A comunidade médica dos Estados Unidos está preocupada com o excesso de exames para detecção de câncer de próstata em homens em idade avançada e o consequente alto índice de tratamento agressivo nesta faixa etária, mesmo em quadros de baixo risco. Em 2010, cerca de 90% dos americanos com câncer de próstata de baixo risco foram submetidos a cirurgia imediata para remover a próstata ou receberam tratamento com radiação, segundo a Associação Americana de Urologia.
As diretrizes da Força-Tarefa de Serviços Preventivos dos Estados Unidos e do Colégio Americano de Médicos não recomendam a triagem de rotina contra o câncer de próstata para homens com mais de 69 ou 70 anos – ou para homens com menos de 10 a 15 anos de expectativa de vida.
Segundo os especialistas, o diagnóstico tende a ser seguido instantaneamente por um tratamento, desconsiderando que nesta faixa etária a maioria dos tumores não corre risco de se espalhar e/ou causar sintomas incômodos antes que da morte do paciente por qualquer outro motivo.
Eles defendem que o tratamento do câncer nessa idade – por cirurgia, radioterapia e/ou quimioterapia – pode causar mais danos do que manter o tumor. Já no caso do Brasil, médicos apontam que o rastreio da doença em fase inicial ainda é um desafio.
Por que no Brasil é diferente?
Segundo Bruno Benigno, urologista do Centro de Oncologia e Urologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, o cenário americano é diferente do brasileiro. “Lá, há um excesso de exames e diagnósticos, mas aqui a maioria dos homens descobre a doença em estágio avançado. Precisamos reforçar a comunicação em relação aos exames de triagem, e não o contrário”, diz.
Nos Estados Unidos, entre 2014 e 2021, a proporção de homens com baixo risco de câncer de próstata que escolheram fazer vigilância ativa, com exames de rastreio a cada três ou seis meses, subiu de cerca de 27% para quase 60%. Já no Brasil, diz o Instituto Nacional de Câncer (Inca), cerca de 20% dos casos já são diagnosticados em estágio avançado por causa da baixa adesão a exames periódicos.
O Inca diz ainda que o câncer de próstata é o tipo mais comum de câncer entre homens brasileiros, e representa 29% dos diagnósticos da doença no País. No ano passado, 16.055 homens morreram pela doença - cerca de 44 óbitos por dia, segundo o Sistema de Informação sobre Mortalidade do Ministério da Saúde.
Para mudar esse cenário, Benigno defende reforçar as campanhas de prevenção e aprimorar os métodos de análise em relação ao quadro clínico dos pacientes para determinar com mais precisão quando o tratamento é ou não vantajoso.
Quando fazer exames de próstata?
A Sociedade Brasileira de Urologia segue a Sociedade Americana de Urologia: os exames devem ser feitos a partir dos 45 anos para todos os homens e aos 40 para os de grupo de risco.
Segundo Marcelo Wroclawski, presidente da entidade brasileira em SP, o momento de parar é quando o homem tem entre 5 e 10 anos de expectativa de vida – cálculo que deve ser feito pelo médico, a partir do estilo de vida e quadro geral de saúde do paciente.
Wroclawski diz que a escolha por interromper o rastreio quando o paciente tem idade avançada se dá pelo entendimento de que não há tantos benefícios em tratar o tumor nessa faixa etária e pelos riscos das biópsias. Um dos principais métodos de detecção do câncer de próstata, as biópsias são invasivas e têm risco de infecção e sangramentos, apesar de alguns centros já oferecerem métodos mais seguros.
O Ministério da Saúde destaca que “a principal recomendação quanto à realização dos exames como ferramenta para o rastreamento do câncer de próstata é de que a indicação médica seja individualizada de acordo com cada caso e compartilhada com o paciente, considerando os benefícios do diagnóstico precoce para as opções de tratamento.”
A pasta reforça ainda, de modo geral, que os métodos por imagem têm papel limitado tanto no diagnóstico quanto no estadiamento clínico da doença. Assim, a ultrassonografia transretal é o método de escolha para a realização da biópsia prostática, porém com a finalidade de orientar o posicionamento da agulha nas diferentes zonas da próstata. A ressonância magnética tem indicação em casos bastante selecionados. Ambos os métodos também têm baixa acurácia na determinação da extensão local da doença.
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Quem é grupo de risco do câncer de próstata?
Fazem parte do grupo de risco do câncer de próstata e por isso devem começar a rastrear a doença aos 40 anos, segundo a SBU:
- Pessoas que ao nascer foram identificadas como do sexo masculino e têm caso de câncer de próstata na família (em especial se quem adoeceu foi o pai ou irmão);
- Pessoas que ao nascer foram identificadas como do sexo masculino e são negras, pois estudos mostram que a incidência e a taxa da mortalidade da doença é maior em negros;
- Pessoas que ao nascer foram identificadas como do sexo masculino e têm alterações genéticas BRCA, que indica predisposição para câncer (rastreio pode ser feito a partir de testes genéticos, mas ainda não é tão comum no Brasil).
Quais são os exames que detectam o câncer de próstata?
Os exames de toque retal e de sangue com coleta de Antígeno Prostático Específico (PSA) são os principais na hora de levantar suspeita de câncer de próstata. A partir da suspeita, podem ser feitas biópsias e/ou exames de imagem, como tomografias, para confirmar o diagnóstico da doença.
Quando vale ou não a pena tratar?
Segundo Benigno, a escolha sobre tratar ou não o câncer de próstata deve ser tomada pelo médico, junto ao paciente e sua família, após análise individual do caso. “O paciente e a família precisam entender os riscos tanto do tratamento, quanto de um possível avanço do tumor”, diz.
Se a expectativa de vida do paciente é inferior a 10 anos e o tumor não aparenta ser agressivo, não tratar pode ser melhor no sentido de garantir a melhor qualidade de vida a esse paciente em seu fim de vida. Já se o paciente idoso tem ótimas condições de saúde e o tumor tem risco de avançar rapidamente, o tratamento pode garantir mais anos de vida.