Começa com um incômodo leve e uma tensão muscular. De repente, a dor se intensifica, a visão fica prejudicada, e pontinhos pretos podem surgir. Em alguns casos, acompanhados de náuseas, vômitos e uma sensibilidade à luz e ao som. É assim que a enxaqueca, uma das dores de cabeça mais frequentes entre as mulheres, se manifesta em momentos de crise.
Uma simples atividade do dia a dia pode se tornar difícil, refletindo no humor e na qualidade de vida. Conforme pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2019, dores de cabeça e enxaqueca são a sétima causa mais frequente pelo qual as pessoas deixam de realizar atividades habituais, impactando 6% da população.
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“Às vezes eu ia parar no hospital, ficava em observação, tomando medicação na veia. Era muito sofrido”, relata Maria de Lourdes de Oliveira Sousa, de 65 anos, que convive com crises de enxaqueca desde a adolescência, mas que nunca soube nomear a dor. Hoje, ela é acompanhada por um neurologista e não sente dores fortes como antes, mas precisa lidar com os episódios que aparecem de uma a três vezes por mês. “Eu tomo os remédios indicados pelo neurologista e, às vezes, me dão as crises, mesmo sendo fracas. Incomoda porque fica aquela dorzinha, sabe?”
O QUE É A ENXAQUECA
Segundo a neurologista pela Santa Casa de São Paulo e neurofisiologista pelo HCFMUSP dra. Natália Longo, a enxaqueca é uma desregulação que ocorre nos neurotransmissores e afetam a via da dor no cérebro, no qual faz com que as pessoas tenham um estímulo para dor de cabeça.
A enxaqueca pura, sem aura, caracteriza-se apenas pela dor moderada a forte, geralmente de um lado da cabeça. Já a enxaqueca com aura é acompanhada de sintomas como sensibilidade à luz, ao som, náuseas e vômitos. Algumas pessoas também podem sentir dormência na boca e nas mãos e ver pontinhos pretos. “Isto é o que chamamos de aura, um déficit neurológico focal que dura, no máximo, uma hora”, explica.
“É algo extremamente depressivo. Eu tenho enxaqueca com aura e vejo luzes passando pela lateral do olho, como se fossem lâmpadas acesas ou feixes coloridos de luz. É lindo, mas uma sensação péssima porque quando surge a aura e a dor forte vem, ela é muito intensa”, desabafa Ana Amélia Marimon, de 63 anos, que também sofre com fortes crises de enxaqueca desde criança e só entendeu que tinha a doença quando procurou um médico. “É como se o cérebro estivesse se expandindo por dentro e fosse arrebentar a caixa craniana”, descreve.
Segundo a neurologista Dra. Maria Lúcia Pimentel, coordenadora do curso de pós-graduação em neurologia da PUC-Rio, a enxaqueca surge principalmente entre a adolescência e a idade adulta. “A enxaqueca é um dos 150 tipos de dores de cabeça, caracterizada pela dor pulsátil unilateral, com intolerância à luz, ao ruído, com náuseas, vômitos e que dura de 4 a 72 horas, geralmente”, explica.
GATILHOS PARA A ENXAQUECA
Dentre os fatores que desencadeiam a enxaqueca estão alimentos e substâncias como doces e cafeína. “Nós sabemos que existem receptores para a cafeína no nosso cérebro. E existem até outros tipos de dores de cabeça relacionada ao café”, avalia Natália. Ela cita a serotonina como um dos principais neurotransmissores presentes no cérebro, que pode ser desregulada pelo chocolate, um dos gatilhos para enxaqueca. No entanto, a médica ressalta que a quantidade de receptores varia de pessoa para pessoa, e os estímulos para dor podem ser diferentes.
