Psiquiatria e sociedade

Opinião|Por que não conseguimos ouvir o outro quando estamos com raiva?


Quando nutrimos rejeição por um indivíduo, como um político, tudo o que ele diz parece errado, mesmo quando faz sentido; assim, nos afastamos cada vez mais de um diálogo produtivo enquanto sociedade

Por Daniel Martins de Barros

Se você está com raiva de um político, provavelmente tem dado muito ouvido para seus opositores. A raiva, afinal, é uma emoção tão pessoal, não é mesmo? Ela tem alvo certo. E sempre acontece como reação a algo que nos fizeram – ou seja, é provocada, não é espontânea. Agora, pense comigo: quando foi a última vez que você teve contato direto com esse político que tanto odeia?

Não digo que faltem motivos para a raiva. A injustiça, sensação primordial por trás dessa reação tão biliosa, é frequente nas páginas dos jornais. Não é estranho que fiquemos bravos. Mas acalentar um ódio particular a alguma figura pública, quase se comprazendo com a salivação raivosa que ela provoca, já parece exagero. Esse estado de nervos é fomentado intencionalmente em redes sociais e grupos de compartilhamento de mensagens – nas bolhas, para simplificar – com intuito de solidificar a rejeição a alguém.

Sentimento de raiva, estimulado em redes sociais e grupos de mensagens, acaba nos afastando do diálogo. Foto: dundanim/Adobe Stock
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Um dos problemas – além da lamentável manipulação dos afetos, claro – é que esse ódio, quando perdura e aumenta, estende-se da pessoa para aquilo que ela representa. Tudo o que ela disser parecerá errado, absurdo até, sem que antes se avalie a pertinência de sua fala. Haverá ataques imediatos ao que ela defender. Qualquer causa que ela abrace parecerá indefensável.

E pior: criativos que somos, é fácil encontrarmos razões para justificar essas posturas que, sem nos darmos conta, são fruto da mais irracional emoção. Ou lhe parece razoável, seja você alinhado à esquerda ou à direita, que 100% das ideias e valores do espectro ideológico oposto estejam errados? Indo além: será realmente possível que tudo o que seu lado defende esteja certo? Não há um equívoco sequer?

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Como o filósofo André Comte-Sponville diz em seu “Dicionário filosófico”, os valores mais caros a cada um dos lados são geralmente identificáveis: “Na esquerda, o gosto pela igualdade, liberdade de costumes, secularismo, defesa dos mais fracos (mesmo que culpados), internacionalismo, lazer, descanso (...), compaixão, solidariedade. Na direita, o gosto pelo sucesso individual, liberdade de empreender, religião, hierarquia, segurança, pátria, família, trabalho, esforço, competição, responsabilidade”. Seja sincero: alguma lista seria completamente descartável?

No fim, instigar o ódio dos cidadãos com objetivo de cooptar os corações tem como efeito colateral (ou seria principal?) criar uma sociedade avessa ao diálogo. Pior para nós, que não conseguimos entrar em acordo sequer sobre pontos que seriam essenciais para melhorar a vida de todos.

Se você está com raiva de um político, provavelmente tem dado muito ouvido para seus opositores. A raiva, afinal, é uma emoção tão pessoal, não é mesmo? Ela tem alvo certo. E sempre acontece como reação a algo que nos fizeram – ou seja, é provocada, não é espontânea. Agora, pense comigo: quando foi a última vez que você teve contato direto com esse político que tanto odeia?

Não digo que faltem motivos para a raiva. A injustiça, sensação primordial por trás dessa reação tão biliosa, é frequente nas páginas dos jornais. Não é estranho que fiquemos bravos. Mas acalentar um ódio particular a alguma figura pública, quase se comprazendo com a salivação raivosa que ela provoca, já parece exagero. Esse estado de nervos é fomentado intencionalmente em redes sociais e grupos de compartilhamento de mensagens – nas bolhas, para simplificar – com intuito de solidificar a rejeição a alguém.

Sentimento de raiva, estimulado em redes sociais e grupos de mensagens, acaba nos afastando do diálogo. Foto: dundanim/Adobe Stock

Um dos problemas – além da lamentável manipulação dos afetos, claro – é que esse ódio, quando perdura e aumenta, estende-se da pessoa para aquilo que ela representa. Tudo o que ela disser parecerá errado, absurdo até, sem que antes se avalie a pertinência de sua fala. Haverá ataques imediatos ao que ela defender. Qualquer causa que ela abrace parecerá indefensável.

E pior: criativos que somos, é fácil encontrarmos razões para justificar essas posturas que, sem nos darmos conta, são fruto da mais irracional emoção. Ou lhe parece razoável, seja você alinhado à esquerda ou à direita, que 100% das ideias e valores do espectro ideológico oposto estejam errados? Indo além: será realmente possível que tudo o que seu lado defende esteja certo? Não há um equívoco sequer?

Como o filósofo André Comte-Sponville diz em seu “Dicionário filosófico”, os valores mais caros a cada um dos lados são geralmente identificáveis: “Na esquerda, o gosto pela igualdade, liberdade de costumes, secularismo, defesa dos mais fracos (mesmo que culpados), internacionalismo, lazer, descanso (...), compaixão, solidariedade. Na direita, o gosto pelo sucesso individual, liberdade de empreender, religião, hierarquia, segurança, pátria, família, trabalho, esforço, competição, responsabilidade”. Seja sincero: alguma lista seria completamente descartável?

No fim, instigar o ódio dos cidadãos com objetivo de cooptar os corações tem como efeito colateral (ou seria principal?) criar uma sociedade avessa ao diálogo. Pior para nós, que não conseguimos entrar em acordo sequer sobre pontos que seriam essenciais para melhorar a vida de todos.

