A SulAmérica obteve, de forma inédita, uma liminar para bloquear R$ 82.540,83 da conta corrente de um usuário suspeito de fraudar pedidos de reembolso apresentados ao plano de saúde.
Além do bloqueio de recursos, também foi suspensa a exigência da operadora de pagar 12 pedidos de reembolso apresentados pelo réu, que totalizariam R$ 7.350.
A defesa não consta no processo e o usuário não foi localizado pela reportagem. Ele tem um prazo de 15 dias para recorrer da decisão, proferida pelo juiz Guilherme Cavalcanti Lamêgo, da 1ª Vara de Itapecerica da Serra.
Investigação
Segundo a SulAmérica, o beneficiário apresentou 248 solicitações de reembolso, sendo 123 fraudulentas.
Geralmente, ele apresentava notas no valor de R$ 550 ao protocolar os pedidos, e uma médica que constava nesses documentos negou ter feito qualquer atendimento.
Posteriormente, foram apresentados novos recibos desse mesmo segurado e de dois dependentes com os nomes de outros especialistas. Ao todo, cinco médicos foram listados como prestadores de serviço, mas, de acordo com a SulAmérica, todos negaram ter realizado os atendimentos.
A auditoria interna continuou investigando a situação e descobriu que, de maio de 2022 até julho de 2024, o usuário e os dependentes receberam R$ 267.199,75 em reembolsos. “Foi possível verificar que a mesma nota fiscal – com adulterações – foi anexada em diversas solicitações diferentes, para forjar o pagamento de um atendimento não realizado”, diz a empresa.
Por fim, a partir da ferramenta de biometria facial, foi possível confirmar que as solicitações foram apresentadas diretamente pelo beneficiário, e não por um terceiro.
A partir daí, a SulAmérica apresentou notícia-crime no Ministério Público de São Paulo e ajuizou ação de cobrança, requerendo a concessão de liminar para o bloqueio de valores.
Para o juiz, a documentação exibida pela operadora de saúde juntamente com as declarações da primeira médica “trazem evidências de burla do sistema de reembolso, de falseamento da realidade, de forjamento de atendimentos, em prejuízo patrimonial da autora”.
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Função educativa
É a primeira decisão de bloqueio de conta de pessoa física, segundo a Associação Brasileira dos Planos de Saúde (Abramge). “Mas isso vai ficar cada vez mais frequente”, afirma Cassio Ide Alves, diretor técnico-médico da associação.
“Temos orientado bastante as operadoras a usar todos os mecanismos possíveis para detectar essas fraudes e recuperar parte do fundo mutual, porque quando esse fundo é lesado sobra para todo mundo”, diz Alves. “A fraude aumenta a sinistralidade, o que afeta o reajuste e a precificação para novos planos. Ela prejudica um dos pilares fundamentais na saúde suplementar que é o mutualismo”.
Além do uso de reconhecimento facial na submissão dos pedidos de reembolso, a Abramge tem recomendado o uso de inteligência artificial para a identificação de padrões divergentes.
Outra medida recomendada é a adoção de sistemas capazes de apontar troca de caracteres em documentos para impedir que uma única nota seja alterada e reapresentada diversas vezes — além da fraude por pedido de reembolso, outros golpes contra operadoras incluem a emissão de boletos falsos, a falsificação de laudos de exames e o fracionamento de recibo.
Alves destaca, contudo, que apenas as grandes operadoras têm capacidade de investir nesse tipo de tecnologia. “Dos 141 associados, 90% são pequenas e médias empresas que vão demorar um pouco para conseguir agregar essa tecnologia”, diz.
“Mas ações como a da SulAmérica têm também uma função educativa”, acredita. “Não podemos tratar a fraude contra planos de saúde como um crime menor. É um problema sério e para todos”.