O Ministério Público Federal (MPF) deu cinco dias para o Conselho Federal de Medicina (CFM) demonstrar os fundamentos técnicos e legais usados para elaborar a nova resolução do órgão que proíbe os médicos de realizarem um procedimento médico que precede o aborto nos casos de gestações com mais de 22 semanas provenientes de estupro.
A norma determina que, a partir dessa idade gestacional, os profissionais ficam impedidos de fazer a chamada assistolia fetal, que consiste na injeção de uma substância que provoca a morte do feto para que depois ele seja retirado do útero da mulher. O procedimento é respaldado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) a partir de 20 semanas de gestação.
Em comunicado publicado nesta quinta-feira, 4, o MPF justificou que, ao proibir esse procedimento, o CFM aumenta as chances da ocorrência de um parto prematuro, o que “pode ser prejudicial e causar transtornos severos tanto para a mulher quanto para o bebê”.
Ainda segundo o MPF, na prática, a resolução inviabiliza a realização do aborto em casos autorizados pela lei. De acordo com o órgão, a lei brasileira não fixa nenhum prazo de gravidez para que as mulheres solicitem o aborto nos casos em que ele é legal. “O direito ao aborto é garantido legalmente em qualquer estágio da gestação quando ela é resultante de violência sexual, assim como nos casos de anencefalia fetal e risco à vida da mulher”, explica.
Apesar disso, em nota que expõe o motivo da resolução, o CFM argumenta que “havendo viabilidade fetal, deve ser assegurada a tecnologia médica disponível para tentar”.
Além do MPF, outras entidades se manifestaram contrariamente à resolução. A Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), por exemplo, emitiu uma nota oficial nesta sexta-feira, 5, solicitando a revogação da resolução, que, segundo a instituição, “estabelece restrições ilegais ao acesso ao aborto”, “amplia vulnerabilidade já existentes e expõe justamente as mulheres mais carentes e necessitadas do apoio e assistência médica”.
Rosires Pereira, presidente da Comissão Nacional Especializada de Violência Sexual e Interrupção da Gestadção Prevista em Lei da Febrasgo, disse ao Estadão nesta quinta-feira, 4, que a nova resolução dificulta o atendimento de meninas de 10, 11 e 12 anos que engravidaram após serem vítimas de estupro e que por diversas razões demoraram para conseguir o atendimento médico necessário.
O CFM foi procurado na tarde desta sexta-feira, 5, para comentar o pedido de esclarecimentos do MPF e as críticas feitas pela Procuradoria à norma, e afirmou que recebeu o ofício do MPF na tarde desta quinta e que encaminhará os esclarecimentos solicitados à Procuradoria “dentro dos prazos definidos”.