Jogos e palavras cruzadas ajudam a prevenir a demência? Resposta é um verdadeiro quebra-cabeça


Cientistas contam que a relação entre jogos de treinamento cerebral e o aprimoramento de nossas capacidades cognitivas ainda é complexa

Por Dana G. Smith e Katie Mogg

Em princípio, faz sentido: você exercita os músculos para deixá-los mais fortes e evitar a fragilidade e o declínio. O cérebro não deveria funcionar do mesmo jeito?

Essa premissa lançou vários sites e aplicativos de treinamento cerebral e, provavelmente, contribuiu para a venda de inúmeros livros de Sudoku, palavras cruzadas e quebra-cabeças lógicos nas últimas duas décadas. E também inspirou vários pesquisadores acadêmicos a explorar se o treinamento cognitivo realmente pode deixar as pessoas mais inteligentes e até mesmo reduzir o risco de demência.

Mas, como sempre acontece na ciência, uma ideia aparentemente simples se revela mais complicada do que parece. Porque a resposta à pergunta “treinar o cérebro dá resultado?” depende do tipo de exercício que você está fazendo e dos benefícios que está buscando.

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Atividades mentalmente desafiadoras, como montar um quebra-cabeça, tendem a ser positivas para o cérebro. Mas a ciência ainda não sabe a magnitude do efeito.  Foto: Prostock-studio/Adobe Stock

Quando os psicólogos fazem pesquisas sobre a possibilidade de melhorar a cognição, eles usam principalmente jogos de computador desenvolvidos para aprimorar um aspecto específico de como pensamos. Alguns jogos de treinamento cerebral ensinam às pessoas estratégias para aprimorar uma habilidade ou reconhecer padrões. Outros aumentam gradualmente a velocidade e o grau de dificuldade, conta Lesley Ross, professora de psicologia da Clemson University.

Muitos estudos demonstraram que investir nesses jogos pode melhorar as habilidades cognitivas das pessoas – não apenas na tarefa específica em que estão trabalhando, mas também em tarefas relacionadas. Isso “não é muito surpreendente”, avalia Adrian Owen, professor de neurociência cognitiva e imagem na Western University, em Ontário, Canadá, assim como alguém que pratica a memorização de números de telefone provavelmente melhora a memorização de datas.

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As evidências de que jogar um tipo de jogo deixará você mais inteligente em geral ou ajudará você a melhorar em um tipo de tarefa completamente diferente são menos convincentes.

“O treinamento do cérebro funciona no sentido de que, se você quiser aprender a tocar violino”, ficará melhor se praticar violino, compara Owen. Mas, se você aprender a tocar violino, “ficará melhor no trompete? Bem, a resposta óbvia é não”.

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Algumas empresas de treinamento cerebral afirmam que seus jogos também podem ajudar a evitar o declínio cognitivo, mas as pesquisas que investigam essa conexão são escassas. Um dos poucos estudos que analisou essa questão constatou que idosos saudáveis que jogavam um jogo desenvolvido para melhorar a velocidade de processamento tiveram um risco 29% menor de demência uma década depois. As pessoas que jogavam dois outros jogos – uma tarefa de memória ou uma tarefa de resolução de problemas – também tiveram um risco menor, embora o benefício não tenha sido tão significativo em comparação com as pessoas que não jogaram nenhum jogo.

Os especialistas disseram que esse estudo sugere que os jogos de treinamento cerebral são promissores, mas é preciso fazer mais testes clínicos.

Há mais pesquisas sobre como os hobbies e comportamentos cotidianos – como fazer palavras cruzadas, jogar jogos de tabuleiro, ler livros ou jornais ou aprender outro idioma – podem proteger contra o declínio cognitivo.

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Vários estudos sugerem que, quanto maior a frequência com que as pessoas se envolvem em atividades cognitivamente estimulantes, menor é o risco de comprometimento cognitivo ou de diagnóstico de demência mais tarde. Por exemplo, um estudo descobriu que, entre os adultos que desenvolveram demência, aqueles que faziam palavras cruzadas regularmente atrasaram o início do declínio da memória em mais de dois anos em comparação com aqueles que não faziam.

