Enquanto o abuso de gorduras saturadas – presentes em carnes, manteiga, queijos e muitos ultraprocessados – eleva o colesterol ruim (LDL), priorizar as versões insaturadas do nutriente pode ajudar a reduzir as taxas, beneficiando a saúde do coração. Entre as fontes de gorduras do tipo monoinsaturadas está o abacate, fruta que disparou em popularidade nos últimos tempos. E, agora, há quem espere obter vantagens ao consumi-lo em forma de óleo.
O óleo de abacate de fato pode ser uma opção saudável no cardápio – e quiçá um concorrente à altura do azeite de oliva extravirgem, famoso por suas benesses. Embora ainda existam ressalvas, como o preço elevado e a necessidade de mais estudos sobre seus componentes, o produto merece ser explorado. Descubra mais sobre suas vantagens e por que ele tem chamado a atenção.
O que é o óleo de abacate?
“É um óleo comestível, extraído da polpa do abacate, rico em gorduras monoinsaturadas e comercializado em garrafas de vidro; bem similar ao azeite de oliva, pode inclusive ser seu substituto”, resume Thamires Lima, nutricionista do Oba Hortifruti, especializada em nutrição clínica, esportiva e saúde intestinal.
Alguns estudos têm destrinchado o perfil nutricional e os benefícios do produto. Um desses trabalhos é conduzido pela pesquisadora Carla João Nogueira de Almeida, mestre em Nutrição e Metabolismo pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP/USP). “Além de possuir perfil lipídico semelhante ao do azeite de oliva, com propriedades físico-químicas e funcionais parecidas, o azeite de abacate possui grande quantidade de vitaminas antioxidantes e fitoquímicos capazes de proporcionar inúmeros benefícios à saúde”, descreve.
Raio-x da composição
De acordo com o nutricionista Fábio da Veiga Ued, professor do Departamento de Ciências da Saúde da FMRP/USP, o óleo de abacate e o azeite de oliva têm em comum os teores elevados de ácido oleico, também chamado de ômega-9, e a presença marcante de vitamina E.
O ômega-9 tem propriedades anti-inflamatórias e cardioprotetoras. A vitamina E, por sua vez, protege as células contra o estresse oxidativo e o envelhecimento, explica Ued, que também é autor de análises sobre o óleo do abacate.
Segundo a Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (TBCA), em uma porção de 8 gramas desse alimento, o equivalente a uma colher de sopa rasa, encontramos 5,4 gramas de ácidos graxos monoinsaturados, como é o caso do ômega-9. Na mesma porção de azeite de oliva, são 6 gramas desse nutriente. Já no quesito gorduras saturadas, o óleo de abacate concentra 1,6 gramas, enquanto o azeite de oliva soma 1,1 gramas.
“O azeite de abacate se destaca por combinar um perfil de gorduras saudáveis com compostos antioxidantes, sendo uma excelente opção para promover a saúde cardiovascular, combater o envelhecimento celular e enriquecer a dieta”, resume Ued.
Além disso, o óleo conta com polifenóis e carotenoides, que ajudam a neutralizar os radicais livres – moléculas instáveis que contribuem para o envelhecimento precoce das células e o surgimento de doenças –, e têm ação anti-inflamatória. Os nutricionistas também destacam a presença de fitoesteróis, capazes de auxiliar na redução da absorção de colesterol.
Estudos indicam ainda que o óleo de abacate possui um alto ponto de fumaça. O termo diz respeito à temperatura a partir da qual o óleo passa a queimar e oxidar, gerando fumaça e compostos associados a malefícios à saúde, como maior risco de câncer.
Melhor do que a manteiga?
Um estudo de pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) mostrou que a substituição da manteiga pelo óleo de abacate do tipo Hass, conhecido como avocado, pode reduzir a inflamação e a glicemia após as refeições.
Para o estudo, 13 voluntários saudáveis consumiram, durante uma semana, uma refeição controle – composta por manteiga, ovos, bacon, pão de trigo, batatas e açúcar gelado. Na semana seguinte, eles receberam a chamada refeição teste, onde a manteiga foi totalmente substituída por óleo de abacate Hass. Nas duas situações, os biomarcadores sanguíneos dos participantes foram medidos após a ingestão dos alimentos, e durante quatro horas.
Os pesquisadores notaram que a refeição teste, com óleo de abacate, levou a melhores níveis de insulina, glicemia, colesterol total, lipoproteína de baixa densidade e triacilgliceróis, além de reduções na proteína C-reativa e interleucina-6, indicadores de inflamação no corpo.
“O estudo mostra o potencial do óleo de abacate Hass para neutralizar o impacto negativo de uma refeição matinal rica em gordura e hipercalórica em biomarcadores importantes relacionados à saúde cardiometabólica”, concluiu a análise.
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Sem exageros
Embora a composição do óleo de abacate e as análises iniciais indiquem que o produto é bem-vindo à rotina alimentar, é preciso ressaltar que ainda há poucos estudos com humanos sobre os efeitos do consumo, alerta Daniela Cierro, vice-presidente da Associação Brasileira de Nutrição (Asbran).
Além disso, a nutricionista Priscila Kobal, docente do Centro Universitário São Camilo, em São Paulo, ressalta: os benefícios para o coração e outras partes do corpo estão associados a um consumo equilibrado. “Ele pode fazer parte da alimentação, mas sempre com moderação, pois qualquer óleo em excesso pode ocasionar um efeito adverso”, frisa a especialista.
