Nunes promulga lei que libera barulho de até 75 decibéis em shows e ‘dark kitchens’ nos bairros


Mudança entra em vigor nesta quarta-feira, 30; proposta do Executivo foi criticada por parte da sociedade civil e até por empresas do setor de alimentação

Por Priscila Mengue
Atualização:

O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), promulgou o projeto de lei que libera a emissão de barulho até 75 decibéis no entorno de shows e grandes eventos e a instalação de “dark kitchens” em áreas residenciais na terça-feira, 29. A assinatura da nova lei ocorreu no mesmo dia em que a Câmara Municipal aprovou a proposta, de autoria do Executivo, em segunda e definitiva votação. As mudanças têm sido criticadas por parte da sociedade civil, associações de bairro e até empresas do setor de alimentação.

A nova lei – de número 17.853/22 – entrou em vigor nesta quarta-feira, 30, após ser publicada no Diário Oficial. A promulgação ocorreu na véspera de uma viagem de Nunes a Montevidéu, para compromissos oficiais. No caso das “dark kitchens”, cozinhas industriais de produção de refeições para a venda por serviços de entrega, as unidades que estão hoje em operação terão 90 dias para se regularizar.

De autoria do Executivo e enviada para deliberação dos vereadores em maio, a lei é voltada à regulação da atividade das dark kitchens, que se expandiram especialmente durante a pandemia e o crescimento de aplicativos de entrega. O texto passou por modificações. A mais criticada foi a inclusão do artigo 13, relativo ao novo limite de decibéis para o entorno de shows e eventos de grande porte.

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A liderança do governo chegou a propor o limite de 85 decibéis, teto que foi reduzido para 75 decibéis. O limite se refere a eventos e shows de grande porte previamente autorizados pelo poder público, “assim definidos em decreto regulamentar, que por sua natureza não ocorrem de forma continuada”. Outra mudança na versão aprovada é a inclusão de um parágrafo que destaca que as disposições constantes no artigo “não eximem os responsáveis do cumprimento de medidas mitigadoras relacionadas com o ruído a serem implementadas no estabelecimento ou entorno, conforme o caso”.

A mudança foi criticada por movimentos da sociedade civil e parte dos vereadores, por envolver um tema não diretamente ligado ao do projeto, o que popularmente é chamado de “jabuti”. Abaixo-assinados apresentados na Câmara reuniram mais de 20,8 mil assinaturas contrárias ao novo limite de decibéis.

Na sessão plenária desta terça, o vereador Celso Giannazi (PSOL) declarou que a bancada do partido pretende contestar a aprovação do PL na Justiça. “É um jabuti sim, porque trata de questões diferentes”, afirmou. Na semana passada, uma decisão do TJ-SP considerou “inconstitucional” o fim da gratuidade para idosos de 60 a 64 anos nos ônibus da capital paulista, por ter sido inserido em um projeto sobre outro tema.

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Ao Estadão antes da votação, o promotor de Justiça do Meio Ambiente da Capital, Jorge Mamede Masseran, disse que entraria com representação para o procurador-geral do Tribunal de Justiça, pedindo a declaração da inconstitucionalidade da lei, caso fosse aprovada.

Parte das empresas dos setor também tem criticado a lei, por restringir o tamanho desse tipo de estabelecimento a 500 metros quadrados em áreas residenciais. Em nota emitida antes da aprovação do então PL, a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) disse que a mudança inviabilizaria economicamente a “manutenção das operações existentes” e pode impedir a abertura de novas unidades.

Já vizinhos de “dark kitchens” declararam em audiências públicas nas últimas semanas que a nova lei é insuficiente. Um dos pontos mais criticados é a falta de restrição ao horário de funcionamento. Moradores do entorno desses espaços relatam um cotidiano de poluição atmosférica e sonora.

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A mudança tem motivado críticas de associações de bairro e moradores por possibilitar o aumento do ruído em áreas hoje com emissão limitada a níveis inferiores, como 50 decibéis, a depender do zoneamento da vizinhança. A lei deve atingir especialmente as vizinhanças de arenas.

