Diferenças sutis entre nós viraram doenças mentais, diz psiquiatra e autora de ‘Nação Tarja Preta’


Em livro lançado recentemente no Brasil, a americana Anna Lembke, também autora de ‘Nação Dopamina’, fala sobre vício e o que ela chama de epidemia de medicamentos prescritos

Por Ana Lourenço
Foto: Steve Fisch
Entrevista comAnna LembkePsiquiatra e autora dos livros 'Nação Tarja Preta' e 'Nação Dopamina'

Quando temos uma dor de cabeça ou na coluna, costumamos recorrer a um analgésico. Dificilmente suportamos a dor por muito tempo. Acontece que passamos a fazer algo parecido para lidar com as chateações e frustrações da vida – algo que vem trazendo repercussões brutais para a sociedade.

“Hoje em dia, as pessoas alimentam cada vez mais a ideia de que a vida precisa ser isenta de dor”, resume a psiquiatra Anna Lembke, professora de Medicina de Adicção na Universidade de Stanford (EUA) e autora do livro ‘Nação Dopamina’. Em seu livro ‘Nação Tarja Preta’, lançado recentemente na versão brasileira pela Editora Vestígio, a médica explora a dependência da população em diversos medicamentos.

A obra foi publicada nos Estados Unidos em 2016 e, agora, chega ao Brasil na tentativa de que “possamos aprender com os erros que os americanos cometeram” sobre o tema. “A questão é que os Estados Unidos, o Brasil e vários países do mundo estão cada vez mais confiando em um comprimido para lidar com o sofrimento humano, sem avaliar os custos em longo prazo ou cogitar que os comprimidos que aliviam a dor a curto prazo têm a possibilidade de torná-la pior com o tempo”, aponta.

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Nos Estados Unidos, o lançamento do livro fez com que houvesse uma maior conscientização sobre as prescrições médicas, em particular dos opioides (analgésicos poderosos, com efeito similar ao da morfina) e benzodiazepinas (usados como tranquilizantes). “A cultura realmente mudou. Agora, os médicos são obrigados por lei a verificar a base de dados de monitorização de medicamentos prescritos e se certificar de que os pacientes não fazem uso indevido ou recebem múltiplas prescrições dos mesmos medicamentos de vários fornecedores”, conta.

No Brasil, por outro lado, a venda de opioides prescritos aumentou 465% entre 2009 e 2015 no Brasil. Além disso o País está entre os maiores consumidores de medicamentos para perda de peso, incluindo drogas que contêm anfetamina, um estimulante altamente aditivo.

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O problema, conforme ela detalha no livro, tem três fontes: a conduta dos médicos, a atuação da indústria farmacêutica e a dependência dos pacientes. Infelizmente, não há muito o que a população geral possa fazer a respeito das duas primeiras questões. Mas há o que trabalhar em relação à última.

“Eu realmente quero que as pessoas entendam profundamente o que está acontecendo em nosso cérebro que nos leva ao consumo compulsivo. Sinto que a neurociência pode dar-lhes ferramentas tangíveis para que consigam compreender o seu comportamento”, conta ela.

Em vários países do mundo, pessoas estão cada vez mais confiando em comprimidos para lidar com o sofrimento humano, alerta psiquiatra americana Foto: Adobe Stock
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O problema do vício

Estamos viciados em soluções rápidas. Muito mais do que tratar uma causa, queremos acabar com as consequências. Isso é incentivado, claro, por toda a pressa que experimentamos no dia a dia do mundo moderno, que inclui desde o incentivo à produtividade até o consumo frenético das redes sociais.

Adotar uma patologia para chamar de sua, de acordo com a escritora, também faz parte disso. “A patologia possibilita uma maneira de se definir perante um mundo em constante mudança e cada vez mais fragmentado”, conta ela. “Todos nascemos com diferenças mentais e físicas inerentes. O que é surpreendente em nossa cultura atual é a prontidão com que essas diferenças são rotuladas como doenças e tratadas com um comprimido.”

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Somado a isso, tem o fato de que hoje é bastante comum falar sobre problemas mentais. Por um lado, isso é ótimo, já que o tema deixa de ser um tabu cheio de estigmas. Mas, por outro, todos nós ficamos sujeitos a sermos “diagnosticados” por terceiros devido a certas características. “Hoje, nossa definição de doença mental agrupa não apenas os desvios, mas até sutis diferenças entre nós. Acabou virando uma maneira de entender não apenas a falha de estar em conformidade, mas a falha de alcançar excelência”, define Anna.

Como consequência, aí vem a medicação – e muitas vezes como parte de uma espécie de experimento. “Fazemos um tipo de diagnóstico retrospectivo. Damos à pessoa uma pílula e, se isso faz com que ela se sinta melhor, dizemos: ‘ah, ela deve ter um distúrbio, já que se adaptou a qualquer pílula que seja’”, explica. Só que essa é uma iniciativa perigosa, já que, a curto prazo, estimulantes, por exemplo, vão ajudar qualquer indivíduo. Mas, em longo prazo, podem ter consequências graves.

“Quando eu vejo esses pacientes 10 anos depois do diagnóstico, no pior cenário eles estão viciados aos estimulantes. Mas, na melhor das hipóteses, eles perderam completamente a confiança em sua capacidade de realizar qualquer trabalho”, analisa Anna. Ainda de acordo com ela, muita gente desenvolve hábitos piores relacionados aos estudos e ao trabalho, porque procrastina até o último minuto e, para conseguir render depois, usa estimulantes.

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Confira, abaixo, a entrevista exclusiva que Anna Lembke concedeu ao Estadão:

Na sua opinião, a sociedade está evitando qualquer mínimo sinal de desconforto?

É quase como se passássemos a nos entender como pacientes; uma espécie de medicalização da vida cotidiana. Agora, tudo o que encaramos como uma dificuldade de alguma forma transformamos em um distúrbio. Aí vamos ao médico e conseguimos uma receita para isso. Virou algo difundido em nossa cultura – e quando digo nossa cultura, quero dizer a cultura do Brasil e dos Estados Unidos. É uma mentalidade. É a estrutura pela qual entendemos nosso sofrimento.

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Existem benefícios nessa mentalidade?

Por um lado, pode ser muito útil dar ao sofrimento uma espécie de quadro psiquiátrico para pensar que há possibilidade de recuperação ou para se identificar com outras pessoas que têm o mesmo transtorno. Isso pode ser uma experiência muito validadora.

Mas a grande desvantagem é que nos vemos apenas como pacientes vulneráveis, que não conseguem resistir a nenhuma tempestade, que não tiveram resiliência e perderam a capacidade de tolerar até mesmo um pequeno desconforto. E isso, claro, é muito problemático. Especialmente quando combinado com o incrível acesso que temos a substâncias e comportamentos que podem mudar a forma como nos sentimos e fazer com que algo nos deixe levemente intoxicados a qualquer momento. Você agora está fugindo da dor em busca do prazer.

Nas redes sociais, é muito comum ver jovens se apresentando com diversos sintomas e detalhando sua rotina de remédios e mudanças de humor. Parece que, hoje em dia, é quase ‘legal’ ter algum tipo de diagnóstico.

