Motoristas da Uber formam minifrotas, cobram diárias e exigem parte de lucros


Colaboradores de aplicativo tanto em São Paulo quanto no Rio adotam práticas de taxistas antes criticadas; anúncios são feitos em sites de classificados

Por Juliana Diógenes e Clarissa Thomé

Promessa de serviço diferenciado e inovador, a Uber tem permitido a replicação de estratégias comuns a taxistas. Em São Paulo e no Rio, as duas maiores metrópoles do País, motoristas cadastrados no aplicativo estão criando “minifrotas”, sublocando veículos, fixando metas de rendimento semanal e cobrando lucros diários de condutores parceiros. Na Uber, um só motorista pode cadastrar quantos carros quiser, o que permite, por exemplo, a formação de frota sem limite de veículos.

A “terceirização” tem o aval e incentivo da empresa americana. Além de cobrar até 25% do valor de cada viagem, não estabelecer qualquer relação trabalhista e não exigir seguro do carro, a empresa não faz nenhum tipo de controle sobre o vínculo entre proprietários de veículos e locatários prestadores de serviço. O esquema de minifrota se assemelha ao modelo de dependência estabelecido entre donos de alvarás e taxistas, com uma diferença: na Uber, o proprietário do carro – e não do alvará – é quem dita as regras.

 Foto: Alex Silva|Estadão
continua após a publicidade

Em sites de classificados, há anúncios de contratação de motoristas. Cobram entre R$ 500 e R$ 700 por semana pelo “aluguel”, com ou sem contrato assinado. O Estado apurou que há proprietários que pedem para fazer um teste de uma semana com o motorista interessado. O objetivo é checar se ele é “rentável”, ou seja, se trabalha horas o suficiente para trazer lucro.

Proprietários esperam também que o interessado já esteja habilitado na Uber – outros dispensam essa exigência. Multas, combustível e avarias ficam por conta do “terceirizado”, mas há casos de divisão de despesas também. O dono paga impostos do carro e a “manutenção preventiva” – há casos de cobrança semanal de 10% para a conservação do veículo. Até R$ 2 mil de caução são exigidos, em algumas negociações, por possíveis casos de avarias. Nos sites, há parceiros que procuram carro para alugar e oferecem pagamento de R$ 400 por semana.

Não há regras nem sequer um padrão de modelo de negócios, uma vez que cada proprietário de carro, que se torna um “empregador”, decide sobre gerenciamento de lucros e despesas com seus parceiros. Especialistas em trânsito e em Direito do Trabalho apostam em uma deterioração do serviço, o que pode afetar os passageiros (mais informações nesta página).

continua após a publicidade

“Não estipulo metas, mas eles têm conta para pagar e precisam tirar pelo menos R$ 3 mil por mês para conseguir algum lucro. Se antes trabalhavam dez horas, depois que a tarifa caiu (redução de 15% no ano passado) passaram a trabalhar 14 horas porque precisam, por necessidade”, explica um motorista da Uber de 56 anos, dono de uma minifrota com três carros e três condutores em São Paulo.

Ele conta também que não fez contrato nenhum e nega que a atividade seja de locação de veículo. “São pessoas do meu relacionamento e estão em parceria, não alugando.”

No caso de um motorista de 49 anos, que não quis se identificar, a parceria é com o filho de um amigo. “Se dependesse só do lucro do meu carro, não pagaria o financiamento do segundo veículo, por isso chamei outro motorista”, afirma. Ele também não fez contrato para firmar o serviço. Segundo o condutor, o lucro e a despesa semanal são divididos sem contar a taxa de 10% cobrada do parceiro para compra de óleo, troca de filtro e reposição de pneus.

continua após a publicidade

‘Fantasmas’. Motoristas da Uber no Rio têm enfrentado problemas semelhantes aos dos colegas taxistas, como pagamento de diárias e a concorrência do que chamam de profissionais “fantasmas”. De acordo com relatos, há pessoas ligadas ao aplicativo terceirizando a própria conta.

O Estado apurou que o esquema consiste em mais de um carro circulando com o mesmo vínculo com a Uber. Ou seja, o motorista autorizado pelo sistema alternativo de transporte subloca sua licença, mediante pagamento de uma taxa.

