O pesquisador Bryan Foy, da Universidade Estadual do Colorado, esteve em trabalho de campo nas florestas do Senegal, em 2008, quando foi picado diversas vezes por mosquitos. Cinco dias depois de voltar para casa, apresentou febre, dores no corpo, fadiga e manchas, o que foi atribuído à dengue. No entanto, dez dias depois, sua mulher, que não havia viajado, desenvolveu os mesmos sintomas. Testes revelaram que eles haviam sido infectados pelo zika. O fato de não haver o mosquito transmissor do zika no Colorado nem tempo hábil para o ciclo completo do vírus no inseto, a coincidência do início da manifestação dos sintomas na mulher com o período de incubação do zika (cerca de dez dias), o fato de o casal ter feito sexo logo após a chegada do pesquisador da África e de nenhum dos quatro filhos ter se contaminado (pensando em uma eventual transmissão por fluidos orais) fizeram o cientista suspeitar de transmissão sexual. O trabalho foi publicado no periódico Emerging Infectious Diseases em maio de 2011 e divulgado pelo Daily Mail e pela revista Science. O vírus foi identificado pela primeira vez em um macaco rhesus na Floresta de Zika, em Uganda, em 1947. Em 1993, pesquisadores do Instituto Pasteur reportaram sua ocorrência no Senegal (onde o cientista se infectou). Só 14 casos haviam sido descritos até 2007, quando um surto que atingiu até 73% da população foi identificado na ilha de Yap, na Micronésia. O sexo deve ter tido um papel pequeno nos casos em Yap, mas o fato de a maior parte dos infectados ter entre 30 e 59 anos (população sexualmente ativa) e da incidência nas mulheres ter sido 50% maior do que em homens (sexo vaginal traz risco mais elevado para as mulheres em doenças transmitidas pelo sexo) sugerem uma possível participação da transmissão sexual, de acordo com próprio Foy, em seu artigo.
No Brasil. Na última semana, a pesquisa do líquido amniótico de duas mulheres grávidas na Paraíba, que tinham recebido diagnóstico de microcefalia em seus fetos, revelaram a presença do zika vírus, que passou a ser, então, o principal suspeito do aumento abrupto de registros do problema.
Foram quase 400 casos nos últimos três meses. Pernambuco é o Estado com maior número de registros, 268. Também foram notificados casos de microcefalia em Sergipe, Paraíba, Rio Grande do Norte, Piauí, Bahia e Ceará.
No início do ano, houve uma epidemia de zika no Nordeste, transmitido pelo mesmo mosquito que é o vetor da dengue, o Aedes aegypti. A suspeita inicial dos casos de microcefalia recaiu sobre o vírus porque 80% das mães relataram sintomas como febre, coceira e manchas pelo corpo, clássicos da doença, no início da gestação. O zika já foi identificado em 14 Estados, incluindo Rio e São Paulo. Com a chegada do verão, é esperado um aumento da população de mosquitos e, possivelmente, uma maior circulação do vírus.
Segundo o Ministério da Saúde, não há relato anterior que ligue o zika à microcefalia. Novos estudos e testagens serão necessários. De qualquer forma, mesmo que seja uma situação inédita, ela pode não ter sido notada antes, ou ainda, uma pequena mutação genética no vírus, algum fator ambiental e até mesmo a associação com alguma outra infecção podem ter mudado a agressividade do zika, a ponto de ele poder ser transmitido verticalmente (de mãe para filho) e de causar alterações no desenvolvimento do cérebro das crianças infectadas.
JAIRO BOUER É PSIQUIATRA