Certo! Você vê no TikTok pessoas que estão literalmente narrando cada emoção subjetiva a cada segundo de cada dia, e eles estão conversando com seus seguidores (que não são de fato amigos de verdadeira rede social ou suporte). Mas isso não significa que estão realmente sendo vulneráveis.

Quero dizer, provavelmente no início foi difícil dar esse primeiro passo, mas, uma vez que eles se tornam “a pessoa das redes sociais que narra sua subjetividade”, é como se isso fosse tudo o que eles são. E, então, eles ficam tão focados interiormente que não tem realmente uma experiência com o mundo. É uma experiência interna.

O que vemos, infelizmente, com as gerações Y e Z é que todo mundo está em busca de gatilhos e da possibilidade de vivenciar algum tipo de trauma intolerável em resposta a algo que desencadeia seu possível diagnóstico.

As redes sociais podem favorecer a dependência química?

Sim, porque há um fenômeno de contágio onde a mídia social pode sugerir comportamentos e substâncias que você não teria considerado de outra forma e que podemos querer usar só porque todo mundo está usando. Mas é importante reconhecer que a própria rede social é uma droga, de modo que o próprio meio é viciante e muito aderente cognitivamente aos nossos cérebros. Somos naturalmente atraídos por ele.

Esse vício pelo prazer é bastante explorado também no livro ‘Nação Dopamina’. Qual a relação dele com o livro ‘Nação Tarja Preta’?

‘Nação Tarja Preta’ foi o primeiro livro que escrevi para um público leigo, e eu realmente não sabia muito bem o que estava fazendo, afinal, nunca escrevi um livro para um público geral. Então, quando terminei de escrever, realmente senti que tinha completado uma curva de aprendizado muito íngreme e havia muitos temas que abordei nele que não explorei completamente, e senti que poderia fazer isso em um outro livro. Até porque o sucesso do primeiro livro que, aliás, eu não esperava, me deu muita confiança de que talvez eu poderia escrever sobre essas outras coisas em profundidade e talvez as pessoas se interessem por elas. ‘Nação Tarja Preta’ foi quem deu à luz ao livro ‘Nação Dopamina’.

Você vê muitas diferenças entre o Brasil e os Estados Unidos em relação a esse tema?

Para mim, parece que o Brasil está cerca de 20 anos atrás dos Estados Unidos, mas há alguns sinais de alerta precoce muito fortes de que o Brasil está caminhando para o mesmo tipo de epidemia de prescrição excessiva que os Estados Unidos experimentaram.

Portanto, tenho esperança de que o Brasil possa aprender com nossos erros e não repeti-los, principalmente quando se trata de sedativos como benzodiazepinas e estimulantes como Ritalina para déficit de atenção ou para perda de peso. Parece que os opioides são melhor controlados no geral por aqui (no Brasil), mas o Tramadol, por exemplo é considerado um opioide menos potente e provavelmente está sendo prescrito em excesso.

Seria importante o lançamento de uma campanha de saúde pública que educasse as pessoas comuns, especialmente aquelas que não têm acesso a palestras científicas, podcasts e livros, sobre os perigos de muitas das pílulas que um médico pode prescrever. Porque as pessoas pensam que tudo que vem de um médico é seguro. E, claro, até os próprios médicos são influenciados pela indústria farmacêutica e não são necessariamente muito bem informados sobre os verdadeiros riscos e benefícios.

A pandemia pode ter piorado os vícios das pessoas?

O que vimos nos Estados Unidos foi um grupo de pessoas que definitivamente tiveram a saúde mental prejudicada desde o primeiro dia e outro grupo que teve melhora nesse aspecto. As pessoas que moravam sozinhas normalmente ficaram piores, e aquelas que viviam em famílias funcionais se saíram melhor porque tinham mais tempo para conexões autênticas.

Mas há muitas evidências de que as pessoas beberam mais, fumaram mais e tornaram-se mais fóbicas sociais. De modo que, quando tudo acabou, muitas pessoas estavam lidando com novas adicções e, com isso, houve muito mais diagnósticos para depressão e ansiedade. Acho que é assim que vejo. Mas, em geral, a pandemia apenas acelerou tendências que já estavam acontecendo.

Qual dica você daria às pessoas sobre o relacionamento com remédios e até com redes sociais?

Para diagnosticar a adicção, exploramos muito os três ‘Cs’: controle, compulsão e contínuo uso. Mas, muitas vezes, mesmo quando esses três aspectos estão presentes, as pessoas estarão em negação e não verão o comportamento que é prejudicial para si e para os outros. Na minha opinião, a melhor maneira de descobrir se estamos viciados ou não é fazer um jejum de dopamina e realmente tentar parar de usar por um período de, no mínimo, quatro semanas para realmente testar qual é a nossa relação com aquela substância.

Quando temos uma dor de cabeça ou na coluna, costumamos recorrer a um analgésico. Dificilmente suportamos a dor por muito tempo. Acontece que passamos a fazer algo parecido para lidar com as chateações e frustrações da vida – algo que vem trazendo repercussões brutais para a sociedade.

“Hoje em dia, as pessoas alimentam cada vez mais a ideia de que a vida precisa ser isenta de dor”, resume a psiquiatra Anna Lembke, professora de Medicina de Adicção na Universidade de Stanford (EUA) e autora do livro ‘Nação Dopamina’. Em seu livro ‘Nação Tarja Preta’, lançado recentemente na versão brasileira pela Editora Vestígio, a médica explora a dependência da população em diversos medicamentos.

A obra foi publicada nos Estados Unidos em 2016 e, agora, chega ao Brasil na tentativa de que “possamos aprender com os erros que os americanos cometeram” sobre o tema. “A questão é que os Estados Unidos, o Brasil e vários países do mundo estão cada vez mais confiando em um comprimido para lidar com o sofrimento humano, sem avaliar os custos em longo prazo ou cogitar que os comprimidos que aliviam a dor a curto prazo têm a possibilidade de torná-la pior com o tempo”, aponta.

Nos Estados Unidos, o lançamento do livro fez com que houvesse uma maior conscientização sobre as prescrições médicas, em particular dos opioides (analgésicos poderosos, com efeito similar ao da morfina) e benzodiazepinas (usados como tranquilizantes). “A cultura realmente mudou. Agora, os médicos são obrigados por lei a verificar a base de dados de monitorização de medicamentos prescritos e se certificar de que os pacientes não fazem uso indevido ou recebem múltiplas prescrições dos mesmos medicamentos de vários fornecedores”, conta.

No Brasil, por outro lado, a venda de opioides prescritos aumentou 465% entre 2009 e 2015 no Brasil. Além disso o País está entre os maiores consumidores de medicamentos para perda de peso, incluindo drogas que contêm anfetamina, um estimulante altamente aditivo.

O problema, conforme ela detalha no livro, tem três fontes: a conduta dos médicos, a atuação da indústria farmacêutica e a dependência dos pacientes. Infelizmente, não há muito o que a população geral possa fazer a respeito das duas primeiras questões. Mas há o que trabalhar em relação à última.

“Eu realmente quero que as pessoas entendam profundamente o que está acontecendo em nosso cérebro que nos leva ao consumo compulsivo. Sinto que a neurociência pode dar-lhes ferramentas tangíveis para que consigam compreender o seu comportamento”, conta ela.

