A chuva e o tamanho da pista do aeroporto de Ubatuba, no litoral norte de São Paulo, podem estar entre os fatores que contribuíram para o acidente aéreo desta quinta-feira, 9, segundo entendimento do especialista em aviação Lito Sousa. O piloto morreu e os quatro passageiros ficaram feridos após a aeronave de pequeno porte sair da pista e explodir na orla da Praia do Cruzeiro.
“As características do aeroporto de Ubatuba e a extensão da pista – é uma pista muito curta, somente 560 metros podem ser usados para o pouso (no sentido da praia) – podem ter contribuído para o acidente”, disse ao Estadão.
De acordo com o manual da aeronave, a faixa de pouso operacional deveria ter ao menos 838 metros de extensão quando o local está molhado. A parte operacional da pista utilizada pelo piloto apresenta, contudo, apenas 560 metros de extensão.
A pista do aeroporto de Ubatuba tem cerca de 940 metros de comprimento, mas essa metragem não é acessível para todos os pousos: para aqueles feitos na direção da praia, como o do acidente, a área disponível cai quase pela metade, em razão da proximidade do aeródromo com a Serra do Mar.
Leia Também:
Segundo o especialista em aviação, a chuva também pode ter sido um fator decisivo, mas é importante esperar a apuração das causas do acidente. “As condições meteorológicas estavam degradadas, com chuva e pista molhada”, avaliou.
“As fotos após o acidente mostram que as nuvens estavam muito baixas e esse aeroporto, de Ubatuba, só opera em condições visuais. Ele não pode operar em condições abaixo das visuais. Então, a meteorologia pode ter sido, sim, uma fator contribuinte”, explicou.
A aeronave, de prefixo PR-GFS e modelo Cessna Citation 525 CJ1, vinha do Aeroporto Municipal de Mineiros, no interior de Goiás. O avião pertence à família do produtor rural Nelvo Fries, segundo o Registro Aeronáutico Brasileiro (RAB), da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).
Conforme a Força Aérea Brasileira (FAB), investigadores do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) foram acionados para realizar a ação inicial da ocorrência. O Ministério Público de São Paulo também instaurou um inquérito para apurar as circunstâncias do acidente.
A FAB afirmou que serão utilizadas técnicas específicas. Serão “conduzidas por pessoal qualificado e credenciado que realiza a coleta e a confirmação de dados, a preservação dos elementos, a verificação inicial de danos causados à aeronave, ou pela aeronave, e o levantamento de outras informações necessárias à investigação”.
Leia abaixo principais trechos da entrevista:
As características do aeroporto de Ubatuba, como a própria extensão da pista, também podem ter contribuído para o acidente? Iniciativas de ampliação de pista ou da área de escape para os aviões, como a implementada recentemente em Congonhas, costumam ser úteis para contornar problemas assim?
As características do aeroporto de Ubatuba e a extensão da pista – é uma pista muito curta, somente 560 metros podem ser usados para o pouso (no sentido da praia) – podem ter contribuído para o acidente. Não acredito que possa ser possível a ampliação de pista lá, porque de um lado a gente tem a orla e, do outro, a Serra do Mar. Então, mesmo que encompridasse a pista no sentido da Serra do Mar, os aviões não poderiam afastar muito mais do que afastam hoje em dia. Já está no limite. Por isso que a pista é tão curta, inclusive. Ela poderia ser maior, mas, como tem o obstáculo da Serra do Mar, ela não pode ser emcompridada, então essa não seria uma solução. Poderia se instalar aquele sistema que há em Congonhas, sim. Isso, em caso de excursão de pista, poderia segurar o avião na pista. É um sistema de segurança caríssimo, mas que, se for avaliado que é importante instalar, teria de ser instalado pela prefeitura.
Em nota enviada à reportagem, a concessionária que administra o aeroporto de Ubatuba afirmou que ‘as condições meteorológicas eram degradadas, com chuva e pista molhada’. Isso também pode ter sido um fator decisivo?
Sim, as condições meteorológicas estavam degradadas, com chuva e pista molhada. Isso pode, sim, ter influenciado no acidente, pode ter sido um fator contribuinte que vai ser devidamente analisado pelo Cenipa. As fotos após o acidente mostram que as nuvens estavam muito baixas e este aeroporto, de Ubatuba, só opera em condições visuais. Ele não pode operar em condições abaixo das visuais. Então, a meteorologia pode ter sido, sim, uma fator contribuinte.
O modelo Cessna Citation 525 CJ1 é considerado seguro? Quais são as características desse tipo de aeronave?
O Citation é considerado seguro. O CJ1 tem como característica ser um avião de entrada no mercado executivo, então é um avião não muito caro. Ele tem uma performance mediana, não é muito rápido. Mas consegue operar em pistas não pavimentadas, pode pousar em grama, em pista de terra, isso é um dos atrativos dele. Por isso, tantos fazendeiros possuem esse tipo de avião. É um avião “dócil” e pode ser pilotado por apenas um piloto. Essas são as características básicas do Citation. Já as estatísticas de segurança são bem no padrão, sem desvios que a gente pudesse afirmar que não é uma aeronave segura.
Pelas imagens, dá para se dizer que o piloto chegou a tentar arremeter? Qual teria sido o procedimento mais adequado no caso?
Pelas imagens, não é possível dizer que houve a tentativa de arremetida. Se houve uma tentativa, foi tardia, porque o nariz da aeronave não está apontando para cima, então não tinha velocidade o suficiente. Provavelmente não houve uma tentativa de arremetida. O procedimento mais adequado, no caso, não podemos avaliar, porque não sabemos exatamente em que ponto da pista ocorreu o toque. Não tem nenhuma gravação de vídeo a esse respeito.
O que dá para se inferir do acidente em Ubatuba com base nas informações preliminares divulgadas até aqui? O que é mais provável de ter causado a saída da pista e a consequente explosão da aeronave?
Não dá para inferir ainda o mais provável, porque várias conjecturas podem ser feitas: como no que diz respeito à performance do avião em relação às condições da pista no momento (do acidente), se a performance do avião comportaria a parada no espaço disponível de pista. Também não é possível afirmar, por exemplo, se houve ou não uma falha no sistema de freios. Por causa da ausência dessas evidências, não se pode ainda afirmar o que seria o mais provável de ter causado a saída de pista.