A morte da influenciadora digital e modelo fotográfica Aline Maria Ferreira da Silva, de 33 anos, na última semana, acendeu um alerta sobre os perigos de alguns dos procedimentos que prometem realçar a beleza. Aline morreu após a realização de aplicações, na região dos glúteos, de PMMA, ou polimetilmetacrilato, substância muito usada para preenchimentos, mas fortemente desaconselhada para procedimentos estéticos por órgãos como as sociedades brasileiras de Cirurgia Plástica (SBPC) e Dermatologia (SBD).
Na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o produto não é proibido, mas é considerado de máximo risco em determinados tipos de aplicação e alvo de uma série de regulamentações.
Segundo a SBD, o uso da substância pode causar reações de curto prazo, como edemas locais, processos inflamatórios, reações alérgicas e formação de granuloma (tipo inflamação causada pelo sistema imunológico), e tardias, muitos anos após a realização da injeção. Por isso, para a associação, os procedimentos que necessitam da utilização da substância PMMA devem ser indicados e realizados por médicos, pois podem produzir resultados imprevisíveis e indesejáveis, incluindo reações incuráveis e persistentes.
O que é PMMA?
O PMMA é um tipo de plástico que possui diversas aplicações, da indústria até a medicina. Nesse campo, costuma ser usado como gel para preencher pequenas áreas nas camadas mais superficiais da pele (preenchimento cutâneo). Segundo a Anvisa, nesse sentido, a sua aplicação é autorizada apenas para duas finalidades:
- Corrigir distrofias causadas por excesso ou perda de gordura em partes do corpo de pacientes com HIV/AIDS (lipoatrofias) devido ao uso de medicamentos antirretrovirais;
- Fazer preenchimento facial e corporal que visam corrigir irregularidades e depressões na pele por meio da bioplastia, técnica de implantes biologicamente compatíveis para correção de irregularidades sem cirurgia.
Ainda segundo a agência, a dosagem utilizada deve ser aquela estritamente necessária para a correção das irregularidades e o procedimento deve ser realizado exclusivamente por profissionais médicos treinados. O órgão regulador estabelece indicações claras dos locais do corpo onde as aplicações podem ser feitas e a concentração exata da substância que pode estar contida em cada mililitro das injeções.
Para preenchimentos subcutâneos, isto é, em camadas mais profundas da pele, é necessário que o profissional seja registrado na Anvisa, pois o produto é considerado de máximo risco.
Apesar de não ser contraindicado pela agência para aplicação nos glúteos com finalidade de correção, o órgão destaca que não há recomendação do uso para aumento de volume corporal ou facial. Segundo a agência, a decisão de aplicação deve ser feita pelo médico responsável, com base nas necessidades de correção e nas diretrizes técnicas de uso do produto.
As associações médicas, por sua vez, são restritivas quanto à esse tipo de utilização. Inclusive, a SBD informa que um parecer técnico conjunto com a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica está em andamento e será apresentado ao Conselho Federal de Medicina (CFM) para definir as regras para esse procedimento estético.
Quais os riscos do PMMA?
De acordo com a cirurgiã plástica Marcela Cammarota, membro do conselho científico e porta-voz da SBCP, a associação é estritamente contra o uso do PMMA para fins estéticos.
Ela explica que, na medicina, a substância é usada na forma de microesferas, que devem ter um tamanho específico para que o organismo não a rejeite. Essa particularidade, por sua vez, exige muita cautela de quem realiza o procedimento.
Se forem muito pequenas, podem ser “engolidas” pelas células, fazendo com que o corpo reconheça o PMMA como uma substância não compatível, levando os anticorpos à atacarem o local do preenchimento. Se forem muito grandes, podem causar inflamações e o corpo tentará expulsá-lo.
Ela destaca ainda que essas reações podem se tornar crônicas, causando problemas que serão permanentes até que a substância seja removida do corpo. Esta, porém, não é uma tarefa fácil. A sua remoção pode exigir a retirada também do próprio tecido em que está o gel infiltrado, causando lesões e deformidades.
O uso de doses altas de PMMA também pode levar à necrose, posto que o plástico pode acabar comprimindo vasos sanguíneos, levando à morte das células. Ainda, podem acontecer infecções. Durante a aplicação, bactérias que estão na camada externa da pele podem penetrar no organismo e “grudar” no material do PMMA. Dessa forma, o uso de antibióticos não consegue tratar a contaminação efetivamente.
Cuidados
Antes da realização de qualquer procedimento invasivo, é importante certificar-se de que o profissional escolhido para a sua realização seja um médico habilitado e regular no Conselho Regional de Medicina (CRM). Também é importante verificar se a marca do produto utilizado é aprovada pela Anvisa.
Além disso, como aponta a SBD, esses procedimentos requerem avaliação prévia da saúde do paciente e devem ser realizados por um médico responsável, preferencialmente em consultórios médicos, clínicas ou hospitais, para garantir a biossegurança.
Vale destacar que as sociedades médicas reconhecem que, apesar dos possíveis efeitos adversos, o PMMA continua a ser uma ferramenta valiosa para tratar lipoatrofias severas em alguns pacientes com HIV/AIDS, desde que administrado por profissionais qualificados para prevenir e gerenciar possíveis complicações.
Marcela Cammarota ressalta que o produto é importante para o tratamento de lipoatrofias, visto que é uma opção permanente de tratamento, o que torna desnecessária a realização de reaplicações frequentes e representa uma economia de recursos para esses pacientes. Para procedimentos estéticos, como aumento do volume dos glúteos, ela recomenda a aplicação de gordura do próprio paciente como uma alternativa permanente e mais segura, pois evita problemas de rejeição.