Em vários países do mundo, pessoas estão cada vez mais confiando em comprimidos para lidar com o sofrimento humano, alerta psiquiatra americana Foto: Adobe Stock

O problema do vício

Estamos viciados em soluções rápidas. Muito mais do que tratar uma causa, queremos acabar com as consequências. Isso é incentivado, claro, por toda a pressa que experimentamos no dia a dia do mundo moderno, que inclui desde o incentivo à produtividade até o consumo frenético das redes sociais.

Adotar uma patologia para chamar de sua, de acordo com a escritora, também faz parte disso. “A patologia possibilita uma maneira de se definir perante um mundo em constante mudança e cada vez mais fragmentado”, conta ela. “Todos nascemos com diferenças mentais e físicas inerentes. O que é surpreendente em nossa cultura atual é a prontidão com que essas diferenças são rotuladas como doenças e tratadas com um comprimido.”

Somado a isso, tem o fato de que hoje é bastante comum falar sobre problemas mentais. Por um lado, isso é ótimo, já que o tema deixa de ser um tabu cheio de estigmas. Mas, por outro, todos nós ficamos sujeitos a sermos “diagnosticados” por terceiros devido a certas características. “Hoje, nossa definição de doença mental agrupa não apenas os desvios, mas até sutis diferenças entre nós. Acabou virando uma maneira de entender não apenas a falha de estar em conformidade, mas a falha de alcançar excelência”, define Anna.

Como consequência, aí vem a medicação – e muitas vezes como parte de uma espécie de experimento. “Fazemos um tipo de diagnóstico retrospectivo. Damos à pessoa uma pílula e, se isso faz com que ela se sinta melhor, dizemos: ‘ah, ela deve ter um distúrbio, já que se adaptou a qualquer pílula que seja’”, explica. Só que essa é uma iniciativa perigosa, já que, a curto prazo, estimulantes, por exemplo, vão ajudar qualquer indivíduo. Mas, em longo prazo, podem ter consequências graves.

“Quando eu vejo esses pacientes 10 anos depois do diagnóstico, no pior cenário eles estão viciados aos estimulantes. Mas, na melhor das hipóteses, eles perderam completamente a confiança em sua capacidade de realizar qualquer trabalho”, analisa Anna. Ainda de acordo com ela, muita gente desenvolve hábitos piores relacionados aos estudos e ao trabalho, porque procrastina até o último minuto e, para conseguir render depois, usa estimulantes.

Confira, abaixo, a entrevista exclusiva que Anna Lembke concedeu ao Estadão:

Na sua opinião, a sociedade está evitando qualquer mínimo sinal de desconforto?

É quase como se passássemos a nos entender como pacientes; uma espécie de medicalização da vida cotidiana. Agora, tudo o que encaramos como uma dificuldade de alguma forma transformamos em um distúrbio. Aí vamos ao médico e conseguimos uma receita para isso. Virou algo difundido em nossa cultura – e quando digo nossa cultura, quero dizer a cultura do Brasil e dos Estados Unidos. É uma mentalidade. É a estrutura pela qual entendemos nosso sofrimento.

Existem benefícios nessa mentalidade?

Por um lado, pode ser muito útil dar ao sofrimento uma espécie de quadro psiquiátrico para pensar que há possibilidade de recuperação ou para se identificar com outras pessoas que têm o mesmo transtorno. Isso pode ser uma experiência muito validadora.

Mas a grande desvantagem é que nos vemos apenas como pacientes vulneráveis, que não conseguem resistir a nenhuma tempestade, que não tiveram resiliência e perderam a capacidade de tolerar até mesmo um pequeno desconforto. E isso, claro, é muito problemático. Especialmente quando combinado com o incrível acesso que temos a substâncias e comportamentos que podem mudar a forma como nos sentimos e fazer com que algo nos deixe levemente intoxicados a qualquer momento. Você agora está fugindo da dor em busca do prazer.

Nas redes sociais, é muito comum ver jovens se apresentando com diversos sintomas e detalhando sua rotina de remédios e mudanças de humor. Parece que, hoje em dia, é quase ‘legal’ ter algum tipo de diagnóstico.

Certo! Você vê no TikTok pessoas que estão literalmente narrando cada emoção subjetiva a cada segundo de cada dia, e eles estão conversando com seus seguidores (que não são de fato amigos de verdadeira rede social ou suporte). Mas isso não significa que estão realmente sendo vulneráveis.

Quero dizer, provavelmente no início foi difícil dar esse primeiro passo, mas, uma vez que eles se tornam “a pessoa das redes sociais que narra sua subjetividade”, é como se isso fosse tudo o que eles são. E, então, eles ficam tão focados interiormente que não tem realmente uma experiência com o mundo. É uma experiência interna.

O que vemos, infelizmente, com as gerações Y e Z é que todo mundo está em busca de gatilhos e da possibilidade de vivenciar algum tipo de trauma intolerável em resposta a algo que desencadeia seu possível diagnóstico.

As redes sociais podem favorecer a dependência química?

Sim, porque há um fenômeno de contágio onde a mídia social pode sugerir comportamentos e substâncias que você não teria considerado de outra forma e que podemos querer usar só porque todo mundo está usando. Mas é importante reconhecer que a própria rede social é uma droga, de modo que o próprio meio é viciante e muito aderente cognitivamente aos nossos cérebros. Somos naturalmente atraídos por ele.

Esse vício pelo prazer é bastante explorado também no livro ‘Nação Dopamina’. Qual a relação dele com o livro ‘Nação Tarja Preta’?

‘Nação Tarja Preta’ foi o primeiro livro que escrevi para um público leigo, e eu realmente não sabia muito bem o que estava fazendo, afinal, nunca escrevi um livro para um público geral. Então, quando terminei de escrever, realmente senti que tinha completado uma curva de aprendizado muito íngreme e havia muitos temas que abordei nele que não explorei completamente, e senti que poderia fazer isso em um outro livro. Até porque o sucesso do primeiro livro que, aliás, eu não esperava, me deu muita confiança de que talvez eu poderia escrever sobre essas outras coisas em profundidade e talvez as pessoas se interessem por elas. ‘Nação Tarja Preta’ foi quem deu à luz ao livro ‘Nação Dopamina’.

Você vê muitas diferenças entre o Brasil e os Estados Unidos em relação a esse tema?

Para mim, parece que o Brasil está cerca de 20 anos atrás dos Estados Unidos, mas há alguns sinais de alerta precoce muito fortes de que o Brasil está caminhando para o mesmo tipo de epidemia de prescrição excessiva que os Estados Unidos experimentaram.

Portanto, tenho esperança de que o Brasil possa aprender com nossos erros e não repeti-los, principalmente quando se trata de sedativos como benzodiazepinas e estimulantes como Ritalina para déficit de atenção ou para perda de peso. Parece que os opioides são melhor controlados no geral por aqui (no Brasil), mas o Tramadol, por exemplo é considerado um opioide menos potente e provavelmente está sendo prescrito em excesso.