“Tem gente colocando outro para trabalhar no lugar. Ou com mais de um carro na mesma conta. São os fantasmas. É complicado, porque começam a vir as reclamações. As pessoas deixam de confiar. Comecei trabalhando só com Uber Black, mas já tive de aderir ao Uber X porque o rendimento caiu”, diz um motorista que se identificou como Augusto, de 56 anos, referindo-se aos serviços de carros de luxo e o que aceita veículos mais populares.

continua após a publicidade

Augusto trabalhava como motorista em uma multinacional do petróleo e foi demitido no ano passado, com a crise no setor. Com a indenização, comprou um Corolla, que equipou com geladeira portátil, para oferecer refrigerante e água aos passageiros. “No início, ganhava mais do que na empresa, mas isso mudou”, afirma.

“Estou esperando a regularização. Tem de ter regras, como o motorista ter o carro no seu nome. Isso vai restringir a concorrência”, diz.

Condutor mostra extrato de corridas Foto: Alex Silva|Estadão
continua após a publicidade

Regra. Se adotada, a exigência afastaria motoristas como Toni, de 39 anos. Ele dirige um carro alugado pelo qual paga R$ 2,4 mil por mês. “A Uber não se importa se você aluga o carro ou se o carro é seu. Eles dão o aplicativo, o suporte.” Animado com R$ 180 a R$ 300 que ganha por dia, na semana passada também publicou um anúncio em um site: “Assumo financiamento do seu veículo”.

“Meu nome está ‘negativado’. Não posso ter financiamento. Mas, se a prestação fosse de até R$ 1,5 mil, estaria valendo a pena”, afirma. Toni, porém, desistiu da ideia ao ser bloqueado pelo aplicativo por ter recebido notas baixas dos passageiros. “A Uber não te dá segurança. Se eu for excluído de vez, entrego o carro e vou procurar alguma coisa para fazer. Eles não dão chance para o motorista se defender. Nem sei o que fiz”, diz.

SERVIÇO TERÁ QUEDA DE QUALIDADE, DIZEM ESPECIALISTAS

continua após a publicidade

Com a brecha para a formação de minifrotas na Uber, o consultor de transporte e trânsito Flamínio Fichmann afirma que a tendência é de queda na qualidade do serviço. “A Uber está errando a mão. Essa terceirização sem responsabilidade coloca o serviço em um limbo. O uso de um veículo por um terceiro não deveria acontecer”, afirma. 

“O que antes era apontado como benefício, que seriam os motoristas de frota de táxi migrar para a Uber para conseguir financiar veículo próprio, por exemplo, agora pode ser o contrário. Sem limite de carro por motorista, empresários de frota podem migrar para a Uber. Em vez de frotista de táxi, passo a ser frotista de Uber”, diz. “Isso é muito ruim.”

O advogado e professor de Direito do Trabalho da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Paulo Sérgio João compara o sistema de frotas de taxistas com o modelo em construção entre motoristas da Uber. “O que os motoristas do aplicativo estão fazendo tem semelhança com o sistema das antigas frotas de veículo para táxi. Funciona do mesmo jeito, informalmente”, diz.

Nesse caso de frotas que prestam serviço para a Uber, não há dúvidas de que funciona como sistema de locação de veículos.” Para o engenheiro e mestre em transporte Sérgio Ejzenberg, a Uber só vai se preocupar quando a qualidade do serviço cair e a empresa perder a rentabilidade. “O mercado se autorregula. A Uber tem de se cuidar como qualquer empresa, senão a concorrência vai atropelar. Se começar a virar bagunça, o usuário vai perceber a queda de qualidade”, afirma.

Concorrência. Um dos principais articuladores do modelo de regulamentação proposto pela Prefeitura, o diretor da São Paulo Negócios, Rodrigo Pirajá, diz que a Uber hoje está “nadando de braçada” na capital. “Eles (aplicativos de transporte de passageiros) fazem o que querem. E qual é o problema da demora (em regulamentar)? Eles estão ganhando espaço. É um mercado em expansão”, explica. 

A Uber esclarece, em nota, que o motorista pode cadastrar quantos carros quiser, “desde que atendidos os requisitos e condições estabelecidos”. “É importante lembrar que os carros e os motoristas parceiros cadastrados passam por uma extensa checagem de documentação”, afirma a empresa. 

