEM). A nova classificação foi instituída em cerca de 200 imóveis do bairro, incluindo ainda uma quadra que antes era Zona Mista (na qual já eram permitidos predinhos).

A mudança permitiu ampla variedade de serviços comerciais e de serviços. Além disso, dá aval à construção de prédios com até 28 metros de altura e o dobro do volume construtivo permitido hoje (limitado a uma vez a área do terreno e 10 metros de altura) em ZER e ZCOR.

A alteração só foi possível por meio da determinação de uma nova descrição para esse tipo de zona, promulgada na Lei de Zoneamento revisada. O Estadão identificou que essa mudança foi proposta em emenda do vereador Sidney Cruz (MDB).

Procurado à época, o vereador justificou que as emendas foram propostas após a identificação de que algumas áreas na cidade “estavam deterioradas e necessitavam de adequações urbanísticas”. Também alegou que a mudança envolve “localização estratégica para o desenvolvimento urbano do município” e que teve o objetivo de promoção de novas atividades, “revitalização urbana” e “maior dinamismo”.

Como fica Alto de Pinheiros?

Por enquanto, não há alterações específicas na ZER de Alto de Pinheiros. A aprovação da emenda que permite a transformação dessas zonas em eixo de verticalização é, contudo, criticada pela Associação dos Amigos de Alto de Pinheiros (Saap).

Em abril, a associação já havia procurado o MPSP a respeito de mudanças no zoneamento de parte das Zonas Corredor do bairro, transformadas em Zona de Centralidade pela revisão aprovada no ano passado. Essa nova classificação abrange quadras próximas à marginal, na Avenida Doutora Ruth Cardoso, com a permissão de prédios de até 48 metros.

A situação é contestada porque esses corredores eram voltados a permitir comércios no entorno de áreas estritamente residenciais. Com a transformação em Zona de Centralidade, as áreas exclusivas de casas perdem esse “cinturão protetivo”.

“Agora veio essa segunda surpresa de novo”, diz a presidente da Saap, Maria Helena Bueno sobre a emenda que abre brecha para mudanças em ZERs. “Queremos o bairro estritamente residencial”, aponta ela, que não é contrária a algumas mudanças (como o aval a mais condomínios de casas) desde que discutidas.

Câmara aprovou "minirrevisão" do zoneamento na semana passada Foto: Felipe Rau/Estadão

O que está na moção e no manifesto de repúdio? Quais associações assinam?

A moção enviada ao MP diz que as emendas que alteram as ZERs seriam irregulares e inconstitucionais. Também defende que mudanças nessas zonas somente poderiam ocorrer após estudos, planejamento e discussão.

“A aprovação de uma emenda desconhecida pela população viola a nossa Constituição Federal, uma vez que resta evidenciado o descumprimento da participação cidadã e do controle social”, argumenta, dentre outros pontos.

O texto é assinado pelas seguintes organizações:

  • Associação dos Moradores da Vila Nova Conceição
  • Associação Viva Moema
  • Associação de Moradores da Vila Mariana
  • Associação dos Moradores do Jardim Lusitânia
  • Associação de Moradores Bairro Paraíso
  • Amigos do Novo Mundo Associados
  • Associação Nossa Guarapiranga
  • Associação de Moradores e Empresas do Brooklin Novo
  • Ame Jardins
  • Associação dos Amigos de Alto de Pinheiros
  • Associação dos Amigos de Alto de Boa Vista
  • Sociedade dos Amigos de Bairro do Jardim Marajoara

Já o manifesto de repúdio chama a “minirrevisão” de “ilegal e autoritária”. “Efetivaram alterações substanciais no uso e ocupação do solo, tudo sem nenhum estudo técnico”, apontam.

No texto, são defendidas “imediatas providências dos poderes constituídos” para que o projeto não seja sancionado por Nunes. No caso de transformação em lei, argumentam que seja judicializada “pelas organizações competentes em razão da notória inconstitucionalidade”.

“Estamos solicitando adesões das entidades para tomarmos uma atitude coletivamente contra esta conduta ilegal da Câmara”, afirmou ao Estadão a arquiteta e urbanista Lucila Lacreta, diretora executiva do Movimento Defenda São Paulo. Dentre os pontos criticados, está a falta de estudos da capacidade de suporte para atender ao possível aumento de potencial construtivo.

