SÃO PAULO - Ao analisar a administração de medicamentos em cinco hospitais públicos brasileiros, uma pesquisa detectou erros na administração de fármacos em 30% dos casos. Desses erros, 77% se concentraram no tempo de administração dos medicamentos, isto é, foram dados aos pacientes antes ou depois da hora certa. O estudo, publicado na revista Acta Paulista de Enfermagem, identificou quase 1,5 mil erros ao analisar a administração de 4.958 doses por via parental (que não passa pelo sistema digestivo), ministradas em cinco unidades hospitalares ligadas a universidades das regiões Norte, Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste. De acordo com Silvia Helena Cassiani, professora da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP), os objetivos do estudo foram descrever as características farmacológicas dos medicamentos envolvidos em erros de administração e determinar a frequência do problema com medicamentos potencialmente perigosos e de baixo índice terapêutico. “Investigar a relação entre as características farmacológicas e os erros de medicação é relevante, uma vez que permite identificar os tipos de medicamentos e os fatores relacionados aos erros, além de fornecer informações úteis para que sejam elaboradas iniciativas de melhoria da segurança dos pacientes”, disse à Agência Fapesp. A pesquisadora desenvolve o projeto “Segurança do paciente: clima organizacional e atitudes de segurança na perspectiva da equipe de saúde”, apoiado pela Fapesp por meio da modalidade Auxílio à Pesquisa - Regular. Segundo o estudo publicado, as administrações de fármacos para os sistemas cardiovascular e nervoso, para o trato alimentar e metabolismo e antifecciosos de uso sistêmico apresentaram maior frequência de erros. Silvia destaca que conhecer a relação entre a dose terapêutica e a dose tóxica é extremamente importante. “O conhecimento sobre os fármacos é essencial diante da diversidade do arsenal terapêutico disponível hoje nos hospitais, que cresce a cada dia com a incorporação de novas classes terapêuticas e sistemas de liberação de fármacos, gerando um fator de risco para erros de medicação”, disse. Grupos de medicamentos como os de baixo índice terapêutico (MBIT) - que contêm substâncias como ácido valproico, aminofilina e lítio - e os potencialmente perigosos (MPP) (anestésicos em geral) merecem monitorização cuidadosa da dose e de seus efeitos clínicos. “A margem de segurança para utilização dos MBIT ou MPP é pequena, portanto os erros de medicação, principalmente de dose e horário, são preocupantes, podendo causar sérios danos, principalmente em crianças e idosos”, alertou. No estudo, foram identificadas como “erros de horários” as situações em que o medicamento foi administrado em um período superior a 60 minutos de antecedência ou de atraso em relação ao horário correto elaborado pelo enfermeiro ou técnico de enfermagem. O trabalho verificou concentração na administração de medicamentos no período da manhã. “Os principais determinantes da alta incidência são fatores internos ao processo de trabalho, como o fato de o profissional ter diversos pacientes para cuidar ou falhas no sistema de distribuição, que levam a atrasos na entrega dos medicamentos e, consequentemente, na sua administração”, disse Adriano Max Reis, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), primeiro autor do artigo. Por outras vias Além dos erros de tempo na administração dos medicamentos (77,3% dos erros), o estudo concluiu que erros de dosagem respondem por 14,4% dos casos, seguido de erros de vias de administração (6,1%), de medicamento não autorizado (1,7%) e de troca de paciente (0,5%). Erros de vias de administração ocorrem quando o medicamento é dado por via errada. “Isso acontece, por exemplo, quando a prescrição indica que a administração deve ser por via intramuscular e o medicamento é aplicado por via intravenosa”, disse Reis. Já o erro de medicamento não autorizado pode ocorrer quando há troca de pacientes. “Geralmente ocorre quando há problemas na identificação do paciente, como, por exemplo, nomes parecidos em uma mesma enfermaria”, disse. Silvia considera que os resultados do estudo refletem a necessidade de se aperfeiçoar os sistemas de medicação dos hospitais brasileiros. “O problema é sistêmico, mas também envolve o conhecimento dos profissionais e da equipe de saúde envolvidos no processo de utilização de medicamentos”, afirmou. Conhecer as características farmacológicas dos medicamentos envolvidos com erros de medicação pode contribuir para o delineamento de ações preventivas, segundo a professora da USP. “A educação permanente e contínua do profissional, o dimensionamento das equipes de enfermagem para evitar sobrecarga de trabalho, um sistema de código de barras para o controle na administração de medicamentos e a distribuição por dose unitária, além da identificação correta e adequada, são medidas que podem mudar esses resultados”, disse.