Um dos pontos que mais motivou críticas no novo texto da revisão do Plano Diretor de São Paulo, a proposta de isenção de Imposto Sobre Serviços (ISS) para quatro estádios do futebol do Corinthians, do Palmeiras e do São Paulo poderá ser ampliada também para os espaços dos clubes Juventus e Portuguesa. A alteração foi proposta em audiência pública na manhã desta sexta-feira, 23, pelo presidente da Comissão de Política Urbana, Rubinho Nunes (União Brasil).
Como o Estadão mostrou, o projeto abrange a Neoquímica Arena e o Estádio Alfredo Schürig – mais conhecido como Parque São Jorge e Fazendinha, ambos na zona leste –, o Estádio Cícero Pompeu de Toledo, do Morumbi, na zona sul, e o Allianz Parque, na oeste. Esses locais podem ser transformados em “polos atrativos esportivos e turísticos” caso o texto seja aprovado e promulgado pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB) com a atual redação.
Os times paulistanos têm histórico de disputa judicial para barrar cobranças milionárias desse imposto. Na audiência pública, o vereador Rubinho Nunes sugeriu a inclusão do Estádio Conde Rodolfo Crespi, do Juventus, na zona leste, e a discussão sobre a possibilidade de acrescentar o Estádio Doutor Oswaldo Teixeira Duarte (o Canindé), da Portuguesa, na região central.
O que é o Plano Diretor?
- É a mais importante lei urbanística municipal, com uma série de regras e incentivos construtivos hoje evidentes na cidade, como a concentração da verticalização perto de metrô, trem e corredor de ônibus
- A revisão estava prevista na própria lei e passou por adiamentos por causa da pandemia
- O texto apresentado pela Câmara tem diversas mudanças em relação ao entregue pela Prefeitura
- A revisão terá a segunda e definitiva votação na Câmara Municipal nesta segunda-feira, 26, dias antes do recesso legislativo
- A isenção do imposto tem finalidade diferente do objetivo do Plano Diretor (de regras urbanísticas), inclusão que é popularmente chamada de “jabuti”.
Um dos vereadores que lideram a revisão na Câmara, o presidente da Comissão de Política Urbana da Casa argumenta que a isenção irá reduzir o custo dos ingressos e serviços nos estádios. “Se torna mais acessível à população, para acompanhar as atividades desportivas daquele local e, no caso de arenas, também os eventos”, justificou. “A partir do momento que se tira o imposto, o custo cai e o acesso à população se torna mais facilitado.”
A mudança não chegou a ser tratada nas demais versões do texto e está no segundo substitutivo, entregue na noite de quarta-feira, 21, pelo relator. Até então, a isenção não tinha entrado na discussão pública sobre a revisão.
Professora de Direito e coordenadora do Núcleo de Questões Urbanas do Insper, Bianca Tavolari avalia que o novo trecho pode gerar questionamentos e insegurança jurídica, pois o Plano Diretor não é uma lei que contempla cobranças de tributação. “Nada no plano toca em nenhuma parte tributária, como IPTU, ISS e outros impostos e taxas municipais”, aponta. “Precisa de lei específica.”
‘Ideia surgiu dentro da bancada corintiana’, diz relator
Em entrevista à Rádio Eldorado, Goulart defendeu que os locais “são grandes polos de atração”. “A ideia é que a gente possa incentivar de forma econômica”, completou. “A ideia é atrair ainda mais turistas, através do esporte, para esses polos de desenvolvimento para a cidade, na zona leste, na zona sul e na zona oeste.”
O vereador tem um histórico familiar ligado ao Corinthians. “A ideia surgiu dentro da bancada corintiana, vamos dizer assim. Dos outros clubes aqui também”, justificou. “A ideia é atrair ainda mais turistas, através do esporte, para esses polos de desenvolvimento para a cidade, na zona leste, na zona sul e na zona oeste.”
Na entrevista, Goulart admitiu que não há estudo até o momento para identificar o impacto fiscal dessa isenção. Também disse que a Secretaria Municipal da Fazenda e a Procuradoria poderão subsidiar a Prefeitura antes da possível promulgação da lei, a fim de avaliar a sanção ou o veto desse trecho.
“Já há uma discussão. Outras legislações que tratam sobre incentivo, sobre ISS para os clubes e outros tributos também”, completou. Ele afirmou que o tema não foi tratado com o prefeito diretamente, ao contrário de outros pontos alterados no texto final da revisão.
Uma maior cobrança pelo pagamento desse imposto por times de futebol começou em São Paulo especialmente na gestão Fernando Haddad (PT). À época, em 2016, a gestão municipal aponta que seriam cerca de R$ 300 milhões relativos apenas ao período entre 2010 e 2014.
Os valores são milionários. No ano passado, por exemplo, o Corinthians obteve decisão judicial que barrou a cobrança de 24 das 29 multas, que totalizavam R$ 20,9 milhões, pelo não pagamento do imposto. À época, a 14ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a cobrança sobre a bilheteria, mas vetou a relativa à realização de eventos e à mensalidade de sócio torcedor, por exemplo.
Na decisão, os desembargadores destacaram que os clubes fazem a locação dos espaços para eventos, o que não seria um serviço, “sob pena de dilargar ao infinito o conceito jurídico de serviço e abarcar todo e qualquer gênero de atividade humana”. “Assim, não se pode acolher a alegação da Fazenda Municipal para justificar a lavratura dos autos de infração aqui impugnados.”
A discussão sobre a cobrança de ISS a times de futebol também é nacional. Além disso, casos semelhantes foram também julgados na 14ª Câmara de Direito Público em 2020 e 2021, envolvendo o São Paulo e o Palmeiras.
Hoje, os estádios também recebem significativo volume de shows e outros megaeventos, além de terem restaurantes de alto padrão, visitas guiadas e outras atrações que ampliam a receita e o número de turistas e visitantes em geral. No ano passado, outra mudança para essas áreas chegou a ser promulgada por Nunes, mas barrada na Justiça, que envolvia o aumento da emissão de decibéis no entorno de estádios.
Texto também prevê ampliação de eixos de verticalização
O texto final da revisão do Plano Diretor também trouxe diversas mudanças em relação aos eixos de verticalização da cidade, como antecipou o Estadão. O recuo apontado pelo relator nos últimos dias será menor do que o anunciado, por abrir brecha para que imóveis mais distantes do que a 700 metros tenham incentivos municipais para a construção de prédios sem limite de altura. Por outro lado, a nova versão amplia as “zonas de exceção” que não poderão receber edifícios tão altos mesmo quando próximas de transporte coletivo, como em vilas e em parte do Bixiga, no centro.
No caso da expansão dos eixos, a mudança depende ainda de alterações na Lei de Zoneamento, que será enviada para revisão pelos vereadores neste mês. A mudança no Plano Diretor passará por três audiências públicas antes da votação definitiva, mas os vereadores que lideram a revisão declararam diversas vezes nos últimos dias que novas alterações não serão acatadas após a veiculação do texto final.