Para Maria de Lourdes (e muitos brasileiros), café e doce não podem faltar no dia a dia, mas podem fazer a enxaqueca voltar. Sempre que uma crise está a caminho, Maria sente seu couro cabeludo sensível e a região da cabeça dolorida. Mesmo tomando os remédios indicados pelo seu médico, a dor persiste.
“Eu até falo para minha filha que parece que o meu rosto está inflamado. Tem dias em que eu amanheço e parece que a minha cabeça está maior do que ela é”, relata. O sintoma é comum e tem nome: alodínia, sensação dolorosa no couro cabeludo acentuada pela sensibilidade. “Nós costumamos dizer que, quando o paciente tem uma dor muito forte, é como se ele tivesse a sensação de estar com a ‘cabeça grande’”, pontua a neurologista Natália.
Além dos doces e da cafeína, outros alimentos, além de álcool e hormônios também estão associados à enxaqueca, deixando as mulheres mais sujeitas a crises. Durante o período menstrual, por exemplo, há mais chances de a enxaqueca se manifestar devido à produção de estrogênio no organismo. “Alimentos muito condimentados, com conservantes, enlatados, gordurosos, frituras, refrigerantes e chá preto também são desencadeantes de crises de enxaqueca”, alerta.
Estresse, ansiedade, má qualidade de sono e depressão são fatores que podem contribuir para o surgimento da enxaqueca. Por se tratar de uma dor comum, a neurologista adverte que as pessoas não levam muito a sério, mas que precisa ser tratada para não prejudicar a qualidade de vida.
QUAIS OS TRATAMENTOS?
Há várias formas de tratamento. Segundo a médica, nos profiláticos os medicamentos usados de forma contínua, mas há alternativas que podem ser associadas aos medicamentos. Técnicas de relaxamento como meditação, massagens e acupuntura, podem ser grandes aliadas no tratamento complementar para alívio da tensão muscular.
“Todo tipo de enxaqueca está conectado ao desequilíbrio dos órgãos internos, sendo uma manifestação de que alguma coisa dentro de você não está em harmonia”, diz Fernando Montoto, especialista em Okido Yoga, que utiliza a técnica oriental kanrenbui, aprendida no Japão, para tratar a enxaqueca de seus pacientes. “No Japão acredita-se que o intestino é o segundo cérebro, e muitos casos de enxaqueca vêm de problemas digestivos. Se o intestino não funciona bem, o paciente tende a ter enxaqueca.”
Montoto utiliza de acupuntura na região da cabeça, massagens, magnetismo e ionização para trabalhar com pontos energéticos que influenciam nas dores corporais. “Não temos um ponto determinado para a enxaqueca. Nós dependemos da pessoa para apalpar os órgãos internos e, por meio do diagnóstico, determinar quais são os órgãos mais carregados e os mais passivos”, explica.
Para as crises de enxaqueca, o movimento de pressionar os órgãos internos e os pontos certos alivia as dores, como ocorreu com Anna Amélia Marimon, paciente de Montoto que notou uma diminuição dos episódios nos últimos meses. “Quando procurei a terapia estava com enxaquecas recorrentes, era uma coisa insana na minha vida”, explica. O tratamento auxiliou não somente as crises de enxaqueca de Anna, mas outras dores no corpo. “Tudo no seu corpo melhora e tem sido bem bom. Eu não tenho mais tido crises fortes.”
“O tratamento é direcionado de forma que seja o mais adequado para o paciente e os pontos são estimulados para trazer o equilíbrio energético, onde corre a energia vital”, ressalta Montoto.
COMO ALIVIAR A DOR EM MOMENTOS DE CRISE?
A neurologista Maria Lúcia Pimentel, coordenadora do curso de pós-graduação em neurologia da PUC-Rio, mostra como algumas ações simples podem ajudar a diminuir a dor.
- Fique em um lugar escuro e sem ruído
- Se possível, tente descansar e desligar do mundo para não receber estímulos externos e piorar a dor
- Tome sua medicação de costume
- Faça exercícios físicos regularmente