Um novo e rigoroso estudo que examinou os efeitos do consumo de café na saúde encontrou boas e más notícias para os amantes da bebida. A pesquisa mostrou que o café tem efeitos marcantes nos níveis de atividade física, fazendo com que as pessoas se movam mais, dando, em média, mil passos extras por dia – um aumento significativo na atividade que pode ajudar a explicar por que o consumo está associado a uma saúde melhor.
Mas o estudo, publicado no New England Journal of Medicine, encontrou algumas desvantagens em consumir uma xícara diariamente. Ele mostrou que as pessoas perderam cerca de 36 minutos de sono noturno nos dias em que bebiam café – e quanto mais bebiam, menos dormiam.
A pesquisa também analisou o efeito do café nas palpitações cardíacas, uma experiência relativamente comum para consumidores da bebida.
O estudo constatou que, em homens e mulheres saudáveis, o café não causa um tipo comum de palpitação – também conhecida como contrações atriais prematuras –, embora algumas autoridades de saúde tenham alertado que isso pode ser um efeito colateral do consumo da bebida. Mas o consumo de café pode levar ao aumento de outro tipo de palpitação cardíaca, conhecida como contração ventricular prematura.
Esses batimentos cardíacos extras ou irregulares são bastante comuns e benignos. Quase todo mundo os experimenta ocasionalmente e, embora possam ser enervantes, a maioria dos especialistas diz que geralmente não são motivo de preocupação em pessoas saudáveis.
Efeitos podem variar
As descobertas sugerem que os efeitos do café na saúde são complexos. Embora o café seja benéfico para muitas pessoas e possa diminuir o risco de doenças crônicas e talvez até prolongar sua expectativa de vida, ele também pode atrapalhar seu sono e causar algumas palpitações cardíacas.
“A realidade é que o café não é totalmente bom ou totalmente ruim – tem efeitos diferentes”, disse Gregory M. Marcus, autor do estudo e professor de medicina na divisão de cardiologia da Universidade da Califórnia em São Francisco.
“Em geral, este estudo sugere que o consumo de café é quase certamente seguro. Mas as pessoas devem reconhecer que existem esses efeitos fisiológicos reais e mensuráveis que podem – dependendo do indivíduo e de seus objetivos de cuidado – ser prejudiciais ou úteis”, diz o professor.
Café e saúde
O café está entre as bebidas mais consumidas no mundo, e décadas de pesquisa sugerem que ele tem efeitos principalmente benéficos.
Muitos estudos observacionais mostram que os bebedores de café vivem mais e têm taxas mais baixas de diabete, câncer, doenças hepáticas, depressão e outras condições crônicas. Mas grande parte dos dados vem de grandes estudos epidemiológicos, que mostram apenas correlações, não causa e efeito. Eles também contam com dados auto relatados, que nem sempre são confiáveis.
Ao mesmo tempo, a pesquisa sobre café e saúde cardiovascular tem sido um tanto conflitante. Estudos iniciais indicaram que a bebida pode ser prejudicial ao coração porque aumenta a pressão sanguínea, a frequência cardíaca e a adrenalina, além de aumentar os níveis de colesterol.
Estudos mais recentes descobriram que beber várias xícaras de café diariamente – incluindo o descafeínado – pode realmente reduzir o risco de morrer de doença cardíaca ou derrame, o que alguns especialistas atribuem às grandes quantidades de antioxidantes e outros compostos anti-inflamatórios.
Apesar da falta de evidências fortes, as autoridades de saúde frequentemente alertam as pessoas com problemas cardíacos, principalmente aquelas com distúrbios do ritmo cardíaco, como fibrilação atrial, para evitar café e outras bebidas com cafeína por medo de que possam desencadear palpitações.
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O estudo
Para ter uma noção mais clara dos efeitos do café na saúde, neste novo estudo, Marcus e seus colegas recrutaram 100 homens e mulheres saudáveis em São Francisco, nos Estados Unidos, e os equiparam com Fitbits, monitores contínuos de glicose e aparelhos de eletrocardiograma que rastreiam seus ritmos cardíacos durante 14 dias.
Cada participante seguiu um cronograma estrito de café: eles foram instruídos a beber tanto café com cafeína quanto quisessem por dois dias, depois abster-se por dois dias e repetir esse ciclo por duas semanas. Os participantes foram instruídos a pressionar um botão em seus monitores cardíacos toda vez que tomassem uma xícara para documentar sua ingestão em tempo real.