Se algo for mentalmente desafiador, “é provável que seja muito bom para o cérebro”, diz Lesley. No entanto, ela acrescenta que esses estudos de atividades cotidianas não são ensaios clínicos randomizados – padrão ouro da ciência e da medicina – que forneceriam uma ligação definitiva entre hobbies cognitivamente estimulantes e um menor risco de demência. Em outras palavras, as evidências atuais mostram apenas uma associação, não uma causalidade direta.

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Quando indagados sobre por que qualquer uma dessas atividades – seja palavras cruzadas ou um jogo especialmente projetado para esse fim – pode ajudar o cérebro, os especialistas mencionaram a teoria da “reserva cognitiva”. A ideia é que quanto mais “músculos mentais” uma pessoa tiver acumulado, mais resistente ela será à demência, explica Joe Verghese, presidente do departamento de neurologia da Escola de Medicina da Stony Brook University.

Essas atividades provavelmente não evitarão os danos cerebrais que levam à demência. Mas, se alguém desenvolver a doença de Alzheimer, a reserva cognitiva “pode mascarar o efeito e retardar o início dos sintomas por alguns anos”, acredita Verghese.

O apoio a essa teoria vem de pesquisas que demonstram que pessoas com mais escolaridade têm um risco menor de desenvolver demência, informa Samuel Gandy, diretor associado do Centro de Pesquisa sobre a Doença de Alzheimer do Hospital Monte Sinai, na cidade de Nova York. Outros estudos mostraram o mesmo para pessoas com empregos cognitivamente desafiadores. É possível que hobbies mentalmente estimulantes possam ter um efeito semelhante.

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Entretanto, não há como medir diretamente a reserva cognitiva, avalia Owen. Como resultado, é difícil dizer se os jogos de treinamento cerebral também podem aprimorá-la.

Em vez disso, alguns pesquisadores apontam para evidências de que os jogos podem aumentar e fortalecer as conexões entre os neurônios, chamadas sinapses. Pode ser que “ao ter mais sinapses, você possa perder algumas e não perceber”, esclarece Gandy.

De modo geral, os especialistas concordaram que, assim como os exercícios físicos ou a manutenção da atividade social, as atividades cognitivamente estimulantes podem ajudar a proteger contra o declínio cognitivo e praticamente não apresentam desvantagens.

Quando se trata de jogos de treinamento cerebral, suas opiniões foram mais variadas e, em grande parte, se resumiram a se o custo da assinatura de um site de treinamento cerebral valia a pena. Verghese diz que os jogos proporcionam “estimulação cognitiva de forma sistemática”, o que os torna uma despesa que vale a pena para quem pode pagar.

Owen rebate dizendo que as pessoas deveriam economizar esse dinheiro, já que muitas das alegações dos sites de treinamento cerebral sobre melhorar a cognição ou evitar a demência “simplesmente não são cientificamente defensáveis”. Talvez Gandy tenha resumido melhor o debate: “Acho que não faz mal, mas não posso prometer que vai ajudar”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

Em princípio, faz sentido: você exercita os músculos para deixá-los mais fortes e evitar a fragilidade e o declínio. O cérebro não deveria funcionar do mesmo jeito?

Essa premissa lançou vários sites e aplicativos de treinamento cerebral e, provavelmente, contribuiu para a venda de inúmeros livros de Sudoku, palavras cruzadas e quebra-cabeças lógicos nas últimas duas décadas. E também inspirou vários pesquisadores acadêmicos a explorar se o treinamento cognitivo realmente pode deixar as pessoas mais inteligentes e até mesmo reduzir o risco de demência.

Mas, como sempre acontece na ciência, uma ideia aparentemente simples se revela mais complicada do que parece. Porque a resposta à pergunta “treinar o cérebro dá resultado?” depende do tipo de exercício que você está fazendo e dos benefícios que está buscando.

Atividades mentalmente desafiadoras, como montar um quebra-cabeça, tendem a ser positivas para o cérebro. Mas a ciência ainda não sabe a magnitude do efeito.  Foto: Prostock-studio/Adobe Stock

Quando os psicólogos fazem pesquisas sobre a possibilidade de melhorar a cognição, eles usam principalmente jogos de computador desenvolvidos para aprimorar um aspecto específico de como pensamos. Alguns jogos de treinamento cerebral ensinam às pessoas estratégias para aprimorar uma habilidade ou reconhecer padrões. Outros aumentam gradualmente a velocidade e o grau de dificuldade, conta Lesley Ross, professora de psicologia da Clemson University.