Os signatários até o momento são:

  • Movimento Defenda São Paulo
  • Sociedade Moradores Butantã-Cidade Universitária
  • Associação dos Moradores Amigos do Parque Previdência
  • Associação dos Proprietários do Residencial Parque dos Príncipes
  • Associação Amigos do Jardim das Bandeiras
  • Ciranda
  • Sociedade Amigos da Cidade Jardim
  • Sociedade dos Amigos do Bairro City Boaçava
  • Sociedade Amigos dos Jardins América, Europa, Paulista e Paulistano
  • Associação dos Amigos e Moradores pela Preservação do Alto da Lapa e Bela Aliança
  • Associação de Moradores da Vila Mariana
  • Associação dos Amigos e Moradores do Jardim Lusitânia
  • Sociedade da Vila Paulista
  • Associação Cultural e Comunitária Vila dos Heróis

Após a aprovação da “minirrevisão” da Lei de Zoneamento na Câmara, ao menos 24 associações de bairros nobres das zonas oeste e sul de São Paulo estão se organizando para contestar judicialmente as emendas que abrem brechas para a construção de prédios em parte das Zonas Exclusivamente Residenciais (ZERs) da cidade. As mudanças impactam especialmente a Cidade Jardim e a Vila Nova Conceição.

Os grupos defendem o veto do prefeito Ricardo Nunes (MDB) ao projeto de lei, cuja sanção está em análise e deve ser decidida ainda neste mês. Em nota, a presidência da Câmara, do vereador Milton Leite (União Brasil), e a relatoria da “minirrevisão”, de Rodrigo Goulart (PSD), defenderam que a tramitação do projeto e a aprovação ocorreram de “forma legal, com participação popular e transparência”.

A nota também destaca que a aprovação das mudanças no zoneamento ocorreram na parte da tarde, “não na calada da noite”. A votação daquele dia se estendeu até a madrugada, mas relativa a outros projetos de lei.

Além disso, salientou, a apresentação de emendas é “prerrogativa de cada parlamentar” e estavam disponíveis para consulta em audiência pública na segunda-feira, 1º, e publicadas no Diário Oficial do dia seguinte. “Portanto, também não cabe falar em falta de transparência nem em falta de participação popular”, concluiu.

As emendas criticadas pelas associações são de autoria do vereador Isac Félix (PL). Na semana passada, o parlamentar havia justificado ao Estadão que parte das mudanças envolve “ajuste que se faz necessário para adequar a transição e preservação das características locais”. Procurado novamente, não se manifestou até o momento.

Alterações no zoneamento liberam prédios em parte de zona restrita a casas na Cidade Jardim Foto: Felipe Rau/Estadão - 24/04/2024

Do total, 12 das associações enviaram moção de repúdio ao Ministério Público de São Paulo (MP-SP) na segunda-feira, 8. O texto diz representar parte dos moradores, proprietários, comerciantes e empresários de diferentes bairros, no qual pedem o veto pelo prefeito e a abertura de ação civil pública pela Promotoria.

As entidades também apontam a possibilidade de abrirem conjuntamente uma ação popular. Há, ainda, outro manifesto de repúdio assinado por 14 organizações, duas signatárias da moção.

Ao Estadão, a Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo confirmou ter recebido representação por escrito assinada pelas associações, a qual será incorporada ao inquérito civil aberto desde o ano passado. Destacou, ainda, que pedidos de suspensão temporária da “minirrevisão” foram indeferidos pela Justiça em 1ª e 2ª instâncias em junho.

Dessa forma, a Promotoria diz ter recomendado que o prefeito tome a decisão final sobre a sanção com base em “subsídios técnicos” e “questões já identificadas quanto ao seu trâmite” na Câmara. Também ressaltou que “aguardará o término da fase em curso”, a fim de, se for o caso, encaminhar recomendação de ação direta de inconstitucionalidade à Procuradoria-Geral de Justiça.

Especialistas ouvidos pelo Estadão avaliam que as alterações nas zonas exclusivamente residenciais estão em desacordo com as diretrizes principais da legislação urbana vigente em São Paulo, de modo que podem ser contestadas judicialmente.

Também consideram que uma mudança dessa magnitude somente poderia ocorrer após estudos e discussão em audiências públicas e em órgãos colegiados da Prefeitura. Isto é, não por meio de emenda publicada no dia da votação.

Além dos casos citados, associações de Alto de Pinheiros e da Cidade Jardim também têm se organizado nos últimos meses para contestar judicialmente alterações no zoneamento que entraram em vigor este ano. Essas mudanças também envolvem vizinhanças ligadas às zonas restritas a casas.

O zoneamento e o Plano Diretor determinam o regramento de diversos aspectos do dia a dia — como limite de barulho, altura máxima das construções e tipos de comércios permitidos — e, também, delimitam onde ocorrerão as principais transformações, como por meio de incentivos a novos apartamentos perto de estações de metrô e a indicação de parques a serem criados, por exemplo.

Em agenda pública no começo do mês, Nunes sinalizou que poderá fazer vetos à “minirrevisão” se forem recomendados pelos técnicos da prefeitura. O Município tem 15 dias úteis para a decisão final, contados a partir do recebimento da carta de lei, ocorrido no dia 4.

Como a “minirrevisão” abriu brecha para prédios em parte dos bairros restritos a casas?

