A futura Linha 6-Laranja do Metrô, em construção na cidade de São Paulo, tem 15 estações previstas, entre a Brasilândia (zona norte) e São Joaquim (região central). A concessionária responsável pela obra, a Linha Uni, agora quer ampliar esse trajeto com mais seis paradas, duas do lado noroeste e outras quatro no sentido sudeste do ramal.
A extensão do trecho poderá alcançar bairros da parte sul e leste da capital, como Ipiranga e Mooca, e ainda mais ao norte da cidade, como a região do Morro Grande. A proposta, que poderá custar R$ 10,4 bilhões e ser iniciada já no final de 2025, ainda depende de aval do governo do Estado.
Está prevista também a desapropriação de mais 90 mil m² de áreas somadas a partir da construção das estações, poços de ventilação e saídas de emergência, conforme o Relatório Ambiental Preliminar (RAP), apresentado pela Linha Uni. Essa ampliação deve atingir diretamente comércios, restaurantes, indústrias e centenas de residências.
Especialistas ouvidos pelo Estadão entendem que a ampliação pode trazer benefícios à cidade, mas defendem que a Linha Uni faça mais discussões abertas com a população sobre o empreendimento.
A expansão do ramal, chamada de fase III da construção da Linha 6-Laranja, está prevista no Contrato de Concessão firmado com o governo paulista, e será executada só em caso de aprovação da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos), que já recebeu a proposta.
Em nota, a Linha Uni diz que desenvolve estudos ambientais com a anuência do governo para garantir a viabilidade do projeto. Após protocolar o estudo à Companhia Ambiental do Estado (Cetesb) em abril, a licença para início das obras é esperada pela concessionária em 18 meses contados a partir da entrega do documento - outubro de 2025. Procurada pela reportagem, a Cetesb não se manifestou.
“Na expansão, estão sendo estudadas duas estações no sentido noroeste e quatro no sentido sudeste. As informações detalhadas sobre o cronograma das obras serão divulgadas conforme o avanço das aprovações e desenvolvimento dos projetos”, diz trecho do relatório ambiental.
A Secretaria Estadual de Parcerias em Investimentos diz “que aguarda a conclusão dos estudos de viabilidade”, realizados pela concessionária, para assinar o contrato de ampliação.
O que está garantida é a construção da fase I da Linha 6-Laranja, que deve conectar a Brasilândia, na zona norte, à Estação São Joaquim (Linha 1-Azul), no centro. A extensão total do projeto já aprovado é de 15,3 quilômetros, com integração com as linhas 4-Amarela do metrô e 7-Rubi e 8-Diamante.
O governo prevê a entrega desta etapa em outubro de 2027, mas, como as obras tiveram atraso de mais mil dias (veja mais abaixo), a conclusão pode ficar para 2028. O cálculo do atraso é contado a partir de 2025, prazo dado para a entrega ainda pela gestão João Doria (então no PSDB), em 2020.
Qual é a proposta de ampliação da linha?
A ampliação prevê construir as estações Velha Campinas e Morro Grande, expandindo-se sentido noroeste a partir da futura estação Brasilândia. Já a partir da Estação São Joaquim, sentido região leste, são propostas as estações Aclimação, Cambuci, Vila Monumento e São Carlos, do lado sudeste.
Com isso, o trecho ainda poderá fazer conexões com a Linha 10-Turquesa da CPTM pela estação São Carlos.
A extensão acrescentaria ao traçado original a expansão do trecho em 6,68 km - ou seja, com as 21 estações, a linha ficaria com cerca de 22 quilômetros de túneis. A ampliação absorveria, segundo a concessionária, 273 mil passageiros por dia útil.
O tempo estimado da construção é de 60 meses (cinco anos) e o custo da obra, conforme a Linha Uni, cerca de R$ 10,4 bilhões, que seriam divididos entre a empresa e o governo. Como o projeto ainda não foi aprovado pelo Estado, não se sabe quanto cada parte vai pagar ainda.
Segundo a Secretaria de Parcerias, a fase I da construção da Linha 6-Laranja terá custo de R$ 18,5 bilhões, dos quais 46,8% serão pagos pelo governo (cerca de R$ 8,65 bilhões) e o 53,1% (cerca de R$ 9,8 bilhões) pela concessionária.
A Linha Uni defende que a extensão da Linha 6-Laranja, se aprovada, seja feita em conjunto ou na sequência da construção do traçado original.