Muitos estudos demonstraram que investir nesses jogos pode melhorar as habilidades cognitivas das pessoas – não apenas na tarefa específica em que estão trabalhando, mas também em tarefas relacionadas. Isso “não é muito surpreendente”, avalia Adrian Owen, professor de neurociência cognitiva e imagem na Western University, em Ontário, Canadá, assim como alguém que pratica a memorização de números de telefone provavelmente melhora a memorização de datas.

As evidências de que jogar um tipo de jogo deixará você mais inteligente em geral ou ajudará você a melhorar em um tipo de tarefa completamente diferente são menos convincentes.

“O treinamento do cérebro funciona no sentido de que, se você quiser aprender a tocar violino”, ficará melhor se praticar violino, compara Owen. Mas, se você aprender a tocar violino, “ficará melhor no trompete? Bem, a resposta óbvia é não”.

Algumas empresas de treinamento cerebral afirmam que seus jogos também podem ajudar a evitar o declínio cognitivo, mas as pesquisas que investigam essa conexão são escassas. Um dos poucos estudos que analisou essa questão constatou que idosos saudáveis que jogavam um jogo desenvolvido para melhorar a velocidade de processamento tiveram um risco 29% menor de demência uma década depois. As pessoas que jogavam dois outros jogos – uma tarefa de memória ou uma tarefa de resolução de problemas – também tiveram um risco menor, embora o benefício não tenha sido tão significativo em comparação com as pessoas que não jogaram nenhum jogo.

Os especialistas disseram que esse estudo sugere que os jogos de treinamento cerebral são promissores, mas é preciso fazer mais testes clínicos.

Há mais pesquisas sobre como os hobbies e comportamentos cotidianos – como fazer palavras cruzadas, jogar jogos de tabuleiro, ler livros ou jornais ou aprender outro idioma – podem proteger contra o declínio cognitivo.

Vários estudos sugerem que, quanto maior a frequência com que as pessoas se envolvem em atividades cognitivamente estimulantes, menor é o risco de comprometimento cognitivo ou de diagnóstico de demência mais tarde. Por exemplo, um estudo descobriu que, entre os adultos que desenvolveram demência, aqueles que faziam palavras cruzadas regularmente atrasaram o início do declínio da memória em mais de dois anos em comparação com aqueles que não faziam.

Se algo for mentalmente desafiador, “é provável que seja muito bom para o cérebro”, diz Lesley. No entanto, ela acrescenta que esses estudos de atividades cotidianas não são ensaios clínicos randomizados – padrão ouro da ciência e da medicina – que forneceriam uma ligação definitiva entre hobbies cognitivamente estimulantes e um menor risco de demência. Em outras palavras, as evidências atuais mostram apenas uma associação, não uma causalidade direta.

Quando indagados sobre por que qualquer uma dessas atividades – seja palavras cruzadas ou um jogo especialmente projetado para esse fim – pode ajudar o cérebro, os especialistas mencionaram a teoria da “reserva cognitiva”. A ideia é que quanto mais “músculos mentais” uma pessoa tiver acumulado, mais resistente ela será à demência, explica Joe Verghese, presidente do departamento de neurologia da Escola de Medicina da Stony Brook University.

Essas atividades provavelmente não evitarão os danos cerebrais que levam à demência. Mas, se alguém desenvolver a doença de Alzheimer, a reserva cognitiva “pode mascarar o efeito e retardar o início dos sintomas por alguns anos”, acredita Verghese.

O apoio a essa teoria vem de pesquisas que demonstram que pessoas com mais escolaridade têm um risco menor de desenvolver demência, informa Samuel Gandy, diretor associado do Centro de Pesquisa sobre a Doença de Alzheimer do Hospital Monte Sinai, na cidade de Nova York. Outros estudos mostraram o mesmo para pessoas com empregos cognitivamente desafiadores. É possível que hobbies mentalmente estimulantes possam ter um efeito semelhante.

Entretanto, não há como medir diretamente a reserva cognitiva, avalia Owen. Como resultado, é difícil dizer se os jogos de treinamento cerebral também podem aprimorá-la.

Em vez disso, alguns pesquisadores apontam para evidências de que os jogos podem aumentar e fortalecer as conexões entre os neurônios, chamadas sinapses. Pode ser que “ao ter mais sinapses, você possa perder algumas e não perceber”, esclarece Gandy.

