BRASÍLIA - Em meio a uma queda de braço com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) sobre restrições contra a covid-19 nas fronteiras, o governo anunciou nesta terça-feira, 7, a edição de uma portaria para colocar quem chega ao Brasil sem estar vacinado contra covid-19 em quarentena de cinco dias. Os imunizados, por sua vez, não precisarão do isolamento. Os viajantes ainda precisarão apresentar um teste RT-PCR negativo feito 72 horas antes de entrar no País. Em pronunciamento convocado às pressas no Palácio do Planalto e repleto de malabarismos retóricos, os ministros Marcelo Queiroga (Saúde), Ciro Nogueira (Casa Civil) e Bruno Bianco (Advocacia-geral da União), no entanto, evitaram falar sobre “passaporte da vacina” para não esbarrar na resistência do presidente Jair Bolsonaro. Os ministros não deram detalhes sobre a portaria e não quiseram responder perguntas dos jornalistas.
Queiroga seguiu Nogueira e disse que é necessário defender as liberdades individuais e respeitar os direitos dos brasileiros. “Países que identificam variantes não podem ser punidos com restrições”, declarou o ministro.
A opção pela quarentena a não imunizados acolhe uma sugestão da Anvisa, que tem manifestado preocupação com o avanço da variante Ômicron, cujos estudos preliminares apontam risco maior de contágio. Em 12 de novembro, a agência enviou à Casa Civil notas técnicas sobre a entrada de viajantes ao Brasil: propôs a abertura das fronteiras para aqueles que comprovarem a vacinação e quarentena de cinco dias para os não imunizados.
Após a quarentena, estrangeiros não vacinados poderão circular livremente pelo País e, eventualmente, se contaminar pelo novo coronavírus em meio à ameaça da Ômicron. Especialistas defendem a exigência de comprovante de imunização, para reduzir o risco de transmissão.
A Anvisa defendia a ampliação da lista de fechamento da fronteira aérea com o Brasil, o que o governo não deve acatar, como sinalizou Queiroga. “Essa temática envolve relações exteriores do Brasil. Posicionamento da Anvisa pode ser acatado ou não na sua totalidade pelo governo”, acrescentou. Bolsonaro, que diz não ter se imunizado, é crítico à exigência do passaporte da vacina. Mais cedo, ao comentar a pressão por mais restrições nas fronteiras para conter a Ômicron, o presidente se exaltou e mentiu sobre as recomendações feitas pela Anvisa. “Estamos trabalhando com a Anvisa, que quer fechar o espaço aéreo. De novo, p…? De novo vai começar esse negócio?”, afirmou, em tom elevado, durante evento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) com empresários do setor. A agência, porém, não recomendou fechar o espaço aéreo. Pouco depois, em outro evento, chamou a adoção do passaporte vacinal de "coleira". “Tanta gente tem morrido, para que o passaporte vacinal? Essa coleira que querem colocar no povo brasileio. Cadê nossa liberdade? Eu prefiro morrer a perder a liberdade”, disse o presidente. Em pronunciamento no Palácio do Planalto, Queiroga repetiu a frase do chefe para justificar a não adoção da medida no País. "Nós respeitamos as liberdades individuais e o povo brasileiro tem procurado as políticas públicas livremente. O presidente ainda há pouco falou: "às vezes, é melhor perder a vida do que perder a liberdade". Não estamos aqui querendo fazer nenhum tipo de polemização, mas são direitos fundamentais e que eles têm a mesma importância e o nosso compromisso é com isso."
O ministro afirmou que, após o período de cinco dias, o viajante poderá sair do isolamento caso o teste seja negativo. "Não se pode discriminar as pessoas entre vacinadas e não-vacinadas para, a partir daí, impor restrições", disse Queiroga. "A ciência já sabe que as vacinas não impedem totalmente a transmissão do vírus", completou. A nova regra foi discutida em reunião interministerial e fará parte de uma portaria a ser publicada. Como mostrou o Estadão/Broadcast, o governo cancelou a reunião que faria nesta segunda-feira, 6, com a Anvisa para discutir eventual adoção do chamado passaporte da vacina para entrar no País e, ainda, possível fechamento das fronteiras aéreas com mais quatro países africanos: Angola, Malawi, Moçambique e Zâmbia.. O cancelamento ocorreu após o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), dar 48 horas para o Executivo explicar o porquê dispensa a apresentação de comprovante de vacinação contra a covid-19 ou a imposição de quarentena obrigatória a quem chega no País, como recomenda a Anvisa.
De acordo com Queiroga, mais de 80% da população acima de 14 anos já foi imunizada com duas doses e a adesão à vacinação tem dado certo porque o Brasil “respeita as liberdades individuais”. “Queremos ser paraíso do turismo mundial”, declarou. “Todo mundo ficou preocupado com a nova variante, mas elas podem acontecer”, minimizou.
Bianco afirmou que a AGU tem acompanhado e chancelado todas as medidas tomadas pelo governo sobre as fronteiras.