AGÊNCIA EINSTEIN – Nem todo mundo lida bem com momentos difíceis quando é preciso vivenciar a tristeza, a raiva, a angústia, o luto. Ainda assim, evitar essas emoções e tentar esforçadamente buscar um lado bom em momentos de dificuldade pode indicar uma positividade tóxica, um termo muito usado em discussões sobre pensamentos excessivamente positivos na pandemia, mas que está longe de perder a relevância.
A positividade tóxica está relacionada a uma certa negação dos sentimentos negativos, uma vez que são repreendidos ou ignorados. O médico coordenador da psiquiatria do Hospital Israelita Albert Einstein, Alfredo Maluf, explica como esse comportamento é diferente da positividade saudável ou do otimismo.
Segundo ele, as emoções são como uma “zona de equilíbrio” e se dividem em positivas e negativas. É natural que algumas pessoas apresentem tendências negativas, enquanto outras buscam uma maior positividade na forma de enxergar o mundo.
“O problema é que quando há um desequilíbrio nesta zona, cria-se uma espécie de mecanismo de defesa de situações irreais, onde se tenta a todo instante eliminar a parte negativa das emoções e da vida,” comenta.
Um estudo realizado pelos departamentos de psicologia das Universidades de Denver e de Nevada, nos Estados Unidos, indicou que não aceitar emoções negativas, como raiva, culpa e medo, pode gerar problemas na saúde mental, entre eles a depressão e a ansiedade.
A pesquisa foi realizada com 116 mulheres que responderam a questionários sobre aceitação, afetos negativos e assistiram a dois vídeos projetados para induzir sentimentos em diferentes escalas. Após cada vídeo, as participantes avaliaram a intensidade máxima de emoções negativas que experimentaram durante a exibição.
Com a experiência, os autores relatam que a negação de sentimentos tende a ocorrer com frequência e que pode ser prejudicial à saúde mental: “paradoxalmente, aceitar, em vez de evitar, uma emoção negativa pode estar associada a níveis mais baixos de afeto negativo”, comentam os responsáveis pelo estudo.
Positividade tóxica x otimismo
O psiquiatra do Einstein explica que, no otimismo, busca-se uma forma de enxergar os pontos positivos da vida, mas sem ignorar os negativos, ao contrário do que acontece na positividade tóxica.
“A pessoa que apresenta um positivismo tóxico sempre acha que tudo vai dar certo e que as coisas sempre se encaixam e assim tentam se proteger dos lados da tristeza e amarguras da vida. Diante disso, são reproduzidas atitudes e frases que passam por cima de sentimentos ruins. A frase ‘pense positivo’ muitas vezes já é um positivismo tóxico em momentos que não é possível levar a situação com positividade”, pontua Maluf.
Entender os sentimentos com mais naturalidade também auxilia no entendimento: raiva, tristeza, desânimo e sentimentos negativos são comuns e inevitáveis. O psiquiatra explica que isso é diferente de patologias como a depressão e níveis elevados de ansiedade.
A positividade tóxica pode prejudicar a saúde de um indivíduo, impedindo-o de trabalhar, pensar e aprender com os momentos difíceis, que têm o mesmo valor das experiências boas. Maluf também observa que essa negação das próprias emoções tem potencial de acontecer também em ambientes e relações tóxicas.
Como se afastar da positividade tóxica?
Além de desenvolver a aceitação de emoções, alguns outros costumes e práticas podem auxiliar no afastamento da positividade tóxica. O artigo ‘’Toxic positivity’: Why it is important to live with negative emotions”, publicado no The Conversation, aponta que mudanças simples de atitude já evitam padrões. Por exemplo, praticar a escuta e o entendimento de pessoas com problemas e substituir frases como “vai ficar tudo bem” e “pense positivo” por “foi um dia difícil, não foi?”.
Já Maluf recomenda uma atenção maior em alguns conteúdos de autoajuda cada vez mais presentes em livros ou em redes sociais. “Deve-se analisar se tais conteúdos auxiliam o leitor a refletir sobre as emoções ou se o incentiva a negar seus pensamentos e sentimentos.”
Na visão do psiquiatra, é necessário possuir condição e equilíbrio para poder refletir sobre os sentimentos, em vez de afastá-los, mesmo que sejam difíceis. “Quanto mais aceitarmos que a vida não é um mar de rosas, você estará mais preparado para as alegrias e as frustrações. Até das coisas que não esperamos, mas que fazem parte da vida”, conclui o especialista.
*Sob supervisão de Carolina Dantas