Seria importante o lançamento de uma campanha de saúde pública que educasse as pessoas comuns, especialmente aquelas que não têm acesso a palestras científicas, podcasts e livros, sobre os perigos de muitas das pílulas que um médico pode prescrever. Porque as pessoas pensam que tudo que vem de um médico é seguro. E, claro, até os próprios médicos são influenciados pela indústria farmacêutica e não são necessariamente muito bem informados sobre os verdadeiros riscos e benefícios.

A pandemia pode ter piorado os vícios das pessoas?

O que vimos nos Estados Unidos foi um grupo de pessoas que definitivamente tiveram a saúde mental prejudicada desde o primeiro dia e outro grupo que teve melhora nesse aspecto. As pessoas que moravam sozinhas normalmente ficaram piores, e aquelas que viviam em famílias funcionais se saíram melhor porque tinham mais tempo para conexões autênticas.

Mas há muitas evidências de que as pessoas beberam mais, fumaram mais e tornaram-se mais fóbicas sociais. De modo que, quando tudo acabou, muitas pessoas estavam lidando com novas adicções e, com isso, houve muito mais diagnósticos para depressão e ansiedade. Acho que é assim que vejo. Mas, em geral, a pandemia apenas acelerou tendências que já estavam acontecendo.

Qual dica você daria às pessoas sobre o relacionamento com remédios e até com redes sociais?

Para diagnosticar a adicção, exploramos muito os três ‘Cs’: controle, compulsão e contínuo uso. Mas, muitas vezes, mesmo quando esses três aspectos estão presentes, as pessoas estarão em negação e não verão o comportamento que é prejudicial para si e para os outros. Na minha opinião, a melhor maneira de descobrir se estamos viciados ou não é fazer um jejum de dopamina e realmente tentar parar de usar por um período de, no mínimo, quatro semanas para realmente testar qual é a nossa relação com aquela substância.

Quando temos uma dor de cabeça ou na coluna, costumamos recorrer a um analgésico. Dificilmente suportamos a dor por muito tempo. Acontece que passamos a fazer algo parecido para lidar com as chateações e frustrações da vida – algo que vem trazendo repercussões brutais para a sociedade.

“Hoje em dia, as pessoas alimentam cada vez mais a ideia de que a vida precisa ser isenta de dor”, resume a psiquiatra Anna Lembke, professora de Medicina de Adicção na Universidade de Stanford (EUA) e autora do livro ‘Nação Dopamina’. Em seu livro ‘Nação Tarja Preta’, lançado recentemente na versão brasileira pela Editora Vestígio, a médica explora a dependência da população em diversos medicamentos.

A obra foi publicada nos Estados Unidos em 2016 e, agora, chega ao Brasil na tentativa de que “possamos aprender com os erros que os americanos cometeram” sobre o tema. “A questão é que os Estados Unidos, o Brasil e vários países do mundo estão cada vez mais confiando em um comprimido para lidar com o sofrimento humano, sem avaliar os custos em longo prazo ou cogitar que os comprimidos que aliviam a dor a curto prazo têm a possibilidade de torná-la pior com o tempo”, aponta.

Nos Estados Unidos, o lançamento do livro fez com que houvesse uma maior conscientização sobre as prescrições médicas, em particular dos opioides (analgésicos poderosos, com efeito similar ao da morfina) e benzodiazepinas (usados como tranquilizantes). “A cultura realmente mudou. Agora, os médicos são obrigados por lei a verificar a base de dados de monitorização de medicamentos prescritos e se certificar de que os pacientes não fazem uso indevido ou recebem múltiplas prescrições dos mesmos medicamentos de vários fornecedores”, conta.

No Brasil, por outro lado, a venda de opioides prescritos aumentou 465% entre 2009 e 2015 no Brasil. Além disso o País está entre os maiores consumidores de medicamentos para perda de peso, incluindo drogas que contêm anfetamina, um estimulante altamente aditivo.

O problema, conforme ela detalha no livro, tem três fontes: a conduta dos médicos, a atuação da indústria farmacêutica e a dependência dos pacientes. Infelizmente, não há muito o que a população geral possa fazer a respeito das duas primeiras questões. Mas há o que trabalhar em relação à última.

“Eu realmente quero que as pessoas entendam profundamente o que está acontecendo em nosso cérebro que nos leva ao consumo compulsivo. Sinto que a neurociência pode dar-lhes ferramentas tangíveis para que consigam compreender o seu comportamento”, conta ela.

Em vários países do mundo, pessoas estão cada vez mais confiando em comprimidos para lidar com o sofrimento humano, alerta psiquiatra americana Foto: Adobe Stock

O problema do vício

Estamos viciados em soluções rápidas. Muito mais do que tratar uma causa, queremos acabar com as consequências. Isso é incentivado, claro, por toda a pressa que experimentamos no dia a dia do mundo moderno, que inclui desde o incentivo à produtividade até o consumo frenético das redes sociais.

Adotar uma patologia para chamar de sua, de acordo com a escritora, também faz parte disso. “A patologia possibilita uma maneira de se definir perante um mundo em constante mudança e cada vez mais fragmentado”, conta ela. “Todos nascemos com diferenças mentais e físicas inerentes. O que é surpreendente em nossa cultura atual é a prontidão com que essas diferenças são rotuladas como doenças e tratadas com um comprimido.”

Somado a isso, tem o fato de que hoje é bastante comum falar sobre problemas mentais. Por um lado, isso é ótimo, já que o tema deixa de ser um tabu cheio de estigmas. Mas, por outro, todos nós ficamos sujeitos a sermos “diagnosticados” por terceiros devido a certas características. “Hoje, nossa definição de doença mental agrupa não apenas os desvios, mas até sutis diferenças entre nós. Acabou virando uma maneira de entender não apenas a falha de estar em conformidade, mas a falha de alcançar excelência”, define Anna.

Como consequência, aí vem a medicação – e muitas vezes como parte de uma espécie de experimento. “Fazemos um tipo de diagnóstico retrospectivo. Damos à pessoa uma pílula e, se isso faz com que ela se sinta melhor, dizemos: ‘ah, ela deve ter um distúrbio, já que se adaptou a qualquer pílula que seja’”, explica. Só que essa é uma iniciativa perigosa, já que, a curto prazo, estimulantes, por exemplo, vão ajudar qualquer indivíduo. Mas, em longo prazo, podem ter consequências graves.

“Quando eu vejo esses pacientes 10 anos depois do diagnóstico, no pior cenário eles estão viciados aos estimulantes. Mas, na melhor das hipóteses, eles perderam completamente a confiança em sua capacidade de realizar qualquer trabalho”, analisa Anna. Ainda de acordo com ela, muita gente desenvolve hábitos piores relacionados aos estudos e ao trabalho, porque procrastina até o último minuto e, para conseguir render depois, usa estimulantes.

Confira, abaixo, a entrevista exclusiva que Anna Lembke concedeu ao Estadão:

Na sua opinião, a sociedade está evitando qualquer mínimo sinal de desconforto?

É quase como se passássemos a nos entender como pacientes; uma espécie de medicalização da vida cotidiana. Agora, tudo o que encaramos como uma dificuldade de alguma forma transformamos em um distúrbio. Aí vamos ao médico e conseguimos uma receita para isso. Virou algo difundido em nossa cultura – e quando digo nossa cultura, quero dizer a cultura do Brasil e dos Estados Unidos. É uma mentalidade. É a estrutura pela qual entendemos nosso sofrimento.