Para garantir que os participantes seguissem as instruções, os pesquisadores enviaram lembretes diários e até os reembolsaram se fornecessem recibos de café com data e carimbo. Eles também usaram uma forma de monitoramento virtual chamada “geofencing” para rastrear visitas a cafeterias.
Resultados
Nos dias em que bebiam café, os participantes tendiam a consumir cerca de uma a três xícaras, embora alguns bebessem muito menos e alguns bebessem até seis xícaras de café por dia.
O café teve efeitos claros sobre o sono. As pessoas dormiam cerca de 7,2 horas noturnas nos dias em que evitavam o café e 6,6 horas nos dias em que o bebiam.
A genética parecia desempenhar um papel: as pessoas que carregam variantes genéticas que os tornam conhecidos como “metabolizadores lentos” da cafeína tiveram maiores reduções no sono quando bebiam café em comparação com “metabolizadores rápidos”, possivelmente porque a cafeína permanece em seus sistemas por mais tempo.
Os efeitos sobre a atividade física foram particularmente notáveis. Marcus, da UCSF, disse que não está claro por que as pessoas andam mil passos extras nos dias em que tomam café, mas é possível que tivessem mais energia e motivação.
De qualquer forma, dar mil passos adicionais por dia está associado a uma redução de 6% a 15% na mortalidade - “tamanhos de efeito notavelmente semelhantes à magnitude do benefício de mortalidade observado entre os bebedores de café”, observou o estudo.
“Essa é uma diferença clinicamente relevante na atividade física que pode ter implicações positivas a longo prazo”, disse Marcus.
Café e o coração
Os pesquisadores estavam particularmente interessados em como o café afetava o coração. As contrações atriais prematuras são um tipo de batimento cardíaco irregular que emana das câmaras superiores do coração, chamadas átrios, enquanto as contrações ventriculares prematuras vêm das câmaras inferiores, chamadas ventrículos.
Quase todo mundo experimenta essas palpitações normalmente, o que pode parecer que seu coração palpitou ou falhou uma batida. Mas os pesquisadores descobriram que nos dias em que as pessoas bebiam mais de uma xícara de café, elas experimentavam cerca de 50% mais contrações ventriculares prematuras.
Embora não sejam considerados perigosos, há algumas evidências de que podem ser um sinal de alerta em pessoas que os experimentam com frequência. Um estudo observacional em 2015, do qual Marcus foi coautor, descobriu que as pessoas que experimentavam muitas dessas palpitações rotineiramente tinham maior probabilidade de desenvolver insuficiência cardíaca. “Isso não significa todo mundo”, disse Marcus. “Mas sabemos que quanto mais você tem, maior o risco.”
Amit Khera, um cardiologista que não participou do estudo, considerou-o único e importante. Ele disse que a maioria das pessoas não deve se preocupar com o potencial do café causar palpitações porque em adultos saudáveis não há indicação de que sejam perigosos. Mas ele alertou que as descobertas não se aplicam necessariamente a pessoas com doenças cardíacas.
“Em pessoas saudáveis com corações normais, é o que eu chamaria de um problema de qualidade de vida, não um problema de risco de vida”, disse Khera, diretor do programa de cardiologia preventiva do Southwestern Medical Center da Universidade do Texas. “Se você sente que seu coração está falhando e isso o incomoda, então, com base nos resultados desses estudos, cortar o café pode reduzir esses sintomas.”
Peter Kistler, especialista em distúrbios do ritmo cardíaco que estuda os efeitos do café na saúde, disse que, embora as pessoas tenham experimentado mais contrações ventriculares prematuras nos dias em que bebiam café, a incidência era baixa e as palpitações “inteiramente benignas”.
“As pessoas devem ter certeza de que o café é seguro e faz parte de uma dieta saudável”, disse Kistler, chefe de pesquisa de eletrofisiologia clínica do Baker Heart and Diabetes Institute, em Melbourne, na Austrália.
Marcus disse que a descoberta precisa de mais investigação. Enquanto isso, as pessoas devem adequar a ingestão de café às suas necessidades individuais. “Não existe um tamanho único para todas as prescrições ou recomendações”, acrescentou. “Realmente depende do indivíduo.”
Se você precisa de motivação para se exercitar, considere usar o café para lhe dar um impulso. Mas se você sofre de insônia ou se preocupa com o alto risco de desenvolver insuficiência cardíaca porque ocorre em sua família, considere reduzir, recomenda Marcus.