Estima-se que mais de 6,8 milhões de pessoas no mundo vivam com algum tipo de doença inflamatória intestinal (DII),1 sobretudo a retocolite ulcerativa e a doença de Crohn. Marcadas por sintomas como diarreia, dor abdominal, febre, perda de peso, fadiga e enfraquecimento, essas condições podem impactar profundamente o dia a dia e a qualidade de vida.2 Por isso, globalmente, o mês de maio é dedicado à disseminação de conhecimento sobre as DIIs, por meio da campanha conhecida como Maio Roxo, que tem como objetivo a conscientização em prol de diagnóstico precoce, informação e apoio para os pacientes e da união de todos em torno de políticas de inclusão de exames e medicamentos na rede pública de saúde.
“A retocolite ulcerativa e a doença de Crohn são doenças sem causa exata definida, nas quais ocorre uma cascata inflamatória do aparelho digestivo”, explica a gastroenterologista Marta Brenner Machado, presidente da Associação Brasileira de Colite Ulcerativa e Doença de Crohn (ABCD).
De acordo com a especialista, são múltiplos os fatores relacionados a seu aparecimento, entre eles a suscetibilidade genética, o desequilíbrio das bactérias da microbiota intestinal ou mesmo a mudança no padrão alimentar do ser humano nas últimas décadas, com a entrada de alimentos carregados de agrotóxicos, conservantes e muita gordura, por exemplo. “É preciso levar em conta até se o paciente passou por cirurgia de apendicite na infância e se recebeu uma quantidade elevada de antibióticos nos primeiros cinco anos de vida”, ressalta Marta Machado.
“Estamos falando, portanto, de doença autoimune, inflamatória e de origem multifatorial”, resume a médica. “Até alguns anos atrás se dizia que a faixa etária mais acometida era dos 15 aos 45 anos. Nos últimos dez anos, identificaram-se dois polos de aumento de casos: os idosos e as crianças. Tanto é assim que hoje no Brasil há vários ambulatórios de DII de pediatria”, conta.
Diagnosticar cedo é fundamental
Embora apresentem manifestações similares, é importante fazer a diferenciação entre a doença de Crohn e a retocolite ulcerativa, de forma a diminuir a jornada em busca do diagnóstico – que, de acordo com pesquisa realizada pela ABCD, pode levar mais de um ano, sendo que há casos em que a espera chega a três anos.3 Da mesma forma, compreender as particularidades de cada uma dessas doenças é o caminho para planejar o tratamento mais adequado.
“A doença de Crohn pode acometer da boca ao ânus. Se o processo inflamatório está no intestino delgado, a pessoa tem queixas como distensão abdominal e vômito. Se está no intestino grosso, apresenta diarreia, sangramento”, esclarece Marta Machado. “Já a retocolite ulcerativa começa no intestino grosso, no reto, e fica restrita a esse órgão”, continua. Nesse caso, destaca a especialista, um dos principais sinais do problema é a urgência evacuatória.
Ponderar as queixas e conhecer o histórico familiar são pontos-chave para diagnosticar as DIIs. “O médico precisa fazer uma boa anamnese, as perguntas certas. O paciente não consegue ver uma conexão, por exemplo, de dores articulares e uveítes [inflamações nos olhos] com doenças inflamatórias intestinais. Mas essas são pistas importantes”, diz Marta Machado. Por fim, exames laboratoriais capazes de detectar marcadores inflamatórios no sangue e sangue nas fezes contribuem para a investigação – em geral finalizada com outros exames de imagem.
O tratamento vai depender da gravidade de cada quadro e da presença ou não de outras comorbidades. “O plano terapêutico mais básico se baseia em comprimidos via oral, imunossupressores e corticoides anti-inflamatórios”, descreve Marta. “Nos casos mais graves, hoje podemos lançar mão dos medicamentos biológicos, que bloqueiam a cascata inflamatória e mudam a vida do paciente”, afirma. Ou seja, cada pessoa precisa de um tratamento individualizado e de acordo com a classificação de seu quadro, que pode ser leve, moderado ou grave. “O importante é diagnosticar e começar a tratar o quanto antes para minimizar o sofrimento”, defende a médica.
O impacto emocional e a vida na pandemia
Estamos falando de doenças que provocam dor, mal-estar e sucessivas idas ao banheiro, afetando assim a vida social e profissional, as atividades do dia a dia, os estudos. Não à toa, o estresse é um fator presente na vida dos pacientes. “Nos relatos, muitos falam de exaustão e fadiga diária, de ter que mudar planos de viagens e trabalho em razão da doença”, observa Marta Machado.
De acordo com a especialista, a chegada da covid-19 impactou significativamente a população afetada pelas DIIs. “A pandemia deixou de lado todas as doenças crônicas, sendo que as DIIs precisam de uma atenção especial”, lamenta. “Os pacientes que fazem uso de imunossupressores passaram a sentir medo de tomar o medicamento e ficar mais suscetíveis à covid-19”, exemplificou. “Mas não se pode parar o tratamento, sob pena de inflamações”, alerta. O recado, portanto, é o seguinte: não deixe de procurar ajuda médica, mesmo que seja por teleatendimento, e não interrompa o tratamento. Para prevenir o contágio do coronavírus, as recomendações são as mesmas feitas à população geral: isolamento e distanciamento social, uso de máscara se for necessário sair, e higienização das mãos com água e sabão ou álcool em gel.
E, assim que as pessoas com DII forem incluídas entre os grupos prioritários de vacinação, elas devem conversar com seu médico e procurar os postos de vacinação para receber as doses.
Por fim, a especialista destaca a importância de participar de algum dos muitos grupos de apoio espalhados pelo Brasil.4 “Não fique sozinho, pois a troca de experiência com outros pacientes faz muita diferença”, conclui Marta Machado.
1 https://www.thelancet.com/journals/langas/article/PIIS2468-1253(19)30358-9/fulltext
2 https://www.abcd.org.br/sobre-a-doenca-de-crohn/ e https://www.abcd.org.br/sobre-a-colite-ulcerativa/
4 https://www.abcd.org.br/para-voce/grupos-encontros/
C-ANPROM/BR/ENTY/0082 Mai2021 – Material destinado ao público geral
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