As criações do arquiteto, professor e pioneiro do design João Carlos Cauduro se tornaram mais do que logomarcas ao longo de décadas: são hoje parte da própria identidade de São Paulo. Autor de criações icônicas – como os símbolos e as sinalizações do Metrô, da CPTM, da Avenida Paulista, da TV Cultura e do Zoológico paulistano – morreu na quarta-feira, 23, aos 88 anos.
“Se você faz um projeto, ele precisa ter como objetivo final melhorar o nosso labirinto urbano. Ou você consegue isso ou só piora a destruição da cidade”, contou em entrevista ao Estadão em 2012. “É difícil explicar como ocorre, é muito intuitivo, não é racional. Muitas vezes estou dormindo e sonho com uma solução”, explicou em outra reportagem do Estadão.
Nascido em 1935, em São Paulo, Cauduro se formou pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP) em 1960. Também estudou desenho industrial na Itália.
Por mais de 30 anos foi professor na USP. Na faculdade, projetou parte dos móveis da Cidade Universitária e implantou a disciplina de Planejamento Visual e Urbano. “A matéria tinha como foco organizar visualmente a cidade, com o objetivo de criar uma cidade mais fácil, mais interessante e agradável”, explicou anos atrás ao Estadão.
Quantos milhões de moradores e visitantes já não consultaram o mapa da rede metroviária paulistana? Ou identificaram uma estação de longe apenas ao avistar a marca das duas flechas sobre um fundo azul? Ou, então, posaram para uma foto em frente aos totens da Avenida Paulista? Identificaram o ônibus que precisariam embarcar de longe, apenas pela cor do veículo? Os exemplos mostram que as criações mais icônicas de Cauduro envolvem a mobilidade urbana e o uso público.
Ele é autor da identidade visual do Metrô, como a marca, as placas de sinalização das estações e o mapa da rede, desenvolvidos a partir de 1967 e anos seguintes. “Até que foi fácil, tentei dar uma ideia do ‘leva e traz’, do ‘sobe e desce’, de ir para o trabalho e voltar para casa, e chegamos nas duas setas azuis, algo simples mas eficiente”, explicou ao Estadão.
Décadas depois, participou de projeto semelhante para a CPTM. “Usando o vermelho, criamos um desenho muito forte e ao mesmo tempo simples, dando uma unidade para as estações”, também contou ao Estadão.
Cauduro igualmente se envolveu em projetos para a rede de ônibus paulistanos, como o que propôs a utilização de cores para diferenciar veículos de distintas partes da cidade. A proposta (popularmente chamada de “saia e blusa”) não é aplicada atualmente, mas marcou a discussão sobre a identificação visual do sistema na capital.
“Estudei todos os mapas antigos para entender a formação da cidade, vi que essas áreas ao redor do centro expandido eram os locais onde o pessoal pernoitava com suas mulas para seguir viagem para outras regiões. E esses caminhos viraram as principais avenidas da capital. A partir daí, conseguimos criar essa identificação visual das placas”, explicou ao Estadão.
Na Avenida Paulista nos anos 1970, envolveu-se na criação de mobiliário urbano variado (como os antigos abrigos dos pontos de ônibus) e da sinalização instalada nas esquinas. Hoje, restam ainda parte dos grandes totens verticais, dispostos ao longo da via.
Junto a Ludovico Martino, no escritório Cauduro Martino Associados, destacou-se no cenário nacional por quase 50 anos e produziu mais de mil marcas. Parte dos projetos foram premiados e integraram uma visão que incluía diferentes fatores, o que foi classificado como “design total”.
A comunicação visual do Zoológico de São Paulo (como as placas de identificação dos animais), os símbolos da TV Cultura e do Banespa e criações para o setor privado estão no histórico do arquiteto. Também trabalhou em projetos para empresas nacionais e multinacionais, como Playcenter, Kibon, Natura e Vale, dentre outras.
Ao Estadão em 2012, o urbanista e secretário de diferentes gestões no Governo e Município Jorge Wilheim lembrou de quando Cauduro teve uma ideia para divulgar o recém-criado Anhembi, na zona norte: espalhar pequenas placas de madeira pintadas à mão pela cidade com uma seta que apontava a direção. “Essa coisa do Cauduro de criar uma sinalização que é informativa e ainda assim bonita é impressionante”, comentou à época. “(Até então) Ninguém sabia onde ficava.”
A morte de Cauduro foi lamentada por instituições públicas e privadas. A FAUUSP lembrou de trabalhos e da carreira como um “professor notável”. “Teve uma trajetória muito destacada e seminal para os rumos do design moderno em São Paulo e no Brasil”, destacou. “Essa faculdade agradece sua vida, e homenageia o seu legado”, concluiu.
O Metrô também lembrou da trajetória do arquiteto, que chamou de “um dos maiores expoentes do design brasileiro”. Já o Conselho de Arquitetura e Urbanismo de São Paulo (CAU/SP) salientou o “papel central na consolidação do design gráfico brasileiro e foi pioneiro no país no chamado ‘design total”. O Instituto de Arquitetos do Brasil - São Paulo (IAB/SP) igualmente lamentou a morte de Cauduro, “um dos principais nomes do design gráfico moderno no Brasil”.
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