Se você está com raiva de um político, provavelmente tem dado muito ouvido para seus opositores. A raiva, afinal, é uma emoção tão pessoal, não é mesmo? Ela tem alvo certo. E sempre acontece como reação a algo que nos fizeram – ou seja, é provocada, não é espontânea. Agora, pense comigo: quando foi a última vez que você teve contato direto com esse político que tanto odeia?

Não digo que faltem motivos para a raiva. A injustiça, sensação primordial por trás dessa reação tão biliosa, é frequente nas páginas dos jornais. Não é estranho que fiquemos bravos. Mas acalentar um ódio particular a alguma figura pública, quase se comprazendo com a salivação raivosa que ela provoca, já parece exagero. Esse estado de nervos é fomentado intencionalmente em redes sociais e grupos de compartilhamento de mensagens – nas bolhas, para simplificar – com intuito de solidificar a rejeição a alguém.

Sentimento de raiva, estimulado em redes sociais e grupos de mensagens, acaba nos afastando do diálogo. Foto: dundanim/Adobe Stock

Um dos problemas – além da lamentável manipulação dos afetos, claro – é que esse ódio, quando perdura e aumenta, estende-se da pessoa para aquilo que ela representa. Tudo o que ela disser parecerá errado, absurdo até, sem que antes se avalie a pertinência de sua fala. Haverá ataques imediatos ao que ela defender. Qualquer causa que ela abrace parecerá indefensável.

E pior: criativos que somos, é fácil encontrarmos razões para justificar essas posturas que, sem nos darmos conta, são fruto da mais irracional emoção. Ou lhe parece razoável, seja você alinhado à esquerda ou à direita, que 100% das ideias e valores do espectro ideológico oposto estejam errados? Indo além: será realmente possível que tudo o que seu lado defende esteja certo? Não há um equívoco sequer?

Como o filósofo André Comte-Sponville diz em seu “Dicionário filosófico”, os valores mais caros a cada um dos lados são geralmente identificáveis: “Na esquerda, o gosto pela igualdade, liberdade de costumes, secularismo, defesa dos mais fracos (mesmo que culpados), internacionalismo, lazer, descanso (...), compaixão, solidariedade. Na direita, o gosto pelo sucesso individual, liberdade de empreender, religião, hierarquia, segurança, pátria, família, trabalho, esforço, competição, responsabilidade”. Seja sincero: alguma lista seria completamente descartável?

No fim, instigar o ódio dos cidadãos com objetivo de cooptar os corações tem como efeito colateral (ou seria principal?) criar uma sociedade avessa ao diálogo. Pior para nós, que não conseguimos entrar em acordo sequer sobre pontos que seriam essenciais para melhorar a vida de todos.

Se você está com raiva de um político, provavelmente tem dado muito ouvido para seus opositores. A raiva, afinal, é uma emoção tão pessoal, não é mesmo? Ela tem alvo certo. E sempre acontece como reação a algo que nos fizeram – ou seja, é provocada, não é espontânea. Agora, pense comigo: quando foi a última vez que você teve contato direto com esse político que tanto odeia?

Não digo que faltem motivos para a raiva. A injustiça, sensação primordial por trás dessa reação tão biliosa, é frequente nas páginas dos jornais. Não é estranho que fiquemos bravos. Mas acalentar um ódio particular a alguma figura pública, quase se comprazendo com a salivação raivosa que ela provoca, já parece exagero. Esse estado de nervos é fomentado intencionalmente em redes sociais e grupos de compartilhamento de mensagens – nas bolhas, para simplificar – com intuito de solidificar a rejeição a alguém.

Sentimento de raiva, estimulado em redes sociais e grupos de mensagens, acaba nos afastando do diálogo. Foto: dundanim/Adobe Stock

Um dos problemas – além da lamentável manipulação dos afetos, claro – é que esse ódio, quando perdura e aumenta, estende-se da pessoa para aquilo que ela representa. Tudo o que ela disser parecerá errado, absurdo até, sem que antes se avalie a pertinência de sua fala. Haverá ataques imediatos ao que ela defender. Qualquer causa que ela abrace parecerá indefensável.

E pior: criativos que somos, é fácil encontrarmos razões para justificar essas posturas que, sem nos darmos conta, são fruto da mais irracional emoção. Ou lhe parece razoável, seja você alinhado à esquerda ou à direita, que 100% das ideias e valores do espectro ideológico oposto estejam errados? Indo além: será realmente possível que tudo o que seu lado defende esteja certo? Não há um equívoco sequer?

Como o filósofo André Comte-Sponville diz em seu “Dicionário filosófico”, os valores mais caros a cada um dos lados são geralmente identificáveis: “Na esquerda, o gosto pela igualdade, liberdade de costumes, secularismo, defesa dos mais fracos (mesmo que culpados), internacionalismo, lazer, descanso (...), compaixão, solidariedade. Na direita, o gosto pelo sucesso individual, liberdade de empreender, religião, hierarquia, segurança, pátria, família, trabalho, esforço, competição, responsabilidade”. Seja sincero: alguma lista seria completamente descartável?

No fim, instigar o ódio dos cidadãos com objetivo de cooptar os corações tem como efeito colateral (ou seria principal?) criar uma sociedade avessa ao diálogo. Pior para nós, que não conseguimos entrar em acordo sequer sobre pontos que seriam essenciais para melhorar a vida de todos.

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Opinião por Daniel Martins de Barros

Professor colaborador do Dep. de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP. Autor do livro 'Rir é Preciso'

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