De modo geral, os especialistas concordaram que, assim como os exercícios físicos ou a manutenção da atividade social, as atividades cognitivamente estimulantes podem ajudar a proteger contra o declínio cognitivo e praticamente não apresentam desvantagens.

Quando se trata de jogos de treinamento cerebral, suas opiniões foram mais variadas e, em grande parte, se resumiram a se o custo da assinatura de um site de treinamento cerebral valia a pena. Verghese diz que os jogos proporcionam “estimulação cognitiva de forma sistemática”, o que os torna uma despesa que vale a pena para quem pode pagar.

Owen rebate dizendo que as pessoas deveriam economizar esse dinheiro, já que muitas das alegações dos sites de treinamento cerebral sobre melhorar a cognição ou evitar a demência “simplesmente não são cientificamente defensáveis”. Talvez Gandy tenha resumido melhor o debate: “Acho que não faz mal, mas não posso prometer que vai ajudar”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

Em princípio, faz sentido: você exercita os músculos para deixá-los mais fortes e evitar a fragilidade e o declínio. O cérebro não deveria funcionar do mesmo jeito?

Essa premissa lançou vários sites e aplicativos de treinamento cerebral e, provavelmente, contribuiu para a venda de inúmeros livros de Sudoku, palavras cruzadas e quebra-cabeças lógicos nas últimas duas décadas. E também inspirou vários pesquisadores acadêmicos a explorar se o treinamento cognitivo realmente pode deixar as pessoas mais inteligentes e até mesmo reduzir o risco de demência.

Mas, como sempre acontece na ciência, uma ideia aparentemente simples se revela mais complicada do que parece. Porque a resposta à pergunta “treinar o cérebro dá resultado?” depende do tipo de exercício que você está fazendo e dos benefícios que está buscando.

Atividades mentalmente desafiadoras, como montar um quebra-cabeça, tendem a ser positivas para o cérebro. Mas a ciência ainda não sabe a magnitude do efeito.  Foto: Prostock-studio/Adobe Stock

Quando os psicólogos fazem pesquisas sobre a possibilidade de melhorar a cognição, eles usam principalmente jogos de computador desenvolvidos para aprimorar um aspecto específico de como pensamos. Alguns jogos de treinamento cerebral ensinam às pessoas estratégias para aprimorar uma habilidade ou reconhecer padrões. Outros aumentam gradualmente a velocidade e o grau de dificuldade, conta Lesley Ross, professora de psicologia da Clemson University.

Muitos estudos demonstraram que investir nesses jogos pode melhorar as habilidades cognitivas das pessoas – não apenas na tarefa específica em que estão trabalhando, mas também em tarefas relacionadas. Isso “não é muito surpreendente”, avalia Adrian Owen, professor de neurociência cognitiva e imagem na Western University, em Ontário, Canadá, assim como alguém que pratica a memorização de números de telefone provavelmente melhora a memorização de datas.

As evidências de que jogar um tipo de jogo deixará você mais inteligente em geral ou ajudará você a melhorar em um tipo de tarefa completamente diferente são menos convincentes.

“O treinamento do cérebro funciona no sentido de que, se você quiser aprender a tocar violino”, ficará melhor se praticar violino, compara Owen. Mas, se você aprender a tocar violino, “ficará melhor no trompete? Bem, a resposta óbvia é não”.

Algumas empresas de treinamento cerebral afirmam que seus jogos também podem ajudar a evitar o declínio cognitivo, mas as pesquisas que investigam essa conexão são escassas. Um dos poucos estudos que analisou essa questão constatou que idosos saudáveis que jogavam um jogo desenvolvido para melhorar a velocidade de processamento tiveram um risco 29% menor de demência uma década depois. As pessoas que jogavam dois outros jogos – uma tarefa de memória ou uma tarefa de resolução de problemas – também tiveram um risco menor, embora o benefício não tenha sido tão significativo em comparação com as pessoas que não jogaram nenhum jogo.

Os especialistas disseram que esse estudo sugere que os jogos de treinamento cerebral são promissores, mas é preciso fazer mais testes clínicos.

