A cientista-chefe da Organização Mundial da Saúde (OMS), Soumya Swaminathan, alertou nesta quarta-feira, 9, que não espera que vacinas contra a covid-19 estejam disponíveis para a população em geral antes de 2022, embora os grupos de risco possam ser imunizados em meados de 2021.
“Muitos pensam que no início do próximo ano haverá uma panaceia que resolverá tudo, mas não será assim: há um longo processo de avaliação, licenciamento, fabricação e distribuição”, frisou a especialista durante sessão de perguntas e respostas na internet.
Soumya indicou que a OMS trata a primeira chegada de vacinas a vários países em meados do próximo ano como o cenário mais otimista, momento em que deverá ser dada prioridade aos grupos de maior risco, visto que então ainda não terão sido produzidas doses para toda a população. “É a primeira vez na história que precisamos de bilhões de doses de uma vacina”, disse a cientista-chefe da entidade.
Na seleção dos grupos prioritários para receber a vacina, a indiana apontou que “os profissionais de saúde devem ser os primeiros, e assim que chegarem mais doses, devem ser alcançados os mais velhos, pessoas com outras doenças, para, assim, ir cobrindo cada vez mais a população, um processo que levará alguns anos".
Soumya enfatizou ainda que as pessoas devem continuar respeitando os protocolos sanitários e de higiene, como o distanciamento social, a utilização de máscaras e a higienização das mãos.
A declaração da cientista foi dada um dia após a farmacêutica AstraZeneca anunciar que a vacina contra a covid-19, desenvolvida em parceria com a Universidade de Oxford, teve os estudos clínicos suspensos por suspeita de reação adversa grave em um dos voluntários participantes no Reino Unido.
De acordo com o jornal The New York Times, uma pessoa familiarizada com a situação disse, sob condição de anonimato, que o participante teve mielite transversa, uma síndrome inflamatória que afeta a medula espinhal e costuma ser desencadeada por infecções virais.
Nesta quarta, no entanto, o ministro britânico da Saúde, Matt Hancock, afirmou que a interrupção dos estudos não é um retrocesso e não é a primeira vez que isso acontece. Segundo ele, é um "processo normal" nesta etapa de testes.
Na última sexta-feira, 4, a porta-voz da OMS, Margareth Harris, já havia dito que a Organização não espera uma ampla vacinação contra o novo coronavírus antes de meados de 2021. "Um número considerável de candidatos já entrou na fase 3 dos testes. Sabemos de pelo menos seis a nove que já percorreram um longo caminho em termos de pesquisa", disse.
“Mas em termos de um cronograma realista, não esperamos ver uma ampla vacinação antes de meados do próximo ano”, acrescentou Margareth. A porta-voz explicou que a fase 3 dos estudos clínicos - ou seja, a etapa de testes em massa com voluntários - leva tempo, pois os cientistas devem verificar se as vacinas são eficazes e seguras.
'Balde de água fria'
Antes do anúncio da AstraZeneca e da declaração da OMS, o ministro interino da Saúde, Eduardo Pazuello, havia dito, na terça-feira, 8, que a previsão era começar a vacinar a população brasileira contra covid-19 em janeiro de 2021. Em reunião ministerial no Palácio do Planalto, Pazuello respondeu a pergunta da youtuber mirim Esther Castilho, escalada pelo presidente Jair Bolsonaro para questionar seus auxiliares, em tom de descontração, durante parte do encontro.
Principal aposta do presidente, o acordo do governo brasileiro com a AstraZeneca garante acesso a 100 milhões de doses do insumo da vacina, das quais 30 milhões de doses seriam entregues entre dezembro e janeiro e 70 milhões, ao longo dos dois primeiros trimestres de 2021. O governo federal abriu crédito de cerca de R$ 2 bilhões para a Fiocruz receber, processar, distribuir e passar a fabricar sozinha o imunizante.
O anúncio da suspensão dos testes clínicos foi recebido no Palácio do Planalto como “um balde de água fria”, nas palavras de um auxiliar de Bolsonaro. A suspensão dos estudos deixou o presidente e integrantes da equipe bastante preocupados.
Programa Covax
Soumya Swaminathan explicou ainda sobre o funcionamento do Covax, programa pelo qual OMS e outros organismos internacionais auxiliam financeiramente a pesquisa de vacinas contra a covid-19 em troca de garantir sua distribuição para todo o mundo.
De acordo com a cientista-chefe, cerca de cem países em desenvolvimento poderiam se beneficiar do programa e mais de 70 manifestaram interesse em participar. Para isso, o Covax está em negociação com as principais empresas e instituições que pesquisam imunizantes para adquirir grandes quantidades de doses, desde que comprovadas sua eficácia e segurança.
“Alguns fabricantes propõem preços de custo, enquanto outros sugerem que sejam menores ou maiores dependendo se o país é mais ou menos rico”, revelou a especialista.
Sobre o preço aproximado das doses, Soumya indicou que atualmente pode variar entre US$ 2 e 30, embora tenha garantido que o mercado “é muito dinâmico e vai mudar à medida que mais vacinas forem disponibilizadas”. Ela também lembrou que alguns países "vacinam seus cidadãos de graça ou a baixo custo".
O Covax faz parte do programa ACT Accelerator da OMS, que não cobre apenas vacinas, mas também ferramentas de diagnóstico e terapias para pacientes com o novo coronavírus.
Após quatro meses de lançamento dessas iniciativas para garantir o acesso universal a ferramentas contra a pandemia, "um tremendo progresso foi feito", disse a cientista, ao ressaltar que a velocidade com que vacinas e medicamentos estão sendo investigados não prejudicará a segurança das pessoas. / EFE