A expectativa era de melhora, mas a mancha de poluição do Rio Tietê se expandiu pelo segundo ano consecutivo. De acordo com estudo da Fundação SOS Mata Atlântica, a sujeira se estende agora por 160 quilômetros. Isso representa um crescimento de 31% em relação a 2022 (122 quilômetros) e quase o dobro de 2021 (85 quilômetros). Em cerca de 30% da extensão monitorada, a água não pode ser utilizada para nada. Entre as causas: a irregularidade climática, a ocupação desordenada do solo e o uso irresponsável de agrotóxicos.
O relatório Observando o Tietê 2023 foi realizado ao longo de 576 quilômetros, em 59 pontos de coleta que abrangem 102 municípios das regiões metropolitanas de São Paulo, Campinas e Sorocaba. Isso representa 50% da bacia de drenagem do rio. O estudo foi realizado com patrocínio da Ypê e o lançamento ocorre na semana do dia 22 - que celebra o maior rio do Estado de São Paulo, que se estende por 1.100 quilômetros desde sua nascente, em Salesópolis, até sua foz, no Rio Paraná.
Segundo Gustavo Veronesi, coordenador do projeto Observando os Rios, da SOS Mata Atlântica, a expansão da mancha de sujeira é resultado de fatores como a irregularidade climática. “Quando não chove, como agora, a sujeira não se dissipa e o material orgânico leva mais tempo para ser decomposto pelas bactérias que estão na água. Por outro lado, quando chove muito (em curto espaço de tempo), quando a chuva não é perene, ela leva toda sujeira difusa que está nas ruas para o rio, em volume muito maior”, afirma.
O estudo não relaciona a situação do rio com as mudanças climáticas, diz Veronesi, que ressalta, porém, que é importante notar que alterações como o aquecimento global estão diretamente ligadas ao comportamento cada vez menos previsível do clima. “Por muito tempo a questão era quando iria acontecer, mas hoje já está acontecendo”, diz. “Não é possível cravar essa relação, mas não se pode ignorar.”
Outros fatores que entram nessa conta, afirma o coordenador do projeto, são as moradias irregulares e o uso de agrotóxicos no interior do Estado. “Isso é um fator que contribui muito para essa mancha, principalmente, hoje, na região do Alto Tietê”, afirma. “Não dá para cobrar saneamento de quem não tem onde morar.”
Apesar do aumento da mancha de poluição, a maior parte do trecho monitorado se mantém em condição regular (293 quilômetros), o que sinaliza uma situação geral de estabilidade. “A gente vê isso como um sinal de melhora e de piora. Se por um lado há alguma melhora, há pontos como o Córrego do Sapateiro, na capital, que piorou neste ano”, diz Veronesi.
Leia Também:
A melhora a que ele se refere é mostrada no estudo pelo aumento da proporção de água de boa qualidade. Apesar de representar a menor parte da extensão monitorada, esses trechos passaram de 60 quilômetros no ano passado para 119, em 2023. Esses trechos se estendem da nascente do Tietê, em Salesópolis, até Mogi das Cruzes, por 61 quilômetros, e em outros 58 quilômetros na região de Botucatu.
As boas notícias param por aí. Desde 2010, nenhum ponto de medição ao longo do rio apresenta qualidade da água considerada ótima.
Projeto prevê investimento de R$ 5,6 bilhões no Tietê
O Rio Tietê deverá receber R$ 5,6 bilhões em obras de recuperação e saneamento até 2026. O projeto, batizado de Integra Tietê, prevê intervenções de desassoreamento do rio e de seus principais afluentes, instalação de troncos e redes coletoras, estações de tratamento de esgoto e a implantação de monitoramento da qualidade da água na entrada e na saída dos 39 municípios da região metropolitana, onde vivem 22 milhões de pessoas.
O programa Novo Rio Pinheiros, em curso desde 2019, serviu de modelo parcial a ser ampliado para os 1.100 quilômetros do Tietê. “Vamos dar continuidade às práticas exitosas do Pinheiros”, disse ao Estadão, em março, a secretária de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística, Natália Resende.
A verba virá de financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e de investimentos da Sabesp. A expansão da rede de saneamento e a gestão de resíduos devem consumir boa parte dos recursos, R$ 3,9 bilhões até 2026.
Desde o início dos anos 1990, promessas de despoluição e dinheiro de diferentes fontes fazem parte do histórico do rio sem vida na região metropolitana de São Paulo. De financiamentos vindos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) à Agência de Cooperação Internacional do Japão, obras de rebaixamento da calha do rio e construção de estações de tratamento saíram do papel. A despoluição, não.
Em setembro do ano passado, em novo contrato de financiamento assinado com o BID, o Estado se comprometeu a investir R$ 430 milhões a serem recebidos do banco a partir de 2028 durante 25 anos. O acordo foi assinado dentro do escopo do programa Renasce Tietê, da gestão passada.
O valor empregado de 2010 a 2020 também dá ideia do tamanho do problema ambiental e da distância em que estamos de ter o rio em condições mínimas no Alto Tietê, conjunto de cidades desde sua nascente em Salesópolis aos municípios da Grande São Paulo. Nesse período, R$ 2,1 bilhões em obras e intervenções para a despoluição foram investidos no rio.
Procurada, a Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística destacou algumas ações, como as metas de:
- ampliar o número de domicílios com coleta e tratamento de esgoto em 1,5 milhão, pela Sabesp, até 2026, na região do Alto Tietê
- retirar mais de 13 milhões de m³ de sedimentos do alto Tietê, até 2026, por meio do DAEE
- monitoramento trimestral da qualidade do rio pela Cetesb, e divulgação de dados por meio do site do IntegraTietê, a ser lançado na exta-feira (22), com série histórica, dos últimos dez anos, em dois indicadores distintos (COT e DBO).