Há mais pesquisas sobre como os hobbies e comportamentos cotidianos – como fazer palavras cruzadas, jogar jogos de tabuleiro, ler livros ou jornais ou aprender outro idioma – podem proteger contra o declínio cognitivo.

Vários estudos sugerem que, quanto maior a frequência com que as pessoas se envolvem em atividades cognitivamente estimulantes, menor é o risco de comprometimento cognitivo ou de diagnóstico de demência mais tarde. Por exemplo, um estudo descobriu que, entre os adultos que desenvolveram demência, aqueles que faziam palavras cruzadas regularmente atrasaram o início do declínio da memória em mais de dois anos em comparação com aqueles que não faziam.

Se algo for mentalmente desafiador, “é provável que seja muito bom para o cérebro”, diz Lesley. No entanto, ela acrescenta que esses estudos de atividades cotidianas não são ensaios clínicos randomizados – padrão ouro da ciência e da medicina – que forneceriam uma ligação definitiva entre hobbies cognitivamente estimulantes e um menor risco de demência. Em outras palavras, as evidências atuais mostram apenas uma associação, não uma causalidade direta.

Quando indagados sobre por que qualquer uma dessas atividades – seja palavras cruzadas ou um jogo especialmente projetado para esse fim – pode ajudar o cérebro, os especialistas mencionaram a teoria da “reserva cognitiva”. A ideia é que quanto mais “músculos mentais” uma pessoa tiver acumulado, mais resistente ela será à demência, explica Joe Verghese, presidente do departamento de neurologia da Escola de Medicina da Stony Brook University.

Essas atividades provavelmente não evitarão os danos cerebrais que levam à demência. Mas, se alguém desenvolver a doença de Alzheimer, a reserva cognitiva “pode mascarar o efeito e retardar o início dos sintomas por alguns anos”, acredita Verghese.

O apoio a essa teoria vem de pesquisas que demonstram que pessoas com mais escolaridade têm um risco menor de desenvolver demência, informa Samuel Gandy, diretor associado do Centro de Pesquisa sobre a Doença de Alzheimer do Hospital Monte Sinai, na cidade de Nova York. Outros estudos mostraram o mesmo para pessoas com empregos cognitivamente desafiadores. É possível que hobbies mentalmente estimulantes possam ter um efeito semelhante.

Entretanto, não há como medir diretamente a reserva cognitiva, avalia Owen. Como resultado, é difícil dizer se os jogos de treinamento cerebral também podem aprimorá-la.

Em vez disso, alguns pesquisadores apontam para evidências de que os jogos podem aumentar e fortalecer as conexões entre os neurônios, chamadas sinapses. Pode ser que “ao ter mais sinapses, você possa perder algumas e não perceber”, esclarece Gandy.

De modo geral, os especialistas concordaram que, assim como os exercícios físicos ou a manutenção da atividade social, as atividades cognitivamente estimulantes podem ajudar a proteger contra o declínio cognitivo e praticamente não apresentam desvantagens.

Quando se trata de jogos de treinamento cerebral, suas opiniões foram mais variadas e, em grande parte, se resumiram a se o custo da assinatura de um site de treinamento cerebral valia a pena. Verghese diz que os jogos proporcionam “estimulação cognitiva de forma sistemática”, o que os torna uma despesa que vale a pena para quem pode pagar.

Owen rebate dizendo que as pessoas deveriam economizar esse dinheiro, já que muitas das alegações dos sites de treinamento cerebral sobre melhorar a cognição ou evitar a demência “simplesmente não são cientificamente defensáveis”. Talvez Gandy tenha resumido melhor o debate: “Acho que não faz mal, mas não posso prometer que vai ajudar”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

Em princípio, faz sentido: você exercita os músculos para deixá-los mais fortes e evitar a fragilidade e o declínio. O cérebro não deveria funcionar do mesmo jeito?

Essa premissa lançou vários sites e aplicativos de treinamento cerebral e, provavelmente, contribuiu para a venda de inúmeros livros de Sudoku, palavras cruzadas e quebra-cabeças lógicos nas últimas duas décadas. E também inspirou vários pesquisadores acadêmicos a explorar se o treinamento cognitivo realmente pode deixar as pessoas mais inteligentes e até mesmo reduzir o risco de demência.

Mas, como sempre acontece na ciência, uma ideia aparentemente simples se revela mais complicada do que parece. Porque a resposta à pergunta “treinar o cérebro dá resultado?” depende do tipo de exercício que você está fazendo e dos benefícios que está buscando.