Existem benefícios nessa mentalidade?

Por um lado, pode ser muito útil dar ao sofrimento uma espécie de quadro psiquiátrico para pensar que há possibilidade de recuperação ou para se identificar com outras pessoas que têm o mesmo transtorno. Isso pode ser uma experiência muito validadora.

Mas a grande desvantagem é que nos vemos apenas como pacientes vulneráveis, que não conseguem resistir a nenhuma tempestade, que não tiveram resiliência e perderam a capacidade de tolerar até mesmo um pequeno desconforto. E isso, claro, é muito problemático. Especialmente quando combinado com o incrível acesso que temos a substâncias e comportamentos que podem mudar a forma como nos sentimos e fazer com que algo nos deixe levemente intoxicados a qualquer momento. Você agora está fugindo da dor em busca do prazer.

Nas redes sociais, é muito comum ver jovens se apresentando com diversos sintomas e detalhando sua rotina de remédios e mudanças de humor. Parece que, hoje em dia, é quase ‘legal’ ter algum tipo de diagnóstico.

Certo! Você vê no TikTok pessoas que estão literalmente narrando cada emoção subjetiva a cada segundo de cada dia, e eles estão conversando com seus seguidores (que não são de fato amigos de verdadeira rede social ou suporte). Mas isso não significa que estão realmente sendo vulneráveis.

Quero dizer, provavelmente no início foi difícil dar esse primeiro passo, mas, uma vez que eles se tornam “a pessoa das redes sociais que narra sua subjetividade”, é como se isso fosse tudo o que eles são. E, então, eles ficam tão focados interiormente que não tem realmente uma experiência com o mundo. É uma experiência interna.

O que vemos, infelizmente, com as gerações Y e Z é que todo mundo está em busca de gatilhos e da possibilidade de vivenciar algum tipo de trauma intolerável em resposta a algo que desencadeia seu possível diagnóstico.

As redes sociais podem favorecer a dependência química?

Sim, porque há um fenômeno de contágio onde a mídia social pode sugerir comportamentos e substâncias que você não teria considerado de outra forma e que podemos querer usar só porque todo mundo está usando. Mas é importante reconhecer que a própria rede social é uma droga, de modo que o próprio meio é viciante e muito aderente cognitivamente aos nossos cérebros. Somos naturalmente atraídos por ele.

Esse vício pelo prazer é bastante explorado também no livro ‘Nação Dopamina’. Qual a relação dele com o livro ‘Nação Tarja Preta’?

‘Nação Tarja Preta’ foi o primeiro livro que escrevi para um público leigo, e eu realmente não sabia muito bem o que estava fazendo, afinal, nunca escrevi um livro para um público geral. Então, quando terminei de escrever, realmente senti que tinha completado uma curva de aprendizado muito íngreme e havia muitos temas que abordei nele que não explorei completamente, e senti que poderia fazer isso em um outro livro. Até porque o sucesso do primeiro livro que, aliás, eu não esperava, me deu muita confiança de que talvez eu poderia escrever sobre essas outras coisas em profundidade e talvez as pessoas se interessem por elas. ‘Nação Tarja Preta’ foi quem deu à luz ao livro ‘Nação Dopamina’.

Você vê muitas diferenças entre o Brasil e os Estados Unidos em relação a esse tema?

Para mim, parece que o Brasil está cerca de 20 anos atrás dos Estados Unidos, mas há alguns sinais de alerta precoce muito fortes de que o Brasil está caminhando para o mesmo tipo de epidemia de prescrição excessiva que os Estados Unidos experimentaram.

Portanto, tenho esperança de que o Brasil possa aprender com nossos erros e não repeti-los, principalmente quando se trata de sedativos como benzodiazepinas e estimulantes como Ritalina para déficit de atenção ou para perda de peso. Parece que os opioides são melhor controlados no geral por aqui (no Brasil), mas o Tramadol, por exemplo é considerado um opioide menos potente e provavelmente está sendo prescrito em excesso.

Seria importante o lançamento de uma campanha de saúde pública que educasse as pessoas comuns, especialmente aquelas que não têm acesso a palestras científicas, podcasts e livros, sobre os perigos de muitas das pílulas que um médico pode prescrever. Porque as pessoas pensam que tudo que vem de um médico é seguro. E, claro, até os próprios médicos são influenciados pela indústria farmacêutica e não são necessariamente muito bem informados sobre os verdadeiros riscos e benefícios.

A pandemia pode ter piorado os vícios das pessoas?

O que vimos nos Estados Unidos foi um grupo de pessoas que definitivamente tiveram a saúde mental prejudicada desde o primeiro dia e outro grupo que teve melhora nesse aspecto. As pessoas que moravam sozinhas normalmente ficaram piores, e aquelas que viviam em famílias funcionais se saíram melhor porque tinham mais tempo para conexões autênticas.

Mas há muitas evidências de que as pessoas beberam mais, fumaram mais e tornaram-se mais fóbicas sociais. De modo que, quando tudo acabou, muitas pessoas estavam lidando com novas adicções e, com isso, houve muito mais diagnósticos para depressão e ansiedade. Acho que é assim que vejo. Mas, em geral, a pandemia apenas acelerou tendências que já estavam acontecendo.

Qual dica você daria às pessoas sobre o relacionamento com remédios e até com redes sociais?

Para diagnosticar a adicção, exploramos muito os três ‘Cs’: controle, compulsão e contínuo uso. Mas, muitas vezes, mesmo quando esses três aspectos estão presentes, as pessoas estarão em negação e não verão o comportamento que é prejudicial para si e para os outros. Na minha opinião, a melhor maneira de descobrir se estamos viciados ou não é fazer um jejum de dopamina e realmente tentar parar de usar por um período de, no mínimo, quatro semanas para realmente testar qual é a nossa relação com aquela substância.

Quando temos uma dor de cabeça ou na coluna, costumamos recorrer a um analgésico. Dificilmente suportamos a dor por muito tempo. Acontece que passamos a fazer algo parecido para lidar com as chateações e frustrações da vida – algo que vem trazendo repercussões brutais para a sociedade.

“Hoje em dia, as pessoas alimentam cada vez mais a ideia de que a vida precisa ser isenta de dor”, resume a psiquiatra Anna Lembke, professora de Medicina de Adicção na Universidade de Stanford (EUA) e autora do livro ‘Nação Dopamina’. Em seu livro ‘Nação Tarja Preta’, lançado recentemente na versão brasileira pela Editora Vestígio, a médica explora a dependência da população em diversos medicamentos.

A obra foi publicada nos Estados Unidos em 2016 e, agora, chega ao Brasil na tentativa de que “possamos aprender com os erros que os americanos cometeram” sobre o tema. “A questão é que os Estados Unidos, o Brasil e vários países do mundo estão cada vez mais confiando em um comprimido para lidar com o sofrimento humano, sem avaliar os custos em longo prazo ou cogitar que os comprimidos que aliviam a dor a curto prazo têm a possibilidade de torná-la pior com o tempo”, aponta.