Para especialistas, a exposição prolongada a barulho alto pode causar danos ao corpo, como distúrbios de sono, doenças cardiovasculares e problemas à saúde mental. Parte dos vereadores de oposição, tem associado a proposta às três notificações que o Allianz Parque recebeu por violações ao Programa Silêncio Urbano (Psiu) no primeiro semestre, o que poderia implicar no fechamento administrativo. Em abril, por exemplo, um show no local chegou à medição de 74 decibéis.

Em nota, a gestão Nunes afirmou que os esforços da Câmara e da Prefeitura “têm sido na direção de promover um debate amplo na busca da melhor definição de parâmetros de incomodidade de ruídos para regulamentar o artigo 146 da Lei de Uso e Ocupação do Solo (16.402/2016)”. “Tendo em vista que o projeto de lei das dark kitchens trata do regramento para uma atividade nova na cidade e de seus parâmetros de incomodidade, entendeu-se possível a inclusão no texto de definição de parâmetros de incomodidade de ruído nas situações não previstas anteriormente na legislação.”

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Em reportagem do Estadão, Abraham Gurvitch, diretor de relacionamento com o mercado da Associação Brasileira das Empresas de Eventos em São Paulo (Abeoc), disse considerar os níveis de ruído previstos na nova lei razoáveis. “No dia do jogo do Brasil, eu estava sozinho na minha sala, com a TV ligada, os picos do decibelímetro foram de 80 decibéis. Está havendo um exagero. Os níveis da nova legislação são razoáveis. A sociedade evolui mais rápido que a regulamentação das atividades.”

Dark kitchens são cozinhas voltadas à produção de refeições e alimentos em geral para a entrega, como por aplicativos. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

‘Dark kitchens’: o que a nova lei na cidade de SP determina

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As chamadas “dark kitchens” são cozinhas industriais voltadas exclusivamente à produção de refeições para entrega, geralmente por aplicativos, sem o atendimento de clientes no local. Moradores de vizinhanças com dark kitchens reclamam dos riscos de poluição sonora e atmosférica causada pelos exaustores e outros equipamentos. Também têm criticado a falta de clareza sobre como seria a fiscalização do setor. Outro ponto questionado foi a ausência de estudo de impacto ambiental desse tipo de atividade.

O texto aprovado enquadra esses espaços em duas subcategorias, a Ind-1b-1 e a Ind-2-1, classificações existentes para outros tipos de estabelecimentos, na Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (a Lei de Zoneamento), de 2016.

A nova lei inclui as dark kitchens de três a dez cozinhas e com até 500 m² como Ind-1b-1. Na lei de zoneamento, essa classificação é voltada a estabelecimentos de fabricação de produtos de padaria, confeitaria, pastelaria e afins com “potencial poluidor”, em especial de odores, “passível de controle tecnológico”. É considerada “compatível com a vizinhança residencial no que diz respeito às características de ocupação dos lotes, de acesso, de localização, de tráfego, de serviços urbanos e aos níveis de ruído, de vibração e de poluição ambiental”.

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Já a Ind-2-1 se refere aos locais com mais de dez cozinhas ou 500 m². Na Lei de Zoneamento, essa classificação é voltada a espaços de “preparação de alimentos, conservas, produtos de cereais, bebidas, dentre outros”. Nesse caso, trata-se de “atividade industrial geradora de impactos urbanísticos e ambientais, que implica a fixação de padrões específicos referentes às características de ocupação dos lotes, de acesso, de localização, de tráfego, de serviços urbanos e aos níveis de ruído, de vibração e de poluição ambiental”.

A lei determina que cada cozinha não pode ser menor que 12 m². Uma mudança no texto original delimitou um distanciamento mínimo entre cada dark kitchen, limitadas a um estabelecimento dentro de cada raio de 300 metros.