Atividades mentalmente desafiadoras, como montar um quebra-cabeça, tendem a ser positivas para o cérebro. Mas a ciência ainda não sabe a magnitude do efeito.  Foto: Prostock-studio/Adobe Stock

Quando os psicólogos fazem pesquisas sobre a possibilidade de melhorar a cognição, eles usam principalmente jogos de computador desenvolvidos para aprimorar um aspecto específico de como pensamos. Alguns jogos de treinamento cerebral ensinam às pessoas estratégias para aprimorar uma habilidade ou reconhecer padrões. Outros aumentam gradualmente a velocidade e o grau de dificuldade, conta Lesley Ross, professora de psicologia da Clemson University.

Muitos estudos demonstraram que investir nesses jogos pode melhorar as habilidades cognitivas das pessoas – não apenas na tarefa específica em que estão trabalhando, mas também em tarefas relacionadas. Isso “não é muito surpreendente”, avalia Adrian Owen, professor de neurociência cognitiva e imagem na Western University, em Ontário, Canadá, assim como alguém que pratica a memorização de números de telefone provavelmente melhora a memorização de datas.

As evidências de que jogar um tipo de jogo deixará você mais inteligente em geral ou ajudará você a melhorar em um tipo de tarefa completamente diferente são menos convincentes.

“O treinamento do cérebro funciona no sentido de que, se você quiser aprender a tocar violino”, ficará melhor se praticar violino, compara Owen. Mas, se você aprender a tocar violino, “ficará melhor no trompete? Bem, a resposta óbvia é não”.

Algumas empresas de treinamento cerebral afirmam que seus jogos também podem ajudar a evitar o declínio cognitivo, mas as pesquisas que investigam essa conexão são escassas. Um dos poucos estudos que analisou essa questão constatou que idosos saudáveis que jogavam um jogo desenvolvido para melhorar a velocidade de processamento tiveram um risco 29% menor de demência uma década depois. As pessoas que jogavam dois outros jogos – uma tarefa de memória ou uma tarefa de resolução de problemas – também tiveram um risco menor, embora o benefício não tenha sido tão significativo em comparação com as pessoas que não jogaram nenhum jogo.

Os especialistas disseram que esse estudo sugere que os jogos de treinamento cerebral são promissores, mas é preciso fazer mais testes clínicos.

Há mais pesquisas sobre como os hobbies e comportamentos cotidianos – como fazer palavras cruzadas, jogar jogos de tabuleiro, ler livros ou jornais ou aprender outro idioma – podem proteger contra o declínio cognitivo.

Vários estudos sugerem que, quanto maior a frequência com que as pessoas se envolvem em atividades cognitivamente estimulantes, menor é o risco de comprometimento cognitivo ou de diagnóstico de demência mais tarde. Por exemplo, um estudo descobriu que, entre os adultos que desenvolveram demência, aqueles que faziam palavras cruzadas regularmente atrasaram o início do declínio da memória em mais de dois anos em comparação com aqueles que não faziam.

Se algo for mentalmente desafiador, “é provável que seja muito bom para o cérebro”, diz Lesley. No entanto, ela acrescenta que esses estudos de atividades cotidianas não são ensaios clínicos randomizados – padrão ouro da ciência e da medicina – que forneceriam uma ligação definitiva entre hobbies cognitivamente estimulantes e um menor risco de demência. Em outras palavras, as evidências atuais mostram apenas uma associação, não uma causalidade direta.

Quando indagados sobre por que qualquer uma dessas atividades – seja palavras cruzadas ou um jogo especialmente projetado para esse fim – pode ajudar o cérebro, os especialistas mencionaram a teoria da “reserva cognitiva”. A ideia é que quanto mais “músculos mentais” uma pessoa tiver acumulado, mais resistente ela será à demência, explica Joe Verghese, presidente do departamento de neurologia da Escola de Medicina da Stony Brook University.

Essas atividades provavelmente não evitarão os danos cerebrais que levam à demência. Mas, se alguém desenvolver a doença de Alzheimer, a reserva cognitiva “pode mascarar o efeito e retardar o início dos sintomas por alguns anos”, acredita Verghese.