Após a aprovação do projeto de lei da “minirrevisão” na terça-feira, 2, os vereadores aprovaram 40 emendas ao texto, a maioria com alterações na classificação de quadras da cidade. Como revelou o Estadão, uma delas abre brecha para a verticalização de regiões exclusivamente de casas há décadas na cidade, como em trechos de Alto de Pinheiros, na zona oeste, e Morumbi, na sul, dentre outros.

A mudança permite que quadras próximas a acessos de metrô, trem e corredor de ônibus virem “eixo de verticalização” mesmo que nas áreas classificadas hoje como Zona Exclusivamente Residencial (ZER).

Essa alteração não é, contudo, automática, pois depende de mudanças na classificação de cada local da cidade no mapa — o que ocorreu, a princípio, exclusivamente em uma quadra da Vila Nova Conceição, no distrito de Moema.

Embora incluída na “minirrevisão do zoneamento”, a mudança altera diretrizes do Plano Diretor. A nova emenda retira as ZERs da lista de locais excluídos das “áreas de influência” das Zonas Eixo de Estruturação da Transformação Urbana (ZEUs).

Isto é, podem passar a ter essa classificação quando localizadas nas vizinhanças de acessos a metrô, trem e corredor de ônibus. Esses locais têm incentivos construtivos atrativos ao mercado imobiliário, de modo que concentram a maioria dos apartamentos lançados na cidade.

Enquanto o limite de altura em uma ZER é de 10 metros, não há gabarito máximo em uma zona de eixo. Áreas desse tipo têm diversos incentivos construtivos, a fim de aumentar a população que reside perto de transporte coletivo de média e alta capacidade.

A mudança não envolve todas as ZERs, pois parte delas está distante de metrô, trem e corredor de ônibus (como o entorno do Parque Cidade Toronto, na zona norte) ou envolve bairros tombados (Jardins e Pacaembu, por exemplo).

Dentre as quadras que poderiam ser afetadas, estão entornos das Estações São Paulo-Morumbi e Vila Sônia, da Linha 4-Amarela, da Estação Sumaré, da Linha 2-Verde, e da Estação Cidade Universitária (em Alto de Pinheiros), da Linha 9-Esmeralda.

Também poderia incidir futuramente sobre vizinhanças onde há expectativa de obras de metrô, monotrilho e trem, como da possível Estação Cerro Corá, da expansão da Linha 2-Verde à oeste, e da Estação Indianópolis, da Linha 20-Rosa, dentre outros exemplos.

Entorno da Praça Panamerica, em Alto de Pinheiros, está nas proximidades de estação de trem e poderia ser impactado por emenda aprovada na Câmara Foto: Felipe Rau/Estadão

A emenda é do vereador Isac Félix (PL). Ao Estadão, por meio da assessoria de imprensa, o parlamentar respondeu na semana passada que as justificativas estão nas emendas.

Nesse caso, havia justificado que “após a implantação de sistema de transporte público coletivo em novos pontos da cidade, onde antes tínhamos apenas residências unifamiliares, nada mais natural do que atender ao texto explícito no capítulo II” do Estatuto da Cidade.

Em seguida, a justificativa traz três trechos do estatuto (que é uma lei federal), como o que fala da “universalização do acesso aos benefícios e às comodidades da vida urbana por parte de todos os cidadãos, seja pela oferta e uso dos serviços, equipamentos e infraestruturas públicas”.

Como a “minirrevisão” altera o zoneamento da Vila Nova Conceição?

Dentre as emendas aprovadas, uma delas transforma parte de uma zona restrita a casas na Vila Nova Conceição em Zona Eixo de Estruturação da Transformação Urbana (ZEU). A mudança envolve uma quadra delimitada pelas Ruas Jacques Félix, Professor Filadelfo Azevedo, Domingos Leme e João Lourenço.

Hoje, esse perímetro é dividido em zona restrita a casas (ZER) e Zona Corredor (ZCOR). Esses corredores permitem alguns tipos de comércios e serviços, mas horizontais, com limite de altura de cerca de 10 metros.

Com a alteração, essa quadra terá incentivos municipais para construir prédios sem limite de altura, tornando-se “eixo de verticalização”. Isso porque está nas proximidades do corredor de ônibus da Avenida Santo Amaro.

Presidente da Associação dos Moradores da Vila Nova Conceição, Marcus Abrantes disse ao Estadão que a organização começou a se organizar contrariamente às mudanças na quinta-feira, 4. “Esperamos que sirva para subsidiar a Prefeitura, para que faça o veto”, aponta. Ele critica a forma como as emendas foram divulgadas.

Na véspera da votação, as emendas foram impressas e disponibilizadas para leitura durante a audiência pública na Câmara, mas o conteúdo não foi apresentado ou debatido. Também foram publicadas no Diário Oficial do dia seguinte, assim como foram lidas rapidamente lidas durante a votação (a leitura da emenda que altera a ZER levou menos de 40 segundos, como identificou o Estadão).