Para a instalação de novos estabelecimentos, deverá ser apresentado previamente, à Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente, um memorial de caracterização do empreendimento. Os espaços deverão oferecer infraestrutura mínima para entregadores, como banheiros e água gratuita. A lei também determina que os estabelecimentos já em funcionamento tenham 90 dias para se regularizar.

Ainda segundo a nova lei, a descarga de gases de exaustão deverá ser feita a uma altura de 5 metros em relação ao topo de todas as construções. Outro ponto é que os estabelecimentos não poderão reservar vagas na via pública como estacionamento para a retirada e entrega de mercadorias.

Também será exigido que a entrada dos estabelecimentos tenha uma placa com informações das empresas que utilizam o espaço. Além disso, os locais com mais de 100 m² terão de ter um bombeiro civil para garantir a segurança.

“O cumprimento das disposições específicas de natureza urbanística e edilícia constantes desta Lei não exime os responsáveis pela atividade principal e pela operação das cozinhas do atendimento à normatização aplicável às atividades industriais não residenciais, tanto de natureza municipal, como estadual e federal”, destaca trecho da lei.

Em relação a ruídos, os estabelecimentos poderão ser responsabilizados tanto pelo barulho dos equipamentos quanto o gerado pela circulação de motocicletas e demais atividades, se for considerado em desacordo com a legislação em vigor. “Os responsáveis pelos estabelecimentos serão responsáveis pela incomodidade que seus prestadores de serviço, nesta qualidade, bem como seus funcionários, venham a causar a terceiros, ainda que em área externa às suas dependências, como passeio e vias públicas”, aponta outro trecho.

O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), promulgou o projeto de lei que libera a emissão de barulho até 75 decibéis no entorno de shows e grandes eventos e a instalação de “dark kitchens” em áreas residenciais na terça-feira, 29. A assinatura da nova lei ocorreu no mesmo dia em que a Câmara Municipal aprovou a proposta, de autoria do Executivo, em segunda e definitiva votação. As mudanças têm sido criticadas por parte da sociedade civil, associações de bairro e até empresas do setor de alimentação.

A nova lei – de número 17.853/22 – entrou em vigor nesta quarta-feira, 30, após ser publicada no Diário Oficial. A promulgação ocorreu na véspera de uma viagem de Nunes a Montevidéu, para compromissos oficiais. No caso das “dark kitchens”, cozinhas industriais de produção de refeições para a venda por serviços de entrega, as unidades que estão hoje em operação terão 90 dias para se regularizar.

De autoria do Executivo e enviada para deliberação dos vereadores em maio, a lei é voltada à regulação da atividade das dark kitchens, que se expandiram especialmente durante a pandemia e o crescimento de aplicativos de entrega. O texto passou por modificações. A mais criticada foi a inclusão do artigo 13, relativo ao novo limite de decibéis para o entorno de shows e eventos de grande porte.

A liderança do governo chegou a propor o limite de 85 decibéis, teto que foi reduzido para 75 decibéis. O limite se refere a eventos e shows de grande porte previamente autorizados pelo poder público, “assim definidos em decreto regulamentar, que por sua natureza não ocorrem de forma continuada”. Outra mudança na versão aprovada é a inclusão de um parágrafo que destaca que as disposições constantes no artigo “não eximem os responsáveis do cumprimento de medidas mitigadoras relacionadas com o ruído a serem implementadas no estabelecimento ou entorno, conforme o caso”.

A mudança foi criticada por movimentos da sociedade civil e parte dos vereadores, por envolver um tema não diretamente ligado ao do projeto, o que popularmente é chamado de “jabuti”. Abaixo-assinados apresentados na Câmara reuniram mais de 20,8 mil assinaturas contrárias ao novo limite de decibéis.

Na sessão plenária desta terça, o vereador Celso Giannazi (PSOL) declarou que a bancada do partido pretende contestar a aprovação do PL na Justiça. “É um jabuti sim, porque trata de questões diferentes”, afirmou. Na semana passada, uma decisão do TJ-SP considerou “inconstitucional” o fim da gratuidade para idosos de 60 a 64 anos nos ônibus da capital paulista, por ter sido inserido em um projeto sobre outro tema.