O apoio a essa teoria vem de pesquisas que demonstram que pessoas com mais escolaridade têm um risco menor de desenvolver demência, informa Samuel Gandy, diretor associado do Centro de Pesquisa sobre a Doença de Alzheimer do Hospital Monte Sinai, na cidade de Nova York. Outros estudos mostraram o mesmo para pessoas com empregos cognitivamente desafiadores. É possível que hobbies mentalmente estimulantes possam ter um efeito semelhante.

Entretanto, não há como medir diretamente a reserva cognitiva, avalia Owen. Como resultado, é difícil dizer se os jogos de treinamento cerebral também podem aprimorá-la.

Em vez disso, alguns pesquisadores apontam para evidências de que os jogos podem aumentar e fortalecer as conexões entre os neurônios, chamadas sinapses. Pode ser que “ao ter mais sinapses, você possa perder algumas e não perceber”, esclarece Gandy.

De modo geral, os especialistas concordaram que, assim como os exercícios físicos ou a manutenção da atividade social, as atividades cognitivamente estimulantes podem ajudar a proteger contra o declínio cognitivo e praticamente não apresentam desvantagens.

Quando se trata de jogos de treinamento cerebral, suas opiniões foram mais variadas e, em grande parte, se resumiram a se o custo da assinatura de um site de treinamento cerebral valia a pena. Verghese diz que os jogos proporcionam “estimulação cognitiva de forma sistemática”, o que os torna uma despesa que vale a pena para quem pode pagar.

Owen rebate dizendo que as pessoas deveriam economizar esse dinheiro, já que muitas das alegações dos sites de treinamento cerebral sobre melhorar a cognição ou evitar a demência “simplesmente não são cientificamente defensáveis”. Talvez Gandy tenha resumido melhor o debate: “Acho que não faz mal, mas não posso prometer que vai ajudar”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

Em princípio, faz sentido: você exercita os músculos para deixá-los mais fortes e evitar a fragilidade e o declínio. O cérebro não deveria funcionar do mesmo jeito?

Essa premissa lançou vários sites e aplicativos de treinamento cerebral e, provavelmente, contribuiu para a venda de inúmeros livros de Sudoku, palavras cruzadas e quebra-cabeças lógicos nas últimas duas décadas. E também inspirou vários pesquisadores acadêmicos a explorar se o treinamento cognitivo realmente pode deixar as pessoas mais inteligentes e até mesmo reduzir o risco de demência.

Mas, como sempre acontece na ciência, uma ideia aparentemente simples se revela mais complicada do que parece. Porque a resposta à pergunta “treinar o cérebro dá resultado?” depende do tipo de exercício que você está fazendo e dos benefícios que está buscando.

Atividades mentalmente desafiadoras, como montar um quebra-cabeça, tendem a ser positivas para o cérebro. Mas a ciência ainda não sabe a magnitude do efeito.  Foto: Prostock-studio/Adobe Stock

Quando os psicólogos fazem pesquisas sobre a possibilidade de melhorar a cognição, eles usam principalmente jogos de computador desenvolvidos para aprimorar um aspecto específico de como pensamos. Alguns jogos de treinamento cerebral ensinam às pessoas estratégias para aprimorar uma habilidade ou reconhecer padrões. Outros aumentam gradualmente a velocidade e o grau de dificuldade, conta Lesley Ross, professora de psicologia da Clemson University.

Muitos estudos demonstraram que investir nesses jogos pode melhorar as habilidades cognitivas das pessoas – não apenas na tarefa específica em que estão trabalhando, mas também em tarefas relacionadas. Isso “não é muito surpreendente”, avalia Adrian Owen, professor de neurociência cognitiva e imagem na Western University, em Ontário, Canadá, assim como alguém que pratica a memorização de números de telefone provavelmente melhora a memorização de datas.

As evidências de que jogar um tipo de jogo deixará você mais inteligente em geral ou ajudará você a melhorar em um tipo de tarefa completamente diferente são menos convincentes.

“O treinamento do cérebro funciona no sentido de que, se você quiser aprender a tocar violino”, ficará melhor se praticar violino, compara Owen. Mas, se você aprender a tocar violino, “ficará melhor no trompete? Bem, a resposta óbvia é não”.