Nos Estados Unidos, o lançamento do livro fez com que houvesse uma maior conscientização sobre as prescrições médicas, em particular dos opioides (analgésicos poderosos, com efeito similar ao da morfina) e benzodiazepinas (usados como tranquilizantes). “A cultura realmente mudou. Agora, os médicos são obrigados por lei a verificar a base de dados de monitorização de medicamentos prescritos e se certificar de que os pacientes não fazem uso indevido ou recebem múltiplas prescrições dos mesmos medicamentos de vários fornecedores”, conta.

No Brasil, por outro lado, a venda de opioides prescritos aumentou 465% entre 2009 e 2015 no Brasil. Além disso o País está entre os maiores consumidores de medicamentos para perda de peso, incluindo drogas que contêm anfetamina, um estimulante altamente aditivo.

O problema, conforme ela detalha no livro, tem três fontes: a conduta dos médicos, a atuação da indústria farmacêutica e a dependência dos pacientes. Infelizmente, não há muito o que a população geral possa fazer a respeito das duas primeiras questões. Mas há o que trabalhar em relação à última.

“Eu realmente quero que as pessoas entendam profundamente o que está acontecendo em nosso cérebro que nos leva ao consumo compulsivo. Sinto que a neurociência pode dar-lhes ferramentas tangíveis para que consigam compreender o seu comportamento”, conta ela.

Em vários países do mundo, pessoas estão cada vez mais confiando em comprimidos para lidar com o sofrimento humano, alerta psiquiatra americana Foto: Adobe Stock

O problema do vício

Estamos viciados em soluções rápidas. Muito mais do que tratar uma causa, queremos acabar com as consequências. Isso é incentivado, claro, por toda a pressa que experimentamos no dia a dia do mundo moderno, que inclui desde o incentivo à produtividade até o consumo frenético das redes sociais.

Adotar uma patologia para chamar de sua, de acordo com a escritora, também faz parte disso. “A patologia possibilita uma maneira de se definir perante um mundo em constante mudança e cada vez mais fragmentado”, conta ela. “Todos nascemos com diferenças mentais e físicas inerentes. O que é surpreendente em nossa cultura atual é a prontidão com que essas diferenças são rotuladas como doenças e tratadas com um comprimido.”

Somado a isso, tem o fato de que hoje é bastante comum falar sobre problemas mentais. Por um lado, isso é ótimo, já que o tema deixa de ser um tabu cheio de estigmas. Mas, por outro, todos nós ficamos sujeitos a sermos “diagnosticados” por terceiros devido a certas características. “Hoje, nossa definição de doença mental agrupa não apenas os desvios, mas até sutis diferenças entre nós. Acabou virando uma maneira de entender não apenas a falha de estar em conformidade, mas a falha de alcançar excelência”, define Anna.

Como consequência, aí vem a medicação – e muitas vezes como parte de uma espécie de experimento. “Fazemos um tipo de diagnóstico retrospectivo. Damos à pessoa uma pílula e, se isso faz com que ela se sinta melhor, dizemos: ‘ah, ela deve ter um distúrbio, já que se adaptou a qualquer pílula que seja’”, explica. Só que essa é uma iniciativa perigosa, já que, a curto prazo, estimulantes, por exemplo, vão ajudar qualquer indivíduo. Mas, em longo prazo, podem ter consequências graves.

“Quando eu vejo esses pacientes 10 anos depois do diagnóstico, no pior cenário eles estão viciados aos estimulantes. Mas, na melhor das hipóteses, eles perderam completamente a confiança em sua capacidade de realizar qualquer trabalho”, analisa Anna. Ainda de acordo com ela, muita gente desenvolve hábitos piores relacionados aos estudos e ao trabalho, porque procrastina até o último minuto e, para conseguir render depois, usa estimulantes.

Confira, abaixo, a entrevista exclusiva que Anna Lembke concedeu ao Estadão:

Na sua opinião, a sociedade está evitando qualquer mínimo sinal de desconforto?

É quase como se passássemos a nos entender como pacientes; uma espécie de medicalização da vida cotidiana. Agora, tudo o que encaramos como uma dificuldade de alguma forma transformamos em um distúrbio. Aí vamos ao médico e conseguimos uma receita para isso. Virou algo difundido em nossa cultura – e quando digo nossa cultura, quero dizer a cultura do Brasil e dos Estados Unidos. É uma mentalidade. É a estrutura pela qual entendemos nosso sofrimento.

Existem benefícios nessa mentalidade?

Por um lado, pode ser muito útil dar ao sofrimento uma espécie de quadro psiquiátrico para pensar que há possibilidade de recuperação ou para se identificar com outras pessoas que têm o mesmo transtorno. Isso pode ser uma experiência muito validadora.

Mas a grande desvantagem é que nos vemos apenas como pacientes vulneráveis, que não conseguem resistir a nenhuma tempestade, que não tiveram resiliência e perderam a capacidade de tolerar até mesmo um pequeno desconforto. E isso, claro, é muito problemático. Especialmente quando combinado com o incrível acesso que temos a substâncias e comportamentos que podem mudar a forma como nos sentimos e fazer com que algo nos deixe levemente intoxicados a qualquer momento. Você agora está fugindo da dor em busca do prazer.

Nas redes sociais, é muito comum ver jovens se apresentando com diversos sintomas e detalhando sua rotina de remédios e mudanças de humor. Parece que, hoje em dia, é quase ‘legal’ ter algum tipo de diagnóstico.

Certo! Você vê no TikTok pessoas que estão literalmente narrando cada emoção subjetiva a cada segundo de cada dia, e eles estão conversando com seus seguidores (que não são de fato amigos de verdadeira rede social ou suporte). Mas isso não significa que estão realmente sendo vulneráveis.

Quero dizer, provavelmente no início foi difícil dar esse primeiro passo, mas, uma vez que eles se tornam “a pessoa das redes sociais que narra sua subjetividade”, é como se isso fosse tudo o que eles são. E, então, eles ficam tão focados interiormente que não tem realmente uma experiência com o mundo. É uma experiência interna.

O que vemos, infelizmente, com as gerações Y e Z é que todo mundo está em busca de gatilhos e da possibilidade de vivenciar algum tipo de trauma intolerável em resposta a algo que desencadeia seu possível diagnóstico.

As redes sociais podem favorecer a dependência química?

Sim, porque há um fenômeno de contágio onde a mídia social pode sugerir comportamentos e substâncias que você não teria considerado de outra forma e que podemos querer usar só porque todo mundo está usando. Mas é importante reconhecer que a própria rede social é uma droga, de modo que o próprio meio é viciante e muito aderente cognitivamente aos nossos cérebros. Somos naturalmente atraídos por ele.

Esse vício pelo prazer é bastante explorado também no livro ‘Nação Dopamina’. Qual a relação dele com o livro ‘Nação Tarja Preta’?

‘Nação Tarja Preta’ foi o primeiro livro que escrevi para um público leigo, e eu realmente não sabia muito bem o que estava fazendo, afinal, nunca escrevi um livro para um público geral. Então, quando terminei de escrever, realmente senti que tinha completado uma curva de aprendizado muito íngreme e havia muitos temas que abordei nele que não explorei completamente, e senti que poderia fazer isso em um outro livro. Até porque o sucesso do primeiro livro que, aliás, eu não esperava, me deu muita confiança de que talvez eu poderia escrever sobre essas outras coisas em profundidade e talvez as pessoas se interessem por elas. ‘Nação Tarja Preta’ foi quem deu à luz ao livro ‘Nação Dopamina’.