Ao Estadão antes da votação, o promotor de Justiça do Meio Ambiente da Capital, Jorge Mamede Masseran, disse que entraria com representação para o procurador-geral do Tribunal de Justiça, pedindo a declaração da inconstitucionalidade da lei, caso fosse aprovada.

Parte das empresas dos setor também tem criticado a lei, por restringir o tamanho desse tipo de estabelecimento a 500 metros quadrados em áreas residenciais. Em nota emitida antes da aprovação do então PL, a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) disse que a mudança inviabilizaria economicamente a “manutenção das operações existentes” e pode impedir a abertura de novas unidades.

Já vizinhos de “dark kitchens” declararam em audiências públicas nas últimas semanas que a nova lei é insuficiente. Um dos pontos mais criticados é a falta de restrição ao horário de funcionamento. Moradores do entorno desses espaços relatam um cotidiano de poluição atmosférica e sonora.

A mudança tem motivado críticas de associações de bairro e moradores por possibilitar o aumento do ruído em áreas hoje com emissão limitada a níveis inferiores, como 50 decibéis, a depender do zoneamento da vizinhança. A lei deve atingir especialmente as vizinhanças de arenas.

Para especialistas, a exposição prolongada a barulho alto pode causar danos ao corpo, como distúrbios de sono, doenças cardiovasculares e problemas à saúde mental. Parte dos vereadores de oposição, tem associado a proposta às três notificações que o Allianz Parque recebeu por violações ao Programa Silêncio Urbano (Psiu) no primeiro semestre, o que poderia implicar no fechamento administrativo. Em abril, por exemplo, um show no local chegou à medição de 74 decibéis.

Em nota, a gestão Nunes afirmou que os esforços da Câmara e da Prefeitura “têm sido na direção de promover um debate amplo na busca da melhor definição de parâmetros de incomodidade de ruídos para regulamentar o artigo 146 da Lei de Uso e Ocupação do Solo (16.402/2016)”. “Tendo em vista que o projeto de lei das dark kitchens trata do regramento para uma atividade nova na cidade e de seus parâmetros de incomodidade, entendeu-se possível a inclusão no texto de definição de parâmetros de incomodidade de ruído nas situações não previstas anteriormente na legislação.”

Em reportagem do Estadão, Abraham Gurvitch, diretor de relacionamento com o mercado da Associação Brasileira das Empresas de Eventos em São Paulo (Abeoc), disse considerar os níveis de ruído previstos na nova lei razoáveis. “No dia do jogo do Brasil, eu estava sozinho na minha sala, com a TV ligada, os picos do decibelímetro foram de 80 decibéis. Está havendo um exagero. Os níveis da nova legislação são razoáveis. A sociedade evolui mais rápido que a regulamentação das atividades.”

Dark kitchens são cozinhas voltadas à produção de refeições e alimentos em geral para a entrega, como por aplicativos. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

‘Dark kitchens’: o que a nova lei na cidade de SP determina

As chamadas “dark kitchens” são cozinhas industriais voltadas exclusivamente à produção de refeições para entrega, geralmente por aplicativos, sem o atendimento de clientes no local. Moradores de vizinhanças com dark kitchens reclamam dos riscos de poluição sonora e atmosférica causada pelos exaustores e outros equipamentos. Também têm criticado a falta de clareza sobre como seria a fiscalização do setor. Outro ponto questionado foi a ausência de estudo de impacto ambiental desse tipo de atividade.

O texto aprovado enquadra esses espaços em duas subcategorias, a Ind-1b-1 e a Ind-2-1, classificações existentes para outros tipos de estabelecimentos, na Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (a Lei de Zoneamento), de 2016.