Segundo a Uber, o carro que o motorista parceiro vai cadastrar precisa ter em dia licenciamento, DPVAT e apólice de seguro com cobertura para acidentes pessoais a passageiros a partir de R$ 50 mil.

Promessa de serviço diferenciado e inovador, a Uber tem permitido a replicação de estratégias comuns a taxistas. Em São Paulo e no Rio, as duas maiores metrópoles do País, motoristas cadastrados no aplicativo estão criando “minifrotas”, sublocando veículos, fixando metas de rendimento semanal e cobrando lucros diários de condutores parceiros. Na Uber, um só motorista pode cadastrar quantos carros quiser, o que permite, por exemplo, a formação de frota sem limite de veículos.

A “terceirização” tem o aval e incentivo da empresa americana. Além de cobrar até 25% do valor de cada viagem, não estabelecer qualquer relação trabalhista e não exigir seguro do carro, a empresa não faz nenhum tipo de controle sobre o vínculo entre proprietários de veículos e locatários prestadores de serviço. O esquema de minifrota se assemelha ao modelo de dependência estabelecido entre donos de alvarás e taxistas, com uma diferença: na Uber, o proprietário do carro – e não do alvará – é quem dita as regras.

 Foto: Alex Silva|Estadão

Em sites de classificados, há anúncios de contratação de motoristas. Cobram entre R$ 500 e R$ 700 por semana pelo “aluguel”, com ou sem contrato assinado. O Estado apurou que há proprietários que pedem para fazer um teste de uma semana com o motorista interessado. O objetivo é checar se ele é “rentável”, ou seja, se trabalha horas o suficiente para trazer lucro.

Proprietários esperam também que o interessado já esteja habilitado na Uber – outros dispensam essa exigência. Multas, combustível e avarias ficam por conta do “terceirizado”, mas há casos de divisão de despesas também. O dono paga impostos do carro e a “manutenção preventiva” – há casos de cobrança semanal de 10% para a conservação do veículo. Até R$ 2 mil de caução são exigidos, em algumas negociações, por possíveis casos de avarias. Nos sites, há parceiros que procuram carro para alugar e oferecem pagamento de R$ 400 por semana.

Não há regras nem sequer um padrão de modelo de negócios, uma vez que cada proprietário de carro, que se torna um “empregador”, decide sobre gerenciamento de lucros e despesas com seus parceiros. Especialistas em trânsito e em Direito do Trabalho apostam em uma deterioração do serviço, o que pode afetar os passageiros (mais informações nesta página).

“Não estipulo metas, mas eles têm conta para pagar e precisam tirar pelo menos R$ 3 mil por mês para conseguir algum lucro. Se antes trabalhavam dez horas, depois que a tarifa caiu (redução de 15% no ano passado) passaram a trabalhar 14 horas porque precisam, por necessidade”, explica um motorista da Uber de 56 anos, dono de uma minifrota com três carros e três condutores em São Paulo.

Ele conta também que não fez contrato nenhum e nega que a atividade seja de locação de veículo. “São pessoas do meu relacionamento e estão em parceria, não alugando.”

No caso de um motorista de 49 anos, que não quis se identificar, a parceria é com o filho de um amigo. “Se dependesse só do lucro do meu carro, não pagaria o financiamento do segundo veículo, por isso chamei outro motorista”, afirma. Ele também não fez contrato para firmar o serviço. Segundo o condutor, o lucro e a despesa semanal são divididos sem contar a taxa de 10% cobrada do parceiro para compra de óleo, troca de filtro e reposição de pneus.

‘Fantasmas’. Motoristas da Uber no Rio têm enfrentado problemas semelhantes aos dos colegas taxistas, como pagamento de diárias e a concorrência do que chamam de profissionais “fantasmas”. De acordo com relatos, há pessoas ligadas ao aplicativo terceirizando a própria conta.

O Estado apurou que o esquema consiste em mais de um carro circulando com o mesmo vínculo com a Uber. Ou seja, o motorista autorizado pelo sistema alternativo de transporte subloca sua licença, mediante pagamento de uma taxa.