Você vê muitas diferenças entre o Brasil e os Estados Unidos em relação a esse tema?

Para mim, parece que o Brasil está cerca de 20 anos atrás dos Estados Unidos, mas há alguns sinais de alerta precoce muito fortes de que o Brasil está caminhando para o mesmo tipo de epidemia de prescrição excessiva que os Estados Unidos experimentaram.

Portanto, tenho esperança de que o Brasil possa aprender com nossos erros e não repeti-los, principalmente quando se trata de sedativos como benzodiazepinas e estimulantes como Ritalina para déficit de atenção ou para perda de peso. Parece que os opioides são melhor controlados no geral por aqui (no Brasil), mas o Tramadol, por exemplo é considerado um opioide menos potente e provavelmente está sendo prescrito em excesso.

Seria importante o lançamento de uma campanha de saúde pública que educasse as pessoas comuns, especialmente aquelas que não têm acesso a palestras científicas, podcasts e livros, sobre os perigos de muitas das pílulas que um médico pode prescrever. Porque as pessoas pensam que tudo que vem de um médico é seguro. E, claro, até os próprios médicos são influenciados pela indústria farmacêutica e não são necessariamente muito bem informados sobre os verdadeiros riscos e benefícios.

A pandemia pode ter piorado os vícios das pessoas?

O que vimos nos Estados Unidos foi um grupo de pessoas que definitivamente tiveram a saúde mental prejudicada desde o primeiro dia e outro grupo que teve melhora nesse aspecto. As pessoas que moravam sozinhas normalmente ficaram piores, e aquelas que viviam em famílias funcionais se saíram melhor porque tinham mais tempo para conexões autênticas.

Mas há muitas evidências de que as pessoas beberam mais, fumaram mais e tornaram-se mais fóbicas sociais. De modo que, quando tudo acabou, muitas pessoas estavam lidando com novas adicções e, com isso, houve muito mais diagnósticos para depressão e ansiedade. Acho que é assim que vejo. Mas, em geral, a pandemia apenas acelerou tendências que já estavam acontecendo.

Qual dica você daria às pessoas sobre o relacionamento com remédios e até com redes sociais?

Para diagnosticar a adicção, exploramos muito os três ‘Cs’: controle, compulsão e contínuo uso. Mas, muitas vezes, mesmo quando esses três aspectos estão presentes, as pessoas estarão em negação e não verão o comportamento que é prejudicial para si e para os outros. Na minha opinião, a melhor maneira de descobrir se estamos viciados ou não é fazer um jejum de dopamina e realmente tentar parar de usar por um período de, no mínimo, quatro semanas para realmente testar qual é a nossa relação com aquela substância.

Quando temos uma dor de cabeça ou na coluna, costumamos recorrer a um analgésico. Dificilmente suportamos a dor por muito tempo. Acontece que passamos a fazer algo parecido para lidar com as chateações e frustrações da vida – algo que vem trazendo repercussões brutais para a sociedade.

“Hoje em dia, as pessoas alimentam cada vez mais a ideia de que a vida precisa ser isenta de dor”, resume a psiquiatra Anna Lembke, professora de Medicina de Adicção na Universidade de Stanford (EUA) e autora do livro ‘Nação Dopamina’. Em seu livro ‘Nação Tarja Preta’, lançado recentemente na versão brasileira pela Editora Vestígio, a médica explora a dependência da população em diversos medicamentos.

A obra foi publicada nos Estados Unidos em 2016 e, agora, chega ao Brasil na tentativa de que “possamos aprender com os erros que os americanos cometeram” sobre o tema. “A questão é que os Estados Unidos, o Brasil e vários países do mundo estão cada vez mais confiando em um comprimido para lidar com o sofrimento humano, sem avaliar os custos em longo prazo ou cogitar que os comprimidos que aliviam a dor a curto prazo têm a possibilidade de torná-la pior com o tempo”, aponta.

Nos Estados Unidos, o lançamento do livro fez com que houvesse uma maior conscientização sobre as prescrições médicas, em particular dos opioides (analgésicos poderosos, com efeito similar ao da morfina) e benzodiazepinas (usados como tranquilizantes). “A cultura realmente mudou. Agora, os médicos são obrigados por lei a verificar a base de dados de monitorização de medicamentos prescritos e se certificar de que os pacientes não fazem uso indevido ou recebem múltiplas prescrições dos mesmos medicamentos de vários fornecedores”, conta.

No Brasil, por outro lado, a venda de opioides prescritos aumentou 465% entre 2009 e 2015 no Brasil. Além disso o País está entre os maiores consumidores de medicamentos para perda de peso, incluindo drogas que contêm anfetamina, um estimulante altamente aditivo.

O problema, conforme ela detalha no livro, tem três fontes: a conduta dos médicos, a atuação da indústria farmacêutica e a dependência dos pacientes. Infelizmente, não há muito o que a população geral possa fazer a respeito das duas primeiras questões. Mas há o que trabalhar em relação à última.

“Eu realmente quero que as pessoas entendam profundamente o que está acontecendo em nosso cérebro que nos leva ao consumo compulsivo. Sinto que a neurociência pode dar-lhes ferramentas tangíveis para que consigam compreender o seu comportamento”, conta ela.

Em vários países do mundo, pessoas estão cada vez mais confiando em comprimidos para lidar com o sofrimento humano, alerta psiquiatra americana Foto: Adobe Stock

O problema do vício

Estamos viciados em soluções rápidas. Muito mais do que tratar uma causa, queremos acabar com as consequências. Isso é incentivado, claro, por toda a pressa que experimentamos no dia a dia do mundo moderno, que inclui desde o incentivo à produtividade até o consumo frenético das redes sociais.

Adotar uma patologia para chamar de sua, de acordo com a escritora, também faz parte disso. “A patologia possibilita uma maneira de se definir perante um mundo em constante mudança e cada vez mais fragmentado”, conta ela. “Todos nascemos com diferenças mentais e físicas inerentes. O que é surpreendente em nossa cultura atual é a prontidão com que essas diferenças são rotuladas como doenças e tratadas com um comprimido.”

Somado a isso, tem o fato de que hoje é bastante comum falar sobre problemas mentais. Por um lado, isso é ótimo, já que o tema deixa de ser um tabu cheio de estigmas. Mas, por outro, todos nós ficamos sujeitos a sermos “diagnosticados” por terceiros devido a certas características. “Hoje, nossa definição de doença mental agrupa não apenas os desvios, mas até sutis diferenças entre nós. Acabou virando uma maneira de entender não apenas a falha de estar em conformidade, mas a falha de alcançar excelência”, define Anna.

Como consequência, aí vem a medicação – e muitas vezes como parte de uma espécie de experimento. “Fazemos um tipo de diagnóstico retrospectivo. Damos à pessoa uma pílula e, se isso faz com que ela se sinta melhor, dizemos: ‘ah, ela deve ter um distúrbio, já que se adaptou a qualquer pílula que seja’”, explica. Só que essa é uma iniciativa perigosa, já que, a curto prazo, estimulantes, por exemplo, vão ajudar qualquer indivíduo. Mas, em longo prazo, podem ter consequências graves.

