No inverno, ter a motivação para sair de casa e praticar exercícios físicos pode ser difícil, afinal, com o tempo frio, a cama e as cobertas se tornam ainda mais convidativas. Mas as baixas temperaturas não são inimigas da sua meta de rotina mais saudável. Na verdade, elas podem até ser aliadas da prática de esportes. No frio, o corpo tende a queimar mais calorias e as temperaturas podem tornar as atividades aeróbicas mais agradáveis e menos cansativas. Isso, é claro, sem deixar de ter suas particularidades e cuidados necessários.
O Estadão entrevistou especialistas para entender os principais efeitos do frio no corpo durante a prática de exercícios, as atividades mais vantajosas nesta época do ano e os cuidados necessários. Confira abaixo as respostas para as principais dúvidas sobre o tema.
Quais os principais desafios ao realizar atividade física no inverno?
O médico Gustavo Starling, diretor da Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte (SBMEE), elenca três principais desafios. Em primeiro lugar, as baixas temperaturas podem dificultar o aquecimento dos músculos pré-treino, atrapalhando o preparo necessário para que corpo execute os movimentos de forma eficiente e segura.
Segundo, as condições climáticas adversas, como neve e gelo, no caso da região sul do País, ou chuva, podem tornar o cenário para a prática dos exercícios desconfortável ou desfavorável.
Além disso, o clima frio pode diminuir a motivação – principalmente para quem costuma treinar pela manhã, quando as temperaturas tendem a ser mais baixas.
Por fim, a exposição às condições ambientais adversas, aliada a um vestuário inadequado para o frio, pode levar ao desconforto ou, até mesmo, em condições mais extremas, a problemas de saúde, como a hipotermia (queda significativa na temperatura do corpo), destaca o especialista.
O risco de lesões aumenta?
“Sim, o risco de lesões pode aumentar ao realizar atividades físicas no inverno”, responde Starling. É que o frio pode levar os músculos a se contraírem mais, tornando-os menos flexíveis e mais propensos a distensões e rupturas.
A chuva também não ajuda. Superfícies molhadas aumentam os riscos de quedas e lesões. Ainda, a menor luz solar e a neblina podem prejudicar a visibilidade e dificultar a percepção de obstáculos, aumentando o risco de acidentes.
Há vantagens em fazer exercícios no frio?
Apesar dos desafios, fazer exercícios no frio pode, sim, ser vantajoso.
Segundo o educador físico Ricardo Luís Guerra, professor do Instituto de Saúde e Sociedade da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), se exercitar em baixas temperaturas pode ser uma boa estratégia para quem quer emagrecer. Nessa condição, o corpo trabalha mais para se manter aquecido, o que pode aumentar o gasto calórico durante o exercício.
Guerra também diz que outra vantagem, comparada ao verão, é o menor risco de superaquecimento – um alto aumento da temperatura corporal com consequências como suor excessivo, cãibras, náuseas e queda da pressão arterial. Como acrescenta Starling, o frio pode proporcionar um ambiente em que é mais fácil regular a temperatura corporal do que no verão; por exemplo, vestir um casaco encorpado já pode ajudar bastante a encarar o vento gelado.
Os especialistas também apontam que exercícios ao ar livre em temperaturas mais baixas podem ser mais agradáveis, aumentando a produção de endorfinas – substâncias químicas que melhoram o humor e reduzem o estresse. Além disso, muitas vezes, os espaços ao ar livre têm menos transeuntes durante o inverno, o que pode proporcionar uma experiência mais relaxante para a prática de exercícios.
Há exercícios que valem mais a pena no frio?
Atividades aeróbicas ao ar livre, como correr, caminhar ou fazer trilhas, são recomendadas, já que podem ser mais agradáveis do que no calor. Além disso, o ar frio pode ajudar a refrescar e manter a temperatura corporal estável durante o exercício.
Segundo Starling, o inverno também pode ser um momento ideal para focar em práticas mais introspectivas, seja em um ambiente fechado e aquecido (indoor) ou ao ar livre, em dias mais amenos. Ele também diz que, para aqueles que têm acesso a piscinas cobertas e aquecidas, a natação pode ser uma excelente forma de exercício no inverno, pois a água aquecida proporciona um ambiente confortável para um treino cardiovascular eficaz.