“Tem gente colocando outro para trabalhar no lugar. Ou com mais de um carro na mesma conta. São os fantasmas. É complicado, porque começam a vir as reclamações. As pessoas deixam de confiar. Comecei trabalhando só com Uber Black, mas já tive de aderir ao Uber X porque o rendimento caiu”, diz um motorista que se identificou como Augusto, de 56 anos, referindo-se aos serviços de carros de luxo e o que aceita veículos mais populares.

Augusto trabalhava como motorista em uma multinacional do petróleo e foi demitido no ano passado, com a crise no setor. Com a indenização, comprou um Corolla, que equipou com geladeira portátil, para oferecer refrigerante e água aos passageiros. “No início, ganhava mais do que na empresa, mas isso mudou”, afirma.

“Estou esperando a regularização. Tem de ter regras, como o motorista ter o carro no seu nome. Isso vai restringir a concorrência”, diz.

Condutor mostra extrato de corridas Foto: Alex Silva|Estadão

Regra. Se adotada, a exigência afastaria motoristas como Toni, de 39 anos. Ele dirige um carro alugado pelo qual paga R$ 2,4 mil por mês. “A Uber não se importa se você aluga o carro ou se o carro é seu. Eles dão o aplicativo, o suporte.” Animado com R$ 180 a R$ 300 que ganha por dia, na semana passada também publicou um anúncio em um site: “Assumo financiamento do seu veículo”.

“Meu nome está ‘negativado’. Não posso ter financiamento. Mas, se a prestação fosse de até R$ 1,5 mil, estaria valendo a pena”, afirma. Toni, porém, desistiu da ideia ao ser bloqueado pelo aplicativo por ter recebido notas baixas dos passageiros. “A Uber não te dá segurança. Se eu for excluído de vez, entrego o carro e vou procurar alguma coisa para fazer. Eles não dão chance para o motorista se defender. Nem sei o que fiz”, diz.

SERVIÇO TERÁ QUEDA DE QUALIDADE, DIZEM ESPECIALISTAS

Com a brecha para a formação de minifrotas na Uber, o consultor de transporte e trânsito Flamínio Fichmann afirma que a tendência é de queda na qualidade do serviço. “A Uber está errando a mão. Essa terceirização sem responsabilidade coloca o serviço em um limbo. O uso de um veículo por um terceiro não deveria acontecer”, afirma. 

“O que antes era apontado como benefício, que seriam os motoristas de frota de táxi migrar para a Uber para conseguir financiar veículo próprio, por exemplo, agora pode ser o contrário. Sem limite de carro por motorista, empresários de frota podem migrar para a Uber. Em vez de frotista de táxi, passo a ser frotista de Uber”, diz. “Isso é muito ruim.”

O advogado e professor de Direito do Trabalho da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Paulo Sérgio João compara o sistema de frotas de taxistas com o modelo em construção entre motoristas da Uber. “O que os motoristas do aplicativo estão fazendo tem semelhança com o sistema das antigas frotas de veículo para táxi. Funciona do mesmo jeito, informalmente”, diz.

Nesse caso de frotas que prestam serviço para a Uber, não há dúvidas de que funciona como sistema de locação de veículos.” Para o engenheiro e mestre em transporte Sérgio Ejzenberg, a Uber só vai se preocupar quando a qualidade do serviço cair e a empresa perder a rentabilidade. “O mercado se autorregula. A Uber tem de se cuidar como qualquer empresa, senão a concorrência vai atropelar. Se começar a virar bagunça, o usuário vai perceber a queda de qualidade”, afirma.

Concorrência. Um dos principais articuladores do modelo de regulamentação proposto pela Prefeitura, o diretor da São Paulo Negócios, Rodrigo Pirajá, diz que a Uber hoje está “nadando de braçada” na capital. “Eles (aplicativos de transporte de passageiros) fazem o que querem. E qual é o problema da demora (em regulamentar)? Eles estão ganhando espaço. É um mercado em expansão”, explica. 

A Uber esclarece, em nota, que o motorista pode cadastrar quantos carros quiser, “desde que atendidos os requisitos e condições estabelecidos”. “É importante lembrar que os carros e os motoristas parceiros cadastrados passam por uma extensa checagem de documentação”, afirma a empresa. 