Algumas empresas de treinamento cerebral afirmam que seus jogos também podem ajudar a evitar o declínio cognitivo, mas as pesquisas que investigam essa conexão são escassas. Um dos poucos estudos que analisou essa questão constatou que idosos saudáveis que jogavam um jogo desenvolvido para melhorar a velocidade de processamento tiveram um risco 29% menor de demência uma década depois. As pessoas que jogavam dois outros jogos – uma tarefa de memória ou uma tarefa de resolução de problemas – também tiveram um risco menor, embora o benefício não tenha sido tão significativo em comparação com as pessoas que não jogaram nenhum jogo.

Os especialistas disseram que esse estudo sugere que os jogos de treinamento cerebral são promissores, mas é preciso fazer mais testes clínicos.

Há mais pesquisas sobre como os hobbies e comportamentos cotidianos – como fazer palavras cruzadas, jogar jogos de tabuleiro, ler livros ou jornais ou aprender outro idioma – podem proteger contra o declínio cognitivo.

Vários estudos sugerem que, quanto maior a frequência com que as pessoas se envolvem em atividades cognitivamente estimulantes, menor é o risco de comprometimento cognitivo ou de diagnóstico de demência mais tarde. Por exemplo, um estudo descobriu que, entre os adultos que desenvolveram demência, aqueles que faziam palavras cruzadas regularmente atrasaram o início do declínio da memória em mais de dois anos em comparação com aqueles que não faziam.

Se algo for mentalmente desafiador, “é provável que seja muito bom para o cérebro”, diz Lesley. No entanto, ela acrescenta que esses estudos de atividades cotidianas não são ensaios clínicos randomizados – padrão ouro da ciência e da medicina – que forneceriam uma ligação definitiva entre hobbies cognitivamente estimulantes e um menor risco de demência. Em outras palavras, as evidências atuais mostram apenas uma associação, não uma causalidade direta.

Quando indagados sobre por que qualquer uma dessas atividades – seja palavras cruzadas ou um jogo especialmente projetado para esse fim – pode ajudar o cérebro, os especialistas mencionaram a teoria da “reserva cognitiva”. A ideia é que quanto mais “músculos mentais” uma pessoa tiver acumulado, mais resistente ela será à demência, explica Joe Verghese, presidente do departamento de neurologia da Escola de Medicina da Stony Brook University.

Essas atividades provavelmente não evitarão os danos cerebrais que levam à demência. Mas, se alguém desenvolver a doença de Alzheimer, a reserva cognitiva “pode mascarar o efeito e retardar o início dos sintomas por alguns anos”, acredita Verghese.

O apoio a essa teoria vem de pesquisas que demonstram que pessoas com mais escolaridade têm um risco menor de desenvolver demência, informa Samuel Gandy, diretor associado do Centro de Pesquisa sobre a Doença de Alzheimer do Hospital Monte Sinai, na cidade de Nova York. Outros estudos mostraram o mesmo para pessoas com empregos cognitivamente desafiadores. É possível que hobbies mentalmente estimulantes possam ter um efeito semelhante.

Entretanto, não há como medir diretamente a reserva cognitiva, avalia Owen. Como resultado, é difícil dizer se os jogos de treinamento cerebral também podem aprimorá-la.

Em vez disso, alguns pesquisadores apontam para evidências de que os jogos podem aumentar e fortalecer as conexões entre os neurônios, chamadas sinapses. Pode ser que “ao ter mais sinapses, você possa perder algumas e não perceber”, esclarece Gandy.

De modo geral, os especialistas concordaram que, assim como os exercícios físicos ou a manutenção da atividade social, as atividades cognitivamente estimulantes podem ajudar a proteger contra o declínio cognitivo e praticamente não apresentam desvantagens.

Quando se trata de jogos de treinamento cerebral, suas opiniões foram mais variadas e, em grande parte, se resumiram a se o custo da assinatura de um site de treinamento cerebral valia a pena. Verghese diz que os jogos proporcionam “estimulação cognitiva de forma sistemática”, o que os torna uma despesa que vale a pena para quem pode pagar.

Owen rebate dizendo que as pessoas deveriam economizar esse dinheiro, já que muitas das alegações dos sites de treinamento cerebral sobre melhorar a cognição ou evitar a demência “simplesmente não são cientificamente defensáveis”. Talvez Gandy tenha resumido melhor o debate: “Acho que não faz mal, mas não posso prometer que vai ajudar”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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