Para muitos fumantes, o café parece o par perfeito para acompanhar um cigarro. Mas, na contramão dessa crença, um estudo do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR) mostra que, na verdade, o alimento pode ser um aliado contra o hábito de fumar – comportamento associado a uma série de doenças, como problemas cardiovasculares, distúrbios respiratórios e câncer.
Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores testaram se o aroma do grão poderia substituir a vontade de fumar, já que ativa a área do cérebro conhecida como “sistema de recompensas”. Contrariando o senso comum, a hipótese se confirmou.
“Geralmente, o café é usado como um gatilho para fumar. Nesse caso, estamos apresentando exatamente o inverso”, comenta a química Silvia Oigman, pesquisadora do IDOR e diretora científica da Café Consciência, startup de biotecnologia, parceira do Instituto.
Na pesquisa, 60 fumantes foram expostos aos aromas de grãos de café, enquanto o outro grupo, chamado controle, foi exposto ao perfume de sabão. Para o experimento, os participantes inalaram grãos de alta qualidade, por meio de um dispositivo adaptado, aprovado pela Food and Drug Administration (FDA) – agência federal do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos.
Após 15 minutos, os pesquisadores observaram que, no grupo que inalou grãos de café, 50% dos participantes voltaram a fumar, enquanto no grupo exposto à fragrância de sabão mais de 73% acenderam um cigarro logo em seguida. Segundo Silvia, essa diferença é clinicamente relevante, pois já representa mudança de hábito e benefícios para os participantes.
A ação do aroma do café se explica pela ativação do sistema de recompensa do cérebro, região responsável por sensações de prazer e bem-estar. Mais especificamente, o café ativa uma estrutura chamada de accumbens, a mesma acionada por substâncias psicoativas, como a cocaína. Essa relação foi descoberta pelos pesquisadores do IDOR em 2014 e foi a base para a ideia de usar a fragrância para modular o sistema de recompensa, oferecendo uma alternativa saudável ao prazer proporcionado pelo cigarro.
Leia Também:
Aroma versus ingestão
Silvia explica que a reação provocada no cérebro ao sentir o cheiro do café e ao ingeri-lo são diferentes, bem como sua possível relação com o uso de cigarro. “Quando consumimos café, ingerimos várias substâncias solúveis presentes na bebida. No entanto, ao sentir o aroma, inalamos substâncias que volatizam [passam facilmente do estado líquido para o gasoso] e alteram nossa percepção olfativa. Cada forma de consumo possui uma composição química diferente e, por isso, um impacto distinto na saúde”, esclarece a pesquisadora.
Isso ajuda a justificar por que a ingestão da bebida pode ser um gatilho para fumar, enquanto a inalação do aroma dos grãos demonstrou provocar outro tipo de reação no cérebro, representada pela redução na busca pelo cigarro.
“É extremamente gratificante, porque se trata de um projeto totalmente nacional que traz inovação em uma área que impacta tanto a saúde pública quanto ambiental e social”, analisa.