Segundo a Uber, o carro que o motorista parceiro vai cadastrar precisa ter em dia licenciamento, DPVAT e apólice de seguro com cobertura para acidentes pessoais a passageiros a partir de R$ 50 mil.

Promessa de serviço diferenciado e inovador, a Uber tem permitido a replicação de estratégias comuns a taxistas. Em São Paulo e no Rio, as duas maiores metrópoles do País, motoristas cadastrados no aplicativo estão criando “minifrotas”, sublocando veículos, fixando metas de rendimento semanal e cobrando lucros diários de condutores parceiros. Na Uber, um só motorista pode cadastrar quantos carros quiser, o que permite, por exemplo, a formação de frota sem limite de veículos.

A “terceirização” tem o aval e incentivo da empresa americana. Além de cobrar até 25% do valor de cada viagem, não estabelecer qualquer relação trabalhista e não exigir seguro do carro, a empresa não faz nenhum tipo de controle sobre o vínculo entre proprietários de veículos e locatários prestadores de serviço. O esquema de minifrota se assemelha ao modelo de dependência estabelecido entre donos de alvarás e taxistas, com uma diferença: na Uber, o proprietário do carro – e não do alvará – é quem dita as regras.

 Foto: Alex Silva|Estadão

Em sites de classificados, há anúncios de contratação de motoristas. Cobram entre R$ 500 e R$ 700 por semana pelo “aluguel”, com ou sem contrato assinado. O Estado apurou que há proprietários que pedem para fazer um teste de uma semana com o motorista interessado. O objetivo é checar se ele é “rentável”, ou seja, se trabalha horas o suficiente para trazer lucro.

Proprietários esperam também que o interessado já esteja habilitado na Uber – outros dispensam essa exigência. Multas, combustível e avarias ficam por conta do “terceirizado”, mas há casos de divisão de despesas também. O dono paga impostos do carro e a “manutenção preventiva” – há casos de cobrança semanal de 10% para a conservação do veículo. Até R$ 2 mil de caução são exigidos, em algumas negociações, por possíveis casos de avarias. Nos sites, há parceiros que procuram carro para alugar e oferecem pagamento de R$ 400 por semana.

Não há regras nem sequer um padrão de modelo de negócios, uma vez que cada proprietário de carro, que se torna um “empregador”, decide sobre gerenciamento de lucros e despesas com seus parceiros. Especialistas em trânsito e em Direito do Trabalho apostam em uma deterioração do serviço, o que pode afetar os passageiros (mais informações nesta página).

“Não estipulo metas, mas eles têm conta para pagar e precisam tirar pelo menos R$ 3 mil por mês para conseguir algum lucro. Se antes trabalhavam dez horas, depois que a tarifa caiu (redução de 15% no ano passado) passaram a trabalhar 14 horas porque precisam, por necessidade”, explica um motorista da Uber de 56 anos, dono de uma minifrota com três carros e três condutores em São Paulo.

Ele conta também que não fez contrato nenhum e nega que a atividade seja de locação de veículo. “São pessoas do meu relacionamento e estão em parceria, não alugando.”

No caso de um motorista de 49 anos, que não quis se identificar, a parceria é com o filho de um amigo. “Se dependesse só do lucro do meu carro, não pagaria o financiamento do segundo veículo, por isso chamei outro motorista”, afirma. Ele também não fez contrato para firmar o serviço. Segundo o condutor, o lucro e a despesa semanal são divididos sem contar a taxa de 10% cobrada do parceiro para compra de óleo, troca de filtro e reposição de pneus.

‘Fantasmas’. Motoristas da Uber no Rio têm enfrentado problemas semelhantes aos dos colegas taxistas, como pagamento de diárias e a concorrência do que chamam de profissionais “fantasmas”. De acordo com relatos, há pessoas ligadas ao aplicativo terceirizando a própria conta.

O Estado apurou que o esquema consiste em mais de um carro circulando com o mesmo vínculo com a Uber. Ou seja, o motorista autorizado pelo sistema alternativo de transporte subloca sua licença, mediante pagamento de uma taxa.

“Tem gente colocando outro para trabalhar no lugar. Ou com mais de um carro na mesma conta. São os fantasmas. É complicado, porque começam a vir as reclamações. As pessoas deixam de confiar. Comecei trabalhando só com Uber Black, mas já tive de aderir ao Uber X porque o rendimento caiu”, diz um motorista que se identificou como Augusto, de 56 anos, referindo-se aos serviços de carros de luxo e o que aceita veículos mais populares.