Isso levaria, segundo a concessionária, à “economia de recursos ao erário”, e otimização do tempo de implantação em razão do reaproveitamento de equipamentos de grande porte, como a tuneladora (o Tatuzão); o corpo técnico de projetistas e os funcionários de campo e administrativos contratados para a 1ª etapa da obra.
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Os autores do relatório apontam que o empreendimento vai alterar “de maneira positiva a acessibilidade da população”, gerar emprego, dinamizar economia e aumentar a arrecadação. Do ponto de visto ambiental, preveem redução para a emissão de poluentes atmosféricos.
A Linha 6 ganhou o apelido de “Linha das Universidades”. Pelo trajeto original, ela vai passar perto de ao menos sete instituições de ensino: Centro Universitário São Camilo, PUC-SP, FMU, FAAP, Mackenzie, Unip e Uninove.
Extensão pode consertar erro, diz especialista
Para Marcos Kiyoto, mestre em Planejamento Urbano com foco em transporte de passageiros pela Universidade de São Paulo (USP), a proposta de ampliação é positiva, uma vez que alcança mais pessoas que moram e trabalham em áreas periféricas nas zonas norte e leste.
“Já é importante atingir a Brasilândia, porque há muito pouco metrô na periferia”, diz. “Além disso, historicamente se negligencia a zona leste. Por décadas, só a Linha 3-Vermelha do metrô passava pela região”, acrescenta.
Para o arquiteto, outra vantagem é alcançar a linha 10-Turquesa, da CPTM, abrindo mais um circuito para as pessoas acessarem a parte central da capital. “Cria-se mais uma conexão para quem vem (da região) do ABC (paulista) e quer chegar ao centro”, diz.
Kiyoto, porém, critica o traçado original, que termina na Estação Joaquim. “Já é um lugar movimentado, com público universitário, uma região comercial. E, sendo terminal, todos que chegarem lá vão descer para pegar Linha 1-Azul ou ônibus. Acumula pessoas em um lugar onde poderia dispersar mais.”
Onde serão as desapropriações?
O relatório informa que as obras levarão a uma desapropriação de 91.087 m² ao todo, o que pode atingir 189 lotes, sendo a maioria de características residenciais. Segundo o estudo, 369 moradores teriam de ser desapropriados por causa da construções das seis estações, também dos poços de ventilação (VSE) e as saídas de emergência (SE), que costumam ser construídos entre os terminais e no final das linhas.
A Estação Morro Grande é a que deve ter mais impacto, atingindo 46 casas e afetando 143 pessoas. Alguns dos endereços afetados foram citados no relatório como blocos residenciais de baixo padrão, conforme classificação da Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento. Além disso, bancos, restaurantes, comércios, mercados e até uma indústria na Mooca também podem ser atingidos.
A concessionária diz que há casos em que os moradores poderão voltar às suas casas depois das obras. “Esses imóveis e populações estarão sujeitos às desapropriações e/ou reassentamento, depois que emitido o Decreto de Utilidade Pública envolvendo essas áreas. Algumas dessas áreas não serão efetivamente desapropriadas, mas terão ocupação apenas no período de obras, sendo devolvidas após o término das destas”, diz trecho do relatório.
Onde as desapropriações vão acontecer?
- Estação Velha Campinas (sentido noroeste) - Terá três blocos de desapropriação no bairro Jardim Sydney, sendo um na Estrada da Boiada; o segundo entre a Estrada da Boiada e Rua Salvo Veloso; e o terceiro entre as ruas Salvo Veloso e Cabo João Assunção. Ao todo são cerca de 13 mil m² de área.
- Estação Morro Grande (sentido noroeste) - Também serão três blocos de desapropriação, no bairro Sítio Morro Grande por conta da construção da estação. Os blocos ficam entre a Avenida Eliseu Teixeira, a Rua Aparecida do Taboado; o bloco 2, entre Ruas Padre Achilles Silvestre e José Francisco Chaves, e o bloco 3, entre a Rua Padre Achilles Silvestre e a Aparecida do Taboado, totalizando 9.792 m².
- Estação Aclimação (sentido sudeste) - A desapropriação da Estação Aclimação ocorreria em um único bloco, de 5.513 m², na Liberdade (centro), entre as ruas Conselheiro Furtado e Bueno de Andrade. A região tem lotes comerciais e de moradia residencial, e é classificada pela Prefeitura como Residencial Vertical Médio Padrão.
