Assim como política e futebol, as ciclofaixas da cidade se tornaram tema de conversa do paulistano nos mais variados momentos, de almoços de família a encontros de boteco e até aniversário de criança. É difícil encontrar alguém que não tenha uma opinião sobre elas. E, pela internet, se espalham os mais variados tipos de análises e julgamentos.
Vou propor uma reflexão sobre o tema indo direto a alguns dos pontos considerados mais "espinhosos". Para isso vou dedicar uma série de três postagens aqui do blog, tendo como premissa a minha percepção de ciclista e minha experiência pelas faixas vermelhas da cidade.
Vamos ao primeiro dos 3 posts:
1 - As ciclofaixas são seguras?
Essa inquietação geralmente vem acompanhada de afirmações como "não basta pintar uma faixa para bicicletas", "tem de estar em um nível elevado" ou "precisa ter grades ou paredes em volta". Entretanto, as ciclofaixas de São Paulo - feitas basicamente com pintura e demarcadas com balizadores e tachões- possuem sim características que proporcionam segurança ao ciclista. A principal é o fato de demarcar e legitimar de forma clara o espaço das bicicletas, expondo assim o direito legítimo do ciclista em circular na via, conforme definido pelo próprio Código Brasileiro de Trânsito.
Nas ciclofaixas, os ciclistas ficam facilmente visíveis, o que não ocorre quando circulam entre os carros. E justamente por ser um espaço livre da circulação de automóveis, ela permite que o ciclista tenha uma melhor visão da via e de cruzamentos. Já temos números que comprovam a eficácia do tapete vermelho, como a redução de 46,4% dos acidentes fatais com ciclistas no primeiro semestre de 2015, quando a extensão da malha cicloviária da cidade saltou de 210 km para 334 km
Você pode argumentar, de forma pertinente, que há motoristas e motociclistas infratores que invadem as ciclofaixas (como acontece diariamente na implantada na R. Guilherme Mainard, no Jd. Pirajussara). Porém, antes de imaginar que a solução é segregar esses espaços com grades e muros, lembre-se de outros elementos do viário da cidade que também não apresentam segregação física e são desrespeitados por condutores infratores, como faixas de pedestres e guias rebaixadas e as linhas divisórias de fluxos opostos (aquelas linhas amarelas que dividem ruas de mãos duplas).
Ficamos assim diante de duas possíveis soluções: segregar fisicamente todo espaço viário que possa ser desrespeitado ou direcionar as reivindicações da sociedade na melhoria da qualidade dos condutores paulistanos, para que respeitem as leis de trânsito como as que determinam que uma ciclofaixa, mesmo se feita apenas com tinta, é um espaço tão sagrado quanto a calçada.
E é justamente o desrespeito às leis de trânsito, e não problemas mecânicos ou imprevisíveis, os responsáveis pela maior parte das mortes no viário. Para se ter uma ideia, entre 2005 e 2009, pelo menos 70% dos acidentes fatais ocorridos na cidade de São Paulo se deram por condutores que desrespeitaram as leis de trânsito.
Se queremos um trânsito mais seguro em São Paulo, temos de direcionar o olhar para o comportamento dos causadores das tragédias, ao invés da ênfase em limitar e segregar os espaços das vítimas.
Pensar em mudanças de comportamento dos motoristas parece utópico? Se lembrarmos de como era o uso do cinto de segurança e de como se transportavam bebês em carros no início da década de 1990 veremos que mudanças importantes podem acontecer até mesmo em curto prazo.
Semana que vem falo sobre a falsa impressão de que ninguém usa as ciclovias.