“Quando eu vejo esses pacientes 10 anos depois do diagnóstico, no pior cenário eles estão viciados aos estimulantes. Mas, na melhor das hipóteses, eles perderam completamente a confiança em sua capacidade de realizar qualquer trabalho”, analisa Anna. Ainda de acordo com ela, muita gente desenvolve hábitos piores relacionados aos estudos e ao trabalho, porque procrastina até o último minuto e, para conseguir render depois, usa estimulantes.

Confira, abaixo, a entrevista exclusiva que Anna Lembke concedeu ao Estadão:

Na sua opinião, a sociedade está evitando qualquer mínimo sinal de desconforto?

É quase como se passássemos a nos entender como pacientes; uma espécie de medicalização da vida cotidiana. Agora, tudo o que encaramos como uma dificuldade de alguma forma transformamos em um distúrbio. Aí vamos ao médico e conseguimos uma receita para isso. Virou algo difundido em nossa cultura – e quando digo nossa cultura, quero dizer a cultura do Brasil e dos Estados Unidos. É uma mentalidade. É a estrutura pela qual entendemos nosso sofrimento.

Existem benefícios nessa mentalidade?

Por um lado, pode ser muito útil dar ao sofrimento uma espécie de quadro psiquiátrico para pensar que há possibilidade de recuperação ou para se identificar com outras pessoas que têm o mesmo transtorno. Isso pode ser uma experiência muito validadora.

Mas a grande desvantagem é que nos vemos apenas como pacientes vulneráveis, que não conseguem resistir a nenhuma tempestade, que não tiveram resiliência e perderam a capacidade de tolerar até mesmo um pequeno desconforto. E isso, claro, é muito problemático. Especialmente quando combinado com o incrível acesso que temos a substâncias e comportamentos que podem mudar a forma como nos sentimos e fazer com que algo nos deixe levemente intoxicados a qualquer momento. Você agora está fugindo da dor em busca do prazer.

Nas redes sociais, é muito comum ver jovens se apresentando com diversos sintomas e detalhando sua rotina de remédios e mudanças de humor. Parece que, hoje em dia, é quase ‘legal’ ter algum tipo de diagnóstico.

Certo! Você vê no TikTok pessoas que estão literalmente narrando cada emoção subjetiva a cada segundo de cada dia, e eles estão conversando com seus seguidores (que não são de fato amigos de verdadeira rede social ou suporte). Mas isso não significa que estão realmente sendo vulneráveis.

Quero dizer, provavelmente no início foi difícil dar esse primeiro passo, mas, uma vez que eles se tornam “a pessoa das redes sociais que narra sua subjetividade”, é como se isso fosse tudo o que eles são. E, então, eles ficam tão focados interiormente que não tem realmente uma experiência com o mundo. É uma experiência interna.

O que vemos, infelizmente, com as gerações Y e Z é que todo mundo está em busca de gatilhos e da possibilidade de vivenciar algum tipo de trauma intolerável em resposta a algo que desencadeia seu possível diagnóstico.

As redes sociais podem favorecer a dependência química?

Sim, porque há um fenômeno de contágio onde a mídia social pode sugerir comportamentos e substâncias que você não teria considerado de outra forma e que podemos querer usar só porque todo mundo está usando. Mas é importante reconhecer que a própria rede social é uma droga, de modo que o próprio meio é viciante e muito aderente cognitivamente aos nossos cérebros. Somos naturalmente atraídos por ele.

Esse vício pelo prazer é bastante explorado também no livro ‘Nação Dopamina’. Qual a relação dele com o livro ‘Nação Tarja Preta’?

‘Nação Tarja Preta’ foi o primeiro livro que escrevi para um público leigo, e eu realmente não sabia muito bem o que estava fazendo, afinal, nunca escrevi um livro para um público geral. Então, quando terminei de escrever, realmente senti que tinha completado uma curva de aprendizado muito íngreme e havia muitos temas que abordei nele que não explorei completamente, e senti que poderia fazer isso em um outro livro. Até porque o sucesso do primeiro livro que, aliás, eu não esperava, me deu muita confiança de que talvez eu poderia escrever sobre essas outras coisas em profundidade e talvez as pessoas se interessem por elas. ‘Nação Tarja Preta’ foi quem deu à luz ao livro ‘Nação Dopamina’.

Você vê muitas diferenças entre o Brasil e os Estados Unidos em relação a esse tema?

Para mim, parece que o Brasil está cerca de 20 anos atrás dos Estados Unidos, mas há alguns sinais de alerta precoce muito fortes de que o Brasil está caminhando para o mesmo tipo de epidemia de prescrição excessiva que os Estados Unidos experimentaram.

Portanto, tenho esperança de que o Brasil possa aprender com nossos erros e não repeti-los, principalmente quando se trata de sedativos como benzodiazepinas e estimulantes como Ritalina para déficit de atenção ou para perda de peso. Parece que os opioides são melhor controlados no geral por aqui (no Brasil), mas o Tramadol, por exemplo é considerado um opioide menos potente e provavelmente está sendo prescrito em excesso.

Seria importante o lançamento de uma campanha de saúde pública que educasse as pessoas comuns, especialmente aquelas que não têm acesso a palestras científicas, podcasts e livros, sobre os perigos de muitas das pílulas que um médico pode prescrever. Porque as pessoas pensam que tudo que vem de um médico é seguro. E, claro, até os próprios médicos são influenciados pela indústria farmacêutica e não são necessariamente muito bem informados sobre os verdadeiros riscos e benefícios.

A pandemia pode ter piorado os vícios das pessoas?

O que vimos nos Estados Unidos foi um grupo de pessoas que definitivamente tiveram a saúde mental prejudicada desde o primeiro dia e outro grupo que teve melhora nesse aspecto. As pessoas que moravam sozinhas normalmente ficaram piores, e aquelas que viviam em famílias funcionais se saíram melhor porque tinham mais tempo para conexões autênticas.

Mas há muitas evidências de que as pessoas beberam mais, fumaram mais e tornaram-se mais fóbicas sociais. De modo que, quando tudo acabou, muitas pessoas estavam lidando com novas adicções e, com isso, houve muito mais diagnósticos para depressão e ansiedade. Acho que é assim que vejo. Mas, em geral, a pandemia apenas acelerou tendências que já estavam acontecendo.

Qual dica você daria às pessoas sobre o relacionamento com remédios e até com redes sociais?

Para diagnosticar a adicção, exploramos muito os três ‘Cs’: controle, compulsão e contínuo uso. Mas, muitas vezes, mesmo quando esses três aspectos estão presentes, as pessoas estarão em negação e não verão o comportamento que é prejudicial para si e para os outros. Na minha opinião, a melhor maneira de descobrir se estamos viciados ou não é fazer um jejum de dopamina e realmente tentar parar de usar por um período de, no mínimo, quatro semanas para realmente testar qual é a nossa relação com aquela substância.

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Entrevista por Ana Lourenço

Repórter do Estadão em São Paulo. Atualmente cobre turismo, na seção Bate-Volta SP, mas tem passagens pela editoria de saúde, cultura e decoração. Formada pela PUC-SP.

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