Se você prefere treinos rápidos e intensos, os circuitos de exercícios funcionais em academias são uma ótima opção para realizar durante o inverno, além de esportes em quadras fechadas, como o futebol de salão. Eles proporcionam um excelente trabalho cardiovascular e de resistência muscular.
Já a natação em locais sem sistema de controle da temperatura e o ciclismo, por exporem muito os sujeitos ao frio e ao vento, são apontados por Guerra como opções desvantajosas nesse época do ano.
É verdade que a gente queima mais calorias no frio?
Sim. De acordo com Guerra, quando exposto ao frio, o corpo aumenta a produção de calor para manter a temperatura interna estável, resultando em um maior gasto energético. Os tremores involuntários provocados pela sensação de frio também geram calor adicional e consomem calorias, segundo Starling. O metabolismo basal, quantidade de energia que o corpo, em repouso, gasta para manter as suas funções vitais, também pode aumentar ligeiramente no frio, mas esse efeito é pequeno.
Vale dizer que o impacto na queima de calorias varia de pessoa para pessoa, dependendo da exposição ao frio, intensidade e duração do exercício, além de características individuais do metabolismo e composição corporal.
Starling destaca: o efeito de queima de calorias no frio não é uma solução milagrosa para perda de peso; manter uma dieta equilibrada e um plano de exercícios consistente é fundamental. Portanto, segundo o médico, o corpo pode queimar mais calorias no frio, mas o impacto real é pequeno e variável entre as pessoas.
Quais os cuidados especiais ao fazer exercício no inverno?
Os especialistas destacam que um dos principais cuidados nessa época do ano é o uso de roupas apropriadas, com materiais que protejam contra o vento e a umidade. Devido aos dias mais escuros, também pode ser importante usar roupas com mais visibilidade, como materiais fluorescentes. Outro conselho é usar calçados apropriados para evitar escorregões e, caso pegue chuva, troque roupas molhadas por secas imediatamente após o exercício.
Além disso, para evitar as desvantagens e riscos de praticar exercícios no inverno, é importante fazer um aquecimento mais longo do que o habitual antes do treino. Dessa forma, os músculos e as articulações, que ficam rígidos devido ao frio e demoram mais para alcançar a temperatura ideal, estarão melhor preparados para a atividade física.
Também, é importantíssimo focar na hidratação e vale considerar alternativas de esportes em ambiente fechado, quando as condições externas forem muito adversas, além de ajustar os planos conforme o tempo, dando uma olhada nas condições meteorológicas.
Quais os riscos em um cenário de prática de exercícios no inverno?
A desidratação é apontada pelos especialistas como um grande risco. No frio, tendemos a sentir menos sede, por isso, é normal “esquecermos” de beber água. Embora transpiremos menos, o corpo ainda perde sua hidratação por meio da respiração e do suor. Por isso, é importante manter uma garrafa de água por perto.
“Mesmo que não sinta sede, beba pequenos goles de água durante o exercício para manter a hidratação. A falta de líquidos pode até prolongar o tempo necessário para a recuperação dos músculos após o treino, aumentando o risco de dores musculares e fadiga”, diz o médico especialista em esportes.
Ricardo Guerra também destaca que essa época é propensa a prejuízos ao sistema respiratório, devido à exposição ao ar seco e gelado, que pode irritar as vias respiratórias.
Outro risco importante, principalmente ao ar livre, é a hipotermia. Por isso o cuidado com as vestimentas e a não exposição a condições muito adversas é tão importante. Caso apresente os primeiros sinais de que a temperatura do corpo está muito baixa, é importante interromper os exercícios. Os sintomas costumam ser:
- Tremores leves
- Dormência nas mãos e nos pés
- Cansaço excessivo
- Lentidão nos movimentos
- Pele pálida e fria
Mas caso a temperatura do corpo baixe mais, os sinais podem evoluir para:
- Tremores mais intensos e incontroláveis
- Confusão mental
- Dificuldades na fala
- Dificuldades em controlar movimentos do corpo
- Redução brusca da frequência cardíaca e respiratória