A nova lei inclui as dark kitchens de três a dez cozinhas e com até 500 m² como Ind-1b-1. Na lei de zoneamento, essa classificação é voltada a estabelecimentos de fabricação de produtos de padaria, confeitaria, pastelaria e afins com “potencial poluidor”, em especial de odores, “passível de controle tecnológico”. É considerada “compatível com a vizinhança residencial no que diz respeito às características de ocupação dos lotes, de acesso, de localização, de tráfego, de serviços urbanos e aos níveis de ruído, de vibração e de poluição ambiental”.

Já a Ind-2-1 se refere aos locais com mais de dez cozinhas ou 500 m². Na Lei de Zoneamento, essa classificação é voltada a espaços de “preparação de alimentos, conservas, produtos de cereais, bebidas, dentre outros”. Nesse caso, trata-se de “atividade industrial geradora de impactos urbanísticos e ambientais, que implica a fixação de padrões específicos referentes às características de ocupação dos lotes, de acesso, de localização, de tráfego, de serviços urbanos e aos níveis de ruído, de vibração e de poluição ambiental”.

A lei determina que cada cozinha não pode ser menor que 12 m². Uma mudança no texto original delimitou um distanciamento mínimo entre cada dark kitchen, limitadas a um estabelecimento dentro de cada raio de 300 metros.

Para a instalação de novos estabelecimentos, deverá ser apresentado previamente, à Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente, um memorial de caracterização do empreendimento. Os espaços deverão oferecer infraestrutura mínima para entregadores, como banheiros e água gratuita. A lei também determina que os estabelecimentos já em funcionamento tenham 90 dias para se regularizar.

Ainda segundo a nova lei, a descarga de gases de exaustão deverá ser feita a uma altura de 5 metros em relação ao topo de todas as construções. Outro ponto é que os estabelecimentos não poderão reservar vagas na via pública como estacionamento para a retirada e entrega de mercadorias.

Também será exigido que a entrada dos estabelecimentos tenha uma placa com informações das empresas que utilizam o espaço. Além disso, os locais com mais de 100 m² terão de ter um bombeiro civil para garantir a segurança.

“O cumprimento das disposições específicas de natureza urbanística e edilícia constantes desta Lei não exime os responsáveis pela atividade principal e pela operação das cozinhas do atendimento à normatização aplicável às atividades industriais não residenciais, tanto de natureza municipal, como estadual e federal”, destaca trecho da lei.

Em relação a ruídos, os estabelecimentos poderão ser responsabilizados tanto pelo barulho dos equipamentos quanto o gerado pela circulação de motocicletas e demais atividades, se for considerado em desacordo com a legislação em vigor. “Os responsáveis pelos estabelecimentos serão responsáveis pela incomodidade que seus prestadores de serviço, nesta qualidade, bem como seus funcionários, venham a causar a terceiros, ainda que em área externa às suas dependências, como passeio e vias públicas”, aponta outro trecho.

O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), promulgou o projeto de lei que libera a emissão de barulho até 75 decibéis no entorno de shows e grandes eventos e a instalação de “dark kitchens” em áreas residenciais na terça-feira, 29. A assinatura da nova lei ocorreu no mesmo dia em que a Câmara Municipal aprovou a proposta, de autoria do Executivo, em segunda e definitiva votação. As mudanças têm sido criticadas por parte da sociedade civil, associações de bairro e até empresas do setor de alimentação.

A nova lei – de número 17.853/22 – entrou em vigor nesta quarta-feira, 30, após ser publicada no Diário Oficial. A promulgação ocorreu na véspera de uma viagem de Nunes a Montevidéu, para compromissos oficiais. No caso das “dark kitchens”, cozinhas industriais de produção de refeições para a venda por serviços de entrega, as unidades que estão hoje em operação terão 90 dias para se regularizar.

De autoria do Executivo e enviada para deliberação dos vereadores em maio, a lei é voltada à regulação da atividade das dark kitchens, que se expandiram especialmente durante a pandemia e o crescimento de aplicativos de entrega. O texto passou por modificações. A mais criticada foi a inclusão do artigo 13, relativo ao novo limite de decibéis para o entorno de shows e eventos de grande porte.

A liderança do governo chegou a propor o limite de 85 decibéis, teto que foi reduzido para 75 decibéis. O limite se refere a eventos e shows de grande porte previamente autorizados pelo poder público, “assim definidos em decreto regulamentar, que por sua natureza não ocorrem de forma continuada”. Outra mudança na versão aprovada é a inclusão de um parágrafo que destaca que as disposições constantes no artigo “não eximem os responsáveis do cumprimento de medidas mitigadoras relacionadas com o ruído a serem implementadas no estabelecimento ou entorno, conforme o caso”.

A mudança foi criticada por movimentos da sociedade civil e parte dos vereadores, por envolver um tema não diretamente ligado ao do projeto, o que popularmente é chamado de “jabuti”. Abaixo-assinados apresentados na Câmara reuniram mais de 20,8 mil assinaturas contrárias ao novo limite de decibéis.

Na sessão plenária desta terça, o vereador Celso Giannazi (PSOL) declarou que a bancada do partido pretende contestar a aprovação do PL na Justiça. “É um jabuti sim, porque trata de questões diferentes”, afirmou. Na semana passada, uma decisão do TJ-SP considerou “inconstitucional” o fim da gratuidade para idosos de 60 a 64 anos nos ônibus da capital paulista, por ter sido inserido em um projeto sobre outro tema.

Ao Estadão antes da votação, o promotor de Justiça do Meio Ambiente da Capital, Jorge Mamede Masseran, disse que entraria com representação para o procurador-geral do Tribunal de Justiça, pedindo a declaração da inconstitucionalidade da lei, caso fosse aprovada.

Parte das empresas dos setor também tem criticado a lei, por restringir o tamanho desse tipo de estabelecimento a 500 metros quadrados em áreas residenciais. Em nota emitida antes da aprovação do então PL, a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) disse que a mudança inviabilizaria economicamente a “manutenção das operações existentes” e pode impedir a abertura de novas unidades.

Já vizinhos de “dark kitchens” declararam em audiências públicas nas últimas semanas que a nova lei é insuficiente. Um dos pontos mais criticados é a falta de restrição ao horário de funcionamento. Moradores do entorno desses espaços relatam um cotidiano de poluição atmosférica e sonora.

A mudança tem motivado críticas de associações de bairro e moradores por possibilitar o aumento do ruído em áreas hoje com emissão limitada a níveis inferiores, como 50 decibéis, a depender do zoneamento da vizinhança. A lei deve atingir especialmente as vizinhanças de arenas.

Para especialistas, a exposição prolongada a barulho alto pode causar danos ao corpo, como distúrbios de sono, doenças cardiovasculares e problemas à saúde mental. Parte dos vereadores de oposição, tem associado a proposta às três notificações que o Allianz Parque recebeu por violações ao Programa Silêncio Urbano (Psiu) no primeiro semestre, o que poderia implicar no fechamento administrativo. Em abril, por exemplo, um show no local chegou à medição de 74 decibéis.

Em nota, a gestão Nunes afirmou que os esforços da Câmara e da Prefeitura “têm sido na direção de promover um debate amplo na busca da melhor definição de parâmetros de incomodidade de ruídos para regulamentar o artigo 146 da Lei de Uso e Ocupação do Solo (16.402/2016)”. “Tendo em vista que o projeto de lei das dark kitchens trata do regramento para uma atividade nova na cidade e de seus parâmetros de incomodidade, entendeu-se possível a inclusão no texto de definição de parâmetros de incomodidade de ruído nas situações não previstas anteriormente na legislação.”

Em reportagem do Estadão, Abraham Gurvitch, diretor de relacionamento com o mercado da Associação Brasileira das Empresas de Eventos em São Paulo (Abeoc), disse considerar os níveis de ruído previstos na nova lei razoáveis. “No dia do jogo do Brasil, eu estava sozinho na minha sala, com a TV ligada, os picos do decibelímetro foram de 80 decibéis. Está havendo um exagero. Os níveis da nova legislação são razoáveis. A sociedade evolui mais rápido que a regulamentação das atividades.”

Dark kitchens são cozinhas voltadas à produção de refeições e alimentos em geral para a entrega, como por aplicativos. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

‘Dark kitchens’: o que a nova lei na cidade de SP determina

As chamadas “dark kitchens” são cozinhas industriais voltadas exclusivamente à produção de refeições para entrega, geralmente por aplicativos, sem o atendimento de clientes no local. Moradores de vizinhanças com dark kitchens reclamam dos riscos de poluição sonora e atmosférica causada pelos exaustores e outros equipamentos. Também têm criticado a falta de clareza sobre como seria a fiscalização do setor. Outro ponto questionado foi a ausência de estudo de impacto ambiental desse tipo de atividade.

O texto aprovado enquadra esses espaços em duas subcategorias, a Ind-1b-1 e a Ind-2-1, classificações existentes para outros tipos de estabelecimentos, na Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (a Lei de Zoneamento), de 2016.

A nova lei inclui as dark kitchens de três a dez cozinhas e com até 500 m² como Ind-1b-1. Na lei de zoneamento, essa classificação é voltada a estabelecimentos de fabricação de produtos de padaria, confeitaria, pastelaria e afins com “potencial poluidor”, em especial de odores, “passível de controle tecnológico”. É considerada “compatível com a vizinhança residencial no que diz respeito às características de ocupação dos lotes, de acesso, de localização, de tráfego, de serviços urbanos e aos níveis de ruído, de vibração e de poluição ambiental”.

Já a Ind-2-1 se refere aos locais com mais de dez cozinhas ou 500 m². Na Lei de Zoneamento, essa classificação é voltada a espaços de “preparação de alimentos, conservas, produtos de cereais, bebidas, dentre outros”. Nesse caso, trata-se de “atividade industrial geradora de impactos urbanísticos e ambientais, que implica a fixação de padrões específicos referentes às características de ocupação dos lotes, de acesso, de localização, de tráfego, de serviços urbanos e aos níveis de ruído, de vibração e de poluição ambiental”.

A lei determina que cada cozinha não pode ser menor que 12 m². Uma mudança no texto original delimitou um distanciamento mínimo entre cada dark kitchen, limitadas a um estabelecimento dentro de cada raio de 300 metros.

Para a instalação de novos estabelecimentos, deverá ser apresentado previamente, à Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente, um memorial de caracterização do empreendimento. Os espaços deverão oferecer infraestrutura mínima para entregadores, como banheiros e água gratuita. A lei também determina que os estabelecimentos já em funcionamento tenham 90 dias para se regularizar.

Ainda segundo a nova lei, a descarga de gases de exaustão deverá ser feita a uma altura de 5 metros em relação ao topo de todas as construções. Outro ponto é que os estabelecimentos não poderão reservar vagas na via pública como estacionamento para a retirada e entrega de mercadorias.

Também será exigido que a entrada dos estabelecimentos tenha uma placa com informações das empresas que utilizam o espaço. Além disso, os locais com mais de 100 m² terão de ter um bombeiro civil para garantir a segurança.

“O cumprimento das disposições específicas de natureza urbanística e edilícia constantes desta Lei não exime os responsáveis pela atividade principal e pela operação das cozinhas do atendimento à normatização aplicável às atividades industriais não residenciais, tanto de natureza municipal, como estadual e federal”, destaca trecho da lei.

Em relação a ruídos, os estabelecimentos poderão ser responsabilizados tanto pelo barulho dos equipamentos quanto o gerado pela circulação de motocicletas e demais atividades, se for considerado em desacordo com a legislação em vigor. “Os responsáveis pelos estabelecimentos serão responsáveis pela incomodidade que seus prestadores de serviço, nesta qualidade, bem como seus funcionários, venham a causar a terceiros, ainda que em área externa às suas dependências, como passeio e vias públicas”, aponta outro trecho.

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