O que muda na Cidade Jardim?

A Zona Exclusivamente Residencial da Cidade Jardim passou por novas mudanças aprovadas por emenda na semana passada, assim como outras foram feitas na revisão do zoneamento do ano passado. A Sociedade Amigos Cidade Jardim contratou um advogado nesta quarta-feira, 10, para contestar as mudanças, segundo o presidente da organização, Marcelo Gatti Reis Lobo, confirmou ao Estadão.

Ambas envolvem quadras no entorno do Jockey Club, cuja transformação em parque é proposta pela nova lei do Plano Diretor e cujas atividades podem ser impactadas pela nova lei que proíbe corridas de animais ligadas a apostas (os efeitos foram temporariamente suspensos pela Justiça).

A alteração aprovada mais recentemente abrange a Rua Taques Alvim, a Avenida das Acácias e a Rua Jaguanambi, que passam a ser uma Zona Mista (ZM), a qual permite prédios medianos e diversos tipos de comércios e serviços.

A emenda é de autoria do vereador Isac Félix (PL). Procurado pelo Estadão, ressaltou que a “proposta visa a estabelecer uma zona de transição, como amortecimento ao bairro, para preservar suas características e, ao mesmo tempo, (se) adequar às dinâmicas da Lei de Zoneamento”. Além disso, na emenda, justificou que a Avenida das Acácias teria um “fluxo de veículos maior”.

Emenda altera zoneamento de vias da Cidade Jardim Foto: Google Street View/Reprodução

Outra mudança na vizinhança entrou em vigor em abril após os vereadores derrubarem parte dos vetos feitos pelo prefeito à revisão do zoneamento. As alterações feitas em abril liberaram a construção de prédios e atividades de comércios e de serviços variadas na Rua Doutor José Augusto de Queiroz, na Rua Severo Dumont, na Rua Doutor Alberto da Silveira, na Rua Fonseca Teixeira e em outras vias da Cidade Jardim.

Nesse caso, a alteração transformou parte das ZERs e das Zonas Corredor (ZCor) da Cidade Jardim em Zona Eixo de Estruturação da Transformação Metropolitana (ZEM). A nova classificação foi instituída em cerca de 200 imóveis do bairro, incluindo ainda uma quadra que antes era Zona Mista (na qual já eram permitidos predinhos).

A mudança permitiu ampla variedade de serviços comerciais e de serviços. Além disso, dá aval à construção de prédios com até 28 metros de altura e o dobro do volume construtivo permitido hoje (limitado a uma vez a área do terreno e 10 metros de altura) em ZER e ZCOR.

A alteração só foi possível por meio da determinação de uma nova descrição para esse tipo de zona, promulgada na Lei de Zoneamento revisada. O Estadão identificou que essa mudança foi proposta em emenda do vereador Sidney Cruz (MDB).

Procurado à época, o vereador justificou que as emendas foram propostas após a identificação de que algumas áreas na cidade “estavam deterioradas e necessitavam de adequações urbanísticas”. Também alegou que a mudança envolve “localização estratégica para o desenvolvimento urbano do município” e que teve o objetivo de promoção de novas atividades, “revitalização urbana” e “maior dinamismo”.

Como fica Alto de Pinheiros?

Por enquanto, não há alterações específicas na ZER de Alto de Pinheiros. A aprovação da emenda que permite a transformação dessas zonas em eixo de verticalização é, contudo, criticada pela Associação dos Amigos de Alto de Pinheiros (Saap).

Em abril, a associação já havia procurado o MPSP a respeito de mudanças no zoneamento de parte das Zonas Corredor do bairro, transformadas em Zona de Centralidade pela revisão aprovada no ano passado. Essa nova classificação abrange quadras próximas à marginal, na Avenida Doutora Ruth Cardoso, com a permissão de prédios de até 48 metros.

A situação é contestada porque esses corredores eram voltados a permitir comércios no entorno de áreas estritamente residenciais. Com a transformação em Zona de Centralidade, as áreas exclusivas de casas perdem esse “cinturão protetivo”.

“Agora veio essa segunda surpresa de novo”, diz a presidente da Saap, Maria Helena Bueno sobre a emenda que abre brecha para mudanças em ZERs. “Queremos o bairro estritamente residencial”, aponta ela, que não é contrária a algumas mudanças (como o aval a mais condomínios de casas) desde que discutidas.

Câmara aprovou "minirrevisão" do zoneamento na semana passada Foto: Felipe Rau/Estadão

O que está na moção e no manifesto de repúdio? Quais associações assinam?

A moção enviada ao MP diz que as emendas que alteram as ZERs seriam irregulares e inconstitucionais. Também defende que mudanças nessas zonas somente poderiam ocorrer após estudos, planejamento e discussão.

“A aprovação de uma emenda desconhecida pela população viola a nossa Constituição Federal, uma vez que resta evidenciado o descumprimento da participação cidadã e do controle social”, argumenta, dentre outros pontos.

O texto é assinado pelas seguintes organizações:

  • Associação dos Moradores da Vila Nova Conceição
  • Associação Viva Moema
  • Associação de Moradores da Vila Mariana
  • Associação dos Moradores do Jardim Lusitânia
  • Associação de Moradores Bairro Paraíso
  • Amigos do Novo Mundo Associados
  • Associação Nossa Guarapiranga
  • Associação de Moradores e Empresas do Brooklin Novo
  • Ame Jardins
  • Associação dos Amigos de Alto de Pinheiros
  • Associação dos Amigos de Alto de Boa Vista
  • Sociedade dos Amigos de Bairro do Jardim Marajoara

Já o manifesto de repúdio chama a “minirrevisão” de “ilegal e autoritária”. “Efetivaram alterações substanciais no uso e ocupação do solo, tudo sem nenhum estudo técnico”, apontam.

No texto, são defendidas “imediatas providências dos poderes constituídos” para que o projeto não seja sancionado por Nunes. No caso de transformação em lei, argumentam que seja judicializada “pelas organizações competentes em razão da notória inconstitucionalidade”.

“Estamos solicitando adesões das entidades para tomarmos uma atitude coletivamente contra esta conduta ilegal da Câmara”, afirmou ao Estadão a arquiteta e urbanista Lucila Lacreta, diretora executiva do Movimento Defenda São Paulo. Dentre os pontos criticados, está a falta de estudos da capacidade de suporte para atender ao possível aumento de potencial construtivo.

Os signatários até o momento são:

  • Movimento Defenda São Paulo
  • Sociedade Moradores Butantã-Cidade Universitária
  • Associação dos Moradores Amigos do Parque Previdência
  • Associação dos Proprietários do Residencial Parque dos Príncipes
  • Associação Amigos do Jardim das Bandeiras
  • Ciranda
  • Sociedade Amigos da Cidade Jardim
  • Sociedade dos Amigos do Bairro City Boaçava
  • Sociedade Amigos dos Jardins América, Europa, Paulista e Paulistano
  • Associação dos Amigos e Moradores pela Preservação do Alto da Lapa e Bela Aliança
  • Associação de Moradores da Vila Mariana
  • Associação dos Amigos e Moradores do Jardim Lusitânia
  • Sociedade da Vila Paulista
  • Associação Cultural e Comunitária Vila dos Heróis

Após a aprovação da “minirrevisão” da Lei de Zoneamento na Câmara, ao menos 24 associações de bairros nobres das zonas oeste e sul de São Paulo estão se organizando para contestar judicialmente as emendas que abrem brechas para a construção de prédios em parte das Zonas Exclusivamente Residenciais (ZERs) da cidade. As mudanças impactam especialmente a Cidade Jardim e a Vila Nova Conceição.

Os grupos defendem o veto do prefeito Ricardo Nunes (MDB) ao projeto de lei, cuja sanção está em análise e deve ser decidida ainda neste mês. Em nota, a presidência da Câmara, do vereador Milton Leite (União Brasil), e a relatoria da “minirrevisão”, de Rodrigo Goulart (PSD), defenderam que a tramitação do projeto e a aprovação ocorreram de “forma legal, com participação popular e transparência”.

A nota também destaca que a aprovação das mudanças no zoneamento ocorreram na parte da tarde, “não na calada da noite”. A votação daquele dia se estendeu até a madrugada, mas relativa a outros projetos de lei.

Além disso, salientou, a apresentação de emendas é “prerrogativa de cada parlamentar” e estavam disponíveis para consulta em audiência pública na segunda-feira, 1º, e publicadas no Diário Oficial do dia seguinte. “Portanto, também não cabe falar em falta de transparência nem em falta de participação popular”, concluiu.

As emendas criticadas pelas associações são de autoria do vereador Isac Félix (PL). Na semana passada, o parlamentar havia justificado ao Estadão que parte das mudanças envolve “ajuste que se faz necessário para adequar a transição e preservação das características locais”. Procurado novamente, não se manifestou até o momento.

Alterações no zoneamento liberam prédios em parte de zona restrita a casas na Cidade Jardim Foto: Felipe Rau/Estadão - 24/04/2024

Do total, 12 das associações enviaram moção de repúdio ao Ministério Público de São Paulo (MP-SP) na segunda-feira, 8. O texto diz representar parte dos moradores, proprietários, comerciantes e empresários de diferentes bairros, no qual pedem o veto pelo prefeito e a abertura de ação civil pública pela Promotoria.

As entidades também apontam a possibilidade de abrirem conjuntamente uma ação popular. Há, ainda, outro manifesto de repúdio assinado por 14 organizações, duas signatárias da moção.

Ao Estadão, a Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo confirmou ter recebido representação por escrito assinada pelas associações, a qual será incorporada ao inquérito civil aberto desde o ano passado. Destacou, ainda, que pedidos de suspensão temporária da “minirrevisão” foram indeferidos pela Justiça em 1ª e 2ª instâncias em junho.

Dessa forma, a Promotoria diz ter recomendado que o prefeito tome a decisão final sobre a sanção com base em “subsídios técnicos” e “questões já identificadas quanto ao seu trâmite” na Câmara. Também ressaltou que “aguardará o término da fase em curso”, a fim de, se for o caso, encaminhar recomendação de ação direta de inconstitucionalidade à Procuradoria-Geral de Justiça.

Especialistas ouvidos pelo Estadão avaliam que as alterações nas zonas exclusivamente residenciais estão em desacordo com as diretrizes principais da legislação urbana vigente em São Paulo, de modo que podem ser contestadas judicialmente.

Também consideram que uma mudança dessa magnitude somente poderia ocorrer após estudos e discussão em audiências públicas e em órgãos colegiados da Prefeitura. Isto é, não por meio de emenda publicada no dia da votação.

Além dos casos citados, associações de Alto de Pinheiros e da Cidade Jardim também têm se organizado nos últimos meses para contestar judicialmente alterações no zoneamento que entraram em vigor este ano. Essas mudanças também envolvem vizinhanças ligadas às zonas restritas a casas.

O zoneamento e o Plano Diretor determinam o regramento de diversos aspectos do dia a dia — como limite de barulho, altura máxima das construções e tipos de comércios permitidos — e, também, delimitam onde ocorrerão as principais transformações, como por meio de incentivos a novos apartamentos perto de estações de metrô e a indicação de parques a serem criados, por exemplo.

Em agenda pública no começo do mês, Nunes sinalizou que poderá fazer vetos à “minirrevisão” se forem recomendados pelos técnicos da prefeitura. O Município tem 15 dias úteis para a decisão final, contados a partir do recebimento da carta de lei, ocorrido no dia 4.

Como a “minirrevisão” abriu brecha para prédios em parte dos bairros restritos a casas?

Após a aprovação do projeto de lei da “minirrevisão” na terça-feira, 2, os vereadores aprovaram 40 emendas ao texto, a maioria com alterações na classificação de quadras da cidade. Como revelou o Estadão, uma delas abre brecha para a verticalização de regiões exclusivamente de casas há décadas na cidade, como em trechos de Alto de Pinheiros, na zona oeste, e Morumbi, na sul, dentre outros.

A mudança permite que quadras próximas a acessos de metrô, trem e corredor de ônibus virem “eixo de verticalização” mesmo que nas áreas classificadas hoje como Zona Exclusivamente Residencial (ZER).

Essa alteração não é, contudo, automática, pois depende de mudanças na classificação de cada local da cidade no mapa — o que ocorreu, a princípio, exclusivamente em uma quadra da Vila Nova Conceição, no distrito de Moema.

Embora incluída na “minirrevisão do zoneamento”, a mudança altera diretrizes do Plano Diretor. A nova emenda retira as ZERs da lista de locais excluídos das “áreas de influência” das Zonas Eixo de Estruturação da Transformação Urbana (ZEUs).

Isto é, podem passar a ter essa classificação quando localizadas nas vizinhanças de acessos a metrô, trem e corredor de ônibus. Esses locais têm incentivos construtivos atrativos ao mercado imobiliário, de modo que concentram a maioria dos apartamentos lançados na cidade.

Enquanto o limite de altura em uma ZER é de 10 metros, não há gabarito máximo em uma zona de eixo. Áreas desse tipo têm diversos incentivos construtivos, a fim de aumentar a população que reside perto de transporte coletivo de média e alta capacidade.

A mudança não envolve todas as ZERs, pois parte delas está distante de metrô, trem e corredor de ônibus (como o entorno do Parque Cidade Toronto, na zona norte) ou envolve bairros tombados (Jardins e Pacaembu, por exemplo).

Dentre as quadras que poderiam ser afetadas, estão entornos das Estações São Paulo-Morumbi e Vila Sônia, da Linha 4-Amarela, da Estação Sumaré, da Linha 2-Verde, e da Estação Cidade Universitária (em Alto de Pinheiros), da Linha 9-Esmeralda.

Também poderia incidir futuramente sobre vizinhanças onde há expectativa de obras de metrô, monotrilho e trem, como da possível Estação Cerro Corá, da expansão da Linha 2-Verde à oeste, e da Estação Indianópolis, da Linha 20-Rosa, dentre outros exemplos.

Entorno da Praça Panamerica, em Alto de Pinheiros, está nas proximidades de estação de trem e poderia ser impactado por emenda aprovada na Câmara Foto: Felipe Rau/Estadão

A emenda é do vereador Isac Félix (PL). Ao Estadão, por meio da assessoria de imprensa, o parlamentar respondeu na semana passada que as justificativas estão nas emendas.

Nesse caso, havia justificado que “após a implantação de sistema de transporte público coletivo em novos pontos da cidade, onde antes tínhamos apenas residências unifamiliares, nada mais natural do que atender ao texto explícito no capítulo II” do Estatuto da Cidade.

Em seguida, a justificativa traz três trechos do estatuto (que é uma lei federal), como o que fala da “universalização do acesso aos benefícios e às comodidades da vida urbana por parte de todos os cidadãos, seja pela oferta e uso dos serviços, equipamentos e infraestruturas públicas”.

Como a “minirrevisão” altera o zoneamento da Vila Nova Conceição?

Dentre as emendas aprovadas, uma delas transforma parte de uma zona restrita a casas na Vila Nova Conceição em Zona Eixo de Estruturação da Transformação Urbana (ZEU). A mudança envolve uma quadra delimitada pelas Ruas Jacques Félix, Professor Filadelfo Azevedo, Domingos Leme e João Lourenço.

Hoje, esse perímetro é dividido em zona restrita a casas (ZER) e Zona Corredor (ZCOR). Esses corredores permitem alguns tipos de comércios e serviços, mas horizontais, com limite de altura de cerca de 10 metros.

Com a alteração, essa quadra terá incentivos municipais para construir prédios sem limite de altura, tornando-se “eixo de verticalização”. Isso porque está nas proximidades do corredor de ônibus da Avenida Santo Amaro.

Presidente da Associação dos Moradores da Vila Nova Conceição, Marcus Abrantes disse ao Estadão que a organização começou a se organizar contrariamente às mudanças na quinta-feira, 4. “Esperamos que sirva para subsidiar a Prefeitura, para que faça o veto”, aponta. Ele critica a forma como as emendas foram divulgadas.

Na véspera da votação, as emendas foram impressas e disponibilizadas para leitura durante a audiência pública na Câmara, mas o conteúdo não foi apresentado ou debatido. Também foram publicadas no Diário Oficial do dia seguinte, assim como foram lidas rapidamente lidas durante a votação (a leitura da emenda que altera a ZER levou menos de 40 segundos, como identificou o Estadão).

O que muda na Cidade Jardim?

A Zona Exclusivamente Residencial da Cidade Jardim passou por novas mudanças aprovadas por emenda na semana passada, assim como outras foram feitas na revisão do zoneamento do ano passado. A Sociedade Amigos Cidade Jardim contratou um advogado nesta quarta-feira, 10, para contestar as mudanças, segundo o presidente da organização, Marcelo Gatti Reis Lobo, confirmou ao Estadão.

Ambas envolvem quadras no entorno do Jockey Club, cuja transformação em parque é proposta pela nova lei do Plano Diretor e cujas atividades podem ser impactadas pela nova lei que proíbe corridas de animais ligadas a apostas (os efeitos foram temporariamente suspensos pela Justiça).

A alteração aprovada mais recentemente abrange a Rua Taques Alvim, a Avenida das Acácias e a Rua Jaguanambi, que passam a ser uma Zona Mista (ZM), a qual permite prédios medianos e diversos tipos de comércios e serviços.

A emenda é de autoria do vereador Isac Félix (PL). Procurado pelo Estadão, ressaltou que a “proposta visa a estabelecer uma zona de transição, como amortecimento ao bairro, para preservar suas características e, ao mesmo tempo, (se) adequar às dinâmicas da Lei de Zoneamento”. Além disso, na emenda, justificou que a Avenida das Acácias teria um “fluxo de veículos maior”.

Emenda altera zoneamento de vias da Cidade Jardim Foto: Google Street View/Reprodução

Outra mudança na vizinhança entrou em vigor em abril após os vereadores derrubarem parte dos vetos feitos pelo prefeito à revisão do zoneamento. As alterações feitas em abril liberaram a construção de prédios e atividades de comércios e de serviços variadas na Rua Doutor José Augusto de Queiroz, na Rua Severo Dumont, na Rua Doutor Alberto da Silveira, na Rua Fonseca Teixeira e em outras vias da Cidade Jardim.

Nesse caso, a alteração transformou parte das ZERs e das Zonas Corredor (ZCor) da Cidade Jardim em Zona Eixo de Estruturação da Transformação Metropolitana (ZEM). A nova classificação foi instituída em cerca de 200 imóveis do bairro, incluindo ainda uma quadra que antes era Zona Mista (na qual já eram permitidos predinhos).

A mudança permitiu ampla variedade de serviços comerciais e de serviços. Além disso, dá aval à construção de prédios com até 28 metros de altura e o dobro do volume construtivo permitido hoje (limitado a uma vez a área do terreno e 10 metros de altura) em ZER e ZCOR.

A alteração só foi possível por meio da determinação de uma nova descrição para esse tipo de zona, promulgada na Lei de Zoneamento revisada. O Estadão identificou que essa mudança foi proposta em emenda do vereador Sidney Cruz (MDB).

Procurado à época, o vereador justificou que as emendas foram propostas após a identificação de que algumas áreas na cidade “estavam deterioradas e necessitavam de adequações urbanísticas”. Também alegou que a mudança envolve “localização estratégica para o desenvolvimento urbano do município” e que teve o objetivo de promoção de novas atividades, “revitalização urbana” e “maior dinamismo”.

Como fica Alto de Pinheiros?

Por enquanto, não há alterações específicas na ZER de Alto de Pinheiros. A aprovação da emenda que permite a transformação dessas zonas em eixo de verticalização é, contudo, criticada pela Associação dos Amigos de Alto de Pinheiros (Saap).

Em abril, a associação já havia procurado o MPSP a respeito de mudanças no zoneamento de parte das Zonas Corredor do bairro, transformadas em Zona de Centralidade pela revisão aprovada no ano passado. Essa nova classificação abrange quadras próximas à marginal, na Avenida Doutora Ruth Cardoso, com a permissão de prédios de até 48 metros.

A situação é contestada porque esses corredores eram voltados a permitir comércios no entorno de áreas estritamente residenciais. Com a transformação em Zona de Centralidade, as áreas exclusivas de casas perdem esse “cinturão protetivo”.

“Agora veio essa segunda surpresa de novo”, diz a presidente da Saap, Maria Helena Bueno sobre a emenda que abre brecha para mudanças em ZERs. “Queremos o bairro estritamente residencial”, aponta ela, que não é contrária a algumas mudanças (como o aval a mais condomínios de casas) desde que discutidas.

Câmara aprovou "minirrevisão" do zoneamento na semana passada Foto: Felipe Rau/Estadão

O que está na moção e no manifesto de repúdio? Quais associações assinam?

A moção enviada ao MP diz que as emendas que alteram as ZERs seriam irregulares e inconstitucionais. Também defende que mudanças nessas zonas somente poderiam ocorrer após estudos, planejamento e discussão.

“A aprovação de uma emenda desconhecida pela população viola a nossa Constituição Federal, uma vez que resta evidenciado o descumprimento da participação cidadã e do controle social”, argumenta, dentre outros pontos.

O texto é assinado pelas seguintes organizações:

  • Associação dos Moradores da Vila Nova Conceição
  • Associação Viva Moema
  • Associação de Moradores da Vila Mariana
  • Associação dos Moradores do Jardim Lusitânia
  • Associação de Moradores Bairro Paraíso
  • Amigos do Novo Mundo Associados
  • Associação Nossa Guarapiranga
  • Associação de Moradores e Empresas do Brooklin Novo
  • Ame Jardins
  • Associação dos Amigos de Alto de Pinheiros
  • Associação dos Amigos de Alto de Boa Vista
  • Sociedade dos Amigos de Bairro do Jardim Marajoara

Já o manifesto de repúdio chama a “minirrevisão” de “ilegal e autoritária”. “Efetivaram alterações substanciais no uso e ocupação do solo, tudo sem nenhum estudo técnico”, apontam.

No texto, são defendidas “imediatas providências dos poderes constituídos” para que o projeto não seja sancionado por Nunes. No caso de transformação em lei, argumentam que seja judicializada “pelas organizações competentes em razão da notória inconstitucionalidade”.

“Estamos solicitando adesões das entidades para tomarmos uma atitude coletivamente contra esta conduta ilegal da Câmara”, afirmou ao Estadão a arquiteta e urbanista Lucila Lacreta, diretora executiva do Movimento Defenda São Paulo. Dentre os pontos criticados, está a falta de estudos da capacidade de suporte para atender ao possível aumento de potencial construtivo.

Os signatários até o momento são:

  • Movimento Defenda São Paulo
  • Sociedade Moradores Butantã-Cidade Universitária
  • Associação dos Moradores Amigos do Parque Previdência
  • Associação dos Proprietários do Residencial Parque dos Príncipes
  • Associação Amigos do Jardim das Bandeiras
  • Ciranda
  • Sociedade Amigos da Cidade Jardim
  • Sociedade dos Amigos do Bairro City Boaçava
  • Sociedade Amigos dos Jardins América, Europa, Paulista e Paulistano
  • Associação dos Amigos e Moradores pela Preservação do Alto da Lapa e Bela Aliança
  • Associação de Moradores da Vila Mariana
  • Associação dos Amigos e Moradores do Jardim Lusitânia
  • Sociedade da Vila Paulista
  • Associação Cultural e Comunitária Vila dos Heróis

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