Como consumir?
O óleo de abacate pode ser usado em saladas, molhos, vinagretes e carpaccios. Também dá para utilizar para refogar ou grelhar legumes, carnes e peixes ou até em receitas doces. Em resumo, funciona como substituto do azeite. Como o ponto de fumaça é alto, existe a possibilidade ainda de usar em frituras – porém, o ideal é evitar esse método de preparo no dia a dia.
É bom ter em mente que o sabor lembra o da fruta, e é um pouco amargo e picante. Por isso, vale brincar de cientista na cozinha, experimentando as melhores combinações.
Falando em ciência, os pesquisadores da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) estão estudando a extração de azeite fino de abacate com a mesma tecnologia usada para o azeite de oliva. Por lá, o engenheiro agrônomo Luiz Fernando Oliveira já fez alguns testes.
Ele recomenda usar o óleo em bifes, arroz refogado e – pasme – até em sorvetes. Segundo Oliveira, sorvete de creme com um fiozinho de óleo de abacate e gotas de limão siciliano formam uma combinação deliciosa.
É óleo ou azeite?
Para essa reportagem, nos deparamos com um pequeno dilema: afinal, é óleo ou azeite de abacate? Diferentes especialistas utilizam os dois termos, e a explicação para essa divergência pode estar no processo de fabricação e nos usos do produto.
O azeite de abacate geralmente é extraído da polpa com um método semelhante ao do azeite de oliva. Ele passa por extração a frio e é conhecido por ser mais refinado, com um perfil gourmet.
Já o termo óleo de abacate é mais amplo, podendo englobar essas versões mais refinadas para usos culinários até as usadas em cosméticos. Esses produtos podem passar por processos de fabricação diferentes, que alteram suas propriedades, usos e qualidade.
Mas, no fim das contas, dá para usar as duas opções. “Considera-se azeite todo óleo vegetal comestível (como o de oliva, dendê e abacate). Sendo assim, na minha opinião, considero os dois termos corretos para se referir ao abacate: óleo ou azeite”, diz Carla.
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Vale a pena colocar no cardápio?
Segundo Ued, o azeite de abacate vale a pena para quem busca alimentos funcionais de alta qualidade e está disposto a investir um pouco mais nisso. Com produção ainda limitada no Brasil, o preço geralmente é um pouco mais elevado em relação ao do azeite de oliva extravirgem (um dos mais vantajosos em termos de saúde). No entanto, o nutricionista pondera que o óleo de abacate dura bastante, pois é altamente concentrado.
À medida que for mais conhecido, consumido e produzido, diz Oliveira, esse óleo pode ficar mais barato.
Para quem quer apostar na tendência, Priscila faz uma ressalva: não é recomendável trocar totalmente os outros óleos da despensa pelo de abacate. O ideal seria apostar em um rodízio. “Os estudos com o óleo de abacate ainda estão sendo iniciados. Por isso, não temos evidências científicas robustas que nos faça indicar essa substituição. Sabemos que o consumo moderado traz benefícios, mas ainda não dá para definir qual o limite de consumo”, explica.
Daniela também faz essa indicação e acrescenta: por enquanto, a melhor forma de adquirir os nutrientes do óleo de abacate é comendo a própria fruta. “Os estudos ainda estão avançando, demonstrando seus benefícios. No entanto, preferimos incentivar uma alimentação variada, com frutas, verduras e legumes, incluindo o abacate nessa rotina”.
Um diferencial da fruta em si é a presença de fibras, substâncias associadas ao controle da saciedade e à manutenção das taxas de colesterol e glicemia.
Nova ciência, novo negócio
A produção de óleo de abacate no Brasil ainda é pequena, em parte pelo desconhecimento sobre as variedades nacionais da fruta. Acreditava-se que os abacates brasileiros tinham menos óleo. No entanto, pesquisas recentes, como a de Carla, revelaram que eles têm qualidade igual ou superior, abrindo caminho para um mercado promissor.
A Epamig, que já trabalha há anos com azeite de oliva, viu uma oportunidade estratégica: aproveitar o mesmo maquinário usado na colheita de azeitonas para extrair o óleo de abacate. Até porque, diferente das azeitonas, que só dão frutos durante três meses do ano, o abacate pode ser colhido o ano todo.
Desde que a Epamig percebeu que poderia utilizar as máquinas paradas para essa outra produção, esse tem sido um novo foco da empresa. E como o Brasil é um grande produtor de abacates, os pesquisadores estimam que o azeite da fruta pode se tornar acessível e popular em breve.
Outro usos
“Como o óleo de abacate tem propriedades antioxidantes, também ajuda na saúde da pele e do cabelo. Afinal, ele faz bem para a saúde das células, e isso diz respeito tanto à parte interna como externa do corpo”, observa Priscila.
Mas Ued faz um alerta: “No rótulo do óleo de abacate comestível estará indicado como “próprio para consumo humano” ou “para uso culinário”. Já o óleo de abacate cosmético é facilmente encontrado no mercado, mas foi desenvolvido para aplicação tópica (em pele, cabelo ou unhas). No rótulo, estará descrito como “uso cosmético” ou ‘uso tópico’”, diferencia.