- Estação Cambuci (sentido sudeste) - A construção da estação, no Cambuci, atingirá três blocos, segundo o relatório. O primeiro, entre a Rua Albuquerque Maranhão e a Avenida Lins de Vasconcelos; o segundo na Rua Albuquerque Maranhão; e o bloco 3, entre a Rua Albuquerque Maranhão, a Avenida Lins de Vasconcelos e a Rua da Independência. As obras provocariam desapropriação de 12.643 m², em uma área com residências, restaurante, posto de gasolina, loja de roupas e casa de carnes.
- Estação Vila Monumento (sentido sudeste) - implementada em dois blocos, na Rua da Independência, no Cambuci. O bloco 1 ocupará área de 11.961,44 m², composta por 1 lote comercial, já o bloco 2, ocupará área 1.000,71 m² e também de uso comercial.
- Estação São Carlos (sentido sudeste) - será construído em 3 blocos na Mooca, na região de uma indústria. O bloco 1 está entre as ruas Presidente Pinto Lima e Presidente Costa Pereira; o bloco 2 está entre as ruas Presidente Pinto Lima, Presidente Costa Pereira e Avenida Presidente Wilson; e o bloco 3 na Avenida Presidente Wilson. A construção atingiria, ao todo 24.985 m².
Comunicação deve ser maior, diz associação
Presidente da Associação dos Engenheiros e Arquitetos de Metrô, Luis Kolle vê com bons olhos a ampliação da linha, mas chama a atenção para a necessidade de ser melhor comunicada à população, sobretudo pelos impactos com as obras.
Segundo ele, a forma de estudo do empreendimento, o RAP, já entregue à Cetesb, é menos aprofundada que o EIA/RIMA - Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental -, que prevê mais mecanismos de discussão com os moradores.
“A associação não critica o avanço que precisa ser feito, só que tem que ser feito com audiência pública, tem que comunicar, ouvir a população. É o que a gente espera”, diz o presidente da associação. “Para a população, quanto mais metrô melhor. Mas tem de ser feito de forma que ajuda, e não atrapalha.”, afirma
Em nota, a Linha Uni diz que o licenciamento ambiental da Fase III foi aprovado pela Cetesb por meio do relatório ambiental preliminar, que incluiu reunião pública na área de influência da obra, e que “a concessionária desenvolveu um plano de comunicação, aprovado pelo órgão ambiental”, no qual foram realizadas “duas reuniões com a comunidade”, nos dias 7 e 8 de agosto.
Atraso de mil dias
Em março, a concessionária informou ao governo que problemas geológicos não previstos levariam ao atraso da construção do traçado inicial da Linha 6, em mais de três anos - 1.096 dias - contados a partir da primeira data prevista de entrega, que era 2025.
Ou seja, o acréscimo de dias faria com que a conclusão da linha fosse para 2028, meses depois da data almejada pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), de implementar a fase I do ramal até outubro de 2027. A concessionária, porém, mantém a proposta de inaugurar parcialmente o trecho em 2026, e a fase I inteira, em 2027.
Por conta dos problemas geológicos, a concessionária pediu um adicional de R$ 230 milhões pelos gastos não previstos no contrato, e o governo chegou a negociar com a concessionária Linha Uni uma aceleração nos trabalhos para que o prazo seja cumprido.
Em nota enviada este mês à reportagem, a gestão Tarcísio afirmou que realizou suas próprias análises e aprovou ressarcimento de R$ 204,1 milhões a ser pago no prazo estimado de 90 dias à concessionária após o valor ser aprovado.
Esse pagamento foi feito, segundo o Estado, “após apresentação de informações técnicas exigidas em contrato pela Linha Uni” e o “parecer de um agente independente”.
Evolução das obras
Das 15 estações do trajeto da fase I da Linha 6-Laranja, a que mais avançou em termos de construção foi a da Estação Santa Marina, com 66,73% dos serviços já realizados.
A que menos evoluiu até agora foi a 14-Bis, com pouco mais de 10% das obras concluídas. Da lista, oito já executaram mais da metade da obra e sete ainda não atingiram 50% da construção necessária, segundo o site da Linha Uni.
A construção é tocada pela empresa Acciona Construción, que faz parte do grupo espanhol Acciona, responsável pela execução das obras desde 2020.
A Linha-Uni diz que tem enfrentado entraves nas obras devido a condições do solo “não previstas originalmente”, como falhas geológicas. “Apesar desses desafios, o projeto está programado para ser entregue parcialmente até o final de 2026, e totalmente concluído até 2027″.
Em relação às obras na Estação 14 Bis, a concessionária diz que um resgate arqueológico “está em andamento no local”, e que os serviços de execução “somente poderão avançar após a conclusão do resgate.”