Augusto trabalhava como motorista em uma multinacional do petróleo e foi demitido no ano passado, com a crise no setor. Com a indenização, comprou um Corolla, que equipou com geladeira portátil, para oferecer refrigerante e água aos passageiros. “No início, ganhava mais do que na empresa, mas isso mudou”, afirma.

“Estou esperando a regularização. Tem de ter regras, como o motorista ter o carro no seu nome. Isso vai restringir a concorrência”, diz.

Condutor mostra extrato de corridas Foto: Alex Silva|Estadão

Regra. Se adotada, a exigência afastaria motoristas como Toni, de 39 anos. Ele dirige um carro alugado pelo qual paga R$ 2,4 mil por mês. “A Uber não se importa se você aluga o carro ou se o carro é seu. Eles dão o aplicativo, o suporte.” Animado com R$ 180 a R$ 300 que ganha por dia, na semana passada também publicou um anúncio em um site: “Assumo financiamento do seu veículo”.

“Meu nome está ‘negativado’. Não posso ter financiamento. Mas, se a prestação fosse de até R$ 1,5 mil, estaria valendo a pena”, afirma. Toni, porém, desistiu da ideia ao ser bloqueado pelo aplicativo por ter recebido notas baixas dos passageiros. “A Uber não te dá segurança. Se eu for excluído de vez, entrego o carro e vou procurar alguma coisa para fazer. Eles não dão chance para o motorista se defender. Nem sei o que fiz”, diz.

SERVIÇO TERÁ QUEDA DE QUALIDADE, DIZEM ESPECIALISTAS

Com a brecha para a formação de minifrotas na Uber, o consultor de transporte e trânsito Flamínio Fichmann afirma que a tendência é de queda na qualidade do serviço. “A Uber está errando a mão. Essa terceirização sem responsabilidade coloca o serviço em um limbo. O uso de um veículo por um terceiro não deveria acontecer”, afirma. 

“O que antes era apontado como benefício, que seriam os motoristas de frota de táxi migrar para a Uber para conseguir financiar veículo próprio, por exemplo, agora pode ser o contrário. Sem limite de carro por motorista, empresários de frota podem migrar para a Uber. Em vez de frotista de táxi, passo a ser frotista de Uber”, diz. “Isso é muito ruim.”

O advogado e professor de Direito do Trabalho da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Paulo Sérgio João compara o sistema de frotas de taxistas com o modelo em construção entre motoristas da Uber. “O que os motoristas do aplicativo estão fazendo tem semelhança com o sistema das antigas frotas de veículo para táxi. Funciona do mesmo jeito, informalmente”, diz.

Nesse caso de frotas que prestam serviço para a Uber, não há dúvidas de que funciona como sistema de locação de veículos.” Para o engenheiro e mestre em transporte Sérgio Ejzenberg, a Uber só vai se preocupar quando a qualidade do serviço cair e a empresa perder a rentabilidade. “O mercado se autorregula. A Uber tem de se cuidar como qualquer empresa, senão a concorrência vai atropelar. Se começar a virar bagunça, o usuário vai perceber a queda de qualidade”, afirma.

Concorrência. Um dos principais articuladores do modelo de regulamentação proposto pela Prefeitura, o diretor da São Paulo Negócios, Rodrigo Pirajá, diz que a Uber hoje está “nadando de braçada” na capital. “Eles (aplicativos de transporte de passageiros) fazem o que querem. E qual é o problema da demora (em regulamentar)? Eles estão ganhando espaço. É um mercado em expansão”, explica. 

A Uber esclarece, em nota, que o motorista pode cadastrar quantos carros quiser, “desde que atendidos os requisitos e condições estabelecidos”. “É importante lembrar que os carros e os motoristas parceiros cadastrados passam por uma extensa checagem de documentação”, afirma a empresa. 

Segundo a Uber, o carro que o motorista parceiro vai cadastrar precisa ter em dia licenciamento, DPVAT e apólice de seguro com cobertura para acidentes pessoais a passageiros a partir de R$ 50 